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Globalização e Fragmentação no Mundo Contemporâneo A globalização é um processo de integração da economia, e essa integração no pós Segunda Guerra se difere da integração do século XIX pois tem uma característica transnacional. O que difere a globalização da integração imperialista é o fato de que a última é marcada por uma ação francesa, inglesa, alemã – enquanto a globalização não é uma ação estatal – e sim corporativista transnacional (embora essas corporações não devam ser totalmente dissociadas dos territórios em que se inserem, pois elas possuem sim vínculos com territórios). Importante ter em mente que o princípio geográfico da localização NÃO FOI SUPERADO. Suas premissas mudaram com o avanço do meio técnico-científico-informacional, mas não deixou de existir. No mundo globalizado, temos um mundo mais integrado, mas também mais desigual. Observa-se uma tendência de compartimentação generalizada dos territórios. A lógica por trás dessa fragmentação é: os lugares eram distantes uns dos outros; com uma rede globalizada de produção, o que acontece numa certa área muitas vezes é comandado a distância – e assim, passa-se a ter uma desigualdade entre os espaços mais conectados e menos conectados (espaços luminosos/rápidos/fluidos vs. Espaços opacos/lentos/viscosos nos termos de Milton Santos). Uma economia globalizada é aquela com capacidade de funcionar como uma unidade, em tempo real e em escala planetária. Em termos institucionais, destacam-se importantes marcos da globalização: → o mercado financeiro global, uma instituição crucial para a organização e governo da economia mundial; são os mercados financeiros, fortalecidos pela intensa desregulamentação ocorrida a partir da década de 1980, que possibilitam o incrível volume de transações financeiras, com alta lucratividade e especulação, o que leva, inevitavelmente, a instabilidade. → as afiliadas de transnacionais e outros arranjos contratuais entre firmas se tornaram mecanismos ainda mais importantes da organização e da administração da produção industrial e de serviços. → a OMC, que permite a resolução de disputas comerciais entre os países num fórum multilateral, representado potencialmente um elemento-chave na governança global da economia. A economia global continua consistida no comércio, agronegócios, indústria e extração de recursos naturais. Entretanto, a partir dos anos 1980, as finanças e os serviços em geral passaram a ser os principais componentes das transações internacionais. O fato de haver poucas barreiras para a circulação do capital e de haver redes técnico- informacionais que permitam o seu deslocamento quase instantâneo tornam os mercados interconectados e globais. A velocidade e a liberdade na circulação do capital, por outro lado, podem acarretar volatilidades não desejadas, como por exemplo, nas taxas de câmbio, nos preços das commodities e no desempenho das bolsas de valores e mercadoria. Os mercados de bens e serviços também são cada vez mais globalizados. A produção se fragmenta espacialmente para aproveitar as vantagens de cada lugar, pelo menos nos setores mais dinâmicos da economia. Tal fragmentação só é possível graças ao desenvolvimento das tecnologias de informação e transporte, bem como de sofisticadas técnicas gerenciais. Entretanto, há limites para esta produção globalizada, especialmente no campo político. Os mecanismos protecionistas continuam estruturais em muitos países. Tal proteção do mercado interno está ligada a questões geopolíticos, estratégias de desenvolvimento ou mesmo questões de política interna. Os limites no comércio internacional (de mercadorias e serviços) ficaram evidentes com o fracasso da chamada Rodada Doha – fórum de liberalização comercial no âmbito da OMC. Tal fracasso está relacionado justamente a impasses quanto à abertura de mercados internos e uma mostra de que não se pode ignorar a persistência do Estado-nação e a do papel dos governos na definição da estrutura e da dinâmica econômica. Em momento de crise econômica, sobretudo, há uma tendência de recrudescimento do nacionalismo e do protecionismo. Se é possível falar na produção e circulação global de bens e serviços, o mesmo não se pode afirmar sobre o mercado de trabalho. A circulação de trabalhadores é bastante regulada e restrita, restrições estas que buscam manter blindadas as sociedades ricas do fluxo de pessoas de áreas empobrecidas. Mesmo assim, as disparidades de renda entre os países funcionam como um motor para que as pessoas deixem seus locais de origem em busca de melhores oportunidades econômicas nos países mais ricos. Do ponto de vista dos países de origem dos migrantes, o processo reduz a pressão sobre serviços públicos essenciais e, em alguns casos, as remesses de dinheiro destes migrantes podem ser bastante significativas para as economias locais. Milton Santos: Por uma outra globalização – do pensamento único à consciência universal ✓ A globalização como fábula: aquelas coisas repetidas como parte da globalização e que na verdade não são – exemplo: fim das fronteiras, perda de importância do Estado, o mundo como aldeia global, etc. São, para Milton Santos, mitos da globalização. O encurtamento das distâncias não é para todos – a tecnologia não é de todos, ela tem donos e usos. Além disso, a ideia de aldeia global também não se mostra verídica – o mundo se conectou, mas os lugares não acabaram. As pessoas ainda vivem suas vidas, atribuindo mais importância a um ou outro fato – se o mundo fosse realmente uma aldeia global, se saberia de tudo de todos os lugares, e o peso e importância dessas informações seriam os mesmos para todos. As preferências locais também não foram extintas – um exemplo interessante são os lanches do McDonald’s: a franquia é mundialmente localizada, mas possui diferentes lanches que são adaptados às características locais (pão de arroz na China, por exemplo). ✓ O mundo como ele é: aquilo que realmente é a globalização – o que ele denomina como uma “globalização perversa”. O olhar de Milton Santos sobre a globalização é de que ela é excludente – o grau de exclusão está ligado diretamente à ideia de que as técnicas estão a serviço de poucos. Santos define a pobreza incluída (desempregados, que sempre existiu), a marginalidade (pessoas à margem da sociedade – o que também sempre existiu) e a pobreza estrutural globalizada (relacionada à perda de importância de certos setores e também à grande fluidez do capital, que permite que ele se desloque quando as circunstâncias não o são mais tão favoráveis e que exclui parcelas da sociedade e impossibilita que elas melhorem sua renda). ✓ Por uma outra globalização: o mundo como ele pode ser; uma visão marxista de possibilidade de ação. Para Santos, as técnicas (a tecnologia) são apenas ferramentas – elas não fizeram a globalização da forma que é (foram os objetivos capitalistas que fizeram uso dessas técnicas da forma que lhes convinha e guiaram a globalização para esse caminho); dessa forma, é possível fazer uso dessas técnicas com outros objetivos, mais “humanos”. A globalização atual é recente pois depende da tecnologia – seu motor, entretanto, não o é. A tecnologia não é o fim em si, é uma ferramenta – para atingir objetivos que não são inéditos. Milton Santos se preocupa em mostrar como a tecnologia é encomendada pelos agentes da globalização – e como essa tecnologia não está à serviço de todos, mas sim apenas dos que podem pagar, existe desigualdade. A ideia de homogeneidade também não se encaixa na globalização – se existe desigualdade, não pode existir homogeneidade. “Os micro-objetos da eletrônica e da informática demandam localizações adequadas e precisas. Construídos por capitais indivisíveis, esses macrossistemas técnicos exigem, para sua operação eficaz, uma acentuada unicidade de direção.”: esse trecho de Milton Santos nos permite identificar dois aspectos muito importantes: o princípio geográfico da localização não foisuperado – a localização ainda importa; e existe um polo de controle, que cria desigualdades entre os mais ou menos conectados a ele.