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1 FACULDADE ÚNICA DE IPATINGA 2 Henrique Dias Sobral Silva Doutorando em História pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2017). Graduado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2015. Atua como professor em escolas rurais e em iniciativas populares de educação nas cidades do Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Membro do Coletivo de Pesquisa Desigualdade Social, Juventudes e Educação de Jovens e Adultos da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atua como professor convidado do Curso de Especialização em Saberes e Práticas da Educação Básica e Ensino de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Possui experiência na área de História e Educação, principalmente nos seguintes temas: História Social e Política, Metodologia Científica, Educação de Jovens e Adultos, Educação a Distância. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS 1ª edição Ipatinga – MG 2021 3 FACULDADE ÚNICA EDITORIAL Diretor Geral: Valdir Henrique Valério Diretor Executivo: William José Ferreira Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa Revisão/Diagramação/Estruturação: Bárbara Carla Amorim O. Silva Bruna Luiza Mendes Leite Carla Jordânia G. de Souza Guilherme Prado Salles Rubens Henrique L. de Oliveira Design: Brayan Lazarino Santos Élen Cristina Teixeira Oliveira Maria Luiza Filgueiras Taisser Gustavo de Soares Duarte © 2021, Faculdade Única. Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autorização escrita do Editor. Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920. NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA Rua Salermo, 299 Anexo 03 – Bairro Bethânia – CEP: 35164-779 – Ipatinga/MG Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300 www.faculdadeunica.com.br 4 Menu de Ícones Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos. Eles são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um com uma função específica, mostradas a seguir: São sugestões de links para vídeos, documentos científico (artigos, monografias, dissertações e teses), sites ou links das Bibliotecas Virtuais (Minha Biblioteca e Biblioteca Pearson) relacionados com o conteúdo abordado. Trata-se dos conceitos, definições ou afirmações importantes nas quais você deve ter um maior grau de atenção! São exercícios de fixação do conteúdo abordado em cada unidade do livro. São para o esclarecimento do significado de determinados termos/palavras mostradas ao longo do livro. Este espaço é destinado para a reflexão sobre questões citadas em cada unidade, associando-o a suas ações, seja no ambiente profissional ou em seu cotidiano. 5 SUMÁRIO UM PERCURSO PELA PEDAGOGIA E ANDRAGOGIA: CONSIDERAÇÕES GERAIS ....................................................................................................... 7 1.1 O LUGAR DO ADULTO NA PEDAGOGIA ............................................................. 7 1.2 PEDAGOGIA E ANDRAGOGIA: DEBATES ........................................................... 8 1.3 ANDRAGOGIA E A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: APROXIMAÇÕES E DIFERENÇAS ....................................................................................................... 11 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................... 14 HISTÓRIA DA EJA NO BRASIL .................................................................. 20 2.1 COLÔNIA E IMPÉRIO (1530-1889): PORQUE ENSINAR ADULTOS? .................. 20 2.2 BRASIL REPUBLICANO (1889-1988): COMO SE ENSINAR ADULTOS? .............. 23 2.3 BRASIL DO TEMPO PRESENTE (1988-SÉCULO XXI): NA LUTA A GENTE SE ENCONTRA ......................................................................................................... 28 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................... 30 ASPECTOS SÓCIO-LEGAIS DA EJA ......................................................... 36 3.1 A LEI COMO ESPAÇO DE DISPUTA .................................................................... 36 3.2 A EJA NAS LEIS DE EDUCAÇÃO NO BRASIL ..................................................... 38 3.3 ESPAÇOS DA SOCIEDADE CIVIL PARA DEBATE SOBRE A MODALIDADE ....... 44 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................... 46 MÉTODOS E TÉCNICAS PARA ENSINO NA EJA ...................................... 52 4.1 CONCEPÇÃO DE ENSINO ................................................................................. 52 4.2 ANÁLISE DE CURRÍCULO .................................................................................... 54 4.3 ABORDAGENS EM SALA DE AULA ..................................................................... 56 4.4 AVALIAÇÕES ...................................................................................................... 59 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................... 61 TODAS AS LETRAS DA EJA ....................................................................... 66 5.1 O J DE JUVENTUDE NA EJA ............................................................................... 66 5.2 O M DE MULHERES NA EJA ................................................................................ 68 5.3 O I DE IDOSOS NA EJA ...................................................................................... 69 5.4 A SIGLA NA SIGLA: O PCD NA EJA .................................................................. 70 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................. 74 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS DA MODALIDADE ................................ 79 6.1 PRECARIZAÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE...................................................... 79 6.2 EVASÃO ESTUDANTIL ......................................................................................... 81 6.3 TERMINALIDADE ................................................................................................. 82 6.4 DESESCOLARIZAÇÃO ........................................................................................ 84 FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................... 86 RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO ............................................... 91 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 92 UNIDADE 01 UNIDADE 02 UNIDADE 03 UNIDADE 04 UNIDADE 05 UNIDADE 06 6 CONFIRA NO LIVRO A unidade I apresenta um panorama das ciências agógicas e sua relação com a educação, destacando a pedagogia e a andragogia como elementos pertinentes para se pensar a formação de adultos. Explora-se ainda o diálogo, aproximações e distâncias entre a andragogia e a Educação de Jovens e Adultos. A unidade II trata da história da educação de jovens e adultos no Brasil. Com perguntas mobilizadoras, espera-se discutir a história desta modalidade pensando em seus alunos, professores e projetos pedagógicos. A unidade III discute o lugar da EJA no debate sócio-político e legislativo. Sem pensarmos asleis como elementos frios e taxativos, esse capítulo tem por intenção demonstrar como é a relação de forças políticas, as ideias e as propostas para a modalidade. Na unidade IV os leitores são convidados a pensar em algumas formas específicas de trato com a EJA. Por meio de métodos, técnicas, currículos, concepções de ensino e formas de avaliações a intenção é aproximar o universo dessa modalidade. Na unidade IV os leitores são aproximados dos públicos da EJA. Por meio de uma identificação ampla que acolhe as especificidades etárias, de gênero e capacidades, é possível conhecer mais a fundo as demandas de cada um desses grupos. Na unidade VI são apresentados alguns desafios presentes na prática docente na modalidade. Espera-se que o reconhecimento teórico desses desafios instrumentalize graduandos para uma atuação mais assertiva em sua prática docente na EJA. 7 UM PERCURSO PELA PEDAGOGIA E ANDRAGOGIA: CONSIDERAÇÕES GERAIS 1.1 O LUGAR DO ADULTO NA PEDAGOGIA Os motivos para o ingresso no curso de Pedagogia são muitos e um dos grandes sensos comuns dos ingressantes é o pensamento de que a graduação será um processo de ensino-aprendizagem voltado somente para o trato com crianças. Esse pré-conceito deve ser desmantelado, afinal, os públicos de trabalho do pedagogo são múltiplos e não somente a infância. Jovens, adultos e idosos também são atendidos pela ação do pedagogo. Longe de receber esses públicos com estranheza, cabe a esse profissional proporcionar um ambiente de acolhimento e escuta sensível para esses sujeitos. Para o trato com essas subjetividades e suas demandas específicas, há intenções e formas de tratamento distintas, pois cada um desses grupos deve receber uma atenção diferenciada conforme sua demanda. Uma das formas de se pensar esses grupos é por meio da diversidade e pela trajetória de escolarização individual. Sua pluralidade de histórias, as questões de gênero (afinal, as questões cotidianas colocadas para homens e mulheres são distintas), a cultura e aspectos sócio-econômicos são elementos importantes para esse debate. No campo da escolarização, há que se pensar: Qual é a formação desse sujeito? Como se dá sua expressão escrita e verbal? Quais experiências essas pessoas trazem para a sala de aula? Essas indagações iniciais são fundamentais para um exercício de contato entre pedagogo e os públicos extra-infantis. Há que se destacar que esse contato inicial não pode se sobrepor ao conhecimento e, por isso, o trato com o processo de ensino-aprendizagem para jovens, adultos e idosos em contato com a Pedagogia é realizado com o suporte de duas áreas, a Andragogia e a Educação de Jovens e Adultos (EJA). A primeira, voltada para a educação universitária ou corporativa, é direcionada a grupos escolarizados e, em muitos casos, portadores de diploma do ensino superior e a segunda voltada para a escolarização, à nível fundamental e para o ensino médio, UNIDADE 8 de alunos jovens e adultos comumente das classes populares de nosso país. Enquanto a Andragogia se detém sob a formação de grupos mais restritos em sua quantidade, pensar a EJA hoje é discutir a situação sócio-política e econômica de cerca de 6,6% da população analfabeta no Brasil e que ainda encontra-se marginalizada por conta da não escolarização ou da deficiência nesse percurso formativo (PNAD, 2019). Ademais, a EJA hoje tem 3.273.668 estudantes matriculados, assim, o convite deste capítulo é pensar os contornos dessas modalidades de educação para adultos (ANUÁRIO BRASILEIRO DA EDUCAÇÃO BÁSICA, 2019). Antes de uma aproximação com um debate entre esses dois eixos de formação, pretende-se discutir os significados e as relações entre a Pedagogia e a Andragogia, os modos como como essas áreas dialogam, considerando suas aproximações e diferenças. Acompanhe a seguir 1.2 PEDAGOGIA E ANDRAGOGIA: DEBATES O percurso aqui estabelecido entre a Pedagogia e a Andragogia começa com o entendimento etimológico dos conceitos. A palavra Pedagogia é uma construção vinda do grego antigo, sendo formada pelo prefixo paidos, que identifica criança e o sufixo agoge, em tradução livre pode ser entendida como condução, acompanhamento. Neste sentido, pensar a Pedagogia seria refletir sobre a orientação técnica e a educação para crianças (ARANHA, 1998). Com uma historicidade que remonta a Grécia Antiga, a Pedagogia foi sendo difundida ao longo de séculos no mundo ocidental, partindo de uma perspectiva de atenção e atuação sobre as formas de conduzir, ensinar e educar o outro. Ao longo dos tempos, há que se dizer que seus debates e questões se aperfeiçoaram e toda 9 uma série de métodos e técnicas foram sendo incorporadas. Sendo assim, hodiernamente, é necessário complexificar a discussão e o entendimento de que a Pedagogia não trata-se apenas da atenção aos seus públicos, mas é, antes de tudo, uma seara de conhecimento que congrega distintas áreas do saber no entorno da discussão sobre ensino-aprendizagem. Em suas referências carrega consigo um compromisso ético-político de diálogo com “[..] saberes científicos, [...] saberes da experiência, dos saberes do senso comum pedagógico, sob o primado da reflexão filosófica” (PINTO, 2008, p. 110). Por outra parte, a construção etimológica da Andragogia se refere a andro que significa adulto e o sufixo agoge que identifica formas de supervisão e suporte. No limite, um ensino voltado para adultos que, logicamente, demanda códigos e características específicas para sua realização. A construção histórica da Andragogia é egressa do século XIX, especificamente dos debates propostos pelo alemão Alexander Kapp (1799-1869). Em seus estudos sobre a Educação, com forte inspiração nas discussões do filósofo grego Platão, o educador construiu o conceito de Andragogia como um conjunto de estratégias com a finalidade de prover o ensino para adultos, tendo sua teoria um forte apelo à experiência dos estudantes. Apesar desses esforços iniciais, foi somente no século XX, mais especificamente com as pesquisas dos educadores norte-americanos Eduard C. Lindeman (1885-1953) e Malcolm Knowles (1913-1997) que o conceito ganhou maior visibilidade. Sendo o primeiro professor-pesquisador, responsável pela ideia de uma educação centrada nas experiências de vida, no comportamento independente da vida adulta e de uma noção de que o aumento da faixa etária fazia com que as diferenças individuais fossem mais presentes. 10 De forma complementar, Knowles - que conheceu e dialogou com Lindeman - propunha que um modelo das características do trabalho andragógico deveriam passar pelo entendimento amplo dos adultos. Para o professor-pesquisador, o adulto demandaria a necessidade/aplicabilidade contextualizada do saber e independência no processo de ensino. Ademais, a Andragogia deveria estar pautada em um forte papel das experiências, a disposição ao aprendizado e a motivação intrínseca, ou seja, aquela advinda do próprio estudante, tal como a melhora da vida material, avanços dos estudos, vaidade, por exemplo (NOGUEIRA, 2004). Expostos esses contornos das duas perspectivas, é necessário pensar como a Pedagogia e a Andragogia dialogam. Afinal, se ambas tratam de educar/conduzir, quais as semelhanças e diferenças desses conceitos? Crianças e adultos se apresentam de formas muito diversas no processo de ensino-aprendizagem? Pensando nas similaridades, a Pedagogia ao passo que em seu conceito trata-se da educação de crianças, carrega consigo estatutos e especificidades didáticas, currículos e uma trajetória de discussões sobre a experiência de alunos e professores. Sendo assim, é possível dizer que a Pedagogia não é alheia à Andragogia, mas sim,é independente e está ao mesmo tempo contida nesta. Outro tema importante que conecta as duas vertentes é a atenção à figura do estudante/aprendiz adulto. Em cada uma dessas abordagens é possível notar a atenção com as experiências desses sujeitos, ainda que os níveis de profundidade dessa abordagem sejam distintas, ambas pensam no acolhimento das demandas desses sujeitos e na bagagem cultural que carregam consigo para suas formação. Um aspecto de destaque comum às duas é a demanda por um ambiente de aprendizagem propício à aprendizagem. Seja com adultos ou crianças, as duas concepções defendem a necessidade de espaços seguros e confortáveis para a execução do processo de ensino-aprendizagem. No campo das diferenças, o ensino e aprendizagem das crianças demanda um exercício teórico e prático de acompanhamento mais contínuo e alargado. Por outra parte, o trato com adultos demanda uma série de considerações específicas, o diálogo com um cabedal bastante alargado de experiências, limitações e características próprias ligadas ao tempo de vida. Os modos de enunciação dos sujeitos também é distinto, dado que na Pedagogia fala-se em professores e estudantes e em termos sinônimos que 11 identificam essas subjetividades, identidades e particularidades presentes no processo escolar. Por outra parte, a Andragogia faz uma opção pelos termos aprendiz adulto e auxiliar de aprendizagem. Para os pesquisadores da Andragogia os termos empregados alteram a figura do professor e seu papel centralizador dos conhecimentos para a de um colaborador com o processo de aprendizagem. Há na Andragogia uma crítica marcada à uma certa Pedagogia, hoje em desuso, que apontava uma centralidade do professor na sala de aula e no processo de ensinar, sendo um aluno secundarizado nessas práticas (JARVIS, 1989). Todavia, a Pedagogia mais recente se desvencilha dessa crítica assumindo uma leitura compartilhada da sala de aula em que professores e estudantes têm seu protagonismo demarcado, bem como suas interações e especificidades. Decorre disso uma noção bastante presente na análise entre essas áreas que aponta para a Pedagogia como uma “educação desde o topo”, sendo a Andragogia uma “educação entre iguais” (JARVIS, 1989, p. 74-75). Isso se dá por conta da postura do professor e do pedagogo frente a esses dois públicos que precisa ser modulada, mas não necessariamente autoritária, cabendo ao profissional realizar sua ação pedagógica conforme o perfil e as demandas do seu coletivo de educandos. Seja no diálogo com especificidades ou similaridades, é importante destacar que o trabalho do pedagogo é fundamental para o entendimento mais alargado das diferenças dos modos de ensino-aprendizagem conforme as faixas etárias citadas. Cabe a esse profissional não só o entendimento dessas distinções, mas também a possibilidade de troca de experiências e saberes com professores responsáveis pelo acolhimento de crianças e adultos. Assim, diante do quadro apresentado, pode-se dizer que só há Andragogia porque existe Pedagogia. A educação de adultos de base andragógica é um conjunto de ações e práticas estruturadas em termos pedagógicos, demonstrando que elas são complementares e, por isso, devem ser reconhecidas de modo crítico pelos pedagogos. Portanto, o convite deste capítulo é para o entendimento das especificidades de adultos e os modos como eles e outros grupos merecem ser tratados, com respeito e dignidade perante os seus saberes, em seu retorno à escola e à escolarização. 1.3 ANDRAGOGIA E A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: 12 APROXIMAÇÕES E DIFERENÇAS No tópico anterior foi discutida a relação entre a Pedagogia e a Andragogia e, nesse momento, o objetivo é tornar o debate mais complexo por meio da comparação entre a Andragogia e a Educação de Jovens e Adultos (EJA). O objetivo aqui é contrastar essas perspectivas de modo a acolher as especificidades, diferenças e possibilidades no processo educativo. A EJA trata-se de uma modalidade de educação, que oferece vagas de ensino fundamental e médio para jovens, adultos e idosos que não tiveram garantido o acesso à escolarização na idade certa, garantindo ao seu público a possibilidade de inclusão social. Ela é oferecida a pessoas acima de 15 anos de idade, pelas secretarias de educação, no formato presencial, semipresencial ou a distância. Ademais, desde a década de 1990, encontra-se respaldada nas leis de educação de nosso país, representando a conquista e os resultados de lutas históricas de movimentos sociais ao longo da segunda metade do século XX. Sua estrutura abarca três funções específicas: a reparadora, dado que garante a possibilidade de reencontro ou primeiro acesso do jovem/adulto à escola; além desta, a equalizadora, em que é possível uma retomada dos estudos do momento em que o processo de educação foi paralizado, sem comprometimentos para a aprendizagem; e a função qualificadora, promotora da presença dos saberes ao longo da vida dos sujeitos (BRASIL, 2000). Diante desses elementos, há que se destacar que a EJA encontra-se fortemente atrelada à noção de educação popular (BRANDÃO, 2017). Em um compromisso amplo e dialógico com construções participativas envolvendo diferentes sujeitos e movimentos sociais, com vistas à uma formação ampla, crítica e pautada na ideia de autonomia. Em uma de suas principais características, destaca-se a atenção à garantia 13 de um ensino de qualidade, alinhado com a bagagem sócio-cultural de jovens, adultos e idosos. Com isso, busca-se a valorização sistemática da experiência e das visões de mundo dos estudantes ao longo do processo formativo, fomentando a possibilidade de construção da autonomia e da cidadania (FREIRE, 1975). Diante do exposto sobre a EJA, certas características irão reaparecer ao longo desta obra, mas, no momento, alguns aspectos que configuram pontos de aproximação com a Andragogia podem ser problematizados aqui. Inicialmente destaca-se o cuidado e interesse crítico e analítico na pessoa do aluno. Em ambas o respeito a experiência é destacada como elemento fundante para o reconhecimento do aluno e de onde será possível ao professor pensar na construção de vínculos, conteúdos e temas para o processo de ensino-aprendizagem. Todavia, avalia-se que no campo das diferenciações, com base na EJA, não é possível acreditar em tendências “à autonomia e a auto-instrução” como propõe a Andragogia (KAUFMANN, 2000). Dado que essas são construções e processos forjados no espaço da formação escolar, cabendo ao docente exercer sua prática de modo a forjar, junto com o estudante, uma aprendizagem autônoma e não coercitiva sobre os alunos. Esse processo, para Freire (1975) se dá por meio do estímulo à curiosidade, da troca de saberes e práticas. Um ponto de diferenciação dessas abordagens é o lugar do mundo do trabalho nas duas perspectivas. Partindo do princípio de que um adulto funcional se relaciona com o mundo do trabalho (seja na condição patrão, de empregado, subempregado, autônomo ou desempregado) observa-se que o trato dessas características é demonstrado de forma desigual nas abordagens em tela. Enquanto a Andragogia refere-se a condição de trabalho de forma genérica, como parte das experiências do adulto, a EJA carrega consigo a noção de mundo do trabalho como tema basilar em sua estruturação. Dado que o demandante da EJA encontra-se nos estratos mais precarizados 14 da sociedade brasileira, sua experiência com o mundo do trabalho é estruturante desse sujeito e, por isso, tende a conformar boa parte de suas leituras de mundo. Desse modo, o trabalho e a condição do trabalhador tornam-se temas essenciais para a apreensão da realidade do aluno e, por conseguinte,tende a se tornar um fator de motivação para os estudantes. As considerações da Andragogia, discutem pouco sobre o processo de alfabetização e de socialização com a escola. Essa baixa discussão aponta para a ideia de uma formação universitária ou corporativa em espaços empresariais. Nesse sentido, nota-se que o adulto propagado pela Andragogia não conta com uma análise sensível e sociológica proposta pela EJA que entende esse sujeito não só em sua individualidade, mas também em suas condições sócio-políticas, econômicas e históricas. Portanto, para um acolhimento de um número maior de adultos é necessário que se pense essa educação “a partir de baixo”, considerando a formação de base desses adultos que, por questões de ordens culturais e/ou sócio-econômicas, não tiveram a garantia de acesso ou a sua manutenção no Ensino fundamental e Médio na idade certa. Diante do exposto, é na EJA que esse adulto tem a possibilidade de se reconectar com a uma formação educacional pautada na construção de sua criticidade e na sua instrumentalização no campo da luta por direitos, por meio do exercício da cidadania. Sendo assim, este livro discutirá ao longo dos próximos capítulos o papel e a importância da Educação de Jovens e Adultos, dado os expressivos números de brasileiros/as matriculados/as na modalidade e diante da necessidade de fortalecer esse eixo de educação. Espera-se conseguir aproximar os estudantes de Pedagogia da discussão da EJA como um campo de luta e aprendizagem em sua formação e futura profissão. FIXANDO O CONTEÚDO 1. Aurélio, aluno do polo Campina Grande (PB), está iniciando o curso de graduação 15 em Pedagogia e tem ouvido que estará habilitado para exercer sua profissão somente para o trabalho com crianças. Diante desta afirmação, qual alternativa abaixo melhor identifica quem são os públicos da Pedagogia? a) Os públicos da pedagogia se resumem a crianças de 0 a 6 anos, sendo as demais faixas etárias acompanhadas por professores de licenciaturas específicas e outros profissionais. b) Os públicos da pedagogia são diversos e acolhem desde crianças, jovens adultos e idosos e, para cada uma dessas faixas etárias, existem abordagens específicas. c) Os públicos da pedagogia podem ser descritos como idosos acima de 70 anos somente. d) Os públicos da pedagogia são diversos acolhendo desde crianças até adultos, mas é importante notarmos que os adultos participam somente do processo quando são pais de crianças em idade escolar. e) Somente crianças e jovens podem ser identificados como públicos da pedagogia, afinal, a pedagogia só acolhe pessoas em escolarização na idade certa. 2. A pedagoga Gilda, formada pelo polo de Cachoeiro do Itapemirim (ES), irá começar a trabalhar com adultos na EJA. Todavia, ela está em dúvidas sobre como pode entender o público adulto a partir dos referenciais teóricos da Pedagogia e das bibliografias sobre o tema. Com base nas análises realizadas ao longo deste capítulo, qual alternativa melhor identifica os elementos que podem auxiliar a pedagoga: a) Basta que ela consulte os dados do IBGE da cidade na qual irá trabalhar. b) Gilda deve fazer entrevistas com os adultos da cidade em que irá trabalhar, independente se estão escolarizados ou matriculados. c) Gilda deve focar somente no entendimento do comportamento em sala de aula, afinal, o que está fora da escola não é do interesse da Pedagogia. d) Gilda deve dedicar-se ao entendimento da diversidade e da trajetória de escolarização individual e coletiva dos sujeitos que serão seus alunos, na teoria e em sua prática pedagógica. e) Gilda deve focar somente na prática, afinal, é ela que irá ensinar tais adultos. 16 3. Responda com V ou F as seguintes alternativas ligadas à discussão sobre Andragogia. ( ) Lunara, que tem 40 anos, é aluna do polo Quissamã (RJ) e está realizando um curso de aperfeiçoamento de pessoal técnico na empresa na qual trabalha, com uma metodologia voltada para adultos chamada andragogia. ( ) O conceito de andragogia é formado pelo prefixo paidos, que identifica criança e o sufixo agoge que identifica condução, educação. ( ) Andragogia não é um método da área de educação, sendo utilizado somente para o cuidado médico com adultos. ( ) Essa metodologia é voltada para crianças. ( ) Ricardo dá aulas sobre procedimentos técnicos em uma empresa de segurança e utiliza métodos e técnicas voltadas para adultos, por meio da Andragogia. Assinale a sequência correta: a) F - F - V - V – V. b) F - F - V - V – F. c) V - F - V - F – V. d) F - F - F - V – V. e) V - F - F - F – V. 4. Sobre o conceito de pedagogia, qual das alternativas abaixo melhor sintetiza seu significado? a) Pedagogia é um exercício sistemático de submissão dos alunos aos professores. b) Pedagogia é a ciência prática do ensino de adultos. c) “A base de um curso de pedagogia é o estudo do fenômeno educativo, em sua complexidade, em sua amplitude” (LIBÂNEO, 1996, p.36). Pedagogia é sinônimo de Educação de Jovens e Adultos, dado que a segunda é mais abrangente que a primeira. d) A pedagogia trata-se de uma ciência preocupada com o ensino e cuidado de crianças e idosos. 17 5. Leia o trecho a seguir: “O modelo andragógico e o pedagógico não necessariamente se excluem. Na prática, os educadores têm a responsabilidade de verificar quando adaptar alguns conceitos andragógicos ao modelo pedagógico e quando a tendência em direção às hipóteses andragógicas é desejável”. (BOMBARDI, S. M. J. Educação de adultos: algumas abordagens. FUNDACENTRO - Ministério do Trabalho e Emprego, São Paulo, 2015, p.15) Diante do trecho destacado, em articulação com a análise sobre a Andragogia e a Pedagogia escolha a alternativa correta: a) O trecho reforça que a Pedagogia e a Andragogia são complementares, estando a pedagogia incutida na andragogia em um diálogo constante. b) O trecho é uma prova concreta do modo como essas áreas são excludentes e não passíveis de aproximação crítica. c) O trecho demonstra um desconhecimento sobre o tema, afinal, não há nada similar entre a andragogia e a pedagogia. d) O trecho é falso, dado que ao longo dos estudos da pedagogia é possível notar que a andragogia lhe é superior em métodos e técnicas, sendo independente dela. e) O trecho é verdadeiro, pois, somente a pedagogia deve ser considerada em um processo educativo voltado para adultos. 6. Luiza é graduanda em Pedagogia do polo Contagem (MG) e fará uma pesquisa sobre o papel do aluno na Educação de Jovens e Adultos. Considerando o que aprendemos ao longo do capítulo, quais sentenças abaixo melhor ilustram as características do aluno adulto: I - O aluno adulto normalmente não tem interesse pela escolarização, sendo sua entrada na escola somente por conta da sociabilidade. II - O aluno adulto carrega consigo uma extensa bagagem cultural e expectativas que precisam ser pensadas e harmonizadas com o processo de escolarização. III - O aluno adulto precisa ser entendido pela escola e seus profissionais por meio 18 da ideia de diversidade e de sua trajetória de formação e trabalho. IV - Educar um adulto é um exercício que só pode ser feito pelo mundo do trabalho. V - A Andragogia disputa com a Pedagogia e com a Educação de Jovens e Adultos o público adulto. Na sequência, identifique a alternativa correta: a) III - IV – V. b) I - II - V. c) III – V. d) II – III. e) II – V. 7. Marlene, aluna de pedagogia do polo Diamante do Sul (PR), está realizando leituras sobre a EJA e a Educação Popular e precisa de uma frase que sintetize alguns aspectos dessa relação. Para ajudar a graduanda, qual das alternativaspode ser avaliada como a correta. a) A EJA e a educação popular não são formas de educação próximas e, por isso, não mantêm qualquer diálogo em seus métodos e técnicas, não sendo possível uma comparação. b) A educação popular é realizada em sindicatos e partidos políticos, não sendo um exercício de construção amplo e cidadão e, portanto, sem qualquer relação com a modalidade de Educação de Jovens e Adultos. c) A educação popular não tem compromissos objetivos com a EJA, seus objetivos estão voltados somente para a expansão da sociabilidade, relações interpessoais e a popularidade dos alunos adultos. d) A EJA está na busca por se firmar como modalidade, condição jurídica que a Educação popular tem desde a década de 1990. e) A EJA e a educação popular são formas de educação próximas e que dialogam intensamente em seus métodos e técnicas, em seu conjunto são formas de ação política e institucional com vias à formação das classes subalternas em nosso país. 8. Com base nas discussões do presente capítulo, leia as assertivas abaixo e, em 19 seguida, assinale a alternativa que identifica a ordem correta dos conceitos expostos por meio das frases abaixo: I. “Baseada no profundo respeito pelo senso comum que trazem os setores populares em sua prática cotidiana, problematizando-o, tratando de descobrir a teoria presente na prática popular” (GADOTTI, 2012, p. 12) II. “[...] campo do conhecimento sobre e na educação” (PINTO, 2008, p.110) III. “[...] É uma modalidade oficial do sistema de ensino, englobando a Educação Formal no nível Fundamental e Médio [...]” (OLIVEIRA, 2010, p.106). IV. Essa modalidade identifica o aluno como aprendiz, considerando sua experiência no processo de ensino-aprendizagem. a) I - Pedagogia; II - Andragogia; III - Educação Popular; IV - EJA. b) I - Educação Popular; II - Andragogia; III - EJA; IV - Pedagogia. c) I - Educação Popular; II - Pedagogia; III - EJA; IV - Andragogia. d) I - EJA; II - Pedagogia; III - Educação Popular; IV - Andragogia. e) I - Andragogia; II - Pedagogia; III - EJA; IV - Educação Popular. 20 HISTÓRIA DA EJA NO BRASIL 2.1 COLÔNIA E IMPÉRIO (1530-1889): PORQUE ENSINAR ADULTOS? Ensinar adultos no Brasil é um exercício antigo e que precisa ser recomposto na forma de uma trajetória histórico-crítica para um entendimento mais aprofundado sobre o tema. Com isso, é possível ao pedagogo em formação entender melhor o processo de desenvolvimento do modo como o ensino esteve presente ao longo de nossa História. Considerando a conquista dos portugueses no ano de 1500 no território que hoje corresponde ao Brasil e o início efetivo da colonização dessa porção do continente americano em 1530, é necessário que se pense em alguns sujeitos específicos que aqui desembarcaram. Em meio aos conquistadores estavam comerciantes, aventureiros, viajantes e também padres. Esses membros da Igreja Católica, notadamente os padres da Companhia de Jesus, os chamados jesuítas, tinham a missão de expandir a fé e de educar aqueles que aqui habitavam, lê-se as populações indígenas. Há que se dizer que a tarefa de educar aqui, trata-se de instrumentalizar homens e mulheres na alfabetização, para a leitura da bíblia e outros escritos de ordem religiosa. Nesse período foram criadas no Brasil, especialmente a partir de 1549, as primeiras escolas jesuítas, com uma Pedagogia de exposição rigorosa de temas, com possibilidades restritas de diálogo e questionamento. Em uma estrutura de ensino- aprendizagem pautada na coerção das experiências dos alunos e na estrutura verticalizada do saber. Há que se notar que esse processo de ensino consistia UNIDADE 21 também no ensino da língua portuguesa, dado que os povos autóctones que aqui viviam tinham uma série de idiomas próprios. Esse processo violento de ensino era chamado de catequese e, diferente da leitura do tempo presente, era visto como um comportamento generoso dos padres em converter populações indígenas à fé católica, sem qualquer atenção aos saberes e práticas dos ocupantes das terras do atual Brasil. É importante frisar que a educação voltada para jovens e adultos, ainda que não possuísse essa denominação, estava voltada basicamente para a formação e integração com a cristandade católica e com o mundo do trabalho, por meio da aprendizagem de ofícios manuais. A ideia de educar índios e não índios para o trabalho é uma prática bastante presente no Brasil com experiências até os dias de hoje. Ainda sobre a catequese, há que se dizer que ela era desigualmente distribuída na sociedade, sendo expressamente proibido o ensino às mulheres brancas e às pessoas negras escravizadas. Parte das elites podiam desfrutar da vinda de professores/as da Europa e, por isso, terem contato com ideias, livros e uma formação mais alargada, alguns inclusive ingressando em universidades que, pela falta de presença destas instituições no Brasil, encontravam-se em Portugal e em outros países europeus. De modo geral, essas possibilidades não eram franqueadas a maior parte da sociedade que seguia sem acesso às escolas e outros espaços institucionais de formação. Essa estrutura de ensino perde força quando da expulsão dos jesuítas (1759) e o confisco de seus bens pela Coroa de Portugal, por questões de ordem econômica. A partir desse momento a educação fica dispersa, mas ainda conectada à Igreja e a outras ordens religiosas que, em larga medida, reforçavam os métodos já citados. Com a chegada da família real ao Brasil (1808) esse cenário tem poucas mudanças e se aprofunda a divisão social naquela sociedade, sendo a educação No Brasil as primeiras escolas foram fundadas pelos padres jesuítas ainda no século XVI. E na sua cidade, quando foi fundada a primeira escola? Ela contava com Educação para Jovens e Adultos? Como se transformou a educação e o processo de ensino- aprendizagem desta unidade escolar até o tempo presente? 22 um privilégio para nobres e abastados, enquanto a maior parte da população encontrava-se sem qualquer amparo nessa área. Com a independência (1822), inicia-se o governo de D. Pedro I e, com a constituição de 1824, passou-se a acolher a formação “primária e gratuita para todos os cidadãos”. Como pode-se perceber essa intenção coletivizadora poderia carregar consigo a possibilidade de formação de jovens e adultos, tal como apontaram Haddad e Di Pierro (2000). A despeito disso, a lei esteve distante da prática e, o que se sabe, é que ao longo de todo o século XIX o cenário de formação pública foi pouco alterado e as diferenças de formação entre classes se aprofundaram. Um elemento que começa a despontar ao longo do período imperial são as iniciativas laicas (não pertencentes à Igreja) de formações voltadas para adultos, em especial com o objetivo de inseri-los em atividades profissionais, com destaque para iniciativas locais, provinciais e por ações de particulares (MANFREDI, 2017). Nesse período, a noção de educação para o trabalho ganha força nos espaços de debate sobre educação, em especial quando pensada para jovens e adultos, notadamente homens livres pobres e das classes médias da sociedade. Esse cenário previa a inserção no incipiente mercado de trabalho do Brasil imperial, marcado fortemente pela experiência do trabalho de homens e mulheres escravizados e da grande plantation. Ainda no período imperial, a partir de 1835, iniciou-se a organização das escolas de formação de professores, conhecidas como escolas normais. Sendo de responsabilidade das províncias (atuais estados), suas orientações pedagógicas respeitavam o currículo das escolas de referência do município da Corte, a cidade do Rio de Janeiro (FERRARO, 2009). Note-seque essa centralização afetava as especificidades locais e desmantelava a possibilidade de construções curriculares com elementos regionais e autônomas. Em termos quantitativos, sabe-se que em “[...] 1877 apenas 21,9% das pessoas livres de 5 anos ou mais sabiam ler e escrever (1.563.000 sobre 7.143.000)” (FERRARO; KREIDLOW, 2004, p. 186). Essa alarmante estatística era complementada com o número de 170.000 crianças que não frequentavam escolas ( (FERRARO; KREIDLOW, 2004). Destacamos que nesses dados não eram quantificadas as pessoas escravizadas o que, certamente, alteraria para mais esses números. Em diálogo com a pergunta do subtítulo deste tópico “Porque ensinar adultos?” É possível dizer que na colônia e no império, ensinar adultos era uma tarefa 23 específica e não democrática, voltada para o fortalecimento da religião católica e para o aprimoramento de mão de obra em setores pontuais da produção. Sendo essas relações construídas em um cenário sócio-político extremamente desigual, machista, rural, monocultor e com mão de obra negra escravizada. Em linhas gerais, aos poucos que encontravam-se em um processo formal de escolarização, restava uma educação catequizadora, acrítica e de forte estímulo à repetição e memorização, tais elementos eram entendidos como essenciais na educação de então. Para a maior parte da população, escravizada ou não, pode- se dizer que já nesse momento estávamos diante de uma situação de extremo analfabetismo, sem projetos políticos amplos e democráticos para o ensino e com a presença de um grave déficit para o país em termos educacionais. Esse legado, sem dúvidas, chegou até a República como veremos na seção posterior. 2.2 BRASIL REPUBLICANO (1889-1988): COMO SE ENSINAR ADULTOS? O período republicano no Brasil começa com o golpe militar do ano de 1889 e naquele momento, com forte apoio do latifúndio monocultor ainda queixoso pelo fim da escravidão. A despeito da força do mundo rural, a vida nas cidades começava a despontar e, tanto nelas quanto no campo, a população era marcada pelas experiências do pós-abolição em que homens e mulheres negras buscavam reconstruir suas histórias como pessoas livres. Há que se destacar que não houve qualquer processo de inclusão social e assistencial para a população negra liberta e, com isso, as desigualdades se aprofundaram nos primeiros anos da República. A população negra foi estigmatizada e, em muitos casos, seguiu com empregos subalternos e não contou com a possibilidade de inserção no ambiente educacional formal, questão que se somou à falta de outros direitos políticos e sociais. Há que se destacar que ao longo da Primeira República (1889-1930) a expansão da escolarização no Brasil cresceu, contudo, as iniciativas de formação voltadas para jovens e adultos permanecem amparadas sob a lógica de uma formação para o trabalho, tanto na cidade como no campo. Havia toda uma construção social no período no sentido de afastar as populações mais pobres da “vadiagem” por meio da educação para o trabalho (KOWARICK, 1987). Em meio a uma série de projetos de reforma construídos nas primeiras décadas 24 da República que versavam sobre a inclusão de disciplinas nos currículos e na organização do sistema educacional (Reforma de Benjamin Constant, 1890) ou a inclusão de disciplinas voltadas para aspectos mais literários do saber (Código Epitácio Pessoa, 1901). Seguida pela intenção de reforço das disciplinas de matriz prática e a desoficialização do ensino (Reforma Rivadávia, 1911) seguidas por outras reformas que tiveram avanços pouco simbólicos e nenhuma delas acolheu com atenção a demanda por formação de adultos (RIBEIRO, 1981). Nesse processo, a educação de adultos com um viés alfabetizador era deixada de lado ou mesmo esquecida. Com isso, concorda-se aqui com as considerações de Azevedo quando este afirma que "Do ponto de vista cultural e pedagógico, a República [...] não teve o pensamento ou a decisão de realizar uma transformação radical no sistema de ensino para provocar uma renovação intelectual [...] necessárias às novas instituições democráticas” (AZEVEDO, 1953). Diante deste cenário, é inegável o papel das elites rurais e agrárias como elementos sociais interessados em uma não mudança da situação política e de formação de boa parte da população, o que em outros termos, pode ser lido como um abandono de políticas de expansão da educação. Esse descuido sistemático com a educação de jovens e adultos nos primeiros anos da República fincaram raízes e, na década de 1930, essas dinâmicas começaram a ser revistas. Com a instauração do golpe de 1930 e o início do governo de Getúlio Vargas o Brasil atinge novos cenários no contexto educacional. Medidas como a criação do Ministério da Educação e Saúde (1930), a criação de um Conselho Nacional de Educação que fosse capaz de organizar parâmetros e diretrizes para a Educação Pública no Brasil e a organização de estudos estatísticos promovidos pelo Governo Federal começaram a compor os planos do governo federal. No bojo desses programas, encontrava-se a organização de uma determinada elite intelectual e urbana que produziu o “Manifesto dos pioneiros da Educação” (1932). Essa intelectualidade pleiteava a gratuidade, laicidade e obrigatoriedade da educação pública no Brasil (ALENCAR, 2016). Entendido como um documento crítico e moderno, o manifesto carrega consigo uma perspetiva de responsabilização do Estado para com a educação e formação escolar do povo brasileiro, elemento que foi recuperado em projetos posteriores. É necessário destacarmos que o país encontrava-se frente a profundas mudanças ocasionadas pelo crescimento das cidades, pela reorganização da 25 pauta de exportações e pelo crescimento mais expressivo da industrialização. Em termos internacionais, o país vivia o período entreguerras e o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Tais momentos de ebulição tiveram impactos enormes na circulação de ideias, projetos e análises políticas sobre educação no Brasil. No que se refere à Educação de Jovens e Adultos, uma de suas primeiras iniciativas públicas foi organizada no período de 1947 a 1950, com a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA). Com forte viés patriótico, de reforço da política nacional, essa iniciativa foi pensada de modo a sanar o analfabetismo no país, no campo e na cidade, prevendo a superação do analfabetismo em um curto espaço de tempo. Dentre suas determinações encontravam-se a ideia de: Estender a ação da escola primária a vários milhões de brasileiros, de ambos os sexos, adolescentes e adultos, que não sabiam ler; O de influir na conjuntura cultural do país, de tal modo que os problemas de educação popular passassem a ser percebidos em toda a extensão e gravidade, inclusive nos grandes grupos de analfabetos da população ativa (BRASIL, 1950, p. 74). Ainda que tenham sido limitados os avanços dessa política, em especial por conta de problemas administrativos, pode-se dizer que temos aqui uma primeira iniciativa estruturada no sentido de pensar um modo público de como se ensinar adultos. Apesar dos limites, essa proposta é uma das primeiras que teve jovens e adultos como principais sujeitos de uma política educacional (VIEGAS; MORAES, 2017). Com o avanço da década de 1950, começa a despontar o exercício de alfabetização proposto por Paulo Reglus Neves Freire, mais conhecido como Paulo Freire (1921-1997). Formado em Direito, Paulo Freire optou por se dedicar ao ensino desde a juventude e, preocupado com a alfabetização de jovens e adultos, passou a lecionar para esses públicos atingindo a marca de alfabetização de 300 cortadores de cana em 45 dias no ano de 1963 (BRANDÃO, 1985). Há que se dizer que naquele momento histórico, setoresreformistas ocupavam os mais altos cargos políticos no Brasil e previam a execução de uma política coligada com a Educação. Estava contido naquele período histórico uma preocupação com a conscientização do povo que se daria por meio da alfabetização da população, pautada na noção de cidadania e para a organização social desses sujeitos (GERMANO, 1997). Seu método dispensava o uso da cartilha e a repetição, privilegiando o 26 acolhimento da experiência dos alunos e a contextualização dos saberes. Com isso, Freire previa que o processo de ensino-aprendizagem estivesse ancorado em três etapas complementares (VIEGAS; MORAES, 2017). Sendo a primeira, a etapa de investigação, em que o educador conhece e mapeia palavras e expressões próprias dos estudantes, buscando familiarizar-se com as temáticas e questões do cotidiano destes. Em seguida, iniciava-se a etapa de tematização, nesse momento, há um intenso debate com os alunos, buscando o entendimento dessas experiências. Na sequência, se estabelece a etapa de problematização, que se realiza por meio da pergunta, da crítica sobre os temas tratados e as possibilidades de transformação. Sendo essa última etapa acompanhada do princípio da escrita e da leitura. Figura 1: Fotografia de Paulo Freire (esq.) alfabetizando um homem adulto Disponível em: https://bit.ly/36ESK5u . Acesso em: 14 jun. 2021. Com isso, o processo de ensino-aprendizagem se configurava como uma ferramenta de transformação social. Sendo o aluno o sujeito desse processo que, longe de ser desenvolvido de modo acrítico, partia de suas questões do cotidiano, transformando-as em palavras e leitura com objetivo de instrumentalizar esse sujeito para uma participação social mais ativa e questionadora (VIEGAS; MORAES, 2017). 27 Inicialmente esse método de alfabetização recebeu acolhimento pelo então Presidente João Goulart (1961-1964), mas, com o golpe civil-militar de 1964, Paulo Freire teve suas ideias caçadas e os jovens e adultos tiveram, mais um revés no seu processo formativo. Com o aprofundamento da ditadura civil-militar, no ano de 1968, a educação para jovens e adultos ficou à cargo do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) (VIEGAS; MORAES, 2017). Com vigência entre os anos de 1968 a 1985, tal política previa a alfabetização de jovens e adultos entre os 15 e 35 anos a partir de uma perspectiva alinhada com a ideologia do regime militar. Com isso, a crítica, a autonomia, o diálogo e problematização, essenciais ao processo de ensino-aprendizagem, estavam fora dos programas dando lugar ao autoritarismo dos processos educacionais, à memorização e a uma forte valorização do regime político (CUNHA; XAVIER, 1984). Se em termos de projeto pedagógico o projeto fracassou, ao que apontam as estatísticas, o Mobral mostrou-se limitado também em seus resultados. Segundo Cunha e Xavier, no censo de 1980 houve um “[...] aumento de 540 mil pessoas no número absoluto de analfabetos de 15 anos e mais no decênio 1970-1980” (CUNHA; XAVIER, 1984, p. 47). Tais elementos foram visitados ainda por sucessivas denúncias de corrupção, demonstrando a falência desse projeto político e educacional. Diante desse quadro, até a chegada da década de 1990, a trajetória da educação de jovens e adultos no Brasil republicana pode ser pontuada com a pergunta do subtítulo “Como se ensinar os adultos?”. Ao que foi possível observar o Brasil foi de projetos que anularam essa questão, passando pelas iniciativas modernizantes do Governo Vargas associando aprendizagem ao mundo do trabalho; o método Paulo Freire que, a partir da década de 1960 instaura um novo paradigma de formação para jovens e adultos pautado na liberdade, criticidade e autonomia e, em seguida, o MOBRAL e sua política de memorização e propaganda 28 política de um regime autoritário. Isto posto, o que se quis demonstrar é que os modelos e métodos de ensino de jovens e adultos são múltiplos e diversos e, ao longo do século XX, eles foram disputados por grupos distintos em nome de projetos políticos e educacionais dos mais variados. Em meio a esse cenário, em 1985 a ditadura se encerrou no Brasil e o legado deixado é marcado por violências, abusos e, no campo da educação, tratou-se de um retrocesso que o país ainda tenta superar. Na tentativa de rever esse quadro, novos atores entram em cena mostrando que o caminho para a educação no Brasil deveria ser escrito a partir da palavra democracia. 2.3 BRASIL DO TEMPO PRESENTE (1988-SÉCULO XXI): NA LUTA A GENTE SE ENCONTRA Democracia é a palavra do ano de 1988, ano em que o Brasil tentava superar o período ditatorial por meio da reabertura política e de uma nova Constituição. Esse documento que reúne as leis de um país foi escrito em meio à reorganização dos movimentos sociais e da ascensão de pautas históricas como saúde, educação, direitos e outros debates que ainda hoje encontram-se na ordem do dia em nosso país (SAVIANI, 2013). Segundo Paiva (2006) foi nesse momento histórico em que a educação passou a ser entendida como um direito em nosso país. Com essa conquista, em termos gerais, o povo brasileiro passou a contar com o registro de um direito historicamente negado. Com isso, “seria possível lutar nos marcos da legalidade e construir uma democracia educacional, instaurando um novo tempo na história da luta política pela educação” (PAIVA, 2006, p. 133). Esse direito comporta a obrigatoriedade e a gratuidade do acesso ao ensino fundamental e, por parte dos poderes instituídos, a oferta irregular ou o não oferecimento do ensino implica em sanções e processos de responsabilização. Nas determinações trazidas pela Constituição de 1988, são previstas ainda políticas de acompanhamento de frequência escolar e incentivo à matrícula e atenção às crianças e jovens. Em meio aos debates de setores organizados da sociedade, em especial os sindicatos de professores, conseguiu-se que a EJA fosse reconhecida como modalidade na Constituição Federal. Com isso, garantiu-se à modalidade a 29 prerrogativa do acolhimento dos educandos que, por diversos motivos sócio- econômicos, foram excluídos da alfabetização na idade certa. Ademais, registrou-se no documento o entendimento da EJA como um espaço no qual propostas de ordem político-pedagógica associadas à relações de diálogo e cooperação para execução do processo de ensino-aprendizagem devem ser realizadas. Na sequência dessas conquistas, um novo avanço foi a inclusão da EJA na lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), anos após em 1998, a inclusão da modalidade na lei do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (1998). Já no contexto do século XXI, a EJA teve sua própria lei de Diretrizes Nacionais Curriculares (2000) e também fez parte da discussão da lei do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (2007). Com a consciência de que cada um desses episódios legislativos não é instaurador de uma nova realidade de sucesso e efetivação da política, esse tema será discutido no capítulo seguinte de forma mais detida. Todavia, neste momento, um elemento importante é notarmos os avanços ocorridos para a EJA e seus públicos no período posterior à Constituição de 1988. Importante notarmos que esse processo não é o resultado de um olhar sensível dos governos e nem da classe política e das elites brasileiras, mas sim, o resultado da mobilização de professores, sindicatos, fóruns e membros da sociedade civil organizados que lutam por direitos na EJA. Todavia, esse processo de garantia de direitos da EJA é uma narrativa que precisa ser constantemente discutida e pensada a partir de outrossujeitos sociais, 30 pois, apesar do reconhecimento da modalidade seus desafios ainda são grandes no campo político. Em especial no que compete aos seus objetivos que, para os governos e o grande capital (lê-se a classe empresarial capitalista), tal percurso de formação deve apenas e tão somente instrumentalizar a mão de obra brasileira de baixo custo. Com isso, se esquece e se distancia a EJA de um de seus objetivos principais: garantir aos jovens e adultos brasileiros a oportunidade de uma escolarização crítica e pautada na garantia da cidadania. Seja como for, o entendimento geral que ronda a experiência da EJA desde os anos de 1990 e ainda encontra-se em construção até a atualidade é o fortalecimento dos direitos conquistados e a luta contra o fechamento de turmas. Nessa luta, uma série de sujeitos tem se levantado em favor da educação pública e de qualidade para jovens e adultos, demonstrando que é na luta que se constrói o futuro. Diante desses e de outras questões da EJA no tempo presente, no próximo capítulo serão discutidos os projetos e os diferentes grupos sociais que tentam construir - ou desconstruir - a modalidade. FIXANDO O CONTEÚDO 1. Ana, graduanda do polo São Luiz/Vinhais (MA), está escrevendo um trabalho 31 acadêmico sobre educação de adultos no período colonial no Brasil e encontrou cinco alternativas para se pensar sobre o tema. Qual alternativa verdadeira sobre o tema? a) A educação para adultos no período colonial no Brasil era voltada apenas para estrangeiros, como por exemplo portugueses, ingleses e franceses. b) No Brasil colonial a educação de adultos era voltada para o ensino de religiões de matriz afro-brasileira, como uma forma de construção do respeito e pela luta anti-racista. c) A educação de adultos era voltada para indígenas, com o objetivo de propagar a fé católica dos colonizadores, sendo esse tipo de educação conhecido como catequese. d) A educação no Brasil colônia era uma educação crítica, pautada no acolhimento do aluno e de suas experiências. e) A educação de adultos na América Portuguesa era o resultado de ensinamentos aprendidos na Europa e ensinados ao povo africano aqui escravizado. 2. Paulo, graduando do polo Pentecoste (CE), após a leitura do capítulo entendeu que análises sobre educação precisam ser aproximadas de uma análise sobre a sociedade em que essa educação se dá. Sendo assim, qual das alternativas abaixo identifica características da sociedade colonial brasileira e o modelo de educação empregado no período? a) A sociedade colonial tratava-se de uma sociedade de violência, escravista e desigual/ modelo de educação jesuítica. b) A sociedade colonial era uma sociedade de caçadores e coletores/ modelo de educação dialógica. c) A sociedade colonial era industrializada e pautada na vida urbana, com trabalho assalariado/ modelo de educação tecnológica. d) A sociedade colonial era formada somente por indígenas e negros/ modelo de educação jesuítica. e) A sociedade colonial foi constituída por padres e indígenas/ modelo de educação do MOBRAL. 3. Avalie as fontes abaixo abaixo sobre a educação jesuítica empregada no Brasil 32 colônia: Os golpes não deviam normalmente passar de seis; nunca no rosto ou na cabeça. [...] sempre na presença de, pelo menos, duas testemunhas. Não se visava nem ferir nem humilhar o aluno, mas apenas causar-lhe uma pequena dor física, que, na primeira idade, é, para certos temperamentos, um meio disciplinar de eficácia incontestável. (FRANCA, 1952, p. 63). (FRANCA, L. Apresentação. In: COMPANHIA DE JESUS. Ratio Studiorum: o método pedagógico dos jesuítas. Tradução de Leonel Franca. O método pedagógico dos jesuítas. São Paulo: Agir, 1952). “O ensino dos meninos aumenta dia a dia o que mais nos consola, os quais vêm com gosto à Escola, sofrem os açoites [...] entre si” (ANCHIETA, 1957, p. 194). (ANCHIETA, José de. Carta ao Padre Inácio de Loyola, Roma (São Vicente, março de 1555. In: LEITE, Serafim, S.J. Cartas dos primeiros jesuítas do Brasil. Coimbra: Tipografia da Atlântida, 1957. v. II, p. 193-209). Diante do exposto e considerando as fontes, marque a alternativa correta. a) Os trechos destacados da Companhia de Jesus e do padre Anchieta demonstram como o diálogo era uma importante ferramenta de ensino na educação jesuítica. b) Tratam-se de dois trechos escritos por membros da Igreja Católica relatando as práticas da Educação Jesuítica. Em suas falas há uma valorização dos castigos como parte de uma prática de ensino, elementos que hoje são condenados na educação. c) As fontes são um relato histórico do amor com que os alunos, jovens e adultos, eram tratados no período colonial. d) Os recortes apresentam abordagens distintas, sendo o Padre Anchieta um entusiasta do avanço da educação, enquanto a recomendação da Companhia de Jesus demonstrava como o carinho e o acolhimento eram fundamentais no processo formativo. e) Os relatos não demonstram qualquer tipo de violência e devem ser entendidos como um registro do bem feito pelos jesuítas aos indígenas. 4. Dulcina, graduanda em Pedagogia do polo de Dom Eliseu (PA), está escrevendo 33 um resumo sobre educação de adultos no período imperial no Brasil. Contudo, Dulcina está com dúvidas sobre a educação voltada para as mulheres no período. Sendo assim, qual das frases a seguir identifica corretamente a educação voltada para as mulheres no período imperial? a) Com a chegada da família real no Brasil a educação promovida pelos padres jesuítas foi tornada a educação oficial para as mulheres. b) D. Pedro II foi um defensor da educação e, por isso, autorizou que todas as mulheres pudessem se escolarizar no Brasil, sem distinção de faixa etária ou classe social. c) A educação era igualmente distribuída na sociedade, sendo necessário pensar não só no gênero, mas também na questão racial. Mulheres indígenas, negras e brancas tinham direito à educação e, eventualmente, eram expostas à catequese como forma de aproximação com a fé católica. d) Todas as mulheres eram contempladas por uma educação democrática, sendo possível inclusive o acesso às universidades, instituições muito famosas no Brasil no período. e) A educação era desigualmente distribuída na sociedade.. Mulheres das classes mais abastadas eram ensinadas por outras mulheres às atividades domésticas e, eventualmente, tinham acesso à professores/as de disciplinas gerais, quase sempre com períodos reduzidos de aprendizagem escolar. Indígenas e negras escravizadas não tinham direito à educação e, eventualmente, eram expostas à catequese como forma de aproximação com a fé católica. 5. Elis, graduanda em Pedagogia do polo Cacoal (RO), está realizando a leitura da Constituição de 1824 e está em busca de elementos sobre a educação de jovens e adultos. Em sua pesquisa a estudante deparou-se com os seguintes artigos: Art.179 - A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros que tem por base a liberdade à segurança individual e a propriedade é garantida pela constituição do império entre outras maneiras pela instituição primária e gratuita a todos os cidadãos. [...] Art.250 - haverá no império escolas primárias em cada termo, ginásio em cada comarca e universidade nos mais apropriados locais. 34 CAMPANHOLE, A.; CAMPANHOLE, H. L. Constituições do Brasil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1986, p. 674-676. Diante de artigos da primeira constituição do Brasil independente que tratavam sobre a educação, qual das alternativas abaixo pode auxiliar Elis em sua pesquisa: a) Elis está diante de uma legislação queapontava para a expansão da escola e da escolarização e que foi cumprida, tornando o Brasil uma referência em educação até o presente momento. b) Elis pode notar que os artigos da constituição reforçam o papel benevolente da classe política brasileira para com o povo. c) Elis pode notar que houve um esforço em registrar o direito à educação na Constituição e que esse esforço se transformou em prática em especial nas áreas mais remotas do país. d) Elis está diante de uma legislação que apontava para a expansão da escola e da escolarização, mas que não foi efetivada no império do Brasil. Há que se notar que a cidadania não era estendida para mulheres, negros e indígenas, sendo eles subalternizados e condenados ao não acesso à educação. e) Elis está diante de uma legislação que foi aplicada somente para indígenas e negros no Brasil imperial. A cidadania naquele momento histórico era voltada apenas para esses grupos. 6. Com base em nossos estudos sobre a Educação de Jovens e Adultos no Brasil republicano leia os trechos abaixo: I. A Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA) foi uma das primeiras iniciativas sistemáticas do governo federal para a erradicação do analfabetismo, contudo, seus resultados foram limitados. II. A EJA existe como política pública desde o início da República demonstrando o interesse do regime em melhor formar a população adulta. III.O “Manifesto dos Pioneiros da Educação” não trata objetivamente sobre a educação de jovens e adultos, mas sua ideia de democratização da educação colabora com a reflexão para o que, mais tarde, veio a se configurar com a EJA. IV. O MOBRAL tinha por objetivo dar condições mínimas para que homens e 35 mulheres ingressassem no mercado de trabalho, sem qualquer compromisso com uma formação cidadã. V. O método de alfabetização proposto por Paulo Freire, dentre outras características, trata-se de um conjunto de ações que objetivam dialogar com o cotidiano e as experiências dos educandos. É correto o que se afirma somente em: a) I e II. b) I, II, III, IV e V. c) I, III, IV e V. d) I, II, IV e V. e) III, IV e V. 7. Classifique as afirmações sobre o método Paulo Freire de alfabetização com V (verdadeiro) ou F (falso): ( ) “Na proposta freiriana o processo educativo está centrado na mediação educador-educando” (FEITOSA, 1999, p. 45). ( ) “O Método Paulo Freire tem como fio condutor a alfabetização visando à libertação” (FEITOSA, 1999, p. 46). ( ) O método Paulo Freire é similar a educação jesuítica, sendo a expressão contemporânea dela. ( ) “O método de Paulo Freire valoriza as fontes culturais e históricas dos indivíduos” (HEIDEMANN et al., 2010, p.417). ( ) O método Paulo Freire é uma forma de introdução aligeirada do jovem e adulto no mundo do trabalho, sem qualquer atenção à cidadania. Assinale a sequência correta: a) F - F - V - V – V. b) V - V - F - V – F. c) V - F - V - F – V. d) F - V - V - V – F. e) V - V - V - V – F. 36 8. Leia o trecho selecionado: Garantidos por políticas decorrentes da LDB promulgada em 1996, que instituiu a Educação de Jovens e Adultos como modalidade da Educação Básica, avanços foram conquistados e, ao longo dos anos 2000, por exemplo, foram consideráveis as ações implementadas pela esfera federal de governo, além das políticas estaduais e municipais que sedimentaram uma oferta. Não obstante, esse conjunto de ações não têm conseguido superar as históricas desigualdades educacionais em função de uma série de razões, dentre as quais o problemático processo de institucionalização da EJA nas redes públicas, nem sempre acompanhado de base financeira, estrutural e pedagógica adequada, além da tímida, ou mesmo ausente, política de formação específica de professores, tanto inicial quanto continuada. (NICODEMOS, A., SERRA, E., ALVES, A. C. O.; SILVA, H. D. S. Prática Docente em Geografia e História no contexto do Programa Nova EJA–RJ. Revista Brasileira de Educação de Jovens e Adultos, 8, 1-24, 2020, p.02). Diante do cenário sócio-político controverso colocado para EJA no tempo presente, assinale a alternativa correta: a) Trata-se de uma análise apressada, pois a EJA hoje está fortalecida e não depende do financiamento público, pois tem parcerias privadas para o seu funcionamento. b) O trecho demonstra que os autores não concordam com os avanços da EJA. c) Os autores realizam uma análise onde só citam pontos negativos da EJA. d) A análise dos autores está equivocada, pois a EJA hoje não tem qualquer problema em seu financiamento, dado que erradicou o analfabetismo no Brasil. e) Diante do trecho exposto, nota-se que a despeito dos avanços políticos e legislativos da EJA nas últimas décadas ainda existem diversos desafios a serem enfrentados pela modalidade e seus sujeitos. ASPECTOS SÓCIO-LEGAIS DA EJA 3.1 A LEI COMO ESPAÇO DE DISPUTA UNIDADE 37 Diferente do que muitos podem pensar, a lei e a legislação importam sim ao trabalho do pedagogo, pois, supor que as leis são criadas como elementos “perfeitos” dentro de uma determinada sociedade seria ingênua e pouco operacional para esse profissional. Discutir ideias e tramitações legislativas, os sujeitos que a construíram e aqueles grupos que organizam a demanda pública, é um exercício necessário à formação do licenciado e de todo cidadão. Assim, será possível a construção de sua ação pedagógica crítica com base nas determinações institucionais vigentes no país e reforçadas pelos Estados e municípios. Afinal, leis são construídas em um ambiente de disputa. Mais do que simplesmente segui-las, cabe ao profissional entender a sua historicidade, os sujeitos que a construíram e os projetos que levaram o texto a ser aprovado ou não. Essa tarefa coloca o pedagogo como investigador da realidade que o circunda em termos profissionais e sob as modalidades com as quais dialoga. Ingressar na EJA ou em qualquer outra modalidade de ensino requer um cuidado e atenção com as legislações voltadas para aquele ramo da Educação (SIQUEIRA; LOPES, 2017). Em especial os projetos que colaboraram com sua efetivação da modalidade e os que pretendem sua extinção e, em meio a isso, o entendimento de que esses projetos foram disputados precisa ser destacado. Os modos de fazer esse exercício de pesquisa podem se dar por meio do acompanhamento de notícias em veículos oficiais de informação, pelos boletins dos sindicatos dos professores e profissionais da educação, fóruns de educação dos Estados e municípios, por exemplo. O exame desses materiais ajuda não só a conhecer as determinações legislativas vigentes, em construção e em desuso, mas também a construir um olhar crítico sobre as relações entre o Estado brasileiro e a Educação, ademais, é sempre importante reforçar que o exercício da profissão docente e pedagógica é um exercício de posicionamento político no mundo (SIQUEIRA; LOPES, 2017). Diante do exposto, não pode o pedagogo contentar-se somente com o que foi aprendido em termos legislativos em sua formação superior, ele deve estar disposto a investigar, buscar e analisar criticamente os termos em que estão se dando os rumos da Educação. Sua posição ativa e atuante será determinante para um exercício cidadão e ético de sua profissão (SIQUEIRA; LOPES, 2017). Além disso, quando falamos em disputas, estamos falando de conflitos teóricos, divergências de pontos de vista que, em maior ou menor medida, são 38 fundantes da construção de quaisquer projetos em âmbito legislativo. No caso específico da EJA, essa luta foi feita não só por membros do legislativo brasileiro, mas também por componentes da sociedade civil. Alguns desses temas serão debatidos na sequência.3.2 A EJA NAS LEIS DE EDUCAÇÃO NO BRASIL No que compete à EJA, é importante situar aqui sua organização legislativa, em especial a partir da década de 1990. Cabe ao pedagogo iniciar sua análise sobre a modalidade a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN n.º 9.394/96). Inicialmente nascida no contexto do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), a LDBEN foi criada como uma forma de reordenar a educação no país. Seu debate é gestado basicamente no período de 1988, ano da promulgação da nova constituição até a aprovação do texto de 1996. Houve uma disputa entre duas vertentes políticas nesse momento, de um lado, os senadores Darcy Ribeiro (RJ), Marco Maciel (PE) e Maurício Corrêa (Ministro do Supremo Tribunal Federal) que defendiam uma educação centralizada sob as determinações do governo. Por outra parte, estavam movimentos sociais organizados na ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação) e no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, que juntos postulavam o controle da sociedade civil sob o sistema de ensino (DANTAS, 2017). O projeto vitorioso foi o dos ministros que, entre outros pontos, trouxe a EJA, pela primeira vez, como modalidade da Educação Básica. Com isso, a Educação de Jovens e Adultos ganhou institucionalidade, sendo seu público formado pelos sujeitos 39 que “[...] Não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria” (LDBEN n.º 9.394/96). Ademais, previa-se que a EJA deveria promover a formação e considerar as características socioeconômicas e culturais dos estudantes, fornecendo um ensino que dialogasse com essas circunstâncias. Ainda na LDBEN, previa-se a manutenção de exames e cursos da categoria de supletivo, que serviriam de suplemento da educação básica, que, mediante aplicação do currículo da EJA, tornaria o estudante habilitado para dar sequência aos seus estudos. A coexistência da EJA com o supletivo e com seus exames trata-se de uma contradição e precisa ser avaliada com atenção pelo pedagogo, em especial por conta da quantidade de casos de denúncias de vendas de certificados e formações aligeiradas oferecidas aos estudantes (VENTURA, 2012). No que compete a idade mínima para ingresso na EJA, tal como citado na primeira unidade, ela é permitida a jovens maiores de 15 anos que podem acessar o Ensino Fundamental e para o acesso ao Ensino Médio, a idade mínima é de 18 anos. Além disso, previa-se que seria ampla e difundida a oferta de vagas para a EJA em escolas da rede pública de forma gratuita. No ano 2000, no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso (1998-2002), Supletivo é uma terminologia bastante comum quando se fala em Educação de Adultos. Seus ecos vem de legislações do período da Ditadura Civil-Militar respectivamente da lei 5692 (BRASIL, 1971) e reforçada pelo parecer 699 (BRASIL, 1972). Suas bases estão assentadas sob a noção de suplência, ou seja, um compromisso com supressão de um processo de escolarização deficitária. Em seus métodos e técnicas destaca-se uma memorização como recurso e poucos espaços de reflexão crítica, seguido por um forte apego à certificação e a noção de qualificação para o mercado de trabalho. Desde a Constituição de 1988 há todo um esforço para a divulgação e ampliação do debate sobre a EJA e seu caráter crítico e dialógico com seus públicos. Quais os demais elementos de distância entre o Supletivo e a EJA? De que forma pode o pedagogo desconstruir a falsa similaridade entre o Supletivo e a EJA? 40 foram criadas novas determinações para a modalidade. Construídos no contexto do Conselho Nacional de Educação, naquele ano dois pareceres aprofundaram os debates sobre a EJA. O primeiro deles foi o parecer CNE/CEB n.º 11, de 10 de maio de 2000, nele a EJA assume o papel de educação continuada e é reforçado seu papel de fomentadora da cidadania dos estudantes (SIQUEIRA; LOPES, 2017). Ademais, começa a ser propagados os sentidos/funções da modalidade, conforme quadro abaixo: Quadro 1: Funções da Educação de Jovens e Adultos Função Reparadora O estudante da EJA deve ter o direito fundamental assegurado por meio de uma nova possibilidade de retomada dos estudos. (BRASIL, 2000). Função Qualificadora Espera-se que a EJA forneça ferramentas para o entendimento de temas da contemporaneidade, em especial aqueles ligados ao mundo do trabalho e as tecnologias. É prevista uma aproximação entre os conteúdos escolares com esses elementos do tempo presente, sem perder a dimensão da criticidade e autonomia na aprendizagem (BRASIL, 2000). Função Equalizadora Tem por finalidade salvaguardar o diálogo do estudante com o letramento e alfabetização. Sendo, portanto, facultado ao público da EJA a possibilidade de atualização e o desenvolvimento de habilidades e competências. (BRASIL, 2000) Fonte: Adaptado de Brasil (2000). Na esteira dessas funções, há que se destacar a segunda medida que foi a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos (DCNEJA), por meio da resolução CNE/CEB nº 01/2000 – BRASIL, 2000. Em um de seus pareceres, são reforçados os "princípios de equidade, diferença e proporcionalidade na apropriação e contextualização das diretrizes curriculares nacionais e na proposição de um modelo pedagógico próprio” (BRASIL, 2000) Acerca desses aspectos, destacamos que a equidade é um princípio que trata da distribuição e planejamento da presença do currículo da EJA nos diferentes níveis de ensino, de modo a proporcionar uma formação melhor distribuída nos eixos correspondentes ao Ensino Fundamental e Médio. A construção desse perfil igualitário em termos sociais, é de responsabilidade dos Estados, sendo cada qual responsável por denominar este momento formativo como etapa, eixo formativo, números subsequentes ou termos afins (SIQUEIRA; GUIDOTTI, 2017). No que compete ao princípio da diferença, trata-se de uma análise cuidadosa e atenta ao perfil dos públicos da EJA, afinal, suas experiências, motivos para a 41 evasão escolar ou não escolarização, são aspectos fundamentais para o estabelecimento do processo pedagógico a ser construído. Diante do exposto, espera-se que a equipe pedagógica e o corpo docente trabalhem de modo integrado para proporcionar uma experiência de acolhimento pautada em um ensino que seja significativo para os alunos da EJA (NICODEMOS; SERRA, 2020). Na sequência, temos o princípio da proporcionalidade que, em termos gerais, trata-se da execução do currículo de modo que os sujeitos da EJA tenham formação compatível com os estudantes da escolarização regular. Com isso, cabe às unidades escolares cumprir dias letivos, cargas horárias, de modo a balancear as demandas curriculares e da cultura escolar, com as dinâmicas de vida dos estudantes da EJA. Com o avanço do século XXI, os espaços institucionais do debate sobre a EJA se expandiram, em especial com a criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), no Ministério da Educação (MEC). Com a SECAD houve uma expansão do diálogo dos movimentos sociais pela EJA junto ao Governo Federal. Tal secretaria colaborou com a criação e execução de propostas e políticas voltadas para a garantia da EJA em todo o país. Há que se dizer que nas últimas décadas, sob a orientação de dinâmicas do neoliberalismo, o aperfeiçoamento da formação dos trabalhadores foi - e ainda tem sido - um ponto de pauta importante no debate sócio-político e econômico (NICODEMOS; SERRA, 2020). Tal debate foi realizado por empresários brasileiros interessados na capacitação de mão de obra, preservando baixos salários e relações de trabalho mais flexíveis. Nesse contexto, foi criado no governo de Luís Inácio Lula
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