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FUNDAMENTOS DE ORGANIZAÇÃO E O COTIDIANO ESCOLAR 1 1 SUMÁRIO FUNDAMENTOS DE ORGANIZAÇÃO E O COTIDIANO ESCOLAR ................ 0 NOSSA HISTÓRIA ............................................................................................. 2 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 3 ASPECTOS DE LIDERANÇA NO PROCESSO DE GESTÃO DE PESSOAS ... 5 POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO NO BRASIL ....................................... 12 ÉTICA E EDUCAÇÃO: A INTERFACE FAMÍLIA E ESCOLA PARA A FORMAÇÃO MORAL ....................................................................................... 16 AS INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS COMO ESPAÇO DE TRABALHO ........ 21 O SISTEMA DE ORGANIZAÇÃO E A GESTÃO ESCOLAR ............................ 23 O SISTEMA DE ORGANIZAÇÃO DA GESTÃO ESCOLAR............................. 24 A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DE UMA ESCOLA ................................. 25 AS RELAÇÕES DA FAMÍLIA COM A ESCOLA NO BRASIL ........................... 28 O ENVOLVIMENTO DOS PAIS NA ESCOLA .................................................. 34 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 37 file://///FACUMINAS-AD-FS/Setores/Pedagogico/EDUCAÇÃO/DIDATICA%20DO%20ENSINO%20DA%20MATEMATICA/FUNDAMENTOS%20DE%20ORGANIZACAO%20E%20O%20COTIDIANO%20ESCOLAR/FUNDAMENTOS%20DE%20ORGANIZACAO%20E%20O%20COTIDIANO%20ESCOLAR.docx%23_Toc124241385 2 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 3 Introdução Vamos iniciar nossos estudos falando sobre os fundamentos que organizam o cotidiano da escola. Porém, quando articulamos conhecimentos e saberes, esquecemos de nos perguntar e de analisar o nosso objeto de estudo, que nesse caso é a escola. Afinal, o que é a escola? A escola, segundo o Dicionário Aurélio Virtual (2017) significa: Entretanto, a escola assume um papel muito mais amplo do que está previsto na essência do seu significado. Como instituição, trabalha com o conceito de educação. Segundo o Dicionário Aurélio Virtual (2017), educação é: “Ato ou efeito de educar (-se). Processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano. Civilidade, polidez”. 4 4 A escola, então, assume um papel e uma respectiva função de ambiguidades: de um lado, ensina conhecimentos científicos, culturais, tecnológicos e históricos de toda a sociedade; de outro, ensina crianças sobre elementos que fazem parte do que é ser humano e que variam de acordo com cada faixa etária: os primeiros passos, a primeira leitura, o bom comportamento, a primeira briga e até mesmo o primeiro amor. A educação é vista como mediadora entre o gesto cultural e sua continuidade, ou seja, é na interação dos homens, em sua tradição, valores e cultura, que o sujeito constitui-se, transforma-se e modifica o meio no qual está inserido. Neste aspecto, definir a educação como um processo social regido por valores e normas que constituem a sociedade, é pensar também na atuação da família e da escola neste processo educacional, pois, ainda hoje, a família é caracterizada como a primeira instância responsável por impor normas e valores sociais e culturais à criança e a escola por dar continuidade a esse processo, mas principalmente transmitir o conhecimento acadêmico. Este ensino tem enfatizado os resultados da aprendizagem, utilizando-se de propostas e estratégias homogêneas independente muitas vezes da idade, experiências, ritmos e origem social de seus sujeitos. 5 5 A partir dessas “dicotomias” que a escola perpassa em seu cotidiano, buscaremos compreender como os fundamentos que organizam esse ambiente lutam diariamente, em todos os seus segmentos, em prol de uma educação que viabilize a transformação, o fazer pedagógico e a construção do conhecimento por meio de quatro perspectivas: os aspectos de liderança no processo de gestão de pessoas; as políticas públicas e educação no Brasil; as questões éticas e educacionais na interface entre a família e a escola para a formação moral dos sujeitos; as instituições educacionais como espaço de trabalho; as relações da família com a escola no brasil; e o envolvimento dos pais na escola. Aspectos de liderança no processo de gestão de pessoas Vamos iniciar nossa conversa com duas questões que buscaremos responder ao longo deste item: o que é ser líder? Onde encontramos líderes nos ambientes educacionais? Esses questionamentos nos fazem lembrar de filmes nos quais temos os líderes de torcida, os capitães de time, os líderes de batalhas, personagens que mudaram realidades de pessoas, cidades, países e de outros que se tornaram figuras célebres em diversos campos, inclusive o religioso, no qual podemos exemplificar a figura de Jesus Cristo. Assim como nos filmes e na própria trajetória histórica, o líder é aquele sujeito que vê em qualquer indivíduo um potencial, tem pensamentos e habilidades estratégicas para resolver e administrar problemas técnicos e também conflitos entre pessoas e equipes com um alto poder de comunicação capaz de motivar a tudo e a todos. Em uma de suas palestras intitulada “A arte de liderar”, Mário Sérgio Cortella (2016) nos apresenta outro conceito acerca do nosso tema e de suma importância para o nosso debate: um líder é aquele que possui uma insatisfação 6 6 positiva, ou seja, aquele que busca por meio da inteligência humana o “movimento” em novas atitudes, novos trabalhos, novas propostas em prol de mudanças em qualquer ambiente de trabalho, e tem em seu âmago o “gostinho de quero mais e sempre o melhor”! O gostinho de quero mais deve ser a virtude de um líder, pois este deve inspirar, motivar e animar ideias, pessoas e projetos em prol de tornar sonhos em realidades, estes que devem abarcar em sua essência a circunstância, pois devem acontecer em momentos específicos. Vale destacar que a atitude de um líder deve ter como premissa a admiração, a procura e até o seguimento de seus companheiros, pois, aqui, o líder é aquele que “corrige sem ofender e orienta sem humilhar” (CORTELLA, 2016), diferenciando-se da chefia, nos quais os subordinados estão ali apenas para obedecer. Aqui, nasce o ponto central da nossa discussão em relação à liderança: a ambição deve ser provocativa em prol da mudança da insatisfação positiva. Agora, se a ambição caminhar junto com a insatisfação negativa (esta que pode ser entendida como os desejos de insatisfação dos indivíduos), o líder, em vezde ser um exemplo para sua equipe e um ponto de apoio, passa a ser uma figura de centralidade do poder. Desse modo, a educação brasileira também vai necessitar de líderes dentro dos seus espaços educacionais. Líderes que estejam aptos para exercer suas atividades com a mente aberta, ou seja, propensos aos novos conhecimentos e às novas realidades; líderes que elevem a equipe para desenvolverem todas as suas potencialidades mesmo nas adversidades; líderes aptos a inovar o trabalho e recrear o espírito, demonstrando a todos que o trabalho não pode ser visto como “sacrilégio”, mas com alegria de propiciar conhecimento e mudanças para, enfim, empreender o futuro. 7 7 Essa ideia vai adentrando os espaços escolares a partir da mudança de paradigma da própria organização dos ambientes escolares e da formação pedagógica do professor. Antes, os professores eram habilitados para ser administradores escolares. Com a aprovação das Diretrizes do Curso de Formação de Docentes, em 2007, tais habilitações deixaram de existir, surgindo uma nova proposta: a formação de gestores. A formação de gestores, nesta apostila, não terá uma abordagem ligada apenas ao papel do gestor escolar, mas sim, a todos os membros que atuam dentro dos espaços escolares e também são líderes: professores em suas salas de aula, inspetores que cuidam dos alunos, equipe das merendeiras, limpeza, enfim, até os nossos educandos, entre os quais sempre temos aquela figura que mais se destaca e lidera os pares. Diante dessa missão, os líderes escolares passam a atender ao princípio da gestão democrática estabelecida na Constituição Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei n. 9.394/1996 – e no Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024. Tal gestão pressupõe a mobilização e 8 8 a organização das pessoas para atuarem coletivamente na promoção de objetivos educacionais. Ou seja, o líder não é aquele que eleva apenas a sua equipe de trabalho no interior da unidade escolar (relação entre professores, alunos e equipe de apoio), mas mobiliza todo o exterior da escola, a comunidade! Conforme definido em Lück (2009, p. 75), [...] alguns elementos emergem como características comuns de atuações de liderança efetiva e que, portanto, compõem o seu significado: • Influência sobre pessoas, a partir de sua motivação para uma atividade. • Propósitos claros de orientação, assumidos por essas pessoas. • Processos sociais dinâmicos, interativos e participativos. • Modelagem de valores educacionais elevados. • Orientação para o desenvolvimento e aprendizagem contínuos. A partir desses elementos, a liderança se expressa como um processo de influência e de insatisfação positiva em conferir movimento às propostas de mudanças, mobilizando talentos, esforços e sonhos, dentro de uma prática que potencialize a melhoria contínua da própria organização, de seus processos e das pessoas envolvidas. Sendo assim, a liderança vivenciada no processo e no exercício de gestão de pessoas deve ter como base: 9 9 • Disponibilidade em aceitar e expressar no trabalho com pessoas os desafios inerentes ao trabalho educacional, suas dificuldades e limitações, com um olhar para as possibilidades de sua superação. • Estimulação do melhor que existe nas pessoas ao seu redor, a partir de uma perspectiva proativa a respeito das mesmas e de sua atuação. • Clareza a respeito da missão, visão e valores educacionais, assim como da participação das pessoas nessa compreensão e sua expressão em suas ações. • Orientação com perspectiva dinâmica, inovadora e norteada para a melhoria contínua. • Exercício contínuo do diálogo aberto e da capacidade de ouvir. • Construção de oportunidades de participação e orientação para o compartilhamento de responsabilidades. • Cultivo de atitudes que acompanham a expressão de comportamentos de liderança. (LÜCK, 2009, p. 76). Desse modo, o líder é aquele que rege sua orquestra, colocando todos num mesmo ritmo e num mesmo entoar. Para que a efetividade de seu exercício encante a todos, alguns aspectos devem ser verificados, tais como Lück (2009, p. 76-77) elencou em sua obra e dos quais nos apropriamos, exemplificando-os. 1. Autoconfiança – conhecimento dos pontos fortes e fracos de sua atuação. Exemplo desse exercício é a atualização constante não apenas de saberes, mas de realidade. 2. Autoridade. Não podemos confundir nesse caso com autoritarismo, pois nesse regime é prevista a ordem: “Quem pode manda, quem tem juízo obedece!”. A autoridade aqui é entendida como: 10 10 3. Agente de mudança, pois recorre à incapacidade positiva, capaz de fazer crescer e melhorara organização ou grupo que lidera. Esse item pode ser ilustrado principalmente em competições de time, nas quais os técnicos e os capitães promovem mudanças por meio de motivações. 4. Compreensão e convicção quanto aos objetivos a serem alcançados, pois acreditam naquilo que fazem e por que o fazem. 5. Comunicação clara e atraente dos objetivos, engajando os demais na sua busca, pois é por meio da dicção e da experiência que o líder contará com o apoio de todos entre todos. Vale destacar que a experiência de um líder não está ligada à sua idade ou tempo de experiência em dada função, mas sim na intensidade de sua prática. 6. Foco nos objetivos. Por maiores que sejam as dificuldades, os obstáculos e os contratempos, o líder deve promover inspiração em toda a sua 11 11 equipe para que “ninguém deixe a peteca cair”, como tão bem salienta um ditado popular. 7. Sensibilidade ao ambiente e às pessoas, compreendendo a vivência e a experiência de cada um, adequando estratégias e ações à realidade ao seu redor. 8. Habilidade para promover e lidar com interações sociais, pois nem todo clima de trabalho é calmo e tranquilo. Existem momentos de “adversidades”, nos quais o líder deve estar preparado para lidar com as “conturbações” e “problemas” do cotidiano. 9. Clima de apoio e confiança, no qual as pessoas aprendem e trocam conhecimentos em prol do desempenho e qualidade do trabalho. 10. Carismático, apto a receber o outro. 11. Sabe ouvir, pois não está ali para julgar, mas auxiliar no que for preciso. 12. Comportamento ético, levando em conta a virtude, a honestidade e a integridade. 13. Senso de justiça, pois todos são responsáveis por aquilo que fazem, e o “erro” deve ser reparado e não repassado para outrem. 14. Coerência, demonstrada em gestos, valores, comportamentos, com humildade para reparar ou corrigir o rumo, quando preciso. 15. Inteligência, pois busca sempre a “insatisfação positiva”. 16. Gosta do que faz, e o faz com qualidade. Como vimos, o líder é aquele que lidera, assume responsabilidades, compartilha conhecimentos e toma decisões coletivamente. Todos são tratados com paridade (igualdade), mas cada um assume sua função. Nos ambientes 12 12 escolares, chamamos essa forma de administração de gestão compartilhada, na qual participam todos os membros da comunidade interna e externa à escola. Também temos a coliderança, que corresponde à atuação articulada de influência sobre os destinos da escola e seu trabalho de forma planejada e inter- complementar pelos membros da equipe de gestão da escola, como por exemplo vice-diretor, coordenador pedagógico, supervisor escolar, orientador educacional e secretário da escola (LÜCK, 2009). Mais uma vez, ressaltamos neste item que o trabalho do líder só pode ser realizado com primor se ele estiver apto a propor mudanças e convicções de maneira espontânea nos sujeitos por meio de atitudes. Mesmo comuma liderança e uma gestão democrática que compartilhem saberes e experiências de maneira efetiva, ainda temos que trilhar um longo caminho para alcançá-las plenamente. Por isso, finalizamos nosso subitem com uma ideia para refletirmos sobre o trabalho pedagógico: “Nenhuma escola pode ser melhor do que as pessoas que nela atuam e do que a competência que põem a serviço da educação”(LÜCK, 2009, p.81). Políticas públicas e educação no Brasil Agora, voltaremos nossos olhares para uma área que gera diversas polêmicas: as políticas educacionais. Esse tema provoca muitas controvérsias, pois é inserido em um campo entre o que é “prescritivo” e “real” daquilo que, de fato, acontece no interior das nossas escolas, o “oculto”. Mas antes de continuarmos esse debate, precisamos definir e entender o que são políticas públicas. De acordo com o professor João Cardoso Palma Filho (2010, p. 10): 13 13 Desse modo, podemos compreender que essas políticas, no Brasil, são as práticas concretizadas em programas, ações e atividades desenvolvidas pelo Estado direta ou indiretamente, que podem contar ou não com a participação de órgãos públicos ou privados, que visam a assegurar, conforme previsto constitucionalmente, como um direito à cidadania. Essa política que não deveria estar condicionada ao termo público, pois se o Estado governa em prol de cuidar de toda a sua população, ou seja, seu público, já deveria estar subentendido que toda política é pública. Porém, em nosso país ainda é preciso reafirmar esse termo em prol dos benefícios e benfeitorias ao nosso povo. De acordo com Palma Filho (2010, p. 10), 14 14 No campo educacional brasileiro, essas tarefas vêm sendo conclamadas e legalizadas desde a Constituição Federal de 1934, influenciada pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, sobre os princípios que deveriam nortear o funcionamento e a organização do sistema educacional. A legislação que se seguiu a esta e subsidiou a educação, considerada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, foi a LDB n. 4.024, de 20/12/1961. Com a ditadura militar, a legislação educacional mais uma vez foi promulgada (Lei n.5.692, de 11/08/1971), tratando em seu âmago da organização dos ensinos de 1º e 2º graus e refletindo a nova ordem instaurada. Em 1985, novas políticas foram desenvolvidas e promulgadas em prol da redemocratização do Estado brasileiro. Dentre todos os seus avanços, na área da educação, podemos citar as que estão em vigor desde então: • Constituição Federal de 1988; • Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069 de 13/07/1990); • Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394, de 20/12/1996); • Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Ensino Médio(1998); 15 15 • Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (1998); • Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (2013). Dentre tantos documentos que legislam a educação brasileira, os estados e os municípios também possuem mecanismos de normatização de suas modalidades educacionais e contam com legislações específicas, instrumentos normativos e executivos de seu sistema e rede de ensino como estatutos do Magistério e concepções teórico-metodológicas consistentes tendo como finalidade a formação e valorização do magistério e a promoção da educação para a formação do cidadão como sujeito autônomo, participativo e capaz de posicionar-se criticamente diante de desafios e resolvê-los. Vale ressaltar também que num mundo globalizado no qual vivemos Palma Filho (2010) aponta em seus estudos que diversos documentos norteadores de nossa educação provêm de organismos internacionais – como Unesco, Banco Mundial, BID, Fundo Monetário Internacional e outros –, alguns dos quais são determinantes em nossa prática e cotidiano educacional. Um exemplo dessa circulação e apropriação de ideias é a Declaração de Jomtien, intitulada “Educação para Todos” (1990), que passou a ser uma referência para todos os demais países, inclusive para o Brasil. Dentro do que foi apresentado, não podemos deixar de abordar que a produção da política educacional é um processo político no qual as decisões são tomadas atendendo a um viés da ideologia presente em cada sociedade e em cada tempo histórico, compreendendo quem são os seus agentes e quem detém o controle desse processo. Ora pode ser dotado de um conservadorismo, ora pode ser regido pelas leis do mercado, nos quais ambos vão legitimar a ordem social. No Brasil, as políticas públicas vêm abordando uma nova ordem, a qual tenta suprir problemáticas socioculturais vivenciadas tanto em âmbito nacional 16 16 quanto estadual, municipal ou local, realizando por meio de leis, decretos e documentos norteadores a superação da desigualdade, a inclusão de todos nos espaços educacionais, a igualdade entre os gêneros e o respeito pelas diferenças. O entendimento se baseia no fato de que todos estão inseridos em uma sociedade global, tecnológica, e centrada no conhecimento. Essas documentações também levam em conta a natureza humana e seu processo de desenvolvimento nas mais diferentes localidades do nosso país, nas sucessivas etapas devida e em relação aos desafios de cada territorialidade. Desse modo, Ética e educação: a interface família e escola para a formação moral Pensando a moralidade como comportamento para a convivência social, esta deve-se fazer presente em qualquer âmbito. A esse propósito destaca Goergen (2010, p. 68): 17 17 Mas, no cotidiano escolar, principalmente, podemos verificar que a moralidade e a ética, em muitas realidades, ficaram em segundo plano. Por que isso aconteceu? De quem é a culpa? Da escola? Da família? Diante de tantos questionamentos, vamos trabalhar com alguns conceitos que não podem estar ausentes neste debate. Chamo a atenção neste item porque o foco deste estudo não é o de buscar culpados ou culpabilizar algum agente como em tantos discursos presentes em aparelhos midiáticos ou até mesmo em documentos que norteiam a educação. O que buscamos aqui é entender alguns conceitos que possam contribuir na e para a formação de nossas crianças, por meio da parceria entre a escola e a família, entre a ética e a moral como virtudes presentes na essência do que é ser humano. Então vamos lá! Iniciando nossas reflexões, vamos falar sobre a questão do juízo de fato e do juízo do observável. Podemos compreender o juízo de fato como sendo a natureza, a relação do que observamos em nosso meio; de forma geral, são os acontecimentos. Já o juízo de valor implica a avaliação do acontecimento, ou seja, a avaliação do juízo do fato. É nele que implicamos normatizações, julgamentos e em alguns casos até mesmo condenações. Nesse momento, nasce a cultura entre dois campos, entendidos aqui como formas de manifestação da cultura: a moral e o sujeito (virtude). Vamos exemplificar: quase todos os povos foram educados a respeitar as pessoas mais velhas, pois elas possuem mais experiência, sabem lidar com os desafios da 18 18 vida. Agora, imaginemos uma idosa de 70 anos que criou um mecanismo de furtar mercadorias de um supermercado. Podemos citá-la como um bom exemplo da moral e da ética? Recorro a este exemplo diferenciado do exercício pedagógico para demonstrar a dicotomia entre o discurso e a prática da ética. Como julgar nesse caso? Como condenar? Será que essa senhora furtou mercadorias para se alimentar? Será que ela tem algum desvio de conduta? Para tanto, recorremos ao princípio da moral, esta que deve despertar oucriar condições para que os sujeitos se tornem conscientes para refletir com autonomia e em diálogo com os demais. A alteridade deve ser um dos conceitos que devem caminhar junto com a moral e com a ética na e para a formação de seres humanos. A função primordial da escola deve ser a de formar indivíduos conscientes de suas escolhas em regime de colaboração com todos os demais sujeitos que compõem a vida social, assumindo a própria formação e a própria história. Porém, em muitos casos, o que foi construído ao longo do processo educacional foi a escola condenando algumas dessas histórias que os sujeitos trazem para dentro dela e vice-versa: algumas famílias condenando o ensino das escolas. Vamos ilustrar. Uma criança matriculada no primeiro ano da escola faz um questionamento à professora: “Podemos fazer menas lição”. A professora automaticamente corrige a criança: “Não existe ‘menas’, se diz ‘menos’”. A criança, ao retornar ao seu lar, corrige seus membros familiares assim como a professora fez com ela. Muitas famílias respondem às suas crianças: “Só porque tá estudando acha que já sabe tudo!”. Recorro mais uma vez a esse exemplo para podermos ilustrar a importância da relação entre escola e família. Ninguém nesse caso agiu errado; muito pelo contrário, cada um contou com a sua história e com a sua função. Mas, e o pensamento da criança nesse momento, como ficou? 19 19 Goergen (2010, p. 68) aborda duas dimensões para nos auxiliar: Aproveitando o exemplo citado acima, a partir da aquisição de novos valores e de uma nova cultura (forma escolar) é que as unidades educativas e a família deveriam assumir uma nova identidade, pautada não apenas na troca de conhecimentos, mas de valores e de normas que fundamentem e condicionem a liberdade. Mas como fazer com que a família participe de todo esse processo? Neste estudo, vamos entender a família como sendo um conjunto de membros que convivem juntos. Nessa perspectiva, a família não mais constitui- se como sendo papai, mamãe, filhos e animais de estimação, apenas, mas composta pelas diversas formas de organização familiar. Para muitos, essa é uma questão de debate e é neste ponto que proponho mudanças em nossa forma de pensarmos e repensarmos sobre quais são os 20 20 valores essenciais de ser e de ter família. Vale ressaltar que nenhum valor é absoluto e nem eterno, e chegou o momento de repensarmos sobre os valores acerca do que é família. Parafraseando Goergen (2010), é aqui que fazemos o trânsito para a ética. Se a formação moral consiste num processo de passar da heteronomia à autonomia, e se a autonomia é conquistada a partir de um exercício de reflexão, é preciso, então, o recurso à ética para que se realize aquela conquista. Essa ética garante não apenas os meus direitos, mas os direitos dos outros, os quais todos devem respeitar. É por isso que o direito é uma norma, pois nos garante liberdade! Se não há norma, há o poder. Este vem sendo o nosso grande desafio na interface entre escola e família: ensinar a norma e os valores, em vez de satisfazer o poder por meio do atendimento de interesses próprios e individuai s, sendo as razões com o meios para determinados fins, uma racionalidade subordinada de certa forma alienada. Essa racional idade dos meios é denominada de instrumental, conforme define Repa e Pinzan i (2008, p. 19): Deste modo, é preciso que a escola e a família façam um grande investimento em suas próprias estruturas, objetivando os seus papéis, reconhecendo que precisam repensar acerca da “norma” de cada instituição para que possam formar, em parceria, cidadãos autônomos não para atuarem apenas no futuro, mas em nosso tempo, o presente. 21 21 Precisamos romper com a lógica do “burlar” e colocar novamente os limites, pois estes garantem os nossos direitos como seres humanos. Mas, para que isso aconteça, e de acordo com Nóvoa (2010, p. 10): As instituições educacionais como espaço de trabalho As instituições de ensino são concebidas hoje como espaço de trabalho. A formação de cidadãos críticos, detentores de conhecimentos, aptos para atuar no mercado de trabalho e que saibam conviver em sociedade passou a compor as prerrogativas da organização escolar (BRASIL, [s.d.]). Mas afinal, qual o conceito de trabalho? O trabalho tem sua origem na palavra latina tripalium. Tripalium era um instrumento utilizado por agricultores para bater os cereais. Essa atividade de “bater” para separar o alimento foi associada posteriormente às ações de tortura. Por isso, quando falamos em trabalho, fazemos a relação automática entre trabalho e labor, trabalho e tortura. 22 22 Com isso, a própria ação do trabalho não nos remete a situações de alegria; muito pelo contrário, nos revela formas “tortuosas” como cansaço. Nesse quesito, devemos pensar a escola como trabalho e os impactos que geram nas pessoas que nela atuam, os quais perpassam desde a valorização dos profissionais que nela atuam até os alunos os quais usufruem esse espaço, isso sem contar as atividades que nela são produzidas. A partir desde dado, podemos pensar que a escola foi se associando ao desenvolvimento do capitalismo e do processo de burocratização das organizações sociais ao longo de sua estruturação, incluindo as formas relacionais e modos de produção do trabalho que foram historicamente construídos a partir da atribuição de novos significados: • aplicação das forças e faculdades humanas para alcançar determinado fim; 23 23 • atividade coordenada de caráter físico ou intelectual necessário à realização de qualquer tarefa, serviço ou empreendimento; • exercício de atividade, como ocupação, ofício, profissão etc. Com isso, os fundamentos e o cotidiano escolar se reorganizar ampara atender não apenas uma nova forma de aparelhamento, mas de repensar a escola em suas atividades de planejar, comandar, organizar, controlar e coordenar os trabalhos: pedagógico, recursos humanos, burocrático e administrativo. Para tanto, essa reorganização deve subsidiar e sanar a questão da falha e da qualificação, desafios tão constantes na realidade educacional brasileira. Por isso, abrangeremos as instituições educacionais como espaços de trabalho para potencializarmos a prática da gestão da sala de aula e dos demais ambientes educativos. Apresentaremos essas formas de organização seguindo os seguintes critérios: o sistema de organização e a gestão escolar; o sistema de organização da gestão escolar; e a estrutura organizacional de uma escola. O sistema de organização e a gestão escolar Organização, administração e gestão são termos aplicados aos processos organizacionais, com significados muito parecidos. Libâneo (2004, p. 97), descreve o significado de cada termo, da seguinte maneira: 24 24 Seguindo os preceitos de Libâneo, a administração escolar doravante concebida passou a ser gerida pela gestão escolar. Mesmo com a mudança da nomenclatura, os termos ainda perpassam o plano apenas teórico, o que nos leva a refletir que o sistema de organização escolar ainda precisa perpassar a zona de autonomia relativa (limite entre os fatores internos e externos2) em prol do desenvolvimento de um trabalho libertário. O sistema de organização da gestão escolar O estudo da escola como organização de trabalho é realizado desde a década de 1930 e, frequentemente, esteve marcado por uma concepção burocrática, funcionalista, aproximando as características da organização escolar à organização empresarial. De acordo com Libâneo (2004), distinguiremos duasconcepções dos processos de organização e gestão em relação às finalidades sociais e políticas da educação: • Concepção científico-racional – visão burocrática e tecnicista da escola, dá forte peso à estrutura organizacional, à definição rigorosa de cargos 25 25 e funções, à hierarquia de funções, às normas e regulamentos, à direção centralizada e ao planejamento com pouca participação das pessoas; • Concepção sócio crítica – um sistema que agrega pessoas, destacando o caráter intencional de suas ações. A organização escolar é construída pela comunidade educativa, envolvendo professores, alunos, pais (forma de democracia de gestão e de tomada de decisão coletivamente); essa concepção de escola se manifesta em diferentes formas de organização e gestão: concepção técnico-científica; concepção auto-gestionária; concepção interpretativa; e concepção democrático-participativa. Diante de tais concepções, e mesmo ambas tendo que caminhar juntas em todos os momentos da organização desse sistema, o que se busca também é a “alma da escola”, como salienta Vasconcellos (2012) em seus estudos. Essa alma, que dá a vida à instituição, deve trabalhar com três dimensões em seu organograma: o relacionamento interpessoal, o trabalho com o conhecimento e a organização da coletividade. A estrutura organizacional de uma escola O termo estrutura, no caso da escola, tem o sentido de ordenamento e disposição das funções que asseguram o funcionamento de um todo. Toda instituição escolar necessita de uma estrutura de organização interna, geralmente prevista no regimento escolar ou em legislação específica, seja de origem estadual, seja municipal. 26 26 De acordo com Libâneo (2004), a estrutura é geralmente representada por meio de órgãos colegiados e refletem a concepção de organização e gestão adotadas, sendo estes divididos em: • Conselho de escola – atribuições consultivas, deliberativas e fiscais, envolvendo aspectos pedagógicos, administrativos e financeiros; • Direção – o diretor coordena, organiza, auxiliado pelos demais componentes, atendendo às normas e aos regulamentos legislativos. O assistente desempenha as mesmas funções na condição de substituto do diretor; • Setor técnico-administrativo – atividades-meio que asseguram o atendimento dos objetivos e funções da escola: secretaria escolar, zeladoria, vigilância e serviço de multimeios (biblioteca, laboratórios, equipamentos audiovisuais, videoteca e outros recursos didáticos); • Setor pedagógico – atividades de coordenação pedagógica e orientação educacional, englobando: supervisionar, acompanhar, assessorar, apoiar, avaliar atividades pedagógico-curriculares, prestar assistência pedagógica aos professores em suas respectivas disciplinas; • Instituições auxiliares – Associação de Pais e Mestres (APM), grêmio estudantil e caixa escolar vinculadas ao Conselho de escola ou ao diretor; • Corpo docente (função – realizar o objetivo prioritário da escola, o processo ensino-aprendizagem) e corpo discente (constitui-se por alunos e suas associações representativas). O processo de organização escolar dispõe de funções que são propriedades comuns ao sistema organizacional de uma instituição, a partir das quais se definem ações e operações necessárias ao funcionamento. As funções ou elementos da organização e gestão englobam, de acordo com Libâneo (2004): 27 27 • Planejamento – explicitação de objetivos e antecipação de decisões para orientar a instituição; • Organização – racionalização de recursos humanos, físicos, materiais, financeiros, criando e viabilizando as condições e modos para se realizar o que foi planejado; • Direção e coordenação – coordenação do esforço humano coletivo do pessoal da escola; • Avaliação – comprovação e avaliação do funcionamento da escola. Porém, para que toda essa estrutura possa funcionar e trabalhar de maneira acoplada é preciso que três funções dialéticas acompanhem esse organograma: o querer, o agir e o expressar, no qual o trabalho escolar deva ser direcionado para a mobilização da aprendizagem, a construção do conhecimento, a elaboração e expressão da síntese do conhecimento e da análise, por meio de um trabalho mediador em que todos possam enfrentar os desafios do dia a dia escolar. 28 28 As relações da família com a escola no Brasil Tanto a família, como a escola são instituições que passaram por mudanças em nossa sociedade, nos últimos tempos. Não é apenas a família que deve ser posta em análise; a escola, que representa o segundo momento de socialização da criança, também vem sofrendo mudanças, ainda que seja possível pensar que a escola não mudou na mesma proporção que a família. A perspectiva histórica da família atual destaca que as responsabilidades educacionais dos pais frente à escola estão ligadas às transformações culturais ocorridas na sociedade. A escola parece estar substituindo práticas educativas da família, não porque assim deseja, mas porque a família parece não cumprir sua função. A família atual, para Chechia (2002), pode estar incorporando diferentes significados sobre a escola, os quais parecem indicar a possibilidade de um novo perfil para a relação família-escola. 29 29 Os significados históricos e socialmente produzidos nesta relação são subsídios apropriados na construção do universo escolar da criança. Contudo, é fundamental considerar que a cultura da família estabelece um sistema de hábitos instituídos e generalizados em relação à escola, e também é verdade que cada família, de acordo com seus conhecimentos e hábitos, gera diferentes hábitos e conhecimentos aos filhos e estes compartilham originalmente dos valores e atitudes dos pais, valores e atitudes que serão mais tarde substituídos pelos da escola ou com ela compartilhados. De um modo geral, a família pode ser considerada uma instituição com um espaço pelo qual os filhos atingem as expectativas de papel, os valores e as atitudes sociais e educacionais, por meio das relações interpessoais com os pais. Dentro da família se estabelece uma rede de comportamentos, atitudes e valores, e isso permite tanto aos filhos como aos pais, formarem relações positivas ou negativas com a escola. Dessa forma, a escola pode estabelecer uma relação também positiva ou negativa, conforme vivencia as experiências com a família de seus alunos, já que seguramente ela é a segunda instituição mais importante no que tange às relações sociais. Decorrente disso, a escola pode ainda formar conceitos positivos ou negativos da família, ou até mesmo prejulgar as atitudes desta por desconhecer que a família pode parecer igual na composição, mas distinta na ação com a escola. Esse aspecto pode gerar uma crença de que a família não respeita a educação escolar, o que não é fato generalizado, já que em muitas famílias existe o respeito pela escola. Autores como Fraiman (1997) e Nogueira & Nogueira (2002) comentam que a crença de que a família não esteja cumprindo suas metas educacionais parece justificar a preocupação da escola em expandir serviços de bem-estar social. E, como observa Carvalho (2000), é importante chamar a atenção para o alcance da política escolar sobre a família, e especialmente sobre as mães, 30 30 explicitando de que forma ela, a política, articula implicitamente escola e família como instâncias educativas. Um dos pontos fundamentais da relação família-escola é a origem de uma "nova história social" da família, a qual revela uma nova concepção de infância e de educação, que colabora para o surgimento de uma nova família. Por exemplo, o filho,no contexto familiar atual, deixa de ser considerado um pequeno adulto, e passa a ser uma pessoa com novos atributos, com necessidade de brincar, ser amado e compreendido. Essas mudanças de significado na educação familiar também trazem mudanças no significado da educação escolar, uma vez que esta busca resposta para soluções de problemas não- vividos antigamente. Neste momento histórico atual da família, observa-se ainda que a mesma parece alegar despreparo e falta de informação para se envolver nos assuntos escolares. Por um lado, a escola persiste em buscar o envolvimento dos pais; por outro, os pais, de maneira independente das intenções, manifestam, de acordo com suas experiências, formas próprias de lidar com os filhos e respectivas obrigações para com a escola. Na verdade, conforme Perez (2000), família e escola ainda parecem inquietas e perplexas diante dos problemas escolares. Como cita a autora, o modelo de parceria família-escola pressupõe a típica família de classe média, cuja mãe se dedica exclusivamente aos filhos e ao lar. Porém, o fato mais grave é que este modelo de família já não é mais predominante. Decorrente disso, podemos entender que a relação família-escola é um processo complexo e, de acordo com Lareau (1987) o modelo atual de família desenvolve de uma forma intensa a responsabilidade dos pais em relação aos filhos. Para a autora, “estes últimos funcionam como um espelho onde os pais veem refletidos os acertos e erros de suas concepções e práticas educativas, os quais costumam se fazer acompanhar de sentimentos de orgulho ou, ao contrário, de culpabilidade” (p.7). Dessa forma, se a família vem adentrando no 31 31 espaço escolar, a escola também, por sua vez, se introduziu consideravelmente na zona de interação com a instituição familiar. Por conseguinte, os pais assumem muitas responsabilidades em relação à vida escolar do filho. Ainda conforme Lareau (1987) os pais são responsáveis pelos sucessos e insucessos (escolares, profissionais) dos filhos, assumindo a tarefa de instalá-los da melhor forma possível na sociedade. Descreve a autora que, para isso, mobilizam um conjunto de estratégias visando a elevar ao máximo a competitividade e as chances de sucesso do filho, sobretudo face ao sistema escolar, o qual, por sua vez, ganha importância crescente como instância de legitimação individual e de definição dos destinos ocupacionais. Tornando quase impossível a transmissão direta dos ofícios dos pais aos filhos, a atividade profissional passa cada vez mais por agências específicas, dentre as quais a mais importante é, sem dúvida, a escola. Portanto, questionamos até que ponto as atitudes da família com a escola constituem uma parte central na relação família-escola atual? Chechia (2002) e Perez (2007) sugerem que elas estão intimamente ligadas com os valores subjacentes da época, pelos quais valorizam a escola mediante as experiências vividas. Recomendam as autoras que qualquer esforço para mudar a relação família-escola deve levar em conta os valores da família. Além disso, enfatizam uma relação direta entre as atitudes desta e o comportamento que ela realmente adota em determinadas situações escolares. Valores, atitudes e mudança de comportamento da família com a escola pertencem ao modelo atual de vida familiar. O que unifica essa nova relação é o modo que a família trata a vida escolar do filho. Além disso, como relatado anteriormente, tal relação atualmente está intimamente ligada à cultura social da época. Por exemplo, a cultura da família em geral e sua experiência, ensinaram- lhe as maneiras de se relacionar com a escola. Logo, as atitudes, valores e comportamentos familiares com a escola são adquiridos ou aprendidos na sociedade. 32 32 Então, o que na atualidade realmente define tal relação? Garcia e Souza (2004) definiram-na como uma união entre as duas instituições, em que ambas podem receber experiências, avaliar e atuar com base em informação claramente definidas tanto para a família, quanto para a escola. Desse modo, observamos que, na relação família-escola definida pelas autoras, não há interesse pela criança. E ainda relatam que as famílias precisam aprender a linguagem da escola, principalmente a burocrática. A escola precisa entender e aceitar a linguagem da família, na maioria das vezes inculta e rudimentar. Concluem que, no momento em que a família e a escola puderem se perceber e se aceitar, provavelmente, o relacionamento entre elas será bem-sucedido. Pensando como uma construção histórica e social, a relação família- escola no Brasil se traduz, conforme Bertan (2005), na necessidade de se estabelecer as conexões de tais instituições com o contexto histórico, social, político, econômico e ideológico da realidade, porque as maiorias dos recursos humanos, atuantes na rede pública, não se conscientizaram da dimensão abrangente do social. Ainda de acordo com o autor acima, atualmente se processam muitas discussões a respeito de uma gestão democrática da escola pública, da educação, da cidadania e das formas participativas no cotidiano escolar. Bertan (2005, p. 3) relata que “o espaço físico e político passou a ser considerado como local privilegiado para os encontros e os debates desse processo”. Contudo, explica o autor, “a escola ainda não abriu espaços necessários à participação da família, mesmo para aqueles que convivem diariamente no seu interior” (p.3). Conclui o autor que, de certa forma, parece que a escola busca empregar uma estrutura de exclusão do aluno e da família. Quando os pais são chamados à escola, ou quando a buscam voluntariamente, às vezes, são tratados de modo orgulhoso ou com paternalismo, impedindo qualquer possibilidade reivindicatória considerada como algo natural. 33 33 Sendo assim, como podemos determinar o que é mais importante para a relação família-escola, se ao produzimos alguns sentidos para a família, estamos deixando de lado os da escola? Tais indagações causam-lhes, ao mesmo tempo, alívio e tensão, pois é essa a incógnita que permeia a educação escolar dos filhos. Dizemos que nos causa alívio, pelo fato de ser importante refletir e sentir aquilo que provavelmente a escola sente ao receber os pais, mesmo que não compreenda os pressupostos da família; tensão, pelo fato de olharmos a família como um analista que tenta desvendar seus comportamentos e interpretá-la sob um único ponto de vista. Isso significa que a relação família-escola, na atualidade, deve pressupor um novo diálogo. Assim, não se pode mais pensar em uma instituição separada da outra, mas considerar que ambas são distintas em seus valores e atitudes. Dando prosseguimento ao que estamos dizendo, de acordo com Garcia e Souza (2004), as famílias divergem umas das outras quanto a modelos educativos. As autoras narram que “os professores parecem esquecer-se disso quando culpam os pais e a desestruturação familiar pelo fracasso escolar da criança” (p.69). Entre os aspectos mais significativos para a escola está o fato de a mesma considerar a família burguesa o paradigma de família “bem- estruturada”. Entretanto, esse modelo está longe da realidade, principalmente na quase totalidade das famílias de crianças de escola pública. Considerando ainda essa questão do conceito que a escola forma sobre a família, Chechia (2002) relata que a “família parece ser vista como uma instituição importante, mas complexa, por muitas escolas” (p.86). Como relata a autora, atualmente a escola vem julgando a família, por exemplo, pela falta de envolvimento, dentre outros aspectos, sem procurar entendê-la no seu contexto. Outro aspecto importante relatado por Chechia (2002) é o fato de muitos professores acharem mais fácil culpar afamília por aquilo que ela não faz, do que refletir sobre qual é a família do seu aluno, qual o contexto em que vivem os seus membros e como percebem a escola de seus filhos. 34 34 O que é preciso considerar, nessas observações é, se de fato poderíamos dizer se, no discurso da família, a mesma está ou não preocupada com a escola. Ela pode não estar produzindo o valor que a escola espera, mas, ao seu modo, a família considera a escola no âmbito das suas preocupações. A relação família- escola, segundo Perez (2007), tem em si uma carga avaliativa, conforme a atuação de ambas. Por exemplo, é comum observar-se o julgamento da escola sobre uma relação frágil, quando o aluno apresenta insucesso. Já não é tão comum esse julgamento com famílias de alunos com sucesso escolar O envolvimento dos pais na escola Partindo da possibilidade do envolvimento dos pais com a escola, Schargel (2002) faz uma importante observação com relação ao apoio da escola para o envolvimento, descrevendo estratégias que possibilitam o desenvolvimento de uma cultura de envolvimento com a aproximação dos pais, tais como: superação de barreiras - o treinamento da convivência com a diversidade propicia também um ambiente de acolhimento aos diferentes níveis 35 35 de competência e estilos de aprendizagem dos alunos; respeito aos perfis educacionais dos membros da família, em geral, os pais e responsáveis sentem- se distantes da escola por causa das próprias experiências negativas; incentivo à participação ativa com flexibilidade de horário, as escolas podem incentivar a participação dos pais, investigando quando podem participar de reuniões, em vez de somente divulgar os horários que convêm à escola; visitas domiciliares às famílias e aumento e ampliação da comunicação com o uso da tecnologia, as escolas que preenchem a lacuna digital de forma criativa têm condições de prestar maior apoio às famílias. Torna-se assim importante oferecer um serviço por meio do qual as famílias possam ter fácil acesso à escola. Algumas pessoas não sabem ler, daí a importância da comunicação por áudio e vídeo; desenvolvimento de sólida base Lar-Escola- Comunidade. Conclui o autor que é necessário para o desenvolvimento de uma cultura de envolvimento abranger, além dos pais e das famílias, também as comunidades, a partir de projetos de aprendizado de serviço. O envolvimento dos pais com a escola não é um ritual que se reserva apenas para tratar de assuntos escolares relacionados ao desempenho acadêmico, nas reuniões de pais. Ele vai além e, de acordo com Hughes (1999), 36 36 é um modo de participação que inclui vários elementos acerca dos assuntos da escola, os quais permitem desenvolver uma cultura de participação que deve ser vista como um processo permanente de equilíbrio da relação família-escola. Comenta o autor que, quanto mais cedo os pais se envolverem com a escola e com processo educativo do filho, o seu efeito parece ser mais poderoso. Para o autor, o apoio e a participação dos pais são as formas mais importantes para melhorar a escola e o desempenho escolar do filho. Conforme os dados da pesquisa de Hughes (1999), o envolvimento dos pais melhora a freqüência às aulas, a motivação da aprendizagem, a auto-estima e diminui a agressividade do filho. Quanto mais os pais participarem nos assuntos escolares, de uma forma sustentada, em todos os níveis, tais como: administração, tomada de decisões e de supervisões de atividades, levantamento de fundos e assessoramento às tarefas escolares, melhor será o desempenho e adaptação escolar do filho. 37 37 REFERÊNCIAS BASTOS, J. B. (Org.). Gestão democrática – O sentido da escola. 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. BLEGER, J. (1984). Psico-higiene e Psicologia Institucional. Porto Alegre, Artes Médicas. BOMENY, H. 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