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Desenvolver a capacidade de resolução de problemas nas crianças é parte do ensino do autocontrole. A habilidade de resolver problemas interpessoais está intimamente ligada à prevenção de comportamentos impulsivos e agressivos em crianças. As crianças enfrentam problemas todos os dias: pequenas desavenças com os colegas em suas brincadeiras e esportes, dificuldades escolares, dificuldade para completar uma tarefa ou até mesmo para escolher uma roupa para brincar. A resolução de problemas é uma habilidade importante que faz parte de vários repertórios, mas aqui discutiremos seu papel no autocontrole. As crianças precisam aprender a lidar com seus problemas por si mesmas. Ao tentar resolver a maioria dos problemas das crianças, como fazer seus trabalhos de casa ou gerenciar os conflitos com colegas, os pais criam dependência e imediatismo. Mas quando uma criança resolve um problema por si mesma está melhorando seu senso de competência e consequentemente fortalecendo sua autoestima. Ela precisa pensar no que fazer, e isso implica no autocontrole, na regulação do próprio comportamento. Por outro lado, quando uma criança não tem as habilidades para resolver um problema e de alguma forma se sente impotente, entra em um processo de evitação, de não enfrentamento. Por exemplo, se uma criança está sendo maltratada pelos seus colegas e não sabe como reagir, em vez de enfrentar a situação, dirá que não gosta de escola, ou se queixará de problemas de saúde para evitar se expor à mesma situação. Outras vão se negar a reconhecer que têm escolhas, reagindo impulsiva ou agressivamente. Organizar sequências de ações (OS). A habilidade de pensar sequencialmente, no antes e depois de um determinado comportamento, é um pré-requisito importante para a compreensão de causa e efeito. PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS Autora: Psic. Dra. Cynthia Borges de Moura CRP: 08/5822 Rumo ao autocontrole: Depois do controle inibitório, a resolução de problemas... Algumas habilidades para ensinar resolução de problemas às crianças: (Adaptado de Shure, 2006¹) 1 [1] Shure, M. B. Eu posso resolver problemas: um programa de solução cognitiva para problemas interpessoais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. 1 / 7 Entender o que precipitou um ato (PA). O pensamento causal² também é um pré-requisito para o autocontrole e a resolução de problemas. Não é de hoje que se sabe que, quando os indivíduos assumem a responsabilidade pela sua conduta, reconhecem o problema e o que o desencadeou, isso os coloca em melhores condições de pensar alternativas de solução ou mesmo reparação do seu erro (Hewstone, 1989). Perceber os sentimentos e a perspectiva dos outros (PS). Habilidade também chamada de empatia. Consiste em perceber e compreender os comportamentos e sentimentos alheios. Está relacionada a comportamento pró-social, resolução de conflitos e autocontrole, pois ajuda a criança a adequar o próprio comportamento ao contexto social e interpessoal e gerar soluções adequadas. 3 4 [2] Hewstone, M. Causal attribution: from cognitive processes to collective beliefs. Oxford: Blackwell Publishers, 1989. Formular soluções alternativas (FS). A criança precisa gerar várias soluções possíveis para uma situação-problema. Uma maneira divertida é a “chuva de ideias”, o famoso brainstorming. Consiste em relacionar todas as soluções possíveis por mais “loucas” que possam parecer. Esta técnica é fantástica, pois mesmo ideias absurdas podem ser precursoras de uma boa solução. 5 Considerar as consequências (CC). A habilidade de antecipar o que pode acontecer depois, como resultado de um comportamento pode ajudar a criança no autocontrole. A criança precisa listar as possíveis consequências de cada opção, para ela, e para os outros inclusive. 6 Escolher uma decisão (ED). Nessa fase, devemos ensinar às crianças que se escolhermos uma ação, e isso não resolver o problema, podemos tentar outra coisa. Neste sentido, elas devem ser encorajadas a continuar tentando até que uma solução adequada seja encontrada. 7 PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS 2 / 7 Reconhecer onde está o problema (RP). Identificar onde está “o problema” é uma habilidade importante do autocontrole. Muitas vezes por não discriminarem a quê devem responder, as crianças reagem a aspectos periféricos da situação, criando mais problemas, ao invés de resolvê-los. 2 Oriente a criança não apenas a organizar a sequência, mas também a descrever verbalmente para você o que está acontecendo nas imagens que ela organizou. Para isso você pode usar os seguintes materiais: Sequências Lógicas – Tempo, Trânsito, Vida, Animais, Profissões (Ed. Simque); Antes e Depois (Ed. Matrix) e Coloque na Ordem (Matrix). Coloque o foco do treino não apenas na destreza da realização da tarefa de forma não verbal (organização das sequências), mas principalmente na descrição verbal detalhada da história que se configura na sequência organizada. Assim que a sua avaliação do desempenho da criança atingir nota 4, ou seja, a criança relata verbalmente com detalhes a sequência lógica, descrevendo comportamentos, pensamentos e sentimentos dos personagens (quando for o caso), você pode introduzir as duas próximas habilidades. Comece pela organização de sequências (OS)A B PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS Vá para o reconhecimento do problema (RP) e análise causal (PA) No início dessa etapa use as três situações do Apêndice A. Veja que nessas imagens várias organizações são possíveis. Mostre esses diferentes arranjos e discuta com a criança qual lhe parece ser o problema e o que pode ter causado/motivado o comportamento foco da análise. Veja o primeiro exemplo: 3 / 7 Algumas habilidades para ensinar resolução de problemas às crianças: Você pode pensar o treino de resolução de problemas do seu pequeno cliente seguindo as etapas propostas no diagrama abaixo OS PARP PSFSCC ED A B CD E Observe que aqui (*) não se pretende ensinar uma “análise causal” em profundidade, apenas que a criança discrimine o que pode ter precipitado o problema, para que nos próximos passos, frente ao mesmo estímulo possa reconhecer a legitimidade de outras respostas. Ajude a criança a identificar onde está “o problema” e observe se a atribuição causal que ela faz tem locus externo ou interno. Externo, quando as prováveis causas apontadas mostram que o controle não dependeu do sujeito da ação, e interno quando mostram que o sujeito pode exercer algum controle sobre o que faz. Obviamente conduza-o a perceber que o sujeito tem controle, tem escolha sobre suas ações e poderia ter escolhido agir de forma diferente. Assim que a sua avaliação do desempenho da criança atingir nota 4, ou seja, ela faz atribuições com locus interno, sem sua ajuda, vá para a próxima etapa. C PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS Treine a percepção dos sentimentos e da perspectiva dos outros (PS) A terceira etapa é o treino de empatia. Use as fotos do Apêndice B. Apresente as imagens na sequência que lhe parecer mais apropriada e proponha as seguintes questões: O que está acontecendo? Qual é o problema? Escolha um personagem e me diga como você acha que ele está se sentindo? E o que ele está pensando? 1 - 2- 4 / 7 Arranjo possível Causa provável* Menino faz um castelo de areia com menina Castelo vai aparecendo Castelo fica pronto Menino destrói o castelo O menino pode ter se irritado com algo que a menina pode ter dito, e chutou o castelo. Menino faz castelo de areia com menina (castelo meio pronto) Castelo fica pronto Menino destrói o castelo Menino ajuda reconstruir o castelo Nesse arranjo algo acontece que motiva o menino a chutar o castelo, mas ele parece se arrepender e ajuda a reparar o erro, construindo outro. Menino destrói o castelo da menina Menino ajuda reconstruir o castelo Castelo vai aparecendo Castelo fica pronto. Nesse arranjo, menino vê a menina construindo castelo e o destrói (Ciúme? Inveja?) mas na sequência ajuda a reconstruir,reparando seu erro. Aqui você pode usar os problemas propostos por vários materiais: “70 de Novo!” (Terapia Criativa), “Pergunte que eu Respondo” e “Resolvendo Conflitos” (ambos da Idea Jogos). Não se prenda às respostas dos jogos. Apenas use o problema proposto e gere as alternativas com seu cliente. Vá anotando as opções. Gerem de três a cinco alternativas para cada problema. Em seguida analisem as consequências de cada uma: aquela solução é boa pra quem? Só pra você? Só pro outro? Ou pra ambos? Resolveu o problema de forma adequada? Foi uma reação impulsiva ou uma solução pensada? Essa etapa tem uma importância fundamental no autocontrole e na resolução de problemas, por isso dedique várias sessões a essa parte do treino, e deixe tudo anotado, porque as alternativas e consequências geradas nesta etapa serão trabalhadas na próxima, a de tomada de decisão. Assim que o desempenho da criança atingir nota 4, avance para a Etapa E. A chuva de ideias ou brainstorming é uma técnica conhecida que tem por objetivo gerar opções para a resolução de um problema. Ao usar essa técnica com crianças, não apenas trabalhamos sua capacidade de tomar decisões, como também desenvolvemos sua criatividade. Ao propor um problema para que as alternativas de ação sejam geradas, procure: Incentivar a produtividade. Num primeiro momento, a quantidade é mais importante que a qualidade. É necessário gerar muitas ideias para análise. Escutar ativamente. Ao escutar atentamente podemos entender a proposta e melhorar a ideia apresentada. Ao agregar ideias, podemos gerar uma muito boa. Não descartar ideias. Ao se sentir livre para falar, a criança pode gerar soluções inesperadas e criativas, e se abrirá para pensar quais podem ser boas ou não. PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS 5 / 7 D Formule soluções alternativas (FS) e considere as consequências (CC) Depois que passar pelas seis fotos e a criança tiver obtido nota 3 ou 4 nas últimas duas fotos, passe para a próxima etapa. Se ela atingir rapidamente o critério de nota, use pelo menos três fotos antes de progredir para a habilidade seguinte. E o outro personagem? O que ele deve estar sentindo/pensando? Escolha um personagem para ser você. O que você pensaria se fosse ele? Agora escolha outro personagem e faça o mesmo. 3- 4- 5- O role-playing deve ser sempre iniciado com a criança no papel dela mesma, para que você terapeuta observe como ela se comporta. Na segunda rodada, você faz o papel dela, tentando aprimorar a fala ou o comportamento apresentado, para dar modelo de resolução de problemas. Acrescente poucos detalhes para que ela não entenda seu modelo como crítica ou reprovação ao que ela fez, ou como um modelo inatingível, muito difícil de ser imitado. Na terceira rodada, a criança volta para o papel de protagonista e agora tenta melhorar, com base no seu modelo, a resposta emitida anteriormente. De maneira simplificada, a tomada de decisão significa o processo de escolha de uma opção dentre várias outras. Refere-se a um processo cognitivo de escolha que envolve análises emocionais e racionais das experiências, considerando riscos e implicações atuais e futuras (Bechara, Damasio, Tranel, e Damasio, 1997³). PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS 6 / 7 [3] Bechara, A., Damasio, H., Tranel, D., Damasio, A. R. Deciding advantageously before knowing the advantageous strategy. Science, v.275, n.5304, p.1293-1295, 1997. Não espere 100% de mudança comportamental da criança em termos de resolução de problemas. Se uma criança impulsiva conseguir gerar boas soluções para 6 em cada 10 situações-problema, teremos atingido nosso objetivo. Isso porque na infância, ainda é papel do adulto direcioná-la sobre como se comportar nas diferentes situações e nas tomadas de decisões, e mesmo adultos não acertam sempre nas decisões tomadas! Espera-se que neste ponto, o treino esteja se generalizando para situações do dia a dia, e se ainda não estiver, selecione tais situações para treino específico desde a etapa anterior. E, se necessário, trazendo tópicos das etapas B e C. Converse com ela sobre as vantagens e desvantagens desse novo comportamento. Nesta etapa, assim como na anterior, você pode também incentivá-la a trazer relatos de situações reais para análise e treino das soluções escolhidas. Se as crianças conseguirem analisar consequências imediatas e a curto prazo está ótimo. Até porque, provavelmente, você está usando esse protocolo com crianças impulsivas. Use as mesmas situações-problema na etapa anterior, para as quais vocês levantaram alternativas e consequências, para agora escolher uma decisão e fazer role-playing sobre ela. Depois do ensaio, converse sobre as vantagens e desvantagens desta escolha, e se a criança quiser ensaiar outra decisão para ter opções na situação real, ajude-a nisso. E Escolha uma decisão (ED) e ensaie. PROTOCOLO DE TREINO DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS PARA CRIANÇAS Folha de Registro - Modelo Com respeito a habilidade foco da sessão, o desempenho do cliente foi: 1- Ruim 2- Razoável 3- Bom 4- Muito bom Data Habilidade Nota Observações do terapeuta 7 / 7
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