Prévia do material em texto
Nutrição em Obstetrícia: Após a fecundação, o óvulo percorre a trompa de falópio em direção ao útero para sua implantação. Neste percurso, ocorre uma série de divisões celulares que darão origem ao embrião. Essa fase é chamada de blastogênese. Em seguida, ocorrerá a implantação do óvulo na parede uterina, inicia-se assim, a fase embrionária, onde continua a replicação celular associada à hipertrofia celular, dando origem aos órgãos. O embrião começa a adquirir o aspecto fetal humano. A partir do 3º mês de gestação, começa a fase fetal do desenvolvimento, período caracterizado por crescimento rápido e hipertrofia celular. Por serem fases de intensa divisão, replicação e hipertrofia celulares, alguns nutrientes são essenciais. São eles: · Ácido fólico · Vitaminas B12 e A · Piridoxina · Riboflavina · Aminoácidos · Manganês A implantação do óvulo no endométrio dá início aos ajustes fisiológicos que permitirão a evolução da gestação. Ocorrem modificações no endométrio que darão origem à placenta. Este anexo fetal é uma estrutura esponjosa, complexa e vascularizada, com funções de: · Proteção · Nutrição · Respiração · Excreção · Produção de hormônios (estrogênio e progesterona) No início da gestação, é responsável pela produção de glicogênio, colesterol e ácidos graxos, funcionando como um reservatório para o embrião e, também, pela produção de estrogênio e progesterona responsáveis pelos ajustes iniciais da gestação. Os fluxos sanguíneos materno e fetal são independentes e separados por uma membrana muito fina chamada membrana placentária. É por meio dela que ocorrem as trocas entre mãe e concepto. A transferência dos nutrientes ocorre através dos seguintes mecanismos: Difusão simples: Processo passivo, sem gasto de energia. Os nutrientes passam do meio mais concentrado (materno) para o menos concentrado (fetal). Nutrientes absorvidos: oxigênio, gás carbônico, vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K), carboidratos com peso molecular < 1000, eletrólitos, ácidos graxos e água. Difusão facilitada: Mesmo processo da difusão simples, porém mais rápido devido à presença de transportadores de membrana. Nutrientes absorvidos: carboidratos. Transporte ativo: Realizado por um transportador de membrana contra um gradiente de concentração, com gasto de energia. Nutrientes absorvidos: aminoácidos, ferro, cálcio, iodo, fosfato e vitaminas hidrossolúveis. Pinocitose ou Endocitose: Processo de invaginação da membrana englobando os nutrientes. Usado para absorção de grandes moléculas proteicas, lipoproteínas, fosfolipídios e imunoglobulina (IgG é a única que atravessa a placenta). Ultrafiltração: Transporte rápido de nutrientes por pressão hidrostática ou osmótica. Nutrientes absorvidos: água e solutos. O transporte de lipídeos é mais complexo. A placenta é capaz de regular a captação, a estocagem e a liberação dos lipídeos plasmáticos fetais. Altos níveis de colesterol interferem no metabolismo lipídico da placenta, podendo aumentar a síntese de esteroides (o colesterol é precursor da progesterona). Papel dos hormônios durante a gestação: Os hormônios produzidos neste período da vida (esteroides e proteínas) são responsáveis pelas modificações corporais que permitirão: · O desenvolvimento da gestação · O amadurecimento fetal · O parto · A lactação Sua produção é influenciada pela saúde geral e pelo estado nutricional da gestante. Sua produção pode ser dividida em 2 etapas: Fase Ovariana: Até a 8ª e 9ª semanas de gestação. Produção de gonadotrofina coriônica humana (hCG), estimulando a produção de progesterona e estrogênio. Fase Placentária: A partir da 8ª e 9ª semanas. A placenta passa a produzir esteroides em quantidades crescentes. Gonadotrofina Crônica Humana HCG: · Permite o diagnóstico hormonal da gestação e a manutenção inicial da gravidez. · Impede a rejeição imunológica do embrião e inibe a contratilidade espontânea do útero. · Estimula a produção de relaxina e progesterona pelo ovário, estrogênio pela placenta e testosterona pelo testículo fetal. · Importante no início quando a placenta ainda não produz progesterona e estrogênio em quantidades suficientes. Progesterona: · Relaxa a musculatura lisa, diminuindo a contração uterina e evitando a expulsão do feto. · Reduz motilidade do trato gastrointestinal (TGI). · Favorece a deposição de gordura materna, náuseas, pirose, refluxo gastroesofágico e constipação intestinal. · Aumenta a excreção renal de sódio (efeito natriurético). · Interfere no metabolismo do ácido fólico. · Estimula o apetite materno na 1ª metade da gestação. · Promove o desenvolvimento mamário. Estrogênio: · Aumenta as propriedades hidroscópicas do tecido conjuntivo (favorece crescimento uterino). · Reduz as proteínas séricas favorecendo a formação de edemas. · Afeta a função da tireoide. · Hiperpigmentação cutânea. · Modificações no metabolismo de glicídios. · Alterações nos tecidos conjuntivo e vascular. · Reduz o apetite na 2ª metade da gestação. · Promove desenvolvimento do tecido glandular mamário e, junto com a progesterona, inibe a prolactina e, consequentemente, a produção de leite durante a gestação. · Interfere no metabolismo de ácido fólico. Lactogênio placentário humano (hPL) ou Somatomamotrofina coriônica humana (hCS): · Ação mamotrófica, mas não está envolvido na produção láctea. · Ação contrainsulínica (aumenta resistência periférica à insulina). · Promove a glicogenólise (aumentando a glicemia materna). · Promove a lipólise. · Reduz o consumo de glicose e a gliconeogênese, favorecendo a captação de glicose e aminoácidos pelo feto. · Tem ação semelhante ao hormônio do crescimento fazendo deposição de proteínas nos tecidos. · Inicia o processo de lactogênese. Hormônio do Crescimento: · Eleva a glicemia. · Estimula o crescimento dos ossos longos. · Promove a retenção de nitrogênio. Tireoxina: Regula a velocidade da taxa metabólica basal (TMB). Insulina: Reduz a glicemia e promove a produção energética e síntese de gordura. Glucacon: Eleva a glicemia pela glicogenólise. Cortisona: Eleva a glicemia pela proteólise tecidual. Aldosterona: Promove retenção de sódio e excreção de potássio. Renina – angiotensina: · Estimula a secreção de aldosterona, causando a retenção de sódio e água. · Aumenta a sede. · Calcitonina: Inibe reabsorção óssea de cálcio. Adaptações Metabólicas: Taxa Metabólica Basal (TMB): A partir do 3º mês, ocorre um aumento de 15 a 20% para suprir as necessidades fetais e maternas. Metabolismo de Carboidratos: Mesmo em situações de jejum materno, o feto requer glicose e aminoácidos em quantidades constantes. No 1º trimestre, há uma tendência à hipoglicemia e redução das necessidades de insulina devido à utilização de glicose materna pelo feto. A partir do 2º trimestre, ocorre uma resistência insulínica decorrente da ação hormonal. No 3º trimestre, a sensibilidade insulínica reduz em torno de 50% devido à ação do hPL. Essa resistência à insulina é essencial para fornecer nutrientes, preferencialmente, ao feto e para que haja o acúmulo de gordura em tecido adiposo materno. Os hormônios controladores da glicose da mãe, inclusive, a insulina, não passam para o feto, que produz sua própria insulina a partir da 9ª semana gestacional. A elevação da glicose materna estimula a produção de insulina fetal, podendo levar à macrossomia. Metabolismo Proteico: Os aminoácidos são necessários para o equilíbrio celular, síntese tecidual fetal e materna. A hemodiluição (aumento do volume de plasma sanguíneo, diminuindo a concentração de glóbulos) provoca redução das proteínas plasmáticas, principalmente, a albumina, facilitando a formação de edema. A deficiência de proteínas no período gestacional poderá acarretar alterações nos tecidos e estruturas dos órgãos, levando à redução do peso do concepto e modificações enzimáticas e bioquímicas. Metabolismo Lipídico: Sofre influência dos hormônios da gestação (estrogênio, progesterona e lactogênio placentário humano). Ocorre maior mobilização de gordura corporal para a produção de energia materna, elevando os níveis plasmáticos de ácidosgraxos, triglicerídeos, colesterol, lipoproteínas, apolipoproteínas, lipídeos totais e fosfolipídios, principalmente no 3º trimestre. Adaptações Fisiológicas: Sistema digestivo: · Náuseas e vômitos no 1º trimestre que podem gerar anorexia e perda ponderal. · Gengivas edemaciadas e hiperêmicas que sangram com facilidade. · Ptialismo ou sialorreia e redução do pH salivar, que, associados ao aumento da frequência alimentar e à higiene bucal inadequada, podem levar à formação de cárie dentária. · Redução da função da cárdia e do aumento da secreção de suco gástrico, favorecendo o refluxo gastroesofágico e ocasionando pirose. É comum também, além do refluxo gastroesofágico, a hérnia de hiato. · O aumento do volume uterino junto à ação da progesterona lentifica o esvaziamento gástrico, retarda o trânsito intestinal e eleva a incidência de náuseas, pirose, refluxo gastroesofágico, constipação intestinal e hemorroidas. · Hipotonia do intestino delgado aumenta o tempo de contato entre nutrientes e a mucosa absortiva, favorecendo a absorção de nutrientes e água. · Hipotonia da vesícula biliar, com menor liberação de bile e, consequentemente, intolerância a alimentos gordurosos. Sistema respiratório: · Aumento de 20% na necessidade de O2 causa hiperventilação. · Hiperventilação pulmonar que reduz a pCO2 e facilita as trocas gasosas através da placenta. · O crescimento do útero empurra o diafragma, tornando a respiração mais difícil. · Há substituição da respiração torácica pela abdominal e a gestante fica ofegante. Sistema circulatório e equilíbrio hidroeletrolítico: · Elevação do volume sanguíneo, do débito cardíaco e da frequência cardíaca. · O volume sanguíneo aumenta até 50%, enquanto o volume globular sobe apenas 25% levando a uma hemodiluição e anemia fisiológica. · Para manter o equilíbrio hidroeletrolítico, o sistema renina-angiotensina-aldosterona é ativado para reabsorção tubular de água. · Diminuição da resposta vascular endotelial aos constritores angiotensina II e norepinefrina, e uma maior disponibilidade e susceptibilidade para o fator de relaxamento derivado do endotélio e óxido nítrico (NO), provocando vasodilatação. Sistema urinário: O fluxo da urina é mais lento devido à compressão das veias ovarianas sobre os ureteres, aumentado a incidência de infecção urinária. Aumento do fluxo renal e de 50% da taxa de filtração glomerular para facilitar a depuração de resíduos metabólicos (ureia, creatinina e ácido úrico). A capacidade de filtração da glicose aumenta em 50%, mas sua taxa de reabsorção continua a mesma, levando a uma glicosúria fisiológica. Ocorre aumento na frequência de micção pelas alterações hormonais e pela pressão do útero na bexiga, podendo levar à incontinência urinária. Assistência Nutricional Pré Natal: O objetivo do acompanhamento pré-natal é assegurar o desenvolvimento da gestação, permitindo o parto de um recém-nascido saudável, sem impacto para a saúde materna. O acompanhamento nutricional deve ocorrer em todas as consultas do pré-natal. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda, para gestantes de baixo risco, um número mínimo de 6 consultas: uma no 1º trimestre, duas no 2º e três no 3º trimestre. Para gestantes com riscos, as consultas deverão ser mensais até a 28ª semana, quinzenais entre 28 e 36 semanas e semanais no termo. Durante o acompanhamento, são avaliados o estado nutricional da gestante e o ganho de peso durante a gestação para: · Identificar as gestantes em risco nutricional. · Detectar as gestantes com ganho de peso inadequado. · Detectar precocemente as carências nutricionais. · Realizar orientação adequada a cada caso. Avaliação do Estado Nutricional: Avaliação antropométrica: Permite identificar as inadequações prévias à gestação e o ganho de peso inadequado. Deve ser realizada em todas as consultas. Cálculo da idade gestacional: Considera-se o período gestacional de 40 semanas e o arredondamento das semanas deve ser feito da seguinte maneira: · 1,2 e 3 dias: Considerar o número de semanas completas. · 4,5 e 6 dias: Considerar a semana seguinte. Consultas subsequentes: Existem duas possibilidades para o acompanhamento da gestante: · Acompanhamento pelo ganho de peso semanal estimado: verificar o ganho ponderal proposto e comparar com o ganho de peso real da mulher. · Acompanhamento pelo gráfico de Atalah (IMC por semana gestacional): o gráfico apresenta o desenho de três curvas, que delimitam as quatro faixas para classificação do EN Verificando o Aprendizado 1. O transporte de nutrientes da mãe para o feto através da placenta é realizado por diferentes mecanismos. Correlacione os nutrientes com seus respectivos mecanismos de transporte nas colunas abaixo e assinale a alternativa que contém a sequência correta. A. Difusão simples (C ) Vitaminas hidrossolúveis B. Difusão facilitada (D ) Imunoglobulinas C. Transporte ativo ( E) Água D. Pinocitos (A ) Gás Carbônico E. Ultrafiltração (B ) Carboidratos A sequência acima demonstra o tipo de mecanismo de transporte relativo a cada tipo de nutriente citado. 2. Qual hormônio produzido na gestação é responsável pela redução da motilidade do trato gastrointestinal? R: Progesterona · A progesterona é responsável pelo relaxamento da musculatura lisa, causando hipotonia e, consequente, redução da motilidade do trato gastrointestinal.