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UNIVERSIDADE DE VILA VELHA MEDICINA VETERINÁRIA GUILHERME DIAS BRAGA LOPES DOENÇA RENAL CRÔNICA (DRC) VILA VELHA 2020 1 INTRODUÇÃO O termo doença renal crônica (DRC), também conhecida como insuficiência renal, refere-se a uma síndrome que comumente acomete cães e gatos com idades avançadas, embora animais mais jovens possam ser acometidos. A DRC é caracterizada pela perda progressiva e irreversível de grande quantidade de néfrons, o que promove alterações gradativas das funções renais, principalmente as funções endócrinas e excretórias (MORAILLON et al., 2013; KOGIKA; WAKI; MARTORELLI, 2015). Os animais com DRC só apresentaram sintomatologia clínica quando o número de néfrons funcionais, de ambos os rins, sofrerem uma diminuição até 70% a 75% abaixo do normal, pois os rins são capazes de manter as concentrações dos eletrólitos e dos volumes de líquidos normais até o momento que a quantidade de néfrons funcionais cheguem a 25% do normal (POLSIN et al, 1997). Geralmente, a principal causa da lesão renal que desencadeia a progressão da DRC não é totalmente conhecida. Desta forma, denominamos sua etiologia como multifatorial, ou seja, pode ter sido incitada por diversas causas e origens. As principais são: distúrbios glomerulares, distúrbios vasculares renais, distúrbios metabólicos, distúrbios tubulares primários, perda do tecido renal por trauma, distúrbios congênitos, obstrução do trato urinário, distúrbios hereditários (doença renal familiar), infecções, doenças imunológicas, neoplasias, hidronefrose, hipertensão arterial sistêmica primaria, hipercalcemia e sequelas provocadas pela insuficiência renal aguda (GUYTON; HALL, 2011, p.424; KOGIKA; WAKI; MARTORELLI, 2015). 2 FISIOPATOGENIA A taxa de filtração glomerular (TFG) pode ser calculada mediante a soma da TFG de um único néfron (TFGUN) de todos os néfrons funcionais em ambos os rins. Quando ocorre uma perda massiva de néfrons, a taxa de filtração glomerular total (TFG) a princípio, diminui. Esse declínio na TFG, inicialmente é compensado, por meio das mudanças adaptativas geradas nos néfrons remanescentes, que por sua vez sofrem um processo denominado de hiperfiltração glomerular. A hiperfiltração glomerular, compreende o processo em que os néfrons restantes sofrem hipertrofia compensatória, aumentando a TFGUN acima do normal. Essas alterações, por sua vez, promovem um aumento da TFG total por um período de a 4 a 6 semanas aproximadamente (DIBARTOLA; WESTROPP, 2015). A hiperfiltração glomerular provoca um aumento do deslocamento de proteínas em direção ao espaço de Bowman e mesângio, consequente a vasodilatação funcional e aumento da pressão sanguínea nos capilares glomerulares. Além disso, sabe-se que as células que compões os túbulos renais apresentam receptores de fatores de crescimento e hormônios, que geralmente se apresentam na forma de proteínas de baixo peso molecular. Diante do aumento da permeabilidade dos capilares glomerulares, as proteínas com baixo de peso molecular acabam sendo filtradas de formas excessivas, o que induz a proliferação celular e deposição de matriz extracelular conjuntiva (fibrose), provocando a lesão de túbulos e interstício. Além disso, o aumento da reabsorção das proteínas filtradas pelas células do túbulo proximal estimula reações inflamatórias que contribuem diretamente no desenvolvimento da lesão (DIBARTOLA; WESTROPP, 2015; GUYTON; HALL, 2011, p. 424-425). Com a evolução da doença, as lesões escleróticas promovem a troca do tecido normal por um tecido conjuntivo, em um processo denominado de fibrose. Desta forma, conforme o tempo passa, as lesões escleróticas reduzem mais ainda a função renal. Na tentativa de compensar essa perda de função, os néfrons que sobraram precisam se adaptar novamente, o que leva o animal a desenvolver um ciclo vicioso progressivo e lento, que encerra na doença renal terminal (GUYTON; HALL, 2011, p. 425). 3 SINAIS CLÍNICOS E EXAMES LABORATORIAIS A perda de grande quantidade de néfrons e a redução da filtração glomerular para 75%, provoca um aumento das concentrações plasmáticas principalmente de ureia, creatina, ácido guanidoacético e metilguanidina, denominada de azotemia. Nesse caso a elevação dessas substâncias no sangue pode ou não provocar sinais clínicos. Desta maneira, quando temos o aparecimento dos sinais clínicos e lesões sistêmicas (QUADRO 1), denominamos essa síndrome de uremia, que se caracteriza por comprometimento na nutrição, alterações em diversos sistemas do organismo, alterações hematológica e hemostática, alteração do metabolismo de cálcio e fósforo, do equilíbrio eletrolítico e do equilíbrio acidobásico (KOGIKA; WAKI; MARTORELLI, 2015). A anemia em casos de DRC é classificada como multifatorial, pois existem diversas causas que atuam em conjunto, são elas: diminuição da síntese de eritropoetina (principal causa), hemorragia pelo trato gastrintestinal, deficiência nutricional, diminuição da vida das hemácia por toxinas urêmicas e inibição da eritropoiese pela toxinas urêmicas ou PTH. Desta maneira, no hemograma é possível detectar frequentemente uma anemia classificada como normocítica, normocrômica e não regenerativa (KOGIKA; WAKI; MARTORELLI, 2015). De acordo com a concentração de creatinina, podemos classificar a DRC em quatro fases diferentes, de acordo com a creatinemia: fase I (<14 mg/L cães, <16 mg/L gatos), fase II (14-20 mg/L em cães, 16-28 em gatos), Fase III (21-50 mg/L em cães, 29-50 mg/L em gatos) e Fase IV ( > 50 mg/L). A azotemia geralmente aparece na fase II em diante. A partir dessa fase ela sofre intensificação. A dosagem das concentrações séricas de creatinina e ureia são extremamente importantes, pois além de auxiliar no diagnóstico, nos possibilita classificar a fase em que o animal encontra-se e mostra em média quanto o animal ainda apresenta de função renal. Para o diagnóstico definitivo da doença, a ultrassonografia é um exame que auxilia no reconhecimento da doença renal crônica (MORAILLON et al., 2013). Além disso, para a detecção da injuria renal, podemos realizar a dosagem das enzimas GGT e NAG presentes nos túbulos. Quando essas enzimas estão em quantidades elevadas na urina, pode estar relacionada com doença renal ou dano tóxico (MORAILLON et al., 2013). Uma das principais manifestações clínicas que os animais com DRC apresentam são a poliúria, que é o resultado da perda da capacidade de concentração da urina. Consequente a essa perda de água, o animal desenvolverá uma polidipsia. Na urinálise geralmente a principais alterações detectadas em animais com DRC são: hipostenúria ou isostenúria, proteinúria e cilindrúria (KOGIKA; WAKI; MARTORELLI, 2015; MORAILLON et al., 2013). QUADRO 1 – Características fisiopatológicas da Doença Renal Crônica (DRC). Intoxicação urêmica (i.e., retenção de solutos urêmicos) Hiperfiltração Proteinúria Esclerose glomerular Manutenção do balanço externo de solutos, apesar do declínio progressivo da taxa de filtração glomerular Desenvolvimento de poliúria e polidipsia e capacidade de concentração urinária prejudicada Manutenção do balanço de cálcio e fósforo e desenvolvimento de hiperparatireoidismo secundário renal Manutenção do balanço acidobásico e desenvolvimento de acidose metabólica Desenvolvimento de anemia arregenerativa Distúrbios hemostáticos (p. ex., disfunção plaquetária) Distúrbios gastrintestinais Complicações cardiovasculares (p. ex., hipertensão) Distúrbios metabólicos (p. ex., resistência à insulina, síndrome do eutireóideo doente) Fonte: DIBARTOLA; WESTROPP, (2015). REFERÊNCIAS DIBARTOLA, S. P.; WESTROPP, J. L. Insuficiência renal aguda e crônica. In: NELSON, R. W.; COUTO, G. C (Org.). Medicina interna de pequenos animais. 5.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. Cap. 44, p. 663-678. GUYTON, A. C.; HALL, J. E. (Org.). Doenças renais e diuréticos. In: ______. Tratado de fisiologia médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Cap. 31, p. 419-433 KOGIKA, M. M.; WAKI, M. F.; MARTORELLI, C. R. Doença renal crônica. In: JERICÓ, M. M. ; KOGIKA, M. F.; NETO, J. P. A. (Org.).Tratado de medicina interna de cães e gatos. Rio de Janeiro: Roca, 2015. Cap. 159, p. 1349-1409. MORAILLON, R. et al. Insuficiência renal crônica. In: ______. Manual Elsevier de veterinária: diagnóstico e tratamento de cães, gatos e animais exóticos. 7. ed. São Paulo: Elsevier, 2013. Cap.9 , p.767-772. POLZIN, D. J.; OBSBORNE, C. A.; BARTGES, J. W. Insuficiência renal crônica. In: ETTINGER, S. J.; FELDMAN, E. C. (Org.). Tratado de medicina interna veterinária. 4. ed. São Paulo: Manole, 1997. Cap. 134, p. 2394-2431. ROSS, L. A. Sistema urinário. In: FRASER, C.M. et al (Org.). Manual mereck de veterinária. 8. ed. São Paulo: Roca, 2001. Cap. 13, p. 927-951.
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