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AULA 6 GESTÃO DE RECOMPENSAS NO CONTEXTO GLOBAL Profª Maura Vello 02 CONVERSA INICIAL Nas aulas anteriores desta disciplina, falamos de vários fatores relacionados à remuneração e à recompensa, das relações entre pessoas e organizações e de toda a complexidade envolvida nessas abordagens, seja conceitualmente, seja na aplicação de soluções que atendam às organizações na tarefa de desempenhar os diversos papéis de gestão delas esperados. O outro lado dessa narrativa está relacionado às pessoas e sua entrega nas relações de trabalho com essas organizações, bem como ao atendimento de suas necessidades, expectativas e reconhecimento de seus esforços, gerando o fortalecimento das relações entre pessoas e empresas. Assim, desafios estão lançados para ambos os lados. Se ampliarmos o olhar, a nossa volta no ambiente em que vivemos, seja dentro ou fora do trabalho, a percepção será de que as dimensões de tempo, capacidades, distâncias e possibilidades se tornam cada vez mais relativas. As tecnologias à nossa disposição modificam relações entre pessoas, formas de trabalho, dinâmicas organizacionais, mercado de negócios, políticas empresariais, relações econômica e sociais. Esses são os efeitos da globalização, em que se estreitam distâncias e se derrubam fronteiras, gerando novas realidades virtuais e reais para empresas e pessoas, porém com tudo isso vem também o inesperado e o inusitado. Nas organizações, novas demandas, novas formas de administrar e de gerenciar negócios e pessoas, bem como suas expectativas com relação ao que querem e ao que esperam delas nas empresas. Nesta aula, vamos falar desses alinhamentos que vêm surgindo no trabalho, no modo como as organizações vêm se adaptando para atender ao mercado e a seus públicos internos e externos. Também discutiremos o que vem sendo estudado a respeito para auxiliar essas organizações e pessoas a encontrar novos caminhos para o equilíbrio e a satisfação de todos. Veremos, então, o novo contexto organizacional multifuncional e sua complexidade ambiental, a gestão de pessoas, competências e habilidades num ambiente multifuncional e o desafio de atribuir recompensas em ambientes cada vez mais flexíveis e complexos. Entenderemos como criar percepção e valorização entre organizações e pessoas e, por fim, a proposta de uma reflexão quanto às relações e formas de reconhecimento que atendam às composições organizacionais futuras. 03 CONTEXTUALIZANDO Estamos assistindo ao nascimento da era da reciclagem. Bem, neste momento, você deve estar associando essa palavra ao processo físico em si da reciclagem, aquele em que os objetos são reaproveitados. Sim, esse também é um processo em andamento, mas aqui não me refiro a esse método, estou falando do momento de reciclarmos a maneira de viver, de utilizar o nosso tempo, da forma de trabalhar, de buscar lazer, de buscar equilíbrio, de descansar, de buscar realização. Época de rever padrões, da reutilização, do compartilhamento, da redução, do menos é mais, era da conscientização. Uma verdadeira metamorfose comportamental em pleno andamento, concorda? Pergunto: você imaginava que, em alguns anos, teríamos carros elétricos andando pelas ruas, e que alguns países da Europa, como a França, já têm data marcada para acabar com o uso de veículos que usam combustíveis a base de petróleo? Certo, você deve estar se perguntando o que isso tem a ver com esta aula. Vamos pensar... qual a motivação do surgimento dos carros elétricos? Podemos ter várias respostas para essa mesma pergunta, quer ver? Vamos para a vertente da inovação, afinal, essa é uma grande novidade tecnológica, produzida a partir da ideia de alguns pesquisadores. Vamos um pouco além: trata-se de uma inovação promovida a partir de pressões organizacionais para novos modelos que não poluam o meio ambiente, certo? Mas de onde vêm essas pressões? São uma cobrança das autoridades ambientais e da própria sociedade, que já percebeu que algumas coisas não vão se sustentar mais no mundo, se permanecerem como estão. Há ainda outros motivos, mas num único exemplo e suas várias e complexas respostas voltamos a um fator em comum, as mudanças do comportamento humano. Quer ver outro exemplo que mostra como estamos repensando a maneira de viver (esse talvez menos conhecido)? Em alguns países da Europa, você tem a opção de não comprar mais tapetes, você compra o direito de uso destes. Sabe como? Você adquire o uso do bem e, quando for descartar ou trocar o seu tapete, o fabricante irá recolher o objeto usado e você não irá gerar descarte, pois quem produziu o tapete irá reaproveitar todo o seu material na fabricação de novos tapetes ou outros produtos, ou seja, lixo zero. Aí pergunto: esse é ou não um novo jeito de fazer as coisas? 04 Se o jeito de fazer as coisas está mudando a maneira de vermos o mundo, também está mudando as nossas vidas. A tecnologia facilita muita coisa, mas também nos sobrecarrega, uma vez que estamos cada vez mais atarefados, a medida de tempo mudou, a quantidade de informações que recebemos e processamos diariamente é muito maior hoje do que há dez anos, da mesma maneira que fazemos muito mais coisas de forma mais rápida, apoiados nas tecnologias que temos à disposição, as quais não existiam há dez anos. Isso nos leva a uma mudança compulsória de comportamento, ou seja, você assume muito mais compromissos e trabalha muito mais, apesar das facilidades tecnológicas que aparentemente facilitam nossas vidas, certo? Mais uma vez estamos falando de mudança comportamental, seja ela voluntária ou não, e pessoas e organizações precisam se reinventar para esses novos tempos. Na verdade, como falamos no começo deste texto, esse processo já está em andamento, e vamos falar dos desafios destes novos tempos nesta parte final da disciplina. Saiba mais Sobre o nosso papel no mundo, indico o vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=3c88_Z0FF4k&feature=youtu.be> para reflexão. TEMA 1 – O NOVO CONTEXTO ORGANIZACIONAL MULTIFUNCIONAL E SUA COMPLEXIDADE AMBIENTAL Em contextos organizacionais que se reinventam para se adequar a um novo mundo de economia globalizada, na Era da Informação ou, como alguns autores chamam, na Infoera, os modelos tradicionais e hierarquizados não conseguem sobreviver por muito mais tempo. A necessidade de verticalização de comando, da valorização e da especialização em diversas áreas e níveis, da quebra da funcionalidade específica dos cargos para a entrada da multifuncionalidade dos colaboradores, do aprendizado continuado em todos os níveis, do trabalho cooperativo, de resultados atingidos a partir da coletividade e, principalmente, do respeito ao ser humano é imperativa dos novos tempos, não tem mais volta. As organizações que ainda não entenderam essa nova realidade e não iniciaram seu processo de transição sentirão as dificuldades de enfrentar a 05 maleabilidade à sua volta, percebendo suas próprias arestas a aparar e, assim, poder ter mais fluidez e agilidade para se enquadrar nesse novo cenário corporativo e social. A questão é que mais uma vez, ou melhor, mais do que antes, não existirão modelos prontos, pois cada organização, independentemente de seu porte ou área de atuação, terá que encontrar o seu molde, mas alguns aspectos norteadores são comuns às empresas que estão achando o caminho das pedras, e o principal deles é o bem-estar das pessoas. Chiavenato e Matos (2009, p. 124) comentam que, para que as empresas consigam se adaptar às novas contingências ambientais tão complexas, devem se voltar ao bem-estar das pessoas, e ao que vem sendo chamado de Empresa Feliz: É difícil pensar em felicidade em termos individuais, cada homem tem exigências próprias. É totalmente possível e desejável, todavia, que se crie um meio estimulador que induza a comportamentosfelizes, ao estar bem na atividade produtiva. É fundamental que as organizações sejam felizes, isto é, que possuam cultura é clima, motivadores e favoráveis à felicidade. É fundamental para as empresas, nessa nova fase tão turbulenta, que criem ambientes corporativos que promovam o bem-estar, que criem estratégias organizacionais integradoras entre sociedade e empresa e que promovam ações contínuas de mudança cultural, favorecendo a felicidade das pessoas. A lógica é que pessoas felizes trabalham melhor, são mais produtivas, participativas e enfrentam melhor os desafios do cotidiano. Os autores comentam ainda que o novo contexto organizacional precisa estar apoiado na renovação do papel das pessoas e na renovação contínua da própria organização. Para esse processo de tornar ambientes organizacionais espaços de promoção de bem-estar, realização e felicidade, Chiavenato e Matos (2009, p. 122) colocam grandes colunas como as redescobertas que precisam ser aplicadas ao contexto organizacional: Redescoberta do homem – a releitura das pessoas na organização como detentoras de conhecimento faz com que elas se tornem mais livres e com maior poder de influência. Aqueles que se encontram em papéis de liderança têm nas mãos a missão de formar equipes integradas de aprendizagem e precisam exercer papel de gestores educadores. Deve haver, por parte das pessoas e da organização, a busca por equilíbrio e plenitude tanto no trabalho como em qualquer outra área da vida, o que 06 se caracteriza pela harmonização representada pelas condições psicoemocionais e físicas de bem-estar no trabalho que se refletem em produtividade. Redescoberta da organização flexível – a releitura da empresa como facilitadora e promotora de participação e criatividade. Os modelos rígidos de gestão que ainda são característicos de muitas empresas são os próprios causadores de muitos problemas e perdas para as organizações, e ainda vão na contramão das propostas de parceria, descentralização, integração e renovação. A flexibilidade das novas organizações vem dos alinhamentos de discurso com atitudes, da delegação de poder aos colaboradores para que se afirmem dentro do processo de pertencimento e de construção de significação e realização pessoal, ou seja, as pessoas realizam o trabalho e ao mesmo tempo se realizam por meio dele. Redescoberta do cliente – mais exigente, com muitas opções, mais informado, mais educado. Esse novo perfil de mercado não deixa dúvidas de que há uma necessidade emergencial de mudança conceitual nas organizações quanto ao modo de atender aos seus clientes. Essa é uma responsabilidade de todos, e o entendimento desse novo conceito passa pela maturidade das pessoas e do grau de engajamento com a empresa. Mais uma vez estamos tratando de uma mudança comportamental que, apesar de precisar ser internalizada pelas pessoas e pela cultura empresarial, irá refletir externamente no modo como o cliente e o mercado veem a organização. Para complementar a leitura desses novos conceitos, temos também a contribuição de Zuffo (2003), que fala das novas tendências na era da Infoeconomia, termo usado pelo autor para traduzir a Era da Informação no ambiente econômico de alta turbulência e volatilidade em que as empresas estão inseridas e que exige delas rápida adaptabilidade. De acordo com o autor: Nota-se agora as mesmas tendências com as organizações humanas, as quais devem adquirir o máximo de flexibilidade e adaptabilidade para sobreviver no turbulento ambiente da infoeconomia. Desse modo, as organizações hierárquicas do tipo topo para baixo (top-down), que hoje constituem a maioria das instituições em operação, terão de reestruturar-se, se quiserem sobreviver. No dia a dia, os funcionários na linha de frente mercadológica tomarão decisões no atendimento aos clientes, alavancando desta forma a operação de toda a empresa ou organização. Na retaguarda, como linha de apoio, funcionários muitas vezes em estado de espera ou mobilizáveis fornecem conhecimentos ou dados especializados sobre produtos ou serviços. A organização e a velocidade de atendimento dos clientes serão fundamentais para o 07 sucesso. Desse modo, é preciso que se eliminem todos os entraves burocráticos que possam interferir entre a linha de frente e a retaguarda. As necessidades dos clientes devem ser atendidas rápida e criativamente dentro de uma estrutura multidimensional e não linear (Zuffo, 2003, p. 116). Para o autor, os pontos focais das novas configurações organizacionais são o conhecimento e a informação como commodities e o investimento em infraestruturas de comunicação altamente eficientes, que envolvem estruturas tecnológicas e de pessoas preparadas para desempenhar diferentes papéis e trabalhos quando necessário. Ou seja, a multifuncionalidade das pessoas será uma das características marcantes nos ambientes das empresas. Já vemos isso acontecer em algumas delas que adotam a alocação de seus colaboradores por projetos. Essa já e uma realidade em andamento que deve se expandir cada vez mais, e vem aí também o desafio de remunerar e reconhecer o desempenho das pessoas nessas novas configurações de trabalho, bem como entender as novas necessidades que surgem a partir de mudanças tão contundentes tanto ambientais como comportamentais. TEMA 2 – A GESTÃO DE PESSOAS, COMPETÊNCIAS E HABILIDADES NUM AMBIENTE MULTIFUNCIONAL A partir da emergente necessidade de modificações nas configurações organizacionais e nas relações com colaboradores, clientes, fornecedores, parceiros e mercado, surge o desafio de repensar a gestão de pessoas e talentos, desenvolver e criar estímulos. Talvez o maior dos desafios seja fazer a transição de fato entre ambientes corporativos apenas voltados aos resultados, que ainda veem as pessoas como mero instrumental parte do processo produtivo, para os novos modelos de gestão que de fato integram as pessoas ao contexto organizacional de forma apropriada e respeitosa, e não apenas no discurso. Assim, a gestão de pessoas está envolvida em todos os processos da organização e atuando em diferentes frentes, conforme demonstram Chiavenato e Matos (2009) quando tratam das novas competências que envolvem a área. Vejamos o Quadro 1: 08 Quadro 1 – Novo modelo de competências de gestão de pessoas Fonte: Chiavenato; Matos, 2009, p. 477. Temos, então, as seguintes definições para cada uma das novas competências da gestão de pessoas: Competência em capital humano – centrada em apoiar áreas e gestores nas tarefas de agregar, manter, recompensar e desenvolver talentos e capital humano. Credibilidade – propõe gerar credibilidade junto aos seus clientes internos e externos, independentemente de cargos e hierarquias, bem como criar relações harmoniosas e de confiança com todo o staff. Competência em mudanças – deve promover e apoiar mudanças e inovações, desenvolvendo competências necessárias às pessoas, às equipes e aos gestores, para que objetivos sejam atingidos e o ambiente organizacional seja saudável. Competência nos negócios – deve buscar o alinhamento contínuo das suas atividades com os objetivos estratégicos da empresa e promover ajustes, ainda que estes sejam junto ao planejamento quando houver percepção de que ele pode ser prejudicial para a organização e seus colaboradores como um todo. 09 Esse caminho impõe uma série de quebras de paradigmas e barreiras, envolve a derrubada dos velhos modelos de gestão e centralização de poder, sendo preciso promover a mudança cultural em todos os níveis da empresa e, inclusive, um redesenho dos processos de remuneração e recompensa que atenda a conjunturas mais dinâmicas e flexíveis de trabalho. Um dos modelos mais usados pelas organizações para substituir a velha departamentalização funcional são as equipes multifuncionais. Apesarde algumas empresas ainda manterem seus formatos departamentalizados, não perdendo totalmente o formato atual, já promovem movimentos de verticalização em que as pessoas são alocadas por projetos, conforme as demandas vão surgindo. Esse tem sido um processo de transição que tem funcionado, pois, por um lado, as pessoas se sentem motivadas por se envolverem em novos desafios e, com isso, também vão em busca de novos conhecimentos. Nesse sentido, outro fator importante são as novas possibilidades que se abrem dentro da própria empresa, especialmente quanto à visibilidade profissional. Por outro lado, a organização passa a alocar melhor as pessoas e suas capacidades, descobrindo novos talentos a serem administrados e desenvolvidos. Para Chiavenato e Matos (2009, p. 154), “muitas organizações estão migrando da velha departamentalização para estruturas em equipes”. Os autores comentam que a estrutura de equipes representa uma migração dos sistemas mecanísticos fechados para sistemas orgânicos e abertos, com características divergentes, conforme ilustrado no Quadro 2: Quadro 2 – As diferenças entre sistemas mecanísticos e orgânicos Fonte: Chiavenato; Matos, 2009, p. 157. 010 Os autores complementam o entendimento do processo de verticalização esclarecendo que, como comentado anteriormente, na maioria das vezes as unidades de trabalho funcionam horizontalmente ao longo das tradicionais formações hierarquizadas, porém formadas em equipes autônomas que não obedecem necessariamente às hierarquias, o que além de autonomia, também atribui a elas agilidade e eliminação de barreiras burocráticas. Vale ressaltar também que nesses novos formatos orgânicos muitas vezes os próprios colaboradores descobrem novas competências e habilidades, a partir das necessidades que surgem das vindas de novos projetos, o que é um ganho para todos, inclusive para a organização, com o desenvolvimento de novas competências e inteligência organizacional. Para a organização, o maior desafio talvez seja essa nova maneira de administração, tanto dos seus negócios como das pessoas, por isso é preciso ampliar a visão e olhar além do que se vê. Desenvolver novas formas de gestão faz parte desse processo, tentar e experimentar também, até encontrar um jeito próprio de equilibrar negócios e administração de pessoas. É preciso, entretanto, “sair do quadrado”: as novas formas de gestão são desafiadoras, pois não serão mais tão previsíveis e de longa duração, e, ao contrário, precisão de revisões periódicas e ajustes frequentes, ou seja, há muito trabalho pela frente. TEMA 3 – DESAFIO DE ATRIBUIR RECOMPENSAS EM AMBIENTES ORGANIZACIONAIS CADA VEZ MAIS FLEXÍVEIS E COMPLEXOS As novas configurações e formas de trabalho já exigem uma gestão de pessoas com um olhar mais amplo e horizontalizado para os vários componentes que passam a integrar a dinâmica empresarial e que vão demandar da área novas competências e desdobramentos. Não há como passar por esse processo sem redesenhar as maneiras de reconhecer, remunerar e recompensar as competências e habilidades de colaboradores nas empresas. Nesta disciplina, já tratamos de alguns modelos que são aplicados por algumas organizações para recompensar os esforços de colaboradores, como, por exemplo, as recompensas ou o aumento de remuneração aplicado a novas competências ou habilidades técnicas específicas que promovam a melhor execução do trabalho do colaborador. Outro modelo é o reconhecimento aplicado à melhoria de desempenho e ainda a recompensa proposta a 011 colaboradores que promovem inovações e melhorias que comprovadamente se refletem em produtividade, seja em processos ou resultados. Porém, uma grande parcela das empresas brasileiras não tem ainda o hábito de trabalhar com esses processos de meritocracia e diferenciação, pois são trabalhosos, exigem uma gestão preparada e, como já comentamos, uma mudança cultural em todos os níveis da empresa. A questão é que, com os pontos colocados até agora, caminhamos para vários gargalos nas políticas de remuneração e reconhecimento que não acompanham os desafios enfrentados pelas empresas, tanto em relação ao mercado como em relação à manutenção de bons profissionais, base fundamental de sua sustentação. Alguns estudos têm demonstrado, inclusive, que apenas reconhecimentos financeiros, à medida que são ampliados, não aumentam os resultados, pois não garantem às pessoas o atendimento de outros aspectos relevantes. Vejamos, então, alguns desses aspectos relevantes que, segundo Gramigna (2002), têm sido levados em consideração no enfrentamento dos novos tempos pelas organizações na atribuição de remuneração e recompensas. A autora relaciona algumas tendências que são percebidas nas organizações: Possibilidades de carreiras laterais, por meio de aumento das capacidades e competências, ou seja, você não transforma um bom engenheiro em um diretor, você o mantém engenheiro, mas dá a ele condições de se qualificar e melhorar na sua própria área profissional, pois nem todos têm ambição de cargos de comando, mas ainda assim querem crescer profissionalmente. Remunerações e recompensas atreladas ao desempenho de equipes, de unidades e da organização, reconhecendo os diferentes níveis de esforço. Redução da importância e do número de títulos, já que o foco não está mais nos cargos ocupados e, sim, no trabalho desenvolvido em equipes e nas habilidades e competências entregues de cada indivíduo. Foco para remuneração também nas habilidades e competências individuais e nas entregas em grupos ou em projetos. Definição da atividade de remuneração como ferramenta estratégica, em conjunto com outros fatores que agreguem valor e tornem o trabalho significativo para as pessoas. 012 Uso da remuneração e da recompensa como estratégias de comunicação e mudança de comportamento. Esses são alguns exemplos norteadores que podem dar uma nova cara às relações entre empresas e pessoas nos próximos anos. Assim como assistimos a muitas profissões novas surgirem nos últimos tempos, e com certeza muitas outras irão surgir de demandas futuras nos anos que virão, também assistiremos ao surgimento das novas estruturas organizacionais, que já estão acontecendo e são uma realidade. Com a velocidade em que as mudanças ocorrem pressionadas pela dinâmica do nosso mundo moderno, devem se instalar mais rápido do que imaginamos. TEMA 4 – CRIANDO PERCEPÇÃO E VALORIZAÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÕES E PESSOAS A área de gestão de pessoas vem sendo desafiada a criar diretrizes e estratégias que promovam modelos que valorizem e satisfaçam organização e colaboradores de forma clara e coerente, e ainda que se encontrem alinhadas com as condições organizacionais de sustentação, para que apresentem consistência e percepção de valor ao longo do tempo. Nesse sentido, Standler e Pampolini (2014 citados por Dutra, 2004, p. 140) ressaltam que “Dutra defende a proposta ideias-forças para um modelo de gestão de pessoas que é fundamental para a obtenção de resultados que favoreçam todos os atores envolvidos”. Vejamos a proposta de Dutra no Quadro 3: Quadro 3 – Ideias-força para um modelo de gestão de pessoas Fonte: Standler; Pampolini, 2014, p. 140 citados por Dutra, 2004. 013 Esse processo nem sempre é simples, porque envolve expectativas e variáveis de ambos os lados, colaboradores e organização. Se algo sair errado, pode gerar desdobramentos desastrosos para a empresa, como perda de credibilidade junto às pessoas e ao mercado. Porém, se a construção dessa ponte entre interesses organizacionais e obtenção de resultados e harmonização com as pessoas e suas expectativas – em relação ao atendimento desde suas necessidades à obtenção de reconhecimento e possibilidade de desenvolvimento e crescimento – for sólida, transparente epromover confiança, irá gerar bons frutos para todos os interessados. Gramigna (2007, p. 14) comenta que: vivemos um momento inusitado em nossa história, organizações que se comportavam como se tivessem talentos de sobra veem-se diante de um cenário novo: apresentam dificuldades para identificar em seus próprios quadros profissionais que atendam a demanda de competências exigidas pelo mundo globalizado. A autora complementa que as organizações se obrigam a duas atitudes: garimpar profissionais que atendam às qualificações necessárias e entender que as condições de trabalho sejam reconhecidamente atrativas. Assim, é notória a percepção de valor relacionado às competências individuais que interessam às empresas, e, a partir destas, passam a gerar competência e inteligência organizacional, portanto se refletem em reconhecimento “do quanto valem” para ambos os lados. Já existem estudos que comprovam o quanto cada tipo de habilidade ou competência adicional gera de valor agregado a um profissional e o quanto isso pesa para a empresa, dependendo da necessidade e do momento. Além da busca pelos melhores profissionais, as organizações também devem promover o reconhecimento dos seus próprios talentos, e ainda buscar o desenvolvimento destes para que evoluam, pois essa também é uma forma percebida de recompensa – a possibilidade de aprendizado e acúmulo de novas habilidades e competências, crescimento pessoal e profissional. Assim, Chiavenato (2014, p. 461) complementa que entre as novas atribuições da gestão de pessoas está a “análise sistemática de políticas e práticas de pessoal e avaliação do funcionamento, tanto para a correção de desvios quanto para a melhoria contínua”. Vejamos as novas atribuições relacionas pelo autor no Quadro 4: 014 Quadro 4 – Algumas atribuições fundamentais da nova agenda da gestão de pessoas Fonte: Chiavenato, 2014, p. 461. Se, por um lado, as organizações precisam valorizar o capital humano, por outro as pessoas devem fazer a sua parte e buscar o seu próprio desenvolvimento profissional, ou o autodesenvolvimento. Gramigna (2007, p. 50) pontua sobre a responsabilidade de cada indivíduo em seu desenvolvimento cognitivo que “o autoconhecimento é a capacidade de aceitar as próprias necessidades de desenvolvimento e de investir tempo e energia no aprendizado contínuo”. A autora trata de algumas características relacionadas a autodesenvolvimento e gestão do conhecimento, as quais contemplam habilidades, conhecimentos e atitudes que dependem do indivíduo e que são observadas pelas organizações. Habilidades: Saber identificar habilidades e necessidades próprias de desenvolvimento. Buscar aprender coisas novas. Procurar sempre manter-se atualizado. Identificar possibilidades de desenvolvimento de novas habilidades. Buscar conhecer seus pontos fortes e fracos. Conhecimentos: Desenvolvimentos acerca de exigências e competências para o cargo atual ou cargos futuros almejados. 015 Conhecimentos sobre os cursos de aperfeiçoamento de sua área oferecidos pela empresa ou pelo mercado. Atitudes: Tomadas de iniciativas. Interesse em participar de treinamentos e desenvolvimentos. Tendência ao autodidatismo e busca pelo conhecimento. Humildade para reconhecer os pontos que precisam ser desenvolvidos. Busca por qualidade de vida e engajamento em atividades sociais. Tomadas de atitude também têm sido um ponto de observação das empresas. As pessoas que buscam o autodesenvolvimento, seja por motivos profissionais ou na direção de uma melhor qualidade de vida dentro ou fora das organizações, chamam a atenção e os olhares dos recrutadores e das empresas. Isso porque têm o perfil que tem sido procurado e agregam habilidades e atitudes desejáveis que se alinham com os valores organizacionais, o que tem sido percebido como elemento-chave para que os profissionais invistam e permaneçam nas empresas e estas invistam em políticas atrativas e incentivadoras que promovam uma relação duradoura de respeito e desenvolvimento com seus colaboradores. TEMA 5 – UMA REFLEXÃO QUANTO ÀS FORMAS DE RECONHECIMENTO E RECOMPENSAS QUE ATENDAM ÀS DEMANDAS DAS COMPOSIÇÕES ORGANIZACIONAIS FUTURAS Não há como negar que na Era da Informação as organizações deverão permanecer em busca de adaptabilidade em cenários de alta volatilidade resultantes de um processo de integração mercadológico nunca visto, que tem como desdobramentos o acesso remoto facilitado a uma infinidade de recursos tecnológicos e competências humanas que colocaram as empresas em condições de produção também jamais vistas, gerando capacidades de adaptação e inovação fluídas e ágeis. Segundo Zuffo (2003, p. 115), o futuro das empresas contempla: A estruturação das empresas e organizações em redes cooperativas e ambientes culturais tecnológicos propícios, envolvendo desde fornecedores, parceiros tecnológicos, profissionais e trabalhadores, estrutura industrial e comercial, parceiros comerciais, até competidores 016 clientes e consumidores, [que] será outro ponto decisivo para a sobrevivência pelo menos em curto prazo no ambiente. A reestruturação interna das empresas e organizações também deverá ser drástica, acompanhando de certo modo a gigantesca reestruturação de todo o seu relacionamento externo. O autor fala sobre a rapidez com que as coisas devem continuar a se modificar, e também que as facilidades tecnológicas devem acelerar ainda mais esses processos. Por outro lado, assistiremos à valorização das habilidades humanas desenvolvidas, pois é o homem a causa e o fim do desenvolvimento de todo esse processo, ou seja, quem desenvolve tais tecnologias e as utilizará. A inteligência por trás das inovações vem das capacidades e competências desenvolvidas a partir do conhecimento acumulado pelas pessoas e tais inovações atenderão às necessidades de evolução dessas pessoas, seja em ambientes corporativos ou sociais. Apesar de todo o desenvolvimento tecnológico, o que assistimos nos novos tempos é uma grande reviravolta e valoração do humano. As organizações percebem que não há tecnologia que substitua o homem e que este é o seu maior patrimônio e precisa ser bem cuidado, cultivado e reconhecido. As organizações que olham para o futuro olham para os seus colaboradores. As que tiverem o olhar ainda mais atento já têm, por meio de pesquisas, a resposta de que os valores são maiores do que as cifras, além de entenderem que estas últimas motivam pessoas até determinado ponto, e depois o que as faz ir além está relacionado a fatores intrínsecos, ou seja, fatores que precisam gerar significado ou nada feito. Gerar significado tem relação com a identificação entre os seus valores e os valores da organização. Outro fator importante é o sentimento de pertencimento ao contexto e engajamento com os propósitos da empresa, os quais precisam estar alinhados com as próprias expectativas para que façam sentido. As pessoas estão deixando empresas ou ainda gestões que não atendam às suas expectativas, ainda que muitas vezes a remuneração e as recompensas sejam boas. Essa relação pode até perdurar algum tempo, mas o desgaste acaba corroendo a relação colaborador-organização e as diferenças falam mais alto. Pode até ser que pessoas permaneçam nas empresas por necessidades financeiras, e esse de fato é um contexto comum, mas a que preço para ambos os lados? 017 Robbins (2009, p. 82) complementa tal leitura quando fala da motivação da força de trabalho diversificada: Se você pretende maximizar a motivação de seus funcionários, precisa compreender e responder a essa diversidade. Como? A palavra-chave é flexibilidade. Esteja preparado para projetar horários, planos de remuneração, benefícios, condições físicas de trabalho e outros aspectos, a fim de atender a variadas necessidadesde seus funcionários. Isso pode incluir a oferta de atendimento de crianças e idosos, horários flexíveis, telecomutação e tarefas compartilhadas para aqueles com responsabilidades familiares. Também pode incluir políticas de licenças que permitam aos trabalhadores imigrantes viagens a sua terra natal, a criação de equipes de trabalho para os oriundos países com forte cultura coletivista ou a permissão para que os funcionários ajustem seus horários a cada novo semestre letivo. Os fatores comentados pelo autor são apenas alguns dos que começamos a ver se modificar dentro das organizações. A percepção de que existem coisas muito caras aos colaboradores que precisam ser consideradas, como bem-estar dos seus familiares e preservação e respeito de seus costumes, ou ainda o direito a seu bem-estar e integridade física, ao descanso e repouso em caso de necessidade, hoje em dia tão questionados pelas empresas. Há uma tendência de as relações serem mais humanizadas e transparentes entre empresas e pessoas. Talvez esse caminho ainda seja longo, mas, com tantas mudanças acontecendo, os modelos atuais de relação não se sustentam por muito mais tempo. Outro aspecto relevante é que a relação das pessoas com o trabalho está se modificando, e a importância dada ao encaixe do trabalho aos seus interesses pessoais tem sido uma realidade. Um exemplo: nem todos desejam um trabalho com alto salário e desafiador, muitas vezes as pessoas almejam um trabalho que atenda às suas expectativas de realização pessoal, ainda que este não represente a melhor remuneração. Os pesos se modificam e os seus próprios valores e estilo de vida são mais importantes que o dinheiro ou uma carreira. Já existe um movimento de pessoas que desvinculam a realização pessoal de suas carreiras profissionais, sendo o trabalho apenas um meio de sobrevivência, e a realização pessoal, então, passa a estar atrelada a outras atividades que não estão necessariamente ligadas a atividades remuneradas ou à principal atividade remuneradora. Interessante, não é mesmo? Trata-se de outra visão de vida, talvez mais feliz e mais plena. 018 FINALIZANDO Chegamos ao fim de mais uma disciplina, com um tema denso e bastante atual, porém que precisa ser debatido e tratado com muita transparência e cuidado, pois envolve pessoas, suas expectativas e o futuro da gestão de pessoas nas organizações como parte estratégica e fundamental para a sobrevivência destas num ambiente que vem se mostrando cada vez mais dinâmico, complexo e com tendência a se tornar ainda mais volátil com o passar dos anos. Assim, a permanência das organizações no mercado exigirá preparo e muita experimentação na busca por novos modelos de gestão. Vale lembrar que, nesta aula, finalizamos a disciplina de Gestão da Recompensa no Contexto Global falando de alguns temas mais amplos, como os novos desafios na gestão pessoas em gerar reconhecimento em contextos organizacionais multifuncionais, levando em consideração a complexidade ambiental em que as empresas estão inseridas. Falamos também da gestão de pessoas, competências e habilidades em ambientes multifuncionais e o desafio de atribuir recompensas em ambientes complexos. Em seguida, abordamos a criação de percepção e valorização entre organizações e pessoas, e, para finalizar, passamos para uma reflexão final quanto às relações e formas de reconhecimento que atendam às composições organizacionais futuras. Nesse sentido, além das mudanças organizacionais, é fundamental que tenhamos em mente que estamos vivenciando um grande momento de transformação comportamental, como comentamos no início desta aula, e que, independentemente das motivações, o processo de rever conceitos e nossas relações com o trabalho, com a sociedade e com as organizações é parte desse contexto. Agradeço a você pela companhia nessa jornada de estudo e espero que possamos estar novamente juntos numa próxima oportunidade! 019 REFERÊNCIAS CHIAVENATO, I. Gestão de pessoas: o novo papel dos recursos humanos nas organizações. 4. ed. Barueri: Manole, 2014. CHIAVENATO, I.; MATOS, F. G. Visão e ação estratégica: os caminhos da competitividade. 3. ed. Barueri: Manole, 2009. GRAMIGNA, M. R. Modelo de Competências e Gestão de Talentos. São Paulo: Makron Books, 2002. _____. _____. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. ROBBINS, S. P. Fundamentos do Comportamento Organizacional. 8. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009. STADLER, A.; PAMPOLINI, C. P. G. Gestão de Pessoas: ferramentas estratégicas de competitividade. Curitiba: InterSaberes, 2014. ZUFFO, J. A. A Sociedade e a economia no novo milênio: os empregos e as empresas no turbulento alvorecer do século XXI. 3. ed. Barueri: Manole, 2003.
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