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ARQUITETURA E SUSTENTABILIDADE Débora Cavalheiro , 3 1 PROJETO E TEORIA DA ARQUITETURA 1.1 Etapas de um projeto arquitetônico Para realizar um projeto arquitetônico é preciso compreender o contexto de seu empreendimento, sem ignorar aspectos importantes como fatores sociais, econômicos, legislativos etc. Além disso, é necessário ouvir seu cliente e lembrar que ele não tem obrigação de possuir conhecimentos técnicos de engenharia civil e arquitetura e urbanismo. Também é importante informá-lo e justificar algumas possibilidades de caminho para o projeto. Com relação à concepção do empreendimento, o projeto arquitetônico possui algumas etapas. A NBR 64921 - Representação de Projetos de Arquitetura de 1994 coloca como fases de projeto: ● Estudo Preliminar: Estudo da viabilidade de um programa e do partido arquitetônico a ser adotado para sua apreciação e aprovação pelo cliente. Pode servir à consulta prévia para aprovação em órgãos governamentais (ABNT, 1994). De acordo com a norma, seus componentes típicos são: Situação; Plantas, cortes e fachadas; Memorial justificativo. No entanto, esta fase também pode possuir documentos como: 1 No momento da elaboração deste material a norma estava em revisão, portanto procure se manter atualizado sobre posteriores alterações. , 4 Perspectivas; Maquetes (estudos de massa); Desenvolvimentos de detalhes que sejam especiais ao projeto; Análise preliminar de custo. Já a escala deve ser de acordo com o porte do projeto. A norma também alerta sobre o conteúdo dos documentos e nível de detalhamento desta fase: Devem estar representados os elementos construtivos, ainda que de forma esquemática, de modo a permitir a perfeita compreensão do funcionamento do programa e partido adotados, incluindo níveis e medidas principais, áreas, acessos, denominação dos espaços, topografia e orientação (ABNT, 1994). ● Anteprojeto: Definição do partido arquitetônico e dos elementos construtivos, considerando os projetos complementares (estrutura, instalações, etc.). Nesta etapa, o projeto deve receber aprovação final do cliente e dos órgãos oficiais envolvidos e possibilitar a contratação da obra” (ABNT, 1994). De acordo com a norma, seus documentos típicos são: Situação; Plantas, cortes e fachadas; Memorial justificativo (com aspectos construtivos); Discriminação técnica; Documentos para aprovação em órgãos públicos como a prefeitura, por exemplo; Lista preliminar de materiais. , 5 Nesta fase, de acordo com a norma, também podem aparecer: Quadro de acabamento; Maquetes; Estimativa de custo; Desenvolvimento de algum elemento especial ao projeto. A norma também alerta sobre o conteúdo dos documentos e nível de detalhamento desta fase: Devem ser representados: Devem estar bem caracterizados os elementos construtivos, com indicação de medidas, níveis, áreas, denominação de compartimentos, topografia e orientação, eixos e coordenadas. A descrição dos materiais adotados deve atender às necessidades da etapa (ABNT, 1994). ● Projeto executivo: “Apresenta, de forma clara e organizada, todas as informações necessárias à execução da obra e todos os serviços inerentes” (ABNT, 1994). De acordo com a norma, seus componentes típicos são: Locação; Plantas; Cortes; Fachadas; Detalhamentos; Discriminação técnica; Especificações; Lista de materiais. , 6 No entanto, também podem aparecer: Quadro geral de acabamentos; Maquetes detalhada; Orçamento do projeto. Cabe lembrar que, com os avanços tecnológicos dos softwares, as maquetes podem ser eletrônicas. Quanto ao teor das documentações, nesta fase, a norma coloca: “Devem estar corretamente indicados todos os materiais usados e suas quantidades, os detalhes construtivos, além das recomendações necessárias para sua correta execução” (ABNT, 1994). Em algumas situações podem haver outros tipos de projetos como o Projeto Legal, portanto, é relevante verificar os processos de legalização do município em que se está atuando. Na elaboração do projeto é importante também compreender o Partido de Projeto que, para Lemos (2003 apud BISELLI, 2011) é: A mencionada definição é a seguinte: Arquitetura seria, então, toda e qualquer intervenção no meio ambiente criando novos espaços, quase sempre com determinada intenção plástica, para atender a necessidades imediatas ou a expectativas programadas, e caracterizada por aquilo que chamamos de partido. Partido seria uma consequência formal derivada de uma série de condicionantes ou de determinantes; seria o resultado físico da intervenção sugerida. Os principais determinantes, ou condicionadores, do partido seriam: a. A técnica construtiva, segundo os recursos locais, tanto humanos, como materiais, que inclui aquela intenção plástica, às vezes, subordinada aos estilos arquitetônicos; b. O clima; c. As condições físicas e topográficas do sítio onde se intervém; , 7 d. O programa das necessidades, segundo os usos, costumes populares ou conveniências do empreendedor; e. As condições financeiras do empreendedor dentro do quadro econômico da sociedade; f. A legislação regulamentadora e/ou as normas sociais e/ou as regras da funcionalidade (LEMOS, 2003 apud BISELLI, 2011). Para contribuir na elaboração e compreensão do projeto arquitetônico, temos o Programa de Necessidades que levanta os desejos e necessidades do cliente, além de condicionantes do empreendimento. Estudos de fluxos e de setorização também serão grandes ferramentas nesse processo. Como no exemplo da análise de setorização, observe a pesquisa elaborada pela professora MSc Débora Cavalheiro para a casa de Vilanova Artigas com base nas pesquisas de Pereira e Fujioka (2015) e em visita de campo: A casa possui setores de atividades que transitam entre atividades de trabalho (ocre) e de relaxamento/social (azul), já que próximo dos dormitórios há uma área de serviço, cozinha e sanitários e posteriormente a sala de estar seguida do escritório. No entanto, a área privada (dormitórios) é isolada pela área social por meio do bloco de serviços, sendo um dos acessos dá diretamente a área social e escritório, evitando assim o contato obrigatório com a região íntima da casa. A circulação se dá nas laterais da edificação (verde) (CAVALHEIRO, 2019). Com o uso de setorização você pode criar em seu projeto áreas mais privativas e outras mais coletivas e de trabalho ou, se esta for sua intenção, criar espaços mais conectados etc. Pode-se usar como ferramenta de complementação o estudo de fluxos, pois, para estipular setorizações via desenho arquitetônico, é importante compreender as movimentações de usuários, resíduos, insumos etc. Quanto aos fluxos, movimentações e relações entre espaços, podem ser utilizados diagramas para auxiliar o processo projetual. , 8 1.2 Teoria e História da Arquitetura Para criar o projeto, o arquiteto pode buscar referências em projetos que já teve contato, aproveitando soluções tanto técnicas quanto estéticas. Assim, se faz necessário estudar o trajeto da história da arquitetura, compreendendo o debate feito na história e aprendendo com ele. STRICKLAND (2003) menciona aspectos que devem ser observados no estudo da história da arquitetura: ● Tecno-arquitetura: os avanços de engenharia que viabilizaram novas técnicas e processos de construção. ● Autobiografia da humanidade: a arquitetura como a história da arte é uma ferramenta importante para analisar a história da humanidade. Além disso, a autora coloca pontos importantes de observação específicos do produto arquitetônico: ● Ritmo: observe “um padrão de repetição rítmica de elementos,como cheios e vazios, paredes e janelas, elementos projetados ou recuados” (STRICKLAND, 2003, p. XI) ● Linha; ● Escala; ● Luz; ● Textura; ● Cor; ● Ornamento; ● Acústica; ● Local; ● Espaço; ● Peso; ● Massa. , 9 Você pode notar que os ciclos na arte geralmente trazem determinadas características e valores que vão se alternando. Por exemplo, vemos isso nas diferenças entre Barroco e Renascimento, em que o primeiro traz pinturas mais dramáticas e misteriosas e no outro a razão e o conhecimento são valorizados, assim suas pinturas são mais iluminadas, sem espaços obscuros como a escola anterior, desenvolvem a perspectiva etc. Na arquitetura isso não será diferente. Há muitas divisões na história da arquitetura e cada autor irá aferir datas específicas e marcadores, havendo uma ligeira variação entre bibliografias. No entanto, é importante saber diferenciar as principais características de cada momento, em termos da história mundial e das características estéticas. Afinal, a arquitetura será um reflexo da sociedade daquela época. A seguir você encontra os principais estilos e momentos da arquitetura mundial: Arquitetura pré-histórica; Mesopotâmica; Egípcia; Grega; Romana; ● Idade Média Bizantina; Românico; Gótico; ● Renascimento ● Barroco ● Séculos XVIII e XIX Ecletismo; Arquitetura colonial; , 10 ● Século XX Modernismo; Pós-modernismo; Contemporânea. 1.3 Acessibilidade A norma brasileira que irá versar sobre este tema é a ABNT NBR 9050 - Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Tal norma define acessibilidade como: Possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privado de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida (ABNT, 2015, p 2). Desse modo, temos nesta norma orientações sobre diversos aspectos para elaborarmos projetos que possibilitem a acessibilidade da edificação por todos. Mais detalhes podem surgir, por exemplo, no código de obras de seu município ou do município que esteja elaborando um projeto. Muitas vezes quando falamos de acessibilidade pensamos na viabilidade de deslocamento em um edifício por um cadeirante, no entanto, existem diversas outras necessidades que devemos atender em um projeto como, por exemplo, o acesso de uma pessoa idosa, uma pessoa que esteja com problemas de locomoção temporariamente (uma pessoa machucada que esteja utilizando muletas), pessoas com baixa visão, pessoas com nanismo etc. Dessa maneira, é importante conhecer as condições necessárias para que todas as pessoas possam utilizar um espaço construído. Conhecer as diversas necessidades e condições do ser humano é muito importante para o projetista. Uma ferramenta que pode ajudar a compreender e a elaborar melhores projetos é a Avaliação Pós- Ocupação (APO). , 11 A APO é uma ferramenta que avalia as edificações após sua ocupação e cruza instrumentos de avaliação e diagnóstico tanto de especialistas (medições, testes, ensaios etc.) quanto do ponto de vista do usuário (entrevistas, observações e questionários etc.). Essa ferramenta pode nos ajudar e muito na avaliação e atualização das normas de acessibilidade, já que compõe em sua avaliação o público que utiliza os projetos. Assim, a APO contribui para retroalimentar o processo de projeto. De acordo com a norma ABNT NBR 9050, o conceito de Desenho Universal tem como base uma arquitetura e design voltados ao ser humano em toda sua diversidade. Desse modo, o design deve ser pensado para proporcionar o uso por todos, seja um edifício ou um mobiliário, por exemplo, independente de aspectos como faixa etária, características físicas ou habilidades etc. A norma define Desenho Universal como “concepção de produtos, ambientes, programas e serviços a serem utilizados por todas as pessoas, sem necessidade de adaptação ou projeto específico, incluindo os recursos de tecnologia assistiva” (ABNT, 2015, p 4). A norma apresenta alguns princípios do Desenho Universal que devem nortear os projetos de design e de arquitetura: ● Uso equitativo; ● Uso flexível; ● Uso simples e intuitivo; ● Informação de fácil percepção; ● Tolerância ao erro: É uma característica que possibilita que se minimizem os riscos e consequências adversas de ações acidentais ou não intencionais na utilização do ambiente ou elemento espacial. Para tal, devem-se agrupar os elementos que apresentam risco, isolando-os ou eliminando-os, empregar avisos de risco ou erro, fornecer opções de minimizar as falhas e evitar ações inconscientes em tarefas que requeiram vigilância (ABNT NBR 9050); ● Baixo esforço físico; ● Dimensão e espaço para aproximação e uso. , 12 Com isso, é importante lembrar que um espaço pode ser acessível, mas não ter um Desenho Universal. Por exemplo, se um cadeirante deve se separar de seu grupo, que não precisa da cadeira para se locomover, para acessar um museu, este espaço é acessível nesse aspecto, pois há uma maneira que um cadeirante entre neste espaço. No entanto, ele separa as pessoas e não proporciona um uso da mesma forma, pois o projeto deve “propiciar o mesmo significado de uso para todos; eliminar uma possível segregação e estigmatização” (ABNT NBR 9050). REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6492: Representação de projetos de arquitetura. Rio de Janeiro, 1994. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9050: Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro, 2015. CAVALHEIRO, D. C. Análise da Casa do Bandeirante e da Residência Artigas para a disciplina AHAB5 do IFSP. Curso de Arquitetura e Urbanismo, 2019. BISELLI, M. Teoria e prática do partido arquitetônico. Arquitextos, São Paulo, ano 12, n. 134.00, Vitruvius, jul. 2011. Disponível em: <https://bit.ly/3iqi7Ma>. Acesso em: 2 maio 2020. PEREIRA, A. K. O.; FUJIOKA, P. Y. A residência do arquiteto: uma análise gráfica das casas de Vilanova Artigas. Risco. Revista de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo IAU-USP, v. 21, n. 1, 2015. PORTAL VITRUVIUS. Casa Grelha. No sopé da Serra da Mantiqueira. Projetos, Vitruvius, São Paulo, ano 8, n. 092.01, ago. 2008. Disponível em: <https://bit.ly/3fLtLzp>. Acesso em: 2 maio 2020. STRICKLAND, C. Arquitetura Comentada. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003.