Buscar

MEDIAÇÃO JUDICIAL E PENAL - AULA 9

Prévia do material em texto

Mediação judicial e penal
Aula 09 - Fundamentos da mediação penal
INTRODUÇÃO
Atualmente, o sistema de justiça criminal é um fracasso, e as consequências são particularmente visíveis: o
sentimento de insegurança vem crescendo muito e é potencializado pelas notícias que acompanhamos diariamente na
mídia.
Diante dessa situação, podemos con�gurar dois caminhos alternativos:
Mais do mesmo – quando se aparelha o atual sistema de mais meios humanos e materiais, aumentando o número de
tribunais, magistrados e prisões, e, eventualmente, agravam-se as penas;
Exploração de novas ideias e de novos modelos para além do processo judicial – a �m de lidar com o fenômeno da
criminalidade.
Esta última opção, cujo objetivo é resolver con�itos, não é recente.
A partir da década de 1990, surgiram por toda a Europa projetos-piloto de resolução de con�itos penais, em que vítima
e agressor tentaram alcançar um acordo para a reparação dos danos causados pelo delito por meio do processo
designado por mediação.
Apoiada nessa relação, a ideia era restaurar o equilíbrio perturbado pelo delito e paci�car as situações, bem como fazer
com que o delinquente as reparasse de forma construtiva e de acordo com o interesse da vítima, responsabilizando-o
pelos danos provocados por seu ato.
A mediação surgiu, então, como uma forma de luta contra o inadequado funcionamento do sistema judicial, um tipo de
justiça informal, ou seja, um modo alternativo de resolução de litigiosidade para além da justiça tradicional.
Esse processo traz para o mundo jurídico um olhar voltado para o indivíduo, e sua prática deve contribuir para o Direito
e a Justiça, apontando em direção a um caminho de transformação e renovação. Nesse contexto, o mediador é parte
essencial do processo de humanização, pois promove maior proximidade entre os cidadãos e a Justiça.
Nesta aula, vamos entender melhor como funciona o processo de mediação penal.
OBJETIVOS
Listar as características da mediação penal.
Explicar o papel da vítima nesse processo.
Identi�car as vantagens e desvantagens desse tipo de mediação.
CONCEITOS E PRINCÍPIOS DA MEDIAÇÃO PENAL
De acordo com a Resolução nº 99 do Comitê de Ministros do Conselho da Europa (glossário), mediação penal é:
Todo processo que permite à vítima e ao delinquente participar ativamente, se consentem
livremente, da solução das di�culdades resultantes do delito, com a ajuda de um terceiro
independente (mediador)
Em outras palavras, trata-se da participação voluntária do imputado por delito ou por falta e da vítima em um processo
interativo de diálogo e de comunicação.
Conduzido por um mediador imparcial, esse processo tem como objetivo fundamental conseguir a reparação
adequada para o dano causado na vítima pelo delito, bem como a resolução do con�ito, a partir de uma perspectiva
justa e equilibrada com os interesses de ambas as partes.
A mediação tem demonstrado ser um procedimento válido para determinar o protagonismo necessário à vítima e
conseguir uma reparação adequada a suas necessidades reais.
Para o infrator, supõe a oportunidade de reparar por ele mesmo o dano causado e obter determinados benefícios
jurídicos e penitenciários que evitem sua exclusão social, facilitando sua efetiva reinserção social.
Fonte:
A ação da mediação favorece a paz social na comunidade.
Mediante participação voluntária, a mediação permite às partes atingidas pelo delito compartilharem sentimentos,
experiências e necessidades. Além disso, oferece à vítima a oportunidade de obter reparação, sentir-se mais segura e
tentar encerrar uma etapa em sua vida.
Para os delinquentes, é oferecida a oportunidade de compreender melhor as causas e os efeitos de seu
comportamento, bem como de assumir sua responsabilidade, facilitando sua reinserção na sociedade. A comunidade
entende as causas da ação delituosa, promove a paz social e previne o delito.
De acordo com uma perspectiva mais jurídica (VALL; VILLANUEVA, 2003 apud VALLEJO; GESTOSO, 2010, p. 210), os
princípios da mediação na jurisdição penal são:
 Recuperar a atenção para a vítima – �gura esquecida no Direito Penal;
 Estimular nova tendência no infrator castigado – com penas privativas de liberdade e ampliação da diversidade de
medidas alternativas;
 Oferecer nova orientação na política criminal – impulsionada por organismos internacionais, que reconhecem no
sistema penal e social a reparação, a conciliação e a mediação como instrumentos para compensar os prejuízos
acarretados às vítimas, com o objetivo de reconstruir a paz social.



https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:52002IG1008(01)
Sob uma perspectiva mais voltada a sua aplicação (VALL; VILLANUEVA, 2003 apud VALLEJO; GESTOSO, 2010, p. 210),
são caraterísticas essenciais à mediação penal:
• Con�dencialidade;
• Igualdade e liberdade;
• Proteção de direitos – especialmente presunção de inocência;
• Rapidez;
• Neutralidade do mediador;
• Opção responsabilizadora;
• Opção preventiva – orientada para as pessoas em con�ito;
• Participação voluntária;
• Dupla �nalidade:
- Infrator – conhecer as consequências de sua ação, responsabilizar-se pelo dano causado e obter benefícios legais;
- Vítima – ser ouvida e expressar necessidades restauração.
OBJETIVOS BÁSICOS DA MEDIAÇÃO PENAL
Os programas de mediação penal e reparação da vítima se propõem a diferentes objetivos que afetam o agressor e a
vítima, bem como o sistema judicial e a comunidade.
Vamos ver alguns desses objetivos de acordo com os atores que participam, direta ou indiretamente, de tal
procedimento (DAPENA; MARTIN, 1998; GULLAMAT, 2006; GORDILLO, 2007 apud VALLEJO; GESTOSO, 2010, p. 210-
211):
MEDIAÇÃO PENAL
ATORES OBJETIVOS BÁSICOS
Agressor • Conscientizar-se de suas atitudes e de suas consequências sobre a vítima, a
comunidade e ele
mesmo;
• Participar, ativa e voluntariamente, da mediação com a vítima, sempre que
possível e
adequado, conforme a indicação do mediador;
• Compensar e reparar a vítima, participando da solução do conflito;
• Obter os benefícios previstos no sistema judicial.
Vítima • Participar da resolução do conflito no qual esteve envolvido;
• Participar, ativa e voluntariamente, da mediação com o infrator, sempre que
considerado
adequado pelo mediador;
• Ser reparada dos danos e prejuízos sofridos, recuperando a segurança
psicológica,
abalada pelo delito.
Sistemajudicial • Promover atitudes facilitadoras da responsabilização do fato ocorrido e a
reparação da
vítima;
• Permitir, ao mesmo tempo – se assim julgar posteriormente – a atenuação ou
substituição
da pena pelo delito cometido;
• Contribuir para que a intervenção judicial seja uma ocasião para o
restabelecimento da paz
social entre as partes em conflito;
• Garantir processos de reparação e de solução de conflitos em consonância com
direitos,
garantias e interesses dos implicados, facilitando acordos reparadores
livremente assumidos;
• Melhorar a assistência à vítima e reforçar seu papel no processo penal;
• Conseguir maior eficácia e eficiência da Justiça;
• Reduzir o acesso ao recurso da prisão como sistema jurídico-penal;
• Aplicar o princípio da oportunidade, dentro dos limites legais, em todos aqueles
casos
em que o autor manifesta sua vontade para reparar o dano da vítima.
Comunidade • Reforçar a aproximação da Justiça com os cidadãos;
• Possibilitar formas participativas para a resolução dos conflitos surgidos em seu
meio;
• Fortalecer outras formas de reação do sistema judicial que busquem interesses
comuns e
favoreçam a convivência e a prevenção do delito, no lugar de estigmatizar e
reforçar diferenças entre os membros da sociedade.
CARACTERÍSTICAS DA MEDIAÇÃO PENAL
Desde o início da mediação, realizada no Judiciário, acreditava-se que o processo era um instrumento muito útil para
solucionar con�itos gerados nas relações patrimoniais e na família.
As questões criminais foram excluídas categoricamente. Sem dúvida, isso ocorreu devido à força imposta pelo sistema
de legalidade e à con�scação estatal do con�ito da vítima, com o argumento – consideradoracional – de que a
mediação não era legalmente possível.
Atenção
, Nenhum sistema judicial soluciona todos os con�itos que lhe são colocados, nem a mediação serve para todos os tipos de
con�itos penais.
De acordo com Romero (2002, p. 111-112), as partes devem assumir e respeitar os princípios da mediação, que:
• Não é adversarial;
• É voluntária – não exclui a via judicial;
• Respeita a con�dencialidade e a voluntariedade;
• É informal e �exível, ainda que tenha uma estrutura de�nida;
• É econômica em tempo, dinheiro e energia;
• Devolve às partes a capacidade de administrar os problemas presentes e futuros;
• Permite continuar com a relação ou encerrá-la de forma digna;
• É realizada por um terceiro neutro e imparcial, desprovido de poder decisório – o mediador não é um mero
intermediário das ofertas das partes;
• Possibilita maior grau de cumprimento dos acordos mutuamente aceitos.
A relação entre vítima e ofensor evidencia um con�ito, independente de estar sendo tratado pelo Direito Penal. A
simples existência da controvérsia já permite a tentativa de resolvê-la por meio da mediação.
É POSSÍVEL MEDIAR O CONFLITO PENAL?
Nas organizações tribais, o desterro e o isolamento da comunidade eram as consequências mais temidas por parte
daqueles que violavam as normas sociais do grupo. A ruptura do vínculo com a comunidade era um destino pior do
que a morte.
Na sociedade atual, o encarceramento se parece com o desterro, embora o impacto não seja o mesmo. Os infratores
se sentem isolados de sua família e de sua comunidade e, com esses laços rompidos, já não temem o desterro.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 (glossário) fez uma severa advertência sobre a utilização
da pena, simplesmente não acatada:
Fonte:
“A lei não pode estabelecer mais penas que as estritamente necessárias”.
Por isso, é necessário que o Direito Penal construa, como forma harmoniosa de vida, uma nova dimensão para a pena,
reservando-a para os casos estritamente necessários.
Poderíamos falar de um Direito Penal com intervenção mínima, cujo resultado é: destinar para o âmbito da justiça
penal os temas transcendentes e encaminhar as condutas menos delituosas para uma instância conciliatória.
Highton Alvarez e Gregorio (1998, p. 58-59) propõem três grandes grupos de trabalho nessa área. São eles:
Vídeo.
https://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf
Questões
penalmente
graves
Casos penais
menores
Casos de
despenalização
O Estado deve intervir,
submetendo o sujeito
a suas regras
ordinárias, porém com
mais rapidez pela
quantidade menor de
processos.
Aqueles que podem
permitir um conjunto
intermediário de
soluções para o
processo e a pena.
Exemplos
• Suspensão do
processo;
• Prisão domiciliar;
• Prisão apenas nos
finais de semana;
• Trabalho
comunitário etc.
Neste caso, o problema vai
para uma área
administrativa, na qual a
principal meta é recompor
a ordem alterada,
considerando a satisfação
da vítima.
A mediação seria diferente, dependendo das circunstâncias e dos lugares.
Em alguns programas, nos casos encaminhados, o acordo – totalmente cumprido – substitui a persecução penal.
Em outros, o envio dos casos ocorre depois da formalização da culpa e da responsabilidade criminal, recebida pelo
tribunal. Se interessar à vítima, a mediação será um requisito para a liberdade condicional.
Os demais programas recebem casos tanto antes da
decisão quanto na etapa posterior à sentença.
O objetivo da mediação é promover um procedimento de resolução de con�itos que se perceba como justo, tanto por
parte da vítima quanto por parte do autor do fato.
Trata-se de dar a oportunidade de:
  • Falar sobre a ofensa;
• Obter respostas;
• Expressar sentimentos;
• Criar um plano de reparação mutuamente aceitável.
  A mediação penal não possibilita que o ofensor se livre facilmente do problema. A�nal, ainda que aceite participar da
mediação, o réu terá de cumprir a sentença imposta pelo juiz. E uma das tarefas mais difíceis dos autores de delitos é
enfrentar a vítima frente a frente.
PROCESSO DE MEDIAÇÃO PENAL
De acordo com Vallejo e Gestoso (2010), na literatura, é possível encontrar diferentes modelos de procedimentos
utilizados na mediação penal.
  A estrutura geral do processo pode variar conforme:
• O estilo ou o per�l do mediador;
• As pautas do programa;
• O tipo de intervenção;
• O número de fases propostas ou sua ordem.
De forma resumida, podemos destacar como fundamentais as seguintes fases:
1
Solicitação da mediação
Esta pode vir das partes e da organização judicial.
2
Contato
Neste momento, o mediador entra em contato, separadamente,
com aquele que pediu a mediação e, depois, com a outra parte,
com o objetivo de avaliar a idoneidade do motivo da mediação
como mecanismo de resolução de conflitos.
3
Desenvolvimento e intercâmbio
Esta fase se produz de forma:
• Direta – mediante a presença física da vítima, do agressor e do
mediador;
• Indireta – interposta pelo mediador e sem contato entre as
partes.
Além dos sujeitos ativos do processo, os advogados das partes
podem estar presentes ou participar da mediação.
4
Acordo
Este pode ser escrito ou verbal e abranger aqueles aspectos que
as partes alcançaram com o assessoramento do mediador.
5
Comunicação aos órgãos judiciais
O acordo alcançado é levado ao órgão judicial responsável, com
o objetivo de ser reconhecido dessa forma, garantir sua aplicação
e permitir a obtenção dos benefícios penais contemplados na lei
para o agressor.
6
Acompanhamento
Esta fase é básica, mas pouco aplicada. Apenas os estudos da
satisfação dos usuários oferecem o perfil ou o valor da mediação.
A VÍTIMA DO DELITO E O SISTEMA PENAL
Mesmo os maiores defensores do sistema judicial reconhecem que os processos não funcionam como deveriam. Os
tribunais estão sobrecarregados, e o caminho dos processos é lento e caro.
Além disso, de acordo com Highton, Alvarez e Gregorio (1998, p. 39):
O processo pode ser desumano e revitimizar a vítima e o autor.
O modo de levar a situação ao juízo e as eventuais respostas ao problema que o processo
pode oferecer impedem a satisfação das necessidades dos implicados, pois os interesses
dos participantes nem sempre concordam com os possíveis caminhos e efeitos de uma
decisão judicial.
O processo penal não oferece possibilidade para que as partes explorem suas futuras
relações e interações.
O sistema judicial falha no que diz respeito ao reconhecimento da dor da vítima.
A persecução estatal não abre a possibilidade de explorar a eventual contribuição de cada
um dos participantes enquanto causadores de um resultado.
QUEM É O TITULAR DO CONFLITO?
Fonte:
Dentro dos critérios da sociedade brasileira, na área criminal, justiça equivale a castigo.
De acordo com o lema olho por olho, quem comete um crime deve cumprir o correspondente tempo de detenção. Após
o período de encarceramento, o indivíduo pagou sua dívida com a sociedade, e a justiça foi feita.
Mas justiça para quem? Com certeza, não
para a vítima.
Representado pelo sistema penal, o Estado intervém no que pode ser considerado con�ito e o tira das pessoas
originalmente envolvidas nele. Essa apropriação do Estado se realiza mediante procedimentos formais, muitas vezes
incapazes de responder, de forma compreensível, ao autor ou à vítima.
Em um processo penal, a vítima é uma espécie de perdedora de uma dupla partida: primeiro, frente ao infrator e,
depois, frente ao Estado. Ela é excluída de qualquer participação em seu próprio con�ito, porque o Estado se apodera
dele.
A ideia de proteção ao bem jurídico, que rege o Direito Penal, reduziu o con�ito à relação Estado-autor. Esse fato
contribuiu para distanciar a vítima dos órgãos da Justiça, porque a lei oferece proteção para uma entidade abstrata
(bem jurídico), e não para o indivíduo.
Nessa situação, a vítima leva a pior, mas a sociedade também perde a possibilidade de intervenção pedagógica no
caso.
DESLOCAMENTO DA VÍTIMA DO PROCESSO PENAL
Há uma evoluçãona colocação da vítima no processo penal que gera várias consequências, tais como:
Posição da vítima nas origens no Direito Penal
Em sua origem, o Estado delegava, exclusivamente, à vítima o direito de punir, porque as
ações emergentes dos delitos eram privadas. Muitas vezes, por medo, a vítima �cava
inativa.
Depois, o Direito Penal partiu da vingança privada da vítima ou de seus agregados para um
sistema de composições ou pagamento em bens. Havia uma negociação entre ofendido e
autor do fato ou suas respectivas famílias.
A vítima participava em posição de destaque, quando a composição era uma forma comum
de solução dos con�itos sociais, e o sistema acusatório privado, o principal meio de punição
penal.
Os Estados dependiam, em grande medida, da ação do cidadão para fazer cumprir as leis
penais. As vítimas podiam obter para si uma quantidade de penas pecuniárias impostas, que
eram repartidas com a Coroa ou se destinavam a algum uso público.
Nos tempos medievais, as práticas eram restitutivas, e as ofensas, resolvidas por meio de
um terceiro não interessado que:
• Mediava a situação entre vítima e ofensor;
• Determinava a reparação a ser feita;
• Controlava o valor pago à vítima.
Quando o senhor feudal descobria esses pagamentos, exigia uma participação. Em seu
nome, um �scal intervinha no processo para recolher o percentual de seu patrão. Disso se
originou a concepção de crime contra o Estado e de responsabilidade para com o Estado
sob a forma de multas.
Monopólio do castigo por parte do Estado
No período medieval, o Estado monopolizou o direito do castigo e, cada vez mais, apoderou-
se da ação, que passou a ser de exercício público.
Como consequência, originou-se um órgão especí�co, encarregado de sua promoção e de
seu desenvolvimento: o Ministério Público, com autoridade e controle sobre o exercício da
ação penal.
Dessa forma, o sistema penal se tornou um instrumento de controle direto sobre as
pessoas. Já não importava o dano real produzido, no sentido da restituição ou
compensação. Apareceu a pena estatal como mecanismo de controle e instrumento de
coação nas mãos do Estado.
O crime se comete mais contra o Estado e a sociedade do que contra o indivíduo, o qual
sofre concretamente a perda ou a consequência do ato delituoso.
A sociedade brasileira de�ne a justiça como equivalente ao tempo de encerramento e
maximiza o castigo. O esquema social a�rma para a vítima que essa situação lhe trará a
desejada justiça.
Mas, logo ao obter o que buscava, aparece um sentimento de vazio e insatisfação em
relação ao castigo, porque:
• Outros importantes interesses e necessidades não foram considerados.
• As perdas não foram restauradas.
• As perguntas não foram respondidas.
• A tragédia �cou sem sentido.
• As feridas não foram curadas.
Revitimização da vítima
A situação anteriormente relatada de insatisfação da vítima manifesta-se quando ela está
muito interessada na penalização do ofensor e quando entende que está sofrendo uma
reação do Estado ao delito.
Muitas vezes, as pessoas prejudicadas pelo fato criminoso são revitimizadas pelo trabalho e
por obstáculos que têm de enfrentar depois do crime por meio de todo o processo criminal.
Elas encaram:
oras;
• Perdas econômicas;
• Ausências em dias de trabalho;
• Falta de consideração;
• Tratamento desrespeitoso;
• Outras consequências negativas.
Algumas chegam a comentar que estariam melhores e mais tranquilas se não tivessem
denunciado o delito para evitar a revitimização.
Em um sistema legalista como o brasileiro, o procedimento penal transcorre totalmente à
margem da opinião da vítima, que sofreu o fato originário da ação. Logo, o ofendido é
apenas uma �gura marginal.
Em contrapartida, o autor do fato delituoso é, de certo modo, a �gura central desse
procedimento, já que tudo gira em torno de culpabilidade ou não.
Toda vez que tem de participar dos atos processuais, a vítima é obrigada a:
• Testemunhar ou enfrentar acareações, reconhecimentos e circunstanciais maus tratos;
• Suportar, várias vezes, recordações dolorosas sobre o que viveu;
• Assumir situações de risco.
Ela não é atendida em seus desejos e pedidos, por mais razoáveis e justi�cados que sejam,
nem informada sobre o desenvolvimento do processo.
Tudo isso se con�gura como revitimização ou vitimização secundária, o que permite
questionar: esta é a vítima do delito ou do processo?
POSSIBILIDADES DE PARTICIPAÇÃO DA VÍTIMA NO PROCEDIMENTO
PENAL
Quando consideramos que os crimes atingem as vítimas muito mais do que a ordem social ou a sociedade, passamos
a entender a importância da participação da vítima como sujeito do processo penal.
Alguns passos têm sido dados em favor da participação do
ofendido. Um deles é a chamada delegação da ação civil:
instrumento que permite o acesso da vítima à reparação do
dano.
Deveria ser criado um sistema de assistência real e e�ciente, em que a vítima pudesse se dirigir em busca de auxílio –
principalmente aquela que não tem possibilidades reais de exercer seus direitos.
De acordo com Highton, Alvarez e Gregorio (1998, p. 50), a vítima deve ter os direitos de:
• Informação;
• Participação do processo;
• Reparação e assistência econômica.
Ao incorporar a vítima do delito ao sistema penal, é possível desconstruir o Direito Penal autoritário e humanizá-lo, no
sentido de voltar a tratá-lo como atividade de seres humanos concretos, individuais, pessoas que se relacionam e que
têm con�itos entre si.
A autonomia da vontade da vítima e do autor deve ser permitida com certo poder de decisão e controle judicial,
buscando uma solução conciliatória e reparatória. Além disso, é fundamental reconhecer esses atores como
protagonistas do con�ito social, que se transformou em ação penal.
INTERESSE DA VÍTIMA
Vídeo.
Vídeo.
O procedimento criminal não é, com frequência, o interesse essencial da vítima do delito. Ela quer reparação pelas
lesões ou pelos danos causados. As pretensões materiais ressarcitórias são, tradicionalmente, procedimentos civis de
reparação.
O ofendido também se vê vinculado a um procedimento além do penal e pode ser que não receba nada –
principalmente se o autor carece de recursos.
Se a �nalidade do sistema penal é a paci�cação da
sociedade, é importante, em muitos casos, revalorizar as
situações interpessoais dos interessados envolvidos no
delito.
A vítima deve ser atendida com atenção, e suas decisões têm de ser consideradas. Muitas vezes, o prosseguimento de
certos processos penais agrava o con�ito, que poderia ser superado de outra forma.
PROBLEMAS TEÓRICOS DA MEDIAÇÃO PENAL
Como um procedimento informal, de resultado impreciso, a mediação penal apresenta múltiplas questões que
levantam dúvidas nos pro�ssionais da justiça criminal.
Nos casos penais, esse processo se diferencia da mediação que ocorre em outros contextos pela importância dos
valores envolvidos na matéria, além da percepção que existe sobre a necessidade de castigar os indivíduos que vão
contra as normas penais.
De acordo com Highton, Alvarez e Gregorio (1998), não há respostas de�nitivas, mas algumas questões podem ser
destacadas. Vejamos:
A mediação penal seria a institucionalização de uma justiça de segunda ordem?
Quando há �exibilização de pautas jurídicas e processuais, se as partes estão legalmente representadas, cria-se uma
justiça criminal de segunda ordem?
A mediação penal não seria algo que já existe?
A conclusão dos casos criminais é mais rápida a partir da mediação.
Quando a mediação de casos penais é apropriada?
As diretrizes para estabelecer que casos penais são suscetíveis à mediação ainda são contraditórias. Geralmente, esse
processo é realizado em casos com faltas menores e entre indivíduos com relação continuada.
Alguns estudiosos desaconselham a mediação penal na violência doméstica. Outras pessoas relatam casos de
sucesso na violência ou em crimes graves. Na seleção dos casos mediáveis, ainda existem muitas dúvidas de quando
a mediação é apropriada.
A mediação de casos penais expande a possibilidade de responder ao crime?Esta é uma dúvida sobre a possibilidade de a mediação penal dar conta de mais casos do que o procedimento judicial
por sua informalidade e direcionalidade.
O que signi�ca o mediador voluntário para o sistema de justiça criminal?
O uso de voluntários é uma forma de cortar custos, bem como de reduzir a sobrecarga e o congestionamento dos
despachos judiciais. No entanto, há uma tentativa de dar poder aos membros da sociedade civil.
Por que há resistência à mediação penal?
Muitas são as razões para isto. A mais forte é a tradição cultural que insiste no tema da adversidade. Além disso, o
sistema penal é regido pelas disposições processuais e pelas regulamentações de provas. Trata-se, portanto, de um
procedimento público.
A mediação permite que as partes:
• Explorem as causas subjacentes ao con�ito;
• Discutam necessidades;
• Expressem sentimentos;
• Cheguem a soluções criativas em um ambiente privado e informal.
Devido a essas questões, há certa intranquilidade em relação à preservação do valor do Direito na mediação penal.
VANTAGENS E DESVANTAGENS DA MEDIAÇÃO PENAL
As pessoas que acreditam neste sistema apresentam as seguintes vantagens:
 Em termos humanistas, a melhor forma de responder à maldade é por meio da bondade e do bem. A reconciliação, a
reparação e o perdão são socialmente mais construtivos.
 O perdão é uma força psicológica que pode ser dirigida para o alívio da vítima.
 A política criminal de prevenção está integrada à política social.
 A mediação é uma forma mais direta e ativa de participação da vítima no sistema de Justiça.
 As vítimas estão diretamente envolvidas no sistema, mas não são consideradas sobre as decisões judiciais.
 Os autores dos fatos intervêm de forma ativa e não passiva.
 Reforça-se a participação da cidadania, especialmente nos casos em que a comunidade está envolvida.
 A superpopulação carcerária vê-se aliviada com este procedimento.
 A mediação pode atuar na mudança positiva da comunidade, na responsabilidade coletiva e no desenvolvimento
social.
A seguir, listamos as vantagens, desvantagens, di�culdades e os limites da mediação penal:
Vantagens para as vítimas
• Possibilidade de que o infrator reti�que sua postura e de que, na medida do possível, isso
tenha valor para a vítima;
• Oportunidade para confrontar o autor com o impacto da ofensa – a vítima expressa seus
sentimentos e pensamentos diretamente ao ofensor;
• Oportunidade de a vítima conhecer quem é o autor do fato;
• Circunstância para obter respostas às perguntas que só o autor pode dar;
• Alternativa de aliviar medos exagerados sobre o autor;
• Opção de pedir e receber desculpas;
• Motivo para ser visto como pessoa em lugar de objeto;
• Tempo e lugar para exercer in�uência como participante primário e importante na resposta
à ofensa;
• Espaço para converter o autor como responsável;









• Situação apta para determinar ressarcimentos ou reparações;
• Forma de sentir que a justiça foi feita;
• Meio de alcançar uma forma de conclusão que traga paz.
Vantagens para os autores
• Oportunidade para reti�car o mal in�igido;
• Ocasião para oferecer desculpa ou explicação;
• Dar conta das reais consequências dos atos;
• Espaço que permite vê-los como pessoas, e não monstros;
• Oportunidade de participar da decisão sobre a indenização ou restauração por meio de
acordo viável;
• Única oportunidade, em algumas ocasiões, de evitar processo criminal;
• Possibilidade de restaurar a própria imagem.
Vantagens para a comunidade
• Diminuição do impacto da delinquência com aumento da reparação;
• Redução da incidência do crime pela compreensão dos autores quanto às consequências
para as vítimas;
• Expansão da experiência de Justiça;
• Diminuição do impacto do encarceramento sobre a comunidade.
Vantagens para o sistema judicial
• Satisfação das necessidades das vítimas;
• Aumento do sentimento de justiça e de bem-estar com o sistema criminal;
• Aumento da satisfação pública em relação ao sistema judicial criminal;
• Diminuição do tempo para processar as ofensas criminais dentro do sistema adversarial;
• Redução dos custos de manutenção dos institutos de detenção.
Limitações do processo
• A mediação penal não é para todas as vítimas nem para todos os autores.
• A mediação não é um remédio rápido para curar a multiplicidade de problemas.
• A mediação não está destinada a solucionar a reincidência.
• Sem mediadores adequadamente treinados, a mediação penal fracassa.
Desvantagens e di�culdades do processo
• A mediação não é aplicada de forma sistemática.
• Em muitos casos, não se planejam nem se avaliam esses programas de mediação.
• Os crimes violentos têm sido excluídos desta mediação, apesar de seu percentual de
sucesso.
• Só um pequeno número de crimes pode participar desta mediação – a maioria deve ser
castigada por meio dos métodos tradicionais.
DIFERENÇAS ENTRE MEDIAÇÃO CIVIL E PENAL
A mediação é utilizada em uma crescente quantidade de con�itos. Veja, a seguir, as características que diferenciam os
tipos civil e penal desse processo:
Inexistência de relação prévia
Muitas vezes, a mediação penal ocorre entre estranhos. Já a mediação civil, geralmente,
acontece entre partes com relações preexistentes.
Desequilíbrio de poder
A mediação civil não deve ser realizada quando há desequilíbrio de poder. Na mediação
penal, esse desequilíbrio é comum, pois há uma pessoa prejudicada e um infrator. Muitas
vezes, a vítima espera encontrar nesse processo um monstro, o que abala seu poder
pessoal.
Reuniões preliminares separadas
O modelo clássico de mediação civil tende a evitar o contato prévio das partes com o
mediador em sessões individuais, a �m de que não haja o risco de formar alianças que
possam comprometer a imparcialidade.
Na base da mediação penal tradicional, acontecem reuniões individuais entre o mediador e
cada uma das partes. A ideia é explicar o procedimento e preparar para o encontro frente a
frente. Nessas ocasiões, aproveita-se, também, para descartar os casos em que, por
diversos motivos, a mediação não será proveitosa.
Modo de estar em disputa
Na mediação penal, as partes não estão em disputa com a mesma conotação que se tem na
mediação civil. A questão da inocência ou da culpabilidade não é mediada, mas existem
alguns fatos em disputa que podem ser tratados na mediação penal.
Foco no diálogo e na empatia
Muitos modelos da mediação estão voltados para o acordo. Na mediação penal, o acordo é
secundário, e a atenção é dirigida para o diálogo, com ênfase no(a):
• Empatia;
• Restabelecimento da vítima;
• Possibilidade de assumir responsabilidades por parte do autor;
• Reparação das perdas.
Neutralidade
Quando se trata de mediação penal, há um critério diferente. Na situação de crime, o
conceito de neutralidade não é apropriado. Na maioria dos casos, comete-se um crime
contra uma pessoa inocente. O mediador é imparcial, respeitando as partes desse
procedimento, mas não é neutro quanto à transgressão cometida. Esse pro�ssional tenta
estabelecer alianças com ambas as partes.
EXERCÍCIO:
1. O modelo restaurador de reação ao delito – modelo integrador ou de justiça restaurativa – tem como objetivo(s):
Proteger os bens jurídicos, violados pela prática delitiva.
Reinserir o condenado à sociedade por meio da religião e da laborterapia.
Aplicar pena ao condenado, buscando desestimulá-lo à prática de novos delitos.
Punir o delinquente como meio de castigá-lo e retribuir-lhe o mal pelo delito praticado.
Buscar a recuperação do delinquente, proporcionar assistência à vítima e restabelecer o controle social, abalado pela prática do
delito.
Justi�cativa
2. A moderna criminologia:
Tem como protagonistas o delinquente, a vítima e a comunidade.
Trata o castigo do infrator como esgotamento das expectativas que o fato delitivo desencadeia.
Não considera como seu objeto de debate os aspectos político-criminais das técnicas de intervenção social e de seu controle.
Apresenta como principais objetivos a reparação do dano causado ao Estado, a ressocializaçãodo delinquente e a repressão
do crime.
Vislumbra o delito como enfrentamento formal, simbólico e direto entre dois rivais (Estado e infrator) que se enfrentam,
isolados da sociedade, à semelhança da luta entre o bem e o mal.
Justi�cativa
3. O modelo restaurador de reação ao delito – também conhecido como modelo integrador ou de Justiça restaurativa –
tem como objetivo(s):
Proteger os bens jurídicos violados pela prática delitiva.
Reinserir o condenado à sociedade por meio da religião e da laborterapia.
Aplicar pena ao condenado, buscando desestimulá-lo à prática de novos delitos.
Punir o delinquente como meio de castigá-lo e retribuir-lhe o mal pelo delito praticado.
Buscar a recuperação do delinquente, proporcionar assistência à vítima e restabelecer o controle social abalado pela prática do
delito.
Justi�cativa
Glossário

Continue navegando