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Psicologia Social Estudos da Influência Social Desenvolvimento do material Patricia Castro de Oliveira e Silva 1ª Edição Copyright © 2022, Afya. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Afya. Sumário Estudos da Influência Social Para início de conversa… ................................................................................ 3 Objetivo ................................................................................................... 3 1. Cognição e Percepção Social .................................................................... 4 2. Uniformidade, Conformidade e Obediência ........................................ 11 3. Influência Social, Modelos e Novas Aplicações ................................. 15 Referências .................................................................................................... 19 Para início de conversa… Você já pensou o quanto a sua percepção de mundo e seu agir cotidiano são influenciados pelas outras pessoas? Já pensou no quanto sua percepção e comportamentos podem ser alvo de manipulação? Neste capítulo, vamos estudar a Influência Social, um tema muito caro a algumas vertentes da Psicologia Social. Primeiramente, vamos compreender o conceito de cognição social em suas estruturas constituintes, para compreendermos como lemos o mundo e a nós mesmos. Logo após, vamos tratar dos conceitos de uniformidade, conformidade e obediência, trazendo estudos clássicos nessa área, como o famoso estudo de Milgram (1963). Por fim, vamos pensar, nos tempos atuais, como esses conceitos forjados no momento de nascimento e consolidação da Psicologia Social nos ajudam na compreensão do mundo pós-moderno. Veremos, também, que os estudos sobre as influências sociais podem ser ferramentas colaborativas para compreendermos os sentimentos e as ações, tanto dos outros, como de nós mesmos, e, assim, nos tornarmos menos manipuláveis e/ou manipuladores(as) socialmente. Objetivo Compreender como as ações de uma pessoa são condições para as ações de outra, aplicando essa compreensão em experimentos de influências sociais. Psicologia Social 3 1. Cognição e Percepção Social A influência social é um dos tópicos mais importantes na psicologia social. Allport (1924) chegou a definir a psicologia social como o estudo sobre como as pessoas são influenciadas pela presença dos outros, presença tanto imaginária, quanto real. No entanto, precisamos pensar a influência social para além da perspectiva individualista da Psicologia Social, pensando, também, nos fenômenos de influência indireta e de grupo. Nesse sentido, é importante pensarmos que nossos comportamentos se desenvolvem a partir de uma condição humana, que, enquanto espécie, nos proporciona o aparato biológico necessário ao desenvolvimento, mas também estão absolutamente relacionados à influência cultural. Assim, teremos uma perspectiva da Psicologia Evolucionista e da Psicologia Cultural para compreender o comportamento humano. A Psicologia Evolucionista estuda como a seleção natural contribui para mudanças adaptativas e para a evolução das espécies. Ainda que contribua para a compreensão de tais fenômenos em qualquer organismo vivo que possua um sistema nervoso – tal como para a compreensão do sonar dos morcegos ou a grossa camada de pêlos e gordura dos ursos polares –, seu maior objeto de estudo são as características psicológicas e comportamentos sociais dos seres humanos. ‘‘ A perspectiva evolucionista sublinha nossa natureza humana universal. Não apenas compartilhamos certas preferências alimentares, mas também compartilhamos respostas a questões sociais, tais como em quem devo confiar, e quem devo temer? Quem devo ajudar? Quando, e com quem, devo acasalar? Quem pode me dominar, e quem eu posso controlar? Os psicólogos evolucionistas afirmam que nossas respostas emocionais e comportamentais a essas perguntas são as mesmas que funcionaram para nossos antepassados (...). Uma vez que essas tarefas sociais são comuns para as pessoas em toda a parte, os humanos de qualquer lugar tendem a concordar sobre as respostas. Por exemplo, todos os humanos classificam os outros por autoridade e status. (MYERS, 2014, p.138) Ainda que a Psicologia Evolutiva considere que temos características universais enquanto espécie e que estas são fruto do processo de seleção natural, ela também admite a influência cultural. Nesse sentido, postula que viemos preparados para aquisição da linguagem e para formação de vínculos com outros humanos, de modo a assegurar nossa sobrevivência. Viemos predispostos, por exemplo, a cooperar com os outros para assegurar alimentos, cuidar dos mais jovens e à autoproteção (MYERS, 2014). A natureza, portanto, nos predispõe a adquirir a cultura na qual nascemos (FISKE et al., 1998 apud MYERS, 2014), e “a diversidade de nossas linguagens, costumes e comportamentos expressivos confirma que muito de nosso comportamento é socialmente programado, não inato” (MYERS, 2014, p.139). Psicologia Social 4 Cognição social é um conceito que busca explicar os processos pelos quais as pessoas (de)cofidificam e explicam outras pessoas e a si mesmas. Conforme afirma Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011), esse processo de leitura do outro e de si ocorre, via de regra, de forma instantânea, mas também pode envolver considerações e análises detalhadas que podem levar mais tempo. O autor também nos chama à atenção para o fato de que, apesar de, na maioria das vezes, sermos “bons julgadores/as”, a rapidez com que julgamos a nós e aos outros também nos leva a cometer uma série de equívocos. Estudar os processos da Cognição Social pode nos ajudar a compreender tais equívocos, de modo a identificá-los e reduzi-los em nosso dia a dia. No entanto, para compreendermos o conceito de cognição social, é necessário, primeiramente, compreendermos a inteligência social humana, em sua definição e evolução, por meio do estudo dos componentes básicos da Cognição Social, que são os schemas e as atribuições. Conforme Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011), a inteligência social humana surgiu no contexto de ampliação do número de pessoas que compunham um grupo na época dos primeiros hominídeos. Inicialmente, os hominídeos viviam em pequenos grupos, mas, com o crescimento populacional e com os desafios impostos pelas adversidades do meio, que exigiam estratégias de enfrentamento coletivas, houve o aumento desses grupos. No período entre 6 milhões a 150 mil anos atrás, o tamanho médio dos grupos hominídeos foi de em torno de 50 para 150 membros. A ampliação do número de membros nos grupos demandou o desenvolvimento de teorias que pudessem contribuir para o julgamento do comportamento dos outros. Nesse momento da história de nossa espécie, a associação com outros humanos em busca de parcerias assumiu um lugar tão importante quanto a escolha do alimento ou a detecção e enfrentamento de predadores. No entanto, a formação de alianças exigia o desenvolvimento de habilidades no sentido de identificar a melhor parceria ou aquelas que em nada contribuiriam para si ou para o grupo, e até mesmo poderiam ser perigosas. Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011) afirma que a seleção de novas alianças envolve questões de altruísmo recíproco, ou seja, as alianças só poderiam funcionar bem se fossem observadas regras como “eu te ajudo e você me ajuda”. No entanto, é preciso ponderar que sempre existe o risco de não haver reciprocidade. “O problema da não reciprocidade é tão grave que a espécie que não desenvolver mecanismos para enfrentá- lo não sobrevive” (TRÓCCOLI apud TORRES; NEIVA, 2011, p.80). Sendo a questão da reciprocidade tão vital, todas as espécies desenvolveram mecanismos para lidar com membros que não são solidários, isto é, que não têm reciprocidade. Axelrod (1984), buscandoanalisar esses mecanismos, propôs a existência de três condições que contribuem para resolver o problema dos membros egoístas e aproveitadores: (1) organismos se contraram repetidas vezes; (2) organismos reconhecem aqueles que já encontraram Psicologia Social 5 antes, diferenciando-os dos que nunca encontraram; e (3) organismos possuem memória de modo que podem lembrar como aqueles que já encontraram os trataram. Axelrod (1984) postula que as três condições foram surgindo nos hominídeos ao longo de seu período formativo. Nos dias atuais, é possível afirmar que todos somos sensíveis ao altruísmo recíproco e, via de regra, buscamos selecionar nossas parcerias levando em conta esse quesito. Os grupos humanos cada vez maiores demandaram, também, uma capacidade de memória maior para decodificar os comportamentos dos outros, bem como um raciocínio social mais elaborado no sentido de possibilitar equilíbrios delicados na manutenção de laços sociais considerados entre o que era identificado com lealdades e/ou não. ‘‘ Nesse ponto, já estamos considerando estratégias e jogos políticos bastante sofisticados, nos quais mentiras, promessas, jogos de cena e até mesmo sinceridade e franqueza, ajudam-nos a manter nossos amigos e a enganar nossos inimigos. (TRÓCCOLI apud TORRES; NEIVA, 2011, p.82)’’ A capacidade que uma pessoa tem de compreender sentimentos, desejos, crenças e intenções, suas próprias e de outras pessoas, é uma característica humana cujas origens, formas de expressão e consequências sociais despertam o interesse dos pesquisadores, em especial na área da Psicologia Social. Essa capacidade de leitura de si e do outro tem sido especialmente estudada por psicólogos desenvolvimentistas e cognitivistas sob o nome de Teoria da Mente ou, como Whiten (1991 apud JOU, 1999) denominou, everyday mindreading (leitura da mente de todo dia). A maioria dos pensadores da área entende que, assim como as pessoas, de maneira geral, desenvolvem teorias senso comum para compreensão do mundo físico, também desenvolvem teorias psicológicas para explicar o comportamento dos indivíduos, seus desejos e suas intenções, que seria a teoria da mente. Para Bruner (1990 apud JOU, 1999), cada cultura desenvolve sua psicologia popular por meio de narrativas sobre a atitude e o comportamento das pessoas. ‘‘ Ao dizer que um indivíduo tem uma teoria da mente, queremos significar que o indivíduo atribui estados mentais a si próprio e aos outros (seja da mesma espécie ou de outra). Um sistema de inferência desse tipo é, apropriadamente, visto como uma teoria, primeiro, porque esses estados não são observáveis diretamente e, segundo, porque o sistema pode ser usado para fazer predições, especificamente, sobre o comportamento de outros organismos. (PREMACK; WOODRUFF, 1978, p.515)’’ Jou (1999) nos coloca as proposições dos autores Horgan e Woodward (1990) e Whiten e Perner (1991) como importantes para a compreensão da natureza das teorias da mente, por parecerem mais esclarecedoras a respeito de sua natureza. Horgan e Woodward (1990 apud JOU, 1999) consideram a psicologia popular como um conjunto de princípios que constituem os conhecimentos de senso comum sobre o comportamento humano. Esses princípios conferem um papel central a certas atitudes intencionais, em especial crenças e desejos. Whiten e Perner (1991 apud JOU, 1999, s.p) acrescentam que, “nas conversas do dia a dia, emprega- Psicologia Social 6 se o que tem se designado como (teorias da) psicologia popular para explicar o comportamento das pessoas. A própria linguagem utilizada está impregnada de verbos mentais como: pensar, achar, sentir, saber, imaginar etc.”. É importante compreendermos como esse conhecimento torna-se parte de nós, como o desenvolvemos e como ele afeta e constrói o nosso cotidiano. Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011) afirma que somente a partir do surgimento da teoria da mente as crianças passaram a compreender que as pessoas podem ter crenças que são diferentes das delas e, ainda, que elas e as outras pessoas podem manter crenças que não encontram fundamento em dados de realidade, isto é, falsas. É a partir do desenvolvimento da teoria da mente que as crianças se tornam capazes de manipular outras pessoas e de mentir, o que as torna mais aptas à vida em grupo, pois elas se tornam capazes de jogar os jogos sociais e políticos necessários à vida em sociedade. Nesse sentido, para o desenvolvimento humano em sociedade, a linguagem tem papel fundamental. Nos anos de 1950, Noam Chomsky demonstrou que seria impossível para as crianças aprenderem uma língua de forma tão rápida apenas com os estímulos dados pelos pais e pelo ambiente cultural. A criança só aprende uma língua porque ela nasce programada para esse tipo de aprendizagem. Dunbar (2004 apud TORRES; NEIVA, 2011) postulou que a linguagem evoluiu para ajudar nossos ancestrais na obtenção de informações sobre quem merece ou não confiança e que a função básica da linguagem é a troca de informações sobre o ambiente social. Nesse sentido, voltamos ao altruísmo recíproco que estaria na base do desenvolvimento de um mecanismo inato, ou seja, a linguagem se desenvolveu pela necessidade de nossos ancestrais de ampliar a eficácia de sua comunicação, em grupos cada vez maiores, sobre quem é ou não confiável. Como em grupos maiores não é possível distinguir apenas por meio da experiência direta e pessoal, surge a necessidade do desenvolvimento de um sistema de comunicação sofisticado. 1.1 Princípios da Cognição Social Algumas características se desenvolveram na espécie humana a partir de demandas do meio e de mudanças no funcionamento dos grupos desde os primeiros hominídeos, o que contribuiu para o desenvolvimento das teorias da mente e da linguagem. Agora, veremos, apoiados em Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011), alguns dos princípios que norteiam os estudos da cognição social: a. O indivíduo como um avarento cognitivo: Diz respeito à nossa necessidade intrínseca de buscar simplificações e aproximações, em vez de nos esforçarmos em processos analíticos cuidadosos e bem fundamentados. Psicologia Social 7 b. Orientação para os processos: Diz respeito aos processos cognitivos, que, para a Psicologia Cognitivista, são descritos como processos computacionais de Input (quando recebemos as informações, codificamos e armazenamos) e Output (quando recuperamos o armazenado para realizar inferências e para gerar produtos). c. Pessoas como agentes causais: Diz respeito ao que recebemos da teoria da mente, por meio de nossa herança evolutiva, que é a percepção de que as pessoas são agentes causais. Ou seja, diz respeito à nossa percepção de que as pessoas são impulsionadas internamente em direção às suas ações e objetivos, o que faz com que as pessoas fiquem bem mais interessantes e complexas como alvos de percepção e julgamento. d. Percepção mútua: Diz repeito ao fato de a cognição social ser uma percepção mútua. Ou seja, nossos impulsos para compreender e explicar as outras pessoas são perpassados pelo que percebemos como a percepção e o julgamento delas sobre nós. e. Centralidade do eu: Diz respeito ao fato de que a percepção de outra pessoa envolve o eu de quem percebe, isto é, quem percebe a outra pessoa acaba por perceber a si mesmo. Se julgamos, por exemplo, a adequação do comportamento de uma pessoa em determinada circunstância, instantaneamente, estamos julgando também o nosso. Ao julgarmos o outro, estamos emitindo, ao mesmo tempo, um julgamento sobre nós mesmos. f. Qualidade da percepção: Diz respeito ao grau de confiabildiade de nossos processos availiativos do mundo e de nós mesmos. O processo adaptativo da espécie humana, a chamada Psicologia leiga, nos ajuda bastante, mas cometemos erros. Para ampliar a qualidade da percepção e diminuir nossos equívocos, também nos valemos das percepções de outras pessoas, em especial das pessoas de nossa confiança e respeito. g. Orientaçãopragmática (tático-motivada): Diz respeito à orientação do pensamento em direção à ação. O indivíduo pensa para agir, escolhe entre diferentes possibilidades e estratégias que garantam parcerias e reciprocidade. h. Predominância dos processos automáticos (indivíduo como ator- ativado): Diz respeito à predominância de processos afetivos e comportamentais automáticos. Ou seja, o indivíduo tático- -motivado, discutido no item anterior, na maioria das vezes, pensa e seleciona estratégias de maneira inconsciente. Nós usamos nossas estruturas cognitivas para compreender de maneira rápida e satisfatória as pessoas e a nós mesmos. Para tanto, valemo- nos de dois elementos fundantes da Cognição Social: os Schemas e as Atribuições. Os Schemas expressam preconcepções e/ou teorias sobre conceitos, objetos ou eventos, em que se incluem as preconcepções e teorias sobre os outros e sobre nós mesmos. Nossos schemas são constituídos por um emaranhado de informações conectadas, fios inatos, históricos, sociais e culturais que nos constituem. Podemos pensar, por exemplo, no que é, para nós, uma pessoa confiável, uma pessoa inteligente, uma pessoa bem-sucedida.. . Imediatamente, vem à nossa mente uma série de características que acreditamos Psicologia Social 8 que essas pessoas possuem. Esses são nossos Schemas, nossas pré- concepções sobre essas pessoas. ‘‘ A rapidez com a qual as pessoas julgam as outras acontece porque o julgamento é feito automaticamente on-line. Os schemas permitem que façamos julgamentos e avaliações simplificadas, polarizadas e automáticas. Somos apresentados a alguém que nunca vimos antes e, imediatamente, temos reações positivas ou negativas já a partir do momento que começamos a receber informações (tom de voz, aparência, postura, conteúdo do que diz). Acontece que, quando encontramos alguém que ativa algum schema ligado a outra pessoa ou evento, ocorre uma reação ou transferência das mesmas reações de julgamento para a pessoa que acabamos de conhecer – sem que tenhamos nenhuma consciência disso. (TRÓCCOLI apud TORRES; NEIVA, 2011, p.87)’’ Além dos schemas, nossos julgamentos sobre os outros também são influenciados por evidências e informações que percebemos como de outras fontes. Alguns fatores contribuem para esse confronto com outras evidências, que terá como consequência uma análise mais depurada e aprofundada do mundo e das pessoas, bem como nossa motivação, a confluência entre os schemas e os dados de realidade. Ou seja, dados e informações são capazes de superar nossos schemas e estereótipos sobre uma pessoa ou situação social. Porém, quando estamos muito cansados física e/ou mentalmente, nossos schemas tendem a se sobrepor às evidências. Nossa motivação também é determinante na preponderância ou superação dos schemas. O outro elemento que compõe a Cognição Social são as atribuições, que dizem respeito à nossa leitura causal das pessoas e situações. Nós atribuímos causas aos comportamentos das pessoas e aos nossos próprios, e essas atribuições causais influenciam nossas reações afetivas e nossos comportamentos futuros. Também de acordo com Tróccoli (apud TORRES; NEIVA, 2011, p.87), “Quando atribuímos disposições ou traços como causas de comportamentos observados, fornecemos toda informação necessária para ficar armazenada no schema relativo aos traços, comportamentos e reações afetivas em questão”. As atribuições são constituídas a partir de situações vividas como negativas, inesperadas ou importantes, ou seja, de situações que significaram sucesso ou fracasso em algum objetivo e provocaram reações afetivas positivas, como alegria, ou negativas, como tristeza ou frustração. Somente a partir desses afetos relacionados às pessoas ou situações é que se desenvolvem as atribuições. Psicologia Social 9 Segundo Weiner (2005 apud TORRES; NEIVA, 2011), as causas atribuídas ao comportamento que resultou no alcance ou não dos objetivos do indivíduo podem ser enquadradas em três dimensões: dimensões locus (interno ou externo), estabilidade (estável ou instável) e controlabilidade (controlável ou incontrolável). Dentro dessa proposição de enquadre tridimensional das atribuições, são exemplos as seguintes as mais comuns atribuições: ▪ Aptidão: interna, estável, incontrolável. ▪ Esforço: interna, instável, controlável. ▪ Habilidade: interna, instável, controlável. ▪ Acaso: externa, instável, incontrolável. ▪ Ajuda: externa, instável, incontrolável. ▪ Sorte: externa, instável, incontrolável. A área da Cognição Social diz respeito aos estudos sobre como percebemos, processamos, armazenamos e usamos informações que recebemos de nosso mundo social. Veja, a seguir, alguns exemplos de atribuição Intrapessoal e Interpessoal: Atribuição Intrapessoal Alcançou o objetivo Não alcançou o objetivo Evento positivo Tipos de causas e suas consequências: Aptidão: expectativa alta de sucesso; emoções positivas. Esforço: boas expectativas de sucesso; emoções positivas + determinação + precaução. Habilidade: boas expectativas de sucesso; emoções positivas + incerteza quanto à habilidade. Sorte, acaso, ajuda: baixa expectativa de sucesso; emoções imediatas positivas, mas passageiras. Tipos de causas e suas consequências: Falta de aptidão: expectativa muito baixa de sucesso; emoções negativas (vergonha, humilhação, embaraço). Baixo esforço: boas expectativas de sucesso; emoções negativas passageiras (baixa autoestima, culpa). Falta de habilidade: expectativa moderada de sucesso; emoções negativas substituídas por apreensão. Falta de sorte, acaso ruim, falta de ajuda: expectativa positiva cautelosa de sucesso; emoções negativas, mas passageiras. Evento negativo Se o evento foi inesperado, negativo ou importante, então, ocorre uma busca por causas que podem ser descritas em um espaço ▪ Locus ▪ Estabilidade ▪ Controlabilidade Se positivo: ▪ Feliz Se negativo: ▪ Tristeza ▪ Frustração Figura 1: Exemplos de atribuição intrapessoal. Fonte: Adaptado de Weiner (2005 apud TORRES; NEIVA, 2011). Psicologia Social 10 Decide não recriminar Nenhuma condenação Ajuda Nenhuma retaliação Reprimida Condenação Abandono Retaliação Atribuição Interpessoal Evento Fracasso em uma tarefa Câncer do pulmão por ser fumante Não apareceu no trabalho Agrediu uma pessoa Fracasso em uma tarefa Cego de nascimento Faltou a escola Agressão Causa Falta de esforço Comprometimento irresponsável Alcoolismo Intencional maldade Falta de aptidão Inata sem controle Resfriado forte Esbarrou sem querer Responsável Raiva Não responsável Simpatia Reação Comportamental Figura 2: Exemplos de atribuição interpessoal. Fonte: Adaptado de Weiner (2005 apud TORRES; NEIVA, 2011). Ao comparar os esquemas das Figuras 1 e 2, vemos que uma mesma atribuição pode gerar sentimentos bastante distintos se for considerada uma causa interna (esquema intrapessoal) ou externa (esquema interpessoal). A atribuição falta de esforço, por exemplo, tomada como causa de um fracasso, leva a reações afetivas e comportamentais opostas. Quando se trata de atribuição intrapessoal, resulta em respostas afetivas moderadamente negativas e passageiras e em comportamentos de persistência e esperança de sucesso no futuro. No entanto, quando a falta de esforço é uma atribuição interpessoal, provoca sentimento de raiva e comportamentos negativos de condenação, abandono e retaliação. 2. Uniformidade, Conformidade e Obediência Experimentos de conformidade nos mostram, de maneira prática, que é mais fácil defender alguma coisa se você puder encontrar alguém que a defenda com você, com algum nível de uniformidade e coesão (MYERS, 2014). O conceito de uniformidade também nos mostra que: ‘‘ A opinião minoritária de alguém de fora dos grupos com os quais nos identificamos – de alguém de outra faculda- de ou de uma religião diferente – nos influencia menos do que a opinião minoritária de alguém do nosso grupo (CLARK;MAASS, 1988). Uma argumentação heterossexual pelos direitos dos homossexuais influenciaria os heterossexuais de forma mais eficaz do que faria a de um homossexual. As pessoas atendem com mais facilidade aos pedidos de pessoas que supostamente compartilham de sua data de aniversário, de seu primeiro nome ou das características de sua impressão digital (BURGER et al., 2004; SILVIA, 2005). Quanto mais coeso é o grupo, mais poder ele adquire sobre seus membros. (MYERS, 2014, p.176-177)’’ Conformidade diz respeito ao nosso agir em relação ao agir de outras pessoas e como somos afetados pelo comportamento delas. Diz respeito ao nosso agir ou pensar de uma maneira que difere de como pensaríamos Psicologia Social 11 ou agiríamos se estivéssemos sozinhos, ou seja, é uma mudança de crença ou comportamento buscando concordar com os outros. Existem variedades de conformidade: a aquiescência, obediência e aceitação (NAIL et al., 2000 apud MYERS, 2014). Muitas das vezes, nos comportamos de determinada maneira a partir de uma expectativa ou pedido sem que, necessariamente, estejamos de acordo ou acreditando no que fazemos. Esse tipo de conformidade exterior insincera é a chamada aquiescência. Myers (2014) afirma que, se nossa aquiescência está relacionada a uma ordem explícita, é chamada obediência. Existe, ainda, a aceitação, que diz respeito a uma conformidade sincera interna, que pode ter começado com um processo de aquiescência e que se tornou aceitação por um processo interno de revisão. Conforme Myers (2014), a conformidade não é intrinsecamente boa ou ruim, podendo até ser inconsequente. Sua compreensão implica, também, uma análise cultural dos processos de conformidade à luz das características sócio-históricas e culturais dos povos. Psicólogos sociais desenvolveram uma série de estudos para compreender os processos de uniformidade, conformidade e obediência. Veremos, agora, alguns desses estudos. Em 1951, Solomon Asch colocou em uma sala oito pessoas diante de um quadro com várias cartolinas. Cada cartolina continha, do lado esquerdo, uma linha vertical (figura de base) e, à direita, três linhas verticais de comprimentos diferentes, numeradas de 1 a 3, uma das quais tinha o mesmo tamanho da linha de base. Sete das oito pessoas eram cúmplices do experimento e apenas uma pessoa era o sujeito em observação. As pessoas eram convidadas a dizer qual das três linhas da direita correspondia à linha de base da esquerda. Os cúmplices sempre emitiam suas opiniões antes do sujeito observado, e suas opiniões eram sempre equivocadas e, de algum modo, uníssonas, de modo que o sujeito, ainda que discorde das respostas do resto do grupo, se encontra claramente em uma posição minoritária. O experimento encontrou que, apesar de não haver nenhum tipo de pressão explícita do grupo, a pessoa que se encontra na posição de sujeito observado chega a cometer erros de até 5 cm em relação à linha base. O experimento de Asch também encontrou que a conformidade do sujeito aumenta se reforçarmos a dependência do indivíduo em relação ao grupo. Ou seja, se o grupo é apresentado/tomado como particularmente atraente, com respeitabilidade e status, o sujeito tende a querer se integrar a ele. Por outro lado, quando está sozinho, o sujeito tende a manter suas respostas corretas. Por fim, o experimento também aponta que, se as respostas do sujeito forem confirmadas pelo experimentador, sua confiança será reforçada e, em uma nova situação experimental, ele tende a questionar as respostas do grupo. Psicologia Social 12 A B C Figura 3: Exemplo das linhas no experimento de conformidade de Asch. Fonte: Adaptado de Asch (1951). A pressão à conformidade supõe a existência de uma maioria e de uma minoria. Por meio de um sistema de sanções ou de valorizações, os indivíduos minoritários são levados a aceitar as regras da maioria. No experimento de Asch (1951), 30% dos sujeitos experimentais não se conformaram à pressão implícita do grupo, ou seja, um terço dos sujeitos mantiveram-se independentes, o que nos leva à necessidade de sempre considerar quais são os fatores que explicam comportamentos de conformidade. Os experimentos de Asch foram fonte de inspiração para vários outros experimentos de conformidade e obediência; os experimentos de Stanley Milgram (1965, 1974 apud MYERS, 2014) se tornaram os mais famosos e controversos da Psicologia Social (MYERS, 2014). Milgram buscou investigar o que acontece quando as exigências da autoridade vão contra o que a pessoa pensa e sente, ou seja, contra as exigências de sua consciência. Conforme aponta Myers (2014), o experimento de conformidade foi conduzido, originalmente, da seguinte forma: ▪ Dois homens vão ao laboratório de psicologia da Universidade de Yaley para participar de um estudo de aprendizagem e memória. Um cúmplice do experimentado, vestindo um jaleco, explica que esse é um estudo pioneiro sobre o efeito da punição no aprendizado. O experimento requer que um deles ensine uma lista de pares de palavras ao outro e puna os erros aplicando choques de intensidade crescente. Para atribuir os papéis, eles tiram papeizinhos de um chapéu. Um dos homens, que faz o papel de um contabilista amável de 47 anos, que, na verdade, também é cúmplice do experimentador, diz que seu papelzinho diz “aprendiz”, sendo conduzido para uma sala ao lado. O outro homem – este, sim, um voluntário que veio em resposta a um anúncio de jornal – recebe o papel de “professor”, ou seja, ele será o responsável por aplicar os choques quando o “aprendiz” cometer erros. Psicologia Social 13 ▪ O voluntário leva um pequeno choque como exemplo do processo ao qual o “aprendiz” será submetido e depois vê o experimentador prender o aluno em uma cadeira e afixar um eletrodo sobre seu pulso. ▪ Em seguida, o voluntário que fará o papel de professor e o experimentador retornam para a sala principal, onde o voluntário toma o seu lugar à frente de um “gerador de choque”, com interruptores que variam de 15 a 450 volts, com incrementos de 15 volts a cada erro do “aprendiz”. ▪ O experimentador pede ao voluntário professor que “aumente a intensidade do choque em um nível” cada vez que o aluno der uma resposta errada. A cada toque no interruptor, luzes piscam e um alarme elétrico soa. ▪ “Se o voluntário age conforme as solicitações do pesquisador, ele ouve o aluno gemer aos 75, 90 e 105 volts. Aos 120 volts, o ‘aprendiz’ grita que os choques são dolorosos; em 150 volts, ele grita: ‘Experimentador, me tire daqui! Eu não quero mais participar do experimento! Eu me recuso a continuar!’; aos 270 volts, seus protestos tornam-se gritos de agonia, e ele continua a insistir para ser solto; a 300 e 315 volts, ele grita sua recusa a responder; depois de 330 volts, ele fica em silêncio. Em resposta às perguntas e apelos do professor para findar o experimento, o experimentador afirma que a ausência de resposta deve ser tratada como resposta errada.” (MYERS, 2014, p.168) ▪ Na verdade, o “aprendiz” nos experimentos não recebeu nenhum choque. Ele se soltava da “cadeira elétrica” e ligava um gravador que emitia os protestos. Quando Milgram apresentou seu experimento para psiquiatras, universitários e adultos de classe média, a maioria inferiu que não passaria da aplicação de 150 volts se participassem do experimento. No entanto, quando o experimento foi realizado com 40 profissionais homens, com idades entre 20 a 50 anos, 65% avançou até os 450 volts. A minoria que parou antes, em geral o fez em torno dos 150 volts, quando os protestos do aprendiz se tornaram mais convincentes (PACKER, 2008 apud MYERS, 2014; ZIMBARDO, 2007). Milgram refez o experimento com variações e com diferentes populações em outros momentos, obtendo sempre o mesmo resultado de uma maioria que seguia dando os choques, apesar dos protestos e apelos do aprendiz e em resposta às ordens do experimentador. Milgram investigou os fatores que levavamà obediência e concluiu que os principais fatores que a determinavam eram a distância emocional da vítima, a proximidade e legitimidade da autoridade, se a autoridade fazia parte de uma instituição respeitada e os efeitos libertadores de um colega participante desobediente (MYERS, 2014). Os experimentos de Asch e de Milgram possuem certas semelhanças: mostraram como a aquiescência pode ter precedência sobre o senso moral; tiveram sucesso em pressionar as pessoas a irem contra suas próprias consciências e nos sensibilizaram para conflitos morais em Psicologia Social 14 nosso dia a dia aos quais devemos estar atentos, bem como para a importância de pensarmos a influência social sobre nossa autopercepção, percepção dos outros e sobre nossos comportamentos. Os experimentos de Milgram sofreram uma série de críticas, em especial quanto aos aspectos éticos. O pesquisador foi acusado de estar causando danos psicológicos sobre os sujeitos observados (os voluntários), ao forçar-lhes a causar sofrimento sobre outro ser humano, ou em seu autoconceito, após lhe ser revelada a farsa do experimento, em que ela teria que lidar com o fato de saber que não havia ferido ninguém. O voluntário foi capaz de obedecer e seguir dando choques em outro ser humano mediante as ordens de uma figura de autoridade, por ele avaliada e percebida como digna de confiança e portadora de status. Milgram se defendeu das críticas, resultados de suas quase duas dúzias de experimentos com uma amostra diversificada de mais de mil participantes. Além disso, referiu o apoio que obteve dos voluntários após a encenação ser revelada e o experimento explicado; 84% disse que se sentia feliz por ter participado. Em razão das críticas feitas pela comunidade científica aos aspectos éticos do experimento, um ano depois, um psiquiatra entrevistou 40 voluntários dos que mais tinham sofrido e concluiu que, apesar do estresse temporário, ninguém foi efetivamente prejudicado. A história do experimento pode ser vista no filme O Experimento de Milgram, de 2015. 3. Influência Social, Modelos e Novas Aplicações Ng (2001 apud TORRES; NEIVA, 2011) nos apresenta três tipos de influência social. Vejamos: a. Influência direta pessoa a pessoa: É a mais estudada conforme os estudos listados nos livros de Psicologia. Esse tipo de pesquisa tem foco no indivíduo, segundo a definição de psicologia social de Allport, “com uma clara tendência individualista, já que se concentra na pessoa influenciada por algum outro agente (influenciador) e na influência da informação mais do que na influência normativa” (FISCHER; VAUCLAIR apud TORRES; NEIVA, 2011, p.153). Esse tipo de proposição de influência social e respectivos estudos estão alinhados ao recente paradigma em psicologia social psicológica, o paradigma social-cognitivista que pensa as pessoas como entidades autônomas que significam o mundo por meio do pensamento racional. Nessa perspectiva, as influências normativas advindas de grupos e estruturas sociais não são tão relevantes. b. Influência por manipulação indireta das normas e costumes sociais e das atitudes sociais ou culturais: Nessa perspectiva, as pessoas podem ser influenciadas pela manipulação de agendas, da mobilização de valores e normas sociais para direcionar a discussão, ou por exclusão e isolamento de pessoas. c. Influência sutil ou indireta: Atitudes, crenças e comportamentos são influenciados pelos outros sem que a pessoa tenha consciência das estratégias de influência. A cultura é um dos melhores exemplos desse tipo de influência. Psicologia Social 15 Levy et al. (1998 apud TORRES; NEIVA, 2011) nos apresentam uma classificação de tipos de influência social que estariam associados ao primeiro nível da classificação de Ng (2001), ou seja, da influência direta pessoa a pessoa. A partir de uma análise sistematizada dos principais estudos sobre influência social, os autores identificaram quatro características-chave: a. nível de processamento cognitivo (consciente x inconsciente); b. intencionalidade percebida (intencional x não intencional x irrelevante); c. status relativo de influência (maior status x status de par/igual x baixo status x irrelevante); d. direção da mudança (positivo x negativo x irrelevante). O modelo de influência social proposto por Levy et al. (1998 apud TORRES; NEIVA, 2011) busca a compreensão combinada do tipo de influência e os tipos de resultados dessa influência, um tipo de modelo focado na compreensão sobre a pessoa influenciada. Outro tipo de modelo de influência social tem seu foco nas forças que influenciam e vão estudar o poder. Nessa linha, as pesquisas de French e Raven (1959, 1965 apud TORRES; NEIVA, 2011) distinguiram as seguintes bases de poder: poder de recompensa, poder coercivo ou de punição, poder legitimado, poder pericial, poder referente e, por último, o poder de informação. ▪ Poder de recompensa: Poder de distribuir recompensas pela conformidade. Quanto maior a recompensa, maior o poder de uma pessoa. ▪ Poder coercivo ou de punição: Poder de punir pela não conformidade. ▪ Poder legitimado: Crença de que o agente está autorizado a comandar e a tomar decisões, sendo reconhecido em uma determinada estrutura de poder. ▪ Poder pericial: Crença de que um agente tem mais perícia e experiência do que a pessoa-alvo. Esse tipo de poder aumenta com o diferencial de conhecimento entre o agente e a pessoa-alvo. ▪ Poder informacional: Crença de que um agente tem mais informação do que um alvo. ▪ Poder referente: Identificação, atração e respeito por um agente ou fonte de influência. Quanto maiores a identificação e o desejo de se associar à fonte de influência, maior o poder da fonte. Ainda que de grande relevância para o campo da Psicologia Social, os estudos sobre influência social, tanto nas vertentes que se debruçaram sobre o influenciado quanto as que estudaram as fontes de influência, sofreram críticas éticas e, especialmente, metodológicas. Desse modo, outros estudos têm sido realizados para ratificar ou confrontar tais modelos. Psicologia Social 16 Nesse sentido, destacamos os estudos de Bond e Smith (1996 apud TORRES; NEIVA, 2011), que realizaram uma metanálise objetivando verificar se a conformidade depende do desenho do estudo, se ela é estável ao longo do tempo e se há diferenças entre pessoas de diferentes culturas. Inicialmente, os pesquisadores verificaram um nível de conformidade em torno de 29% em todos os estudos que conduziram, ou seja, apenas esse percentual dos sujeitos efetivamente se acomodou, fazendo um julgamento equivocado. Os estudos também mostraram que diversas variáveis do desenho metodológico impactavam significativamente os resultados. Também foi identificado que a conformidade seria maior se o grupo fosse composto por membros internos (em comparação a membros externos, como estrangeiros, alunos de outra universidade etc.) e se os grupos aumentassem de tamanho. Identificaram que as mulheres apresentaram níveis mais elevados de conformidade, e que a conformidade era maior em amostras de sociedades mais coletivistas. Os estudos também mostraram uma redução significativa na conformidade se comparados aos estudos realizados entre 1950 e 1990 (FISCHER; VAICLAIR apud TORRES; NEIVA, 2011). É importante observar que os estudos realizados mais recentemente mostram a importância de se colocar o próprio estudo em análise, ou seja, metodologia e técnicas que sempre influenciam os resultados, levando-se em conta a impossibilidade de um experimento humano absolutamente neutro, bem como proceder a uma análise contextualizada sócio-histórica e culturalmente. O caso da maior conformidade identificada nas mulheres, por exemplo, precisa ser pensado a partir dos atravessamentos das desigualdades de gênero nas sociedades machistas e patriarcais. Ademais, a diminuição dos níveis de conformidade entre os anos 1950 e os anos 1990 também precisam ser analisadosà luz da história, que mostra uma série de avanços nos campos de empoderamento de minorias como as próprias mulheres, populações LGBT, negros e negras, dentre outras. 3.1 Caminhos Atuais dos Estudos sobre Influência Social Nas últimas duas décadas, os estudos sobre influência social que trabalham com a perspectiva da Cognição Social têm ganhado bastante espaço, mas também têm sofrido críticas por, em sua maioria, se alinharem a uma perspectiva individualista, centrando seus questionamentos e postulações no indivíduo que é influenciado. Na atualidade, a persuasão é um dos objetos mais caros aos estudos de influência social, em especial nas sociedades ocidentais, que buscam cada vez mais compreender e ampliar o poder persuasivo da área da propaganda. Porém, novos estudos sobre persuasão e tecnologias têm dominado a área, voltando-se para o estudo das novas tecnologias que modificam a forma unidirecional e passiva como a persuasão era compreendida nos estudos anteriores. As chamadas “tecnologias persuasivas” dizem respeito a quaisquer sistemas interativos de computação elaborados para influenciar e mudar as atitudes e os comportamentos das pessoas (FOGG, 2003 apud TORRES; NEIVA, 2011). Psicologia Social 17 Os estudos sobre cultura são outro exemplo de rumos mais atuais dos estudos sobre influência social. A perspectiva cultural tece uma crítica à maioria dos estudos clássicos que se centravam no influenciado, a partir de uma perspectiva individualista do fenômeno da influência social. Ainda assim, existe uma escassez de estudos nessa área. ‘‘ Há pouca pesquisa focada nos processos de persuasão em ambientes mais coletivistas. Esta é uma situação preocupante, considerando-se que muito do trabalho de persuasão aplicado visa mudar as atitudes e os comportamentos de saúde. As minorias em muitas sociedades modernas e em muitos países em desenvolvimento costumam ser mais coletivistas e voltadas ao grupo, além de apresentarem piores comportamentos e atitudes de saúde quando comparadas com membros dos grupos majoritários individualistas ou com sociedades individualistas. (FISCHER; VAICLAIR apud TORRES; NEIVA, 2011, p.161)’’ Nesse sentido, é importante a ampliação de estudos culturais sobre influência social. Um exemplo desse tipo de estudo é o de Khaled et al. (2007), que desenvolveram um programa de pesquisa que objetivava desenvolver um jogo interativo para ajudar adolescentes e jovens adultos a pararem de fumar. As principais metas da pesquisa eram: identificar as estratégias de persuasão adequadas para os públicos individualistas e coletivistas; traduzir essas estratégias e desenvolver um protótipo de jogo persuasivo que fosse sensível à cultura; avaliar esse protótipo com públicos individualistas e coletivistas. As atitudes em relação ao tabagismo e ao abandono foram avaliadas tanto antes quanto depois do jogo elaborado a partir da premissa de congruência cultural, voltado especificamente para culturas individualistas e coletivistas. De maneira geral, os participantes apresentaram atitudes positivas em relação a abandonar o fumo e atitudes mais negativas sobre o tabagismo depois de jogar. O programa de pesquisa mostrou que a cultura influencia a persuasão, e o processo de influência social e que as tentativas de persuasão culturalmente incongruentes podem chegar a ter efeitos contrários ao esperado. Os pesquisadores indicam as vantagens científicas de se observar aspectos culturais nos processos de influência social, especialmente quando o objetivo é a persusão no sentido de mudanças positivas no âmbito da saúde (Khaled et al., 2007). Os estudos psicossociais sobre os processos de influência social são capazes de nos ajudar a compreender nossa autoavaliação e os processos pelos pelos quais avaliamos as outras pessoas. Desde o início da constituição da Psicologia Social como ciência teórico-conceitual e metodológica, temos vários estudos que buscam compreender como as pessoas são capazes de influenciar as outras. Tais estudos trouxeram resultados importantes, que devem nos colocar em atenção com relação a esses processos quando nos autojulgarmos ou julgarmos de maneira imediata outras pessoas, sabendo que nossos julgamentos são constituídos e perpassados também pela influência social. Por outro lado, os resultados de tais estudos também precisam Psicologia Social 18 ser contextualizados com relação aos seus próprios métodos e técnicas de coleta de dados e à luz da história das diferentes sociedades e sua cultura. Desse modo, mais recentemente tem havido um incremento de estudos que objetivaram ratificar e/ou confrontar estudos clássicos da área, e ainda uma expansão de estudos que pensam a influência social a partir do referencial cultural. Referências ALLPORT, F. H. Social psychology. Boston: Houghton-Mifflin, 1924. ASCH, S. E. Effects of Group Pressure on the Modification and Distortion of Judgments. In: GUETZKNOW, H. (Ed.). Groups, leadership and men. Pittsburgh: Carnegie Press, 1951. AXELROD, R. The evolution of cooperation. USA: Basic Books, 1984. JOU, Graciela Inchausti de; SPERB, Tania Mara. Teoria da Mente: diferentes abordagens. Psicol. Reflex. Crit., Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 287-306, 1999. KHALED, R. et al. 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