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Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX SINDROME EDEMATOSA (OU EDEMIGÊNICA) Edema é que um acúmulo anormal de líquido no espaço intersticial. Líquido este constituído por uma solução aquosa de saís e proteínas plasmáticas em diferentes quantidades, cuja composição varia conforme a causa que o originou. Em sua essência, este conteúdo é originário dos nossos capilares sanguíneos e vasos linfáticos, que estão longe de ser estruturas Impermeáveis - pelo contrário, existe uma hidrodinâmica complexa entre essas estruturas e os tecidos, de modo que todo o liquido que sai da circulação, a princípio também retorna para ela. E para reger esta hidrodinâmica encontramos diversas forças, responsáveis por uma troca equilibrada de líquidos entre os vasos e os tecidos. Podemos dizer que a entrada e a saída de líquido do leito vascular dependem principalmente de dois fatores: • A pressão hidrostática (força exercida pelo sangue contra a parede do vaso), que "empurra" o líquido para fora do vaso. • A pressão oncótica ou coloidosmótica (exercida pelas proteínas plasmáticas que não atravessam a parede vascular), que "puxa” o líquido para o vaso. Observe que a pressão oncótica, exercida principalmente pela albumina, não varia muito, pois a concentração de proteína plasmática é quase constante. Contudo, a pressão hidrostática varia bastante: na porção arteriolar, ela é maior que a pressão oncótica (assim o líquido tende a sair do vaso); enquanto na porção venular, ela é menor que a pressão oncótica (nesta situação o líquido tende a voltar para o vaso). Repare que existem também uma pressão hidrostática e uma pressão oncótica intersticiais, que são bastante próximas na maioria das situações, anulando-se e não influindo significativamente na geração do edema. FISIOPATOLOGIA Forças De Starling E Trocas De Fluido Aproximadamente um terço da água corporal total está confinado no espaço extracelular. Cerca de 75% deste espaço constitui o líquido intersticial, e o restante está no compartimento plasmático. As forças que regulam a disposição dos líquidos entre esses dois componentes do compartimento extracelular são frequentemente conhecidas como forças de Starling. A pressão hidrostática no interior dos capilares e a pressão oncótica no líquido intersticial tendem a promover o movimento de líquido do espaço vascular para o extravascular. Em contraste, a pressão oncótica exercida pelas proteínas plasmáticas e a pressão hidrostática no interior do líquido intersticial promovem a movimentação de fluido para o interior do compartimento vascular. Como consequência, há um movimento de água e solutos difusíveis a partir do espaço vascular na extremidade arteriolar dos capilares. O líquido retorna do espaço intersticial para o sistema vascular na extremidade venosa dos capilares e por intermédio dos vasos linfáticos. Esses movimentos normalmente estão equilibrados, de modo que ocorre uma estabilidade dinâmica entre os volumes dos compartimentos intravascular e intersticial, ainda que ocorra uma grande troca entre eles. Entretanto, caso a pressão hidrostática capilar esteja aumentada e/ou a pressão oncótica esteja reduzida, ocorrerá em seguida um movimento de fluido do espaço intravascular para o intersticial. Edema é definido como um aumento clinicamente aparente no volume do líquido intersticial, que ocorre quando as forças de Starling são alteradas, de modo que exista um fluxo aumentado de líquido do sistema vascular para o interstício. O edema secundário a um aumento da pressão capilar pode resultar de elevação da pressão venosa causada pela obstrução para a drenagem venosa e/ou linfática. Um aumento na pressão capilar poderá ser generalizado, como ocorre na insuficiência cardíaca, ou poderá estar localizado em um membro, quando a pressão venosa estiver elevada devido à tromboflebite unilateral. As forças de Starling também poderão ser desequilibradas quando a pressão oncótica coloidal do plasma estiver reduzida devido a qualquer fator que possa induzir hipoalbuminemia, como quando grandes quantidades de proteína são perdidas na urina, como na síndrome nefrótica, ou quando a síntese estiver reduzida em um estado catabólico grave. Lesão Capilar O edema também pode resultar de lesão do endotélio capilar, que aumenta sua permeabilidade e permite o transporte de proteínas para o compartimento intersticial. A lesão da parede capilar pode resultar do uso de medicamentos, agentes virais ou bacterianos, e traumatismos térmicos ou mecânicos. A permeabilidade capilar aumentada também pode ser consequência de reação de Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX hipersensibilidade e de lesão imunológica. A lesão do endotélio capilar é, possivelmente, responsável pelo edema inflamatório, que em geral não produz cacifo, sendo localizado e acompanhado de outros sinais de inflamação – isto é, rubor, calor e dor. Redução De Volume Arterial Efetivo Em diversos tipos de edema, apesar do aumento no volume do fluido extracelular, o volume efetivo do sangue arterial, um parâmetro que representa o preenchimento do tronco arterial e que efetivamente perfunde os tecidos, encontra-se reduzido. O preenchimento insuficiente do tronco arterial pode ser causado por uma redução de débito cardíaco e/ou resistência vascular sistêmica, por poças de sangue nas veias esplênicas (como na cirrose) e por hipoalbuminemia. Como consequência do preenchimento insuficiente, é acionada uma série de respostas fisiológicas voltadas para restabelecer o volume arterial efetivo normal. Um elemento-chave dessas respostas é a retenção renal de sódio e, portanto, de água, restaurando, dessa forma, o volume arterial efetivo, porém, algumas vezes, também ocasionando ou intensificando um edema. Fatores Renais E O Sistema Renina-Angiotensinaaldosterona O fluxo sanguíneo renal diminuído, característico dos estados nos quais o volume de sangue arterial efetivo está reduzido, é traduzido pelas células justaglomerulares renais (células mioepiteliais especializadas em torno da arteríola aferente) em um sinal para maior liberação de renina. A renina é uma enzima com peso molecular em torno de 40.000 Da que age no seu substrato, o angiotensinogênio, uma α2- globulina sintetizada pelo fígado, para liberar angiotensina I, um decapeptídeo que, por sua vez, é convertido em angiotensina II (AII), um octapeptídeo. A AII possui propriedades vasoconstritoras generalizadas, particularmente nas arteríolas eferentes renais. Esse efeito reduz a pressão hidrostática nos capilares peritubulares, enquanto a fração de filtração aumentada eleva a pressão osmótica coloidal nesses vasos, aumentando, assim, a reabsorção de sal e água nos túbulos proximais, assim como no ramo ascendente da alça de Henle. O sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) atua tanto como um sistema hormonal quanto como um sistema parácrino. A sua ativação leva à retenção de sódio e água e, portanto, contribui para formação de edema. O bloqueio da conversão de angiotensina I em AII e o bloqueio do receptor de AII aumentam a excreção de sódio e água e reduzem vários tipos de edema. A AII que penetra na circulação sistêmica estimula a produção de aldosterona pela zona glomerulosa do córtex suprarrenal. A aldosterona, por sua vez, aumenta a reabsorção de sódio (e a excreção de potássio) pelo túbulo coletor, favorecendo a posterior formação de edema. Em pacientes com insuficiência cardíaca, não só a secreção de aldosterona fica elevada, mas também a meia-vida biológica do hormônio é prolongada, o que reduz o seu catabolismo hepático e eleva, em seguida, o nível plasmático do hormônio. O bloqueio da ação da aldosterona pela espironolactona ou eplerenona (antagonistas da aldosterona) ou pela amilorida (um bloqueador dos canais epiteliais de sódio) em geral induzuma diurese moderada nos estados edematosos. Arginina-Vasopressina A secreção de arginina-vasopressina (AVP) ocorre em resposta a um aumento da concentração osmolar intracelular e, mediante a estimulação dos receptores V2, AVP aumenta a reabsorção de água livre nos túbulos distais e ductos coletores dos rins, aumentando, assim, a água corporal total. A AVP circulante fica elevada em muitos pacientes com insuficiência cardíaca, secundariamente a um estímulo não osmótico associado à diminuição do volume arterial efetivo e à complacência reduzida do átrio esquerdo. Tais pacientes deixam de apresentar a redução normal de AVP com uma redução da osmolalidade, contribuindo para a formação de edema e hiponatremia. Endotelina-1 Esse potente peptídeo vasoconstritor é liberado pelas células endoteliais. Sua concentração no plasma é elevada em pacientes com insuficiência cardíaca grave e contribui para vasoconstrição renal, retenção de sódio e edema. Peptídeos Natriuréticos A distensão atrial leva à liberação na circulação do peptídeo natriurético atrial (ANP), um polipeptídeo; um precursor do ANP de alto peso molecular é armazenado nos grânulos secretores no interior dos miócitos atriais. O peptídeo natriurético cerebral (pré-pró-hormônio BNP) é armazenado primariamente nos miócitos ventriculares e é liberado quando a pressão diastólica ventricular aumenta. ANP e BNP (que é derivado de seu precursor) liberados se ligam ao receptor-A natriurético, que causa: (1) a excreção de sódio e água pelo aumento da taxa de filtração glomerular, inibindo a reabsorção de sódio no túbulo proximal e inibindo a liberação de renina e aldosterona; e (2) dilatação de arteríolas e vênulas antagonizando as ações vasoconstritoras da AII, AVP e estimulação simpática. Portanto, níveis elevados de peptídeos natriuréticos possuem a capacidade de se contrapor à retenção de sódio nos estados hipervolêmico e edematoso. Embora os níveis circulantes de ANP e BNP encontrem-se elevados na insuficiência cardíaca e na cirrose com ascite, os peptídeos natriuréticos não são suficientemente potentes para prevenir a formação de edema. Na verdade, nos estados edematosos, a resistência às ações de peptídeos natriuréticos poderá estar aumentada, reduzindo em seguida a sua eficácia. CAUSAS CLÍNICAS DO EDEMA Um ganho ponderal de vários quilogramas habitualmente precede as manifestações evidentes de edema generalizado, e uma perda ponderal Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX semelhante pela diurese pode ser induzida em paciente levemente edematoso, até que ele alcance seu “peso seco”. Anasarca é um edema maciço e generalizado. Ascite e hidrotórax referem-se ao acúmulo de excesso de líquido no peritônio e nas cavidades pleurais, respectivamente, e são considerados formas especiais de edema. O edema é reconhecido pela persistência de uma depressão da pele após pressão; este é conhecido como edema depressível (cacifo). Em sua forma mais sutil, pode ser detectado pela observação de que, após afastar-se o estetoscópio da parede torácica, a campânula deixa uma reentrância na pele do tórax que permanece por alguns minutos. O edema poderá estar presente quando o anel em um dedo fica mais apertado que antes, ou quando um paciente se queixa de dificuldade em calçar os sapatos, particularmente à noite. O edema também pode ser reconhecido pelo inchaço da face, que é mais aparente nas áreas periorbitais. As quatro principais causas de edema: 1) Elevação da pressão hidrostática capilar, aumentando a saída de líquido do vaso a. Hipervolemia (insuficiência cardíaca, insuficiência renal, etc). b. Obstrução na circulação venosa (cirrose hepática, insuficiência venosa, etc). 2) Redução da pressão oncótica capilar, reduzindo o retorno de líquido para o vaso a. Perda proteica importante (síndrome nefrótica, enteropatia perdedora de proteínas, etc). b. Síntese reduzida de albumina (insuficiência hepática, desnutrição, etc). 3) Aumento da permeabilidade capilar: é o edema associado às inflamações - traumatismos, queimaduras, infecções, reações alérgicas, etc. Geralmente são bem localizados, ao contrário dos anteriores. 4) Distúrbio linfático: pode ser causada por compressão tumoral, filariose (elefantíase), doenças congênitas, ressecção cirúrgica, etc. São também geralmente bem localizados. Edema Generalizado Os distúrbios cardíacos, renais, hepáticos ou nutricionais são responsáveis pela maioria de pacientes com edema generalizado. Em consequência, o diagnóstico diferencial do edema generalizado deve ser direcionado à identificação ou exclusão dessas várias patologias. Edema Localizado Nessa situação, a pressão hidrostática no leito capilar acima da obstrução (proximal) aumenta, de modo que uma quantidade anormal de líquido é transferida do espaço vascular para o intersticial. Como a via alternativa (i.e., os canais linfáticos) também pode estar obstruída ou preenchida no seu nível máximo, ocorre um aumento do volume do líquido intersticial no membro (i.e., ocorre o aprisionamento de líquido no interstício da extremidade). O deslocamento de grandes quantidades de fluido para um membro pode ocorrer em detrimento do volume sanguíneo no resto do corpo, reduzindo, portanto, o volume sanguíneo arterial efetivo e levando à retenção de NaCl e H2O até que o déficit do volume plasmático tenha sido corrigido. O edema localizado devido à obstrução venosa ou linfática pode ser causado por tromboflebite, linfangite crônica, ressecção de linfonodos regionais e filariose, entre outras causas. O linfedema á particularmente intratável porque a restrição de fluxo linfático leva ao aumento da concentração de proteína no fluido intersticial, uma circunstância que agrava a retenção de líquido. Edema Renal Os pacientes com edema devido à insuficiência renal aguda comumente apresentam hipertensão arterial, bem como congestão pulmonar nas radiografias de tórax geralmente na ausência de cardiomegalia, mas podem não desenvolver ortopneia. Os pacientes com insuficiência renal crônica também podem desenvolver edema devido à retenção renal primária de sódio e água. Edema Nefrítico Nas síndromes nefríticas agudas, das glomerulonefrites agudas, por exemplo, que se manifestam com edema, hematúria, hipertensão - sem proteinúria importante (acima de 3,5 g/dia) - a causa fundamental do edema é a redução da taxa de filtração glomerular (TFG). Essa queda da filtração pode ser discreta em alguns pacientes (com creatinina sérica normal), mas pode ser mais grave em outros, sendo que alguns ficam até anúricos (necessitando diálise). O edema é tão mais grave quanto maior for a redução da TFG, pois, como conseqüência desta, ocorrerá uma diminuição muito acentuada da carga filtrada de sódio (solutos) que será ainda mais reduzida após a maior reabsorção tubular desse íon. Assim, a pequena oferta distal de sódio permitirá a reabsorção quase total do Na+ tubular no nefro distal. Cai a excreção renal de sódio e acontece, desse modo, ✓ Edema em região periorbitária, ascite, derrame pleural ✓ Hipertensão acompanhado de encefalopatias e umento DC ✓ Hematúria com cilindros hemáticos ✓ Proteinúria <3g/dia Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX retenção de Na+ (e água, de equilíbrio osmótica). Essencialmente, é um rim com capacidade muito pequena de excreção de Na+. Se fizermos restrição dietética de NaCl (rigorosa), pode não se formar edema - pois equilibrar-se-ia a ingestão com a baixa excreção, sem retenção. Mas se o consumo de sódio for liberal, ocorrerá retenção de Na+ e expansão do volume do extracelular (VEC). Nessas condições, haverá edema e hipertensão arterial. Nos casos de insuficiência renal aguda (necrose tubular aguda) pode haver ou não a formação de edema. Essa doença cursa com destruição dascélulas tubulares e pode evoluir desde oligoanúria até poliúria. Assim, a presença de edema dependerá da associação entre a redução da TFG, a redução na carga excretada de sódio e o aporte de sódio na dieta. Cabe lembrar que a presença de IRA é comum em pacientes críticos, sujeitos a grande aporte de líquidos por infusão parenteral, ricos em sódio, fator que pode levar a expansão do volume extracelular, aumento da pressão hidrostática capilar e edema. Edema Nefrótico Sempre que uma doença renal tiver a presença de lesões específicas da membrana basal glomerular e/ou dos pedicelos das células epiteliais glomerulares, haverá um aumento da permeabilidade glomerular às macromoléculas. Nessas condições, as proteínas plasmáticas são filtradas em grandes quantidades e a perda urinária (proteinúria) ultrapassa 3,5 g/24 h. Clinicamente, manifesta-se por urina espumosa (proteinúria) e edemas. Esse é um quadro que pode estar presente nas manifestações de várias doenças, portanto é chamado de Síndrome Nefrótica. O edema reflete a redução na pressão oncótica do plasma, o que irá acarretar uma menor reabsorção do fluido intersticial, na extremidade venosa do leito capilar. A hipoproteinemia, resultante da perda urinária de proteínas, é agravada pelo catabolismo aumentado da albumina, que acontece na síndrome nefrótica. A redução da pressão oncótica do plasma, resultante da hipoproteinemia, por si só, leva ao aparecimento de edema. Além disso, pode provocar contração do volume intravascular, que pode acarretar redução do débito cardíaco (redução da précarga) e consequente redução da perfusão renal. Esta, por sua vez, leva à ativação do SRAA, reduzindo a excreção renal de sódio. A queda da pressão arterial ou do volume plasmático pode, ainda, estimular a liberação de hormônio antidiurético, que irá provocar retenção de água e hiponatremia. Nessas condições, haverá maior reabsorção de Na+ e de água pelos túbulos renais, com retenção de sódio e água. Quando houver maior atividade antidiurética, poderá ocorrer retenção de água (livre de solutos), que promoverá diluição do extracelular, causando hiponatremia. Esse fluido retido representa um efeito diluidor das proteínas plasmáticas, agravando a redução da pressão oncótica do plasma e reciclando o estímulo à formação de edema. Clinicamente, o edema renal caracteriza-se pela localização facial, particularmente com a presença de edema palpebral - é um edema matinal, que tende a dissipar-se com o correr do dia - além do inchaço de membros inferiores, que (ao contrário) se exacerba com o passar das horas, constituindo um edema vespertino. Pacientes nefróticos com albumina plasmática muito baixa podem apresentar edema generalizado, intenso e extenso (anasarca), inclusive com derrames cavitários (serosites: ascite, derrames pleural e/ ou pericárdico). 1. Uma teoria clássica, chamada de UN-DERFILL, aventa que a proteinúria leva a hipoalbuminemia, queda da pressão oncótica no plasma e extravasamento de líquido para o interstício com contração de volume intravascular. A hipovolemia estabelecida estimula a ativação do sistema reninaangiotensina-aldosterona e/ou do sistema nervoso simpático e/ou da secreção de arginina vasopressina, com consequente retenção de sódio e água. 2. Outra teoria, a do OVERFILL, é de que o mecanismo primariamente alterado seria intrinsicamente renal, mais precisamente em túbulos renais que estariam hiperativos, reabsorvendo primariamente mais sódio e água e levando o paciente a um balanço positivo. Os mecanismos deflagrados para esse aumento primário da reabsorção de sódio seriam mediados por fatores urinários que acompanham a proteinúria. ✓ Edema facilmente compressível concentrado na face com pico durante a manhã e piora em decúbito dorsal ✓ Edema de MMII com pico no fim do dia e piora com a gravidade ✓ Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX Edema Cardíaco Fundamentalmente, o que leva à formação desse edema é a queda do débito cardíaco, em consequência da falência do miocárdio. Como resultado, eleva-se a pressão venosa sistêmica ao mesmo tempo em que se reduz o volume arterial efetivo de sangue (VAES). • Insuficiência cardíaca branda: um pequeno aumento do volume sanguíneo total pode reparar o déficit de volume arterial efetivo por meio da operação da lei de Starling do coração, na qual um aumento no volume diastólico ventricular promove uma contração mais forçada e pode, portanto, manter o débito cardíaco. • Insuficiência renal grave: a retenção de sódio e água continuará, e o incremento do volume sanguíneo irá acumular-se na circulação venosa, aumentando a pressão venosa e causando edema. O volume de sangue, que banha os átrios cardíacos, o ventrículo esquerdo (VE), o arco aórtico, o seio carotídeo e a arteríola aferente renal, é crítico para o controle da volemia, pois esses são segmentos providos de receptores de volume e pressorreceptores que acusam um maior ou menor enchimento do lado arterial da circulação. Desse modo, fala-se em repleção vascular, overfilling, ou depleção vascular arterial, underfilling. Quando se fala em redução do volume arterial efetivo de sangue (VAES), entende- se um enchimento deficiente do leito vascular arterial; expansão do VAES corresponderá a um enchimento supérfluo do leito cardiovascular arterial. Clinicamente, é um edema gravitário por excelência, por causa da pressão venosa elevada nas extremidades e, portanto, acentua-se com a ortostase, no correr do dia (edema vespertino). O reconhecimento da insuficiência cardíaca é relativamente simples devido à pletora de achados físicos e a sua evolução clínica. A presença de uma cardiopatia, manifestada por cardiomegalia e/ou hipertrofia ventricular, junto com evidências de insuficiência cardíaca, tais como dispneia, estertores basais, distensão venosa e hepatomegalia, geralmente indica que o edema resulta de insuficiência cardíaca. Testes não invasivos, como o ecocardiograma, podem ser úteis no estabelecimento do diagnóstico de doença cardíaca. O edema da insuficiência cardíaca ocorre nas porções dependentes do corpo. Assim, em um paciente com edema generalizado, o diagnóstico de insuficiência cardíaca é realizado na presença de história de dispnéia progressiva, que se inicia aos grandes esforços e culmina com ortopnéia; a presença de episódios de dispnéia paroxística noturna; as queixas de nictúria, hemoptise, tosse ou cianose; os antecedentes pessoais de doenças cardíacas (Chagas, doença isquêmica do miocárdio, miocardiopatias, hipertensão arterial e febre reumática entre muitas outras) e aos achados do exame físico (taquicardia com ritmo de galope, 3° bulha, desvio do ictus cordis, estase jugular, estertores pulmonares crepitantes, derrame pleural e hepatomegalia). Edema Cirrótico O processo cirrótico - resposta hepática a vários tipos de agressão que leva à fibrose e regeneração nodular do fígado - afeta a função hepática em consequência do que descrevemos a seguir: a) Alterações do funcionamento dos hepatócitos por causa das lesões celulares (necrose, proliferação), comprometendo, assim, a síntese de albumina. b) Destruição da arquitetura lobular, canalicular e vascular, levando a distorções estruturais, que dificultam o livre fluxo de sangue e linfa nos sinusóides hepáticos - resultado disto é o aumento da pressão no território venoso (portal) e linfático (intrahepático), que se conhece por hipertensão portal. Essa dificuldade de trânsito venoso através do fígado faz com que o sangue busque vias alternativas de tráfego, forçando o aparecimento de circulação colateral venosa, que promoverá um aumento da capacitância (venosa) esplâncnica, acarretando “aprisionamento” de sangue no território mesentérico. Esse sangue, seqüestrado no leito venoso “ampliado”,irá prejudicar o enchimento vascular arterial underfilling, causando redução do volume efetivo de sangue com todas as consequências. c) Formação de shunts arteriovenosos. A insuficiência hepática é acompanhada de um tônus vascular, deslocado para uma condição de relaxamento devido à redução do metabolismo de várias substâncias vasodilatadoras e ao aumento da produção de óxido nítrico. Assim, com a redução da resistência vascular periférica, há redução do VAES e ativação dos 5 mecanismos de controle de volume extracelular no sentido de retenção renal de água e sódio. São sólidas as evidências que mostram uma hiperatividade simpática e a ativação do SRAA, com conseqüente hiperaldosteronismo secundário, em pacientes cirróticos com ascite. ✓ Edema facilmente depressível gravitacional, vespertino acompanhado de congestão pulmonar. ✓ Ortopnéia ✓ Ascite ✓ Derrame pleural. ✓ Hipertensão portal ✓ Grande ascite ✓ Hipoalbuminemia Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX A existência de hipertensão portal torna o território esplâncnico mais vulnerável na presença de hipoalbuminemia, daí a ocorrência de transudação líquida para a cavidade peritonial, formando ascite com maior exuberância nos pacientes cirróticos - que é uma das características clínicas desse tipo de edema. Edema de origem nutricional Uma dieta francamente pobre em proteínas durante um período prolongado pode produzir hipoproteinemia e edema. O último pode ser intensificado pelo desenvolvimento da cardiopatia devida ao beribéri, que também é de origem nutricional, em que múltiplas fístulas arteriovenosas periféricas reduzem a perfusão sistêmica e o volume sanguíneo arterial efetivo, aumentando, desse modo, a formação de edema. O edema pode agravar-se quando indivíduos desnutridos recebem pela primeira vez uma dieta adequada. A ingestão de mais alimentos pode aumentar a quantidade de NaCl ingerida, retida em conjunto com a H2O. O chamado edema da realimentação também pode estar relacionado com um aumento da liberação de insulina, que aumenta diretamente a reabsorção tubular de Na+. Além da hipoalbuminemia, a hipopotassemia e o déficit calórico podem estar envolvidos no edema da desnutrição. Outras causas de edema Estas causas incluem o hipotireoidismo (mixedema) e o hipertireoidismo (mixedema pré-tibial secundário à doença de Graves), cujo edema é liso e devido à deposição de ácido hialurônico e, na doença de Graves, infiltração linfocítica e inflamação; ao hiperadrenocortismo exógeno; à gravidez; e à administração de estrogênios e vasodilatadores, em particular as dihidropiridinas, como a nifedipina. • Mixedema Não é edema propriamente dito. É o acúmulo de polissacarídeos. Causa edema generalizado ou pálpebras, face dorso da mão, língua, pleura e pericárdio. E tem como principal causa: hipotireoidismo. Hipotireoidismo: Edema duro, não depressível; Edema de face e pálpebras; Fraqueza; Pele fria, seca, amarelada e grossa; Letargia; Fala arrastada; Sensibilidade ao frio; Diminuição da sudorese; Língua grossa; Diminuição da memória; Constipação. • Edema Alérgico – Angioedema Edema por liberação de histamina e outros mediadores imunológicos. O principal sintoma da urticária é a comichão, mas o angioedema não costuma provocar comichão. Embora a urticária possa causar perturbação pela comichão e pelo seu aspeto, não tem efeito direto na saúde geral. Em casos raros, o inchaço do angioedema pode afetar a língua ou a garganta, causando dificuldade em respirar ou engolir. Isto pode causar alarme, mas raramente põe a vida em risco. • Edema Por Estase Venosa → Varizes: edema localizado, mole no início, endurecido com a evolução, pálido ou escurecido, indolor, temperatura da pele normal. → Flebites: edema localizado, elástico, doloroso, com a pele lisa, brilhante, eritematosa e quente. → Trombose venosa: localizado, mole, intenso, pele pálida ou cianótica, doloroso. ABORDAGEM Grande parte dos pacientes que se apresentam com síndrome edemigênica já têm um diagnóstico estabelecido e o edema nada mais é do que um componente de menor importância. Contudo, para aqueles que se apresentam com edema a esclarecer, podemos iniciar a investigação a partir da classificação do edema, que pode ser: Generalizado (anasarca) x localizado Os edemas localizados tendem a ser de origem mais vascular (ex.: venoso, linfático) ou alérgica, enquanto os generalizados tendem a ser de grandes doenças sistémicas (ex.: ICC, nefropatia). Agudo x crônico No agudo, se unilateral, pensaremos sempre na trombose venosa profunda (TVP), quando geralmente é doloroso, estando indicado, de imediato, um Doppler para confirmação diagnóstica. Quando bilateral, pode indicar IVD, hepatopatia ou nefropatia descompensadas. No crônico, se unilateral, as principais considerações são a IVC e a doença arterial periférica (insuficiência arterial). Nesta última, o edema se associa à dor intensa (principalmente ao caminhar), atrofia e brilho cutâneo, redução da pilificação e úlcera de fundo limpo. Se bilateral, além das causas já citadas (cardiológica, renal e hepática), devemos pensar em linfedema, particularmente naqueles edemas sem formação de cacifo à compressão. O sinal do cacifo, também chamado de sinal de Godet, é um achado semiológico clássico, caracterizado pela presença de uma depressão quando uma área de edema é comprimida contra uma estrutura mais rígida (ex.: crista tibial). Um edema sem cacifo indica obstrução linfática ou hipertireoidismo (mixedema gré-tibial). No primeiro caso, um edema mais rico em proteína e que não consegue escapar para Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX os línfálicos seria o responsável. No segundo caso, seria o acúmulo de glicosaminoglicanas. Mas veja o raciocínio contrário e que pode nos surpreender na vivência clínica: um edema linfático poderia vir acompanhado do sinal do cacifo também. Na verdade, apenas o linfedema crônico não cursa com este achado - nos linfedemas de instalação recente (1 mês) pode haver cacifo, pois ainda estaria em formação. Assim, mesmo que ocorra obstrução linfática importante, o liquido ainda teria para onde se distribuir no interstício, gerando um discreto cacifo à digitopressão. Periférico x pulmonar No edema periférico, o local de desenvolvimento é bastante influenciado pela gravidade - assim, em pacientes que andam, localiza-se preferencialmente nos pés e aumentam durante o dia. Em acamados, predomina na região sacra. A síndrome nefrótica, por sua vez, apresenta-se geralmente com edema periorbitário peculiar. No edema pulmonar, embora sempre se lembre da ICC, não se pode esquecer do renal crônico e retenção volêmica importante ou mesmo do paciente séptico com síndrome da angústia respiratória aguda (SDRA), que possui uma alteração da permeabilidade vascular. Derrames cavitários É o caso de derrames compartimentalizados, como o pleural, pericárdico, articular e peritoneal. Normalmente, possuem uma abordagem específica, como é o caso da utilização dos critérios de Light ou do gradiente de albumina soro-ascite. Cor, espessura e sensibilidade da pele são significativas. • A hipersensibilidade local e o calor sugerem inflamação. • A cianose local pode significar obstrução venosa. • Nos indivíduos que apresentaram episódios repetidos de edema prolongado, a pele nas áreas acometidas pode ficar espessada, endurecida e, com frequência, avermelhada. • A estimativa da pressão venosa é importante na avaliação do edema. Em geral, um aumento generalizado significativo da pressão venosa pode ser reconhecido pelo ângulo em que as veias cervicais se colapsam. • Nos pacientes com obstrução da veia cava superior, o edema limita-se à face, ao pescoço e aos membros superiores, nos quais a pressão venosa se mostra elevada em comparaçãocom a dos membros inferiores. • A insuficiência cardíaca grave pode causar ascite, que pode ser distinguida da causada por cirrose hepática por meio da pressão venosa jugular, geralmente elevada na insuficiência cardíaca e normal na cirrose. • A determinação da concentração sérica de albumina ajuda sobremodo na identificação dos pacientes em que o edema se deve, pelo menos em parte, à diminuição da pressão oncótica intravascular. • A presença da proteinúria também fornece indícios importantes. A ausência de proteinúria exclui a síndrome nefrótica, mas não as causas não pro- teinúricas de insuficiência renal. A ocorrência de uma proteinúria leve a moderada é a regra nos pacientes com insuficiência cardíaca. A insuficiência cardíaca já teve diversas definições conceituais diferentes - nenhuma, até hoje, conseguiu resistir ao teste do tempo. Cada vez mais se descobre novos detalhes acerca de suas possíveis vias etiopatogênicas, demandando constantes atualizações em sua definição formal. Não obstante, de maneira bem simples, podemos raciocinar assim: a principal função do coração é ejetar o sangue na quantidade necessária para suprir a demanda metabólica do organismo. Antes, no entanto, o coração precisa se encher de sangue! Logo, a insuficiência cardíaca pode ser definida da seguinte forma: Insuficiência Cardíaca (IC) é a síndrome clínica decorrente de alterações estruturais e/ou funcionais do coração que resultam em prejuízo ao seu enchimento e/ou esvaziamento de sangue, gerando aumento nas pressões intracavitárias que Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX culminam em congestão venocapilar pulmonar e/ou venosa sistêmica, além de poder cursar com baixo débito cardíaco e má perfusão orgânica. Dizemos que ela é crônica quando sua evolução é gradual ao longo do tempo. A IC crônica é subdividida em dois grupos: (1) IC com fração de ejeção normal do ventrículo esquerdo (FE ≥ 50%), a ICFEN; (2) IC com fração de ejeção reduzida do ventrículo esquerdo (FE < 40%), aICFER. Os termos ICFEN e ICFER substituíram os antigos termos insuficiência cardíaca "diastólica" e "sistólica", respectivamente. Pacientes com fração de ejeção entre 40-49% possuem FE borderline ou limítrofe/intermediária, e muitos autores os enquadram no conceito de FE normal ou "preservada" (ICFEN). O termo insuficiência cardíaca "congestiva" (ICC) também vem sendo abandonado, pois nem todo portador de IC apresenta franca congestão cardiocirculatória (nas fases iniciais a doença é assintomática, mas já deve ser identificada e tratada, a fim de evitar sua progressão). EPIDEMIOLOGIA Estima-se que, em média, 1-2% da população apresente IC, notando-se um aumento exponencial na prevalência com o avançar da idade (até 10% em pessoas > 65 anos). No Brasil, ela representa a principal causa de hospitalização por doença cardiovascular, e a terceira causa geral de internação em idosos. A mortalidade, num episódio de IC descompensada, gira em torno de 5-15%. A IC incide mais em homens, porém, a prevalência é igual entre os sexos, devido à maior expectativa de vida das mulheres! Dados recentes sugerem que a prevalência mundial de IC está aumentando, principalmente porque seus portadores estão vivendo por mais tempo em função de melhorias no tratamento das doenças de base (ex.: coronariopatia, valvopatias, arritmias). ICFER e ICFEN apresentam mais ou menos a mesma prevalência, isto é, cada uma responde por cerca de 50% dos casos. Alguns autores, no entanto, afirmam que a ICFER é um pouco mais prevalente, representando quase 60%. A prevalência do subgrupo com FE borderline não é bem definida. FISIOPATOLOGIA FISIOLOGIA Antes de estudarmos a fisiopatologia da IC vale a pena relembrar rapidamente alguns conceitos básicos de fisiologia. Diástole é a fase de enchimento ventricular, e Sístole é a fase de ejeção do sangue. Ao término da diástole tem-se o Volume Diastólico Final (VDF), cujo valor normal, no Ventrículo Esquerdo (VE) de um adulto, vai de 80-150 ml (média = 100 ml). O VE saudável, com boa complacência de seus tecidos e relaxamento miocárdico normal, consegue acomodar este volume mantendo uma baixa Pressão Diastólica Final (PDF) ou "pressão de enchimento" (entre 8-12 mmHg). Na sístole (isto é, a cada batimento), cerca de 60 ml (VR: 40- 100 ml) são ejetados. Este é o débito sistólico. O volume remanescente no interior do ventrículo logo após o término da sístole é o Volume Sistólico Final (VSF). O débito cardíaco (fluxo de sangue que o coração bombeia por minuto, ou "volume-minuto") é determinado pelo produto da frequência cardíaca com o débito sistólico: DC = FC x DS. Seu valor normal, no adulto, vai de 4.5 a 6.5 l/min. Se dividirmos o DC pela área de superfície corpórea teremos o Índice Cardíaco (VR: 2.8-4.2 l/min/m²). Fração de Ejeção (FE) representa o percentual do VDF ejetado pelo DS, ou seja: FE = DS/VDF x 100. Seu valor normal, de forma prática, vai de 50-70%. O DS é determinado por três parâmetros independentes (quer dizer, mudanças em qualquer um deles podem alterar o DS independentemente dos demais): 1. Pré-carga; 2. Contratilidade; 3. Pós-carga. O termo pré-carga ventricular se refere essencialmente ao VDF. Este é determinado pelo retorno venoso (fluxo de sangue ao coração durante a diástole), o qual, por sua vez, é determinado pela volemia (volume de sangue no interior do sistema vascular). A Lei de Frank-Starling do coração estabelece que o DS aumenta em proporção à pré-carga ventricular. Quanto maior a pré-carga, maior a distensão dos sarcômeros (unidades contráteis) nas fibrilas miocárdicas. Com os sarcômeros distendidos, miosina e actina deslizam entre si, afastando-se. Estas são as proteínas responsáveis pela formação ativa (com gasto energético) das "pontes cruzadas" que geram a força mecânica da contração. Assim, a distensão do sarcômero cria mais "oportunidades" para a interação entre miosina e actina, permitindo maior geração de força. No entanto, se o sarcômero distender de forma excessiva, miosina Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX e actina terão dificuldade para interagir, e a força contrátil diminui. Assim, a relação entre pré-carga e DS é ascendente até certo ponto! A partir dali o aumento da pré- carga passa a ser deletério, isto é, faz o DS (e consequentemente o DC) despencar. Contratilidade miocárdica (inotropismo) é um termo que se refere à modulação da geração de força pelo miocárdio. Dito de outro modo, representa a variabilidade na eficiência energética da contração para um mesmo grau de estiramento da fibra muscular (ou seja, a fibra pode gerar mais ou menos força com a mesma Pré- Carga). A Contratilidade é determinada por vários fatores, a maioria deles modificando a quantidade de Ca²+ liberada a partir do retículo sarcoplasmático para o citoplasma do cardiomiócito. Um de seus principais determinantes é o tônus adrenérgico (estimulação de receptores β1 cardíacos). Tais receptores estão ligado à proteína G, que estimula a enzima adenilato ciclase, cuja atividade aumenta os níveis de AMP cíclico intracelular. O AMPc ativa uma série de proteínas dentro da célula, estimulando a liberação de Ca²+ no citoplasma e as interações entre miosina e actina nos sarcômeros, ou seja, aumenta o uso de energia para a geração de força. Bloqueadores de canais de Ca²+ e descargas vagais (parassimpáticas) exercem efeito contrário, isto é, diminuem o inotropismo e a eficiência da bomba cardíaca, reduzindo o DS e o DC para um mesmo grau de pré-carga ventricular. Pós-carga ventricular é um termo que se refere a tudo aquilo que promove resistência à ejeção de sangue do ventrículo. Seu principal determinante é o grau de vasoconstrição das arteríolas periféricas, mas fatores como estenose da valva aórtica e rigidez da parede da aorta tornam-seimportantes emalgumas doenças. O aumento da pós- carga diminui o DS e, consequentemente, o DC. A dilatação ventricular exagerada também produz aumento da pós-carga, por dificultar a ejeção de sangue devido a uma questão geométrica. O que acontece nesses casos é um aumento na tensão da parede ventricular (T). Para se contrair, o ventrículo tem que vencer a tensão intrínseca de sua parede. Os determinantes de T são expressos pela Lei de Laplace. Esta diz o seguinte: a tensão da parede ventricular é diretamente proporcional ao raio da cavidade e à pressão intracavitária, e inversamente proporcional à espessura do miocárdio. É por isso que a Hipertrofia do Ventrículo Esquerdo (HVE) representa uma forma de adaptação do coração: o aumento na espessura do ventrículo (à custa de uma hipertrofia dos cardiomiócitos) reduz a tensão em sua parede reduzindo a pós-carga e facilitando a ejeção de sangue, o que ajuda a manter o débito cardíaco dentro da normalidade após um insulto estrutural/funcional (ex.: HAS, estenose aórtica, perda de miócitos após IAM). Obviamente, a própria HVE acaba sendo deletéria: diminui a complacência ventricular, o que aumenta a pressão de enchimento (causando congestão a montante), além de constituir substrato arritmogênico pela desorganização da citoarquitetura tecidual. A hipertrofia pode ser concêntrica (com diminuição da cavidade) ou excêntrica (com preservação ou aumento da cavidade). FISIOPATOLOGIA ICFER Esta é a forma cuja fisiopatologia é mais bem compreendida. Tudo começa após um evento índice (ex.: IAM, cardiotoxicidade, expressão de mutações genéticas) levar à perda de cardiomiócitos (alteração estrutural) ou à perda da habilidade dos cardiomiócitos em gerar força mecânica (alteração funcional), isto é, de um modo ou de outro diminui a capacidade do ventrículo esquerdo em bombear sangue para o corpo. Dependendo da rapidez e extensão do dano inicial, o paciente já pode se tornar sintomático ou permanecer assintomático graças a mecanismos compensatórios eficazes. Diversos sistemas neuro-hormonais são ativados em resposta ao dano miocárdico/queda do débito cardíaco. Em muitos casos o débito cardíaco se recupera e consegue ser mantido numa faixa homeostática, assim permanecendo por período variável (meses a anos). Os principais sistemas neuro- hormonais compensatórios são: (1) sistema adrenérgico (a queda na função sistólica é “sentida” por barorreceptores localizados no próprio coração, arco Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX aórtico e bulbos carotídeos, que ativam reflexamente o sistema nervoso simpático levando à secreção de catecolaminas); (2) sistema renina-angiotensina- aldosterona (a menor distensão da arteríola aferente do glomérulo, bem como o próprio sistema adrenérgico, estimulam a secreção de renina pelo aparelho justaglomerular); (3) sistema de citocinas (substâncias cujos níveis aumentam para contrabalançar a ativação dos dois sistemas anteriores, originadas em vários tecidos, incluindo o próprio coração). Os principais modos pelos quais os referidos sistemas conseguem restaurar temporariamente a função sistólica ventricular são: (1) o aumento do tônus adrenérgico estimula a frequência cardíaca (cronotropismo) e a contratilidade (inotropismo) dos cardiomiócitos funcionantes, além de promover vasoconstrição arteriolar periférica, mantendo a pressão arterial; (2) a maior reabsorção renal de sal e água em resposta à aldosterona e à angiotensina II (que também é vasoconstritora) aumenta a volemia e o retorno venoso e, consequentemente, a pré-carga ventricular, o que pela Lei de Frank-Starling faz aumentar o débito sistólico; (3) as citocinas exercem ação vasodilatadora, contrapondo-se à tendência vasoconstritora imposta pelo excesso de catecolaminas e angiotensina II, preservando a ejeção de sangue do ventrículo esquerdo (manutenção da pós- carga), além de promover efeito natriurético evitando uma congestão cardiocirculatória exagerada. Dentre os membros do "sistema de citocinas" destacamos: (1) peptídeos natriuréticos, como ANP (peptídeo atrial natriurético) e BNP (peptídeo cerebral natriurético); (2) bradicinina; (3) óxido nítrico ; (4) prostaglandinas vasodilatadoras, como PGI2 (prostaciclina). Os peptídeos natriuréticos são produzidos no coração (ANP nos átrios e BNP nos ventrículos), e os demais no endotélio vascular. Os peptídeos natriuréticos e a bradicinina são degradados por uma enzima chamada neprilisina, que atualmente se tornou um importante alvo terapêutico no tratamento da ICFER! Por mecanismos pouco compreendidos, a resposta do sistema de citocinas diminui com o avançar do dano miocárdico. A inibição farmacológica da neprilisina aumenta os níveis de substâncias vasodilatadoras e natriuréticas, restaurando a eficiência deste importante sistema compensatório, o que facilita o desempenho sistólico do coração. Seja como for, havendo ou não sintomas inicialmente, a ativação ininterrupta dos sistemas neuro-hormonais compensatórios culmina no processo de REMODELAMENTO CARDÍACO. Este decorre do efeito tóxico direto da exposição excessiva e prolongada dos cardiomiócitos a substâncias como adrenalina, angiotensina II e aldosterona. Sobrevém lesão adicional (secundária) do miocárdio, com piora da capacidade contrátil e HIPERativação dos sistemas neuro-hormonais compensatórios. Cria-se, assim, um ciclo vicioso. O excesso de adrenalina, angiotensina II e aldosterona lesa os cardiomiócitos, promovendo num primeiro momento hipertrofia compensatória, mas, posteriormente, sérios prejuízos funcionais e estruturais, como por exemplo: (1) disfunção contrátil (desequilíbrios na transcrição gênica levam ao desacoplamento entre excitação-contração, dessensibilização dos receptores β -adrenérgicos, enfraquecimento do citoesqueleto e diminuição do metabolismo energético da célula); (2) necrose/apoptose/autofagia dos cardiomiócitos; (3) substituição da matriz extracelular organizada por um arcabouço fibrótico irregular que não provê sustentação estrutural para uma adequada atividade contrátil, além de diminuir a complacência tecidual (o ventrículo fica "duro"). O coração se dilata, alterando sua geometria (cujo formato se torna cada vez mais esférico e com paredes cada vez mais finas), o que reduz seu desempenho mecânico. Outro fenômeno (que também diminui a função de bomba) é a insuficiência mitral secundária, devido à dilatação do anel mitral e perda da coaptação dos folhetos valvares. Cumpre ressaltar que o aumento dos referidos mediadores é igualmente tóxico para o sistema vascular periférico. Assim como os cardiomiócitos o endotélio também sofre, surgindo DISFUNÇÃO ENDOTELIAL. Com isso, sobrevém uma tendência generalizada de: (1) vasoconstrição; (2) hipertrofia do músculo liso na parede vascular; (3) estado pró-trombótico. O resultado é um distúrbio adicional de remodelamento da macro e microvasculatura, o que potencializa a disfunção isquêmica de múltiplos órgãos e tecidos. Sem tratamento o paciente evolui inexoravelmente com declínio da função sistólica, à custa de dilatação cardíaca progressiva e aumento nas pressões de enchimento, surgindo sinais e sintomas de congestão (inicialmente venocapilar pulmonar e, depois, congestão venosa sistêmica), baixo débito cardíaco (astenia, fraqueza, tonteira), terminando em óbito por morte súbita (geralmente taquiarritmias ventriculares, cujo substrato é a fibrose miocárdica que predispõe ao fenômeno de reentrada, especialmente na vigência de aumento do tônus adrenérgico) ou falência circulatória refratária. Outro sistema neuro-hormonal ativado pela queda do débito cardíaco por intermédio dos barorreceptores circulatórios é a secreção não osmótica de ADH (vasopressina). Este hormônio induz vasoconstrição periférica (atuando em receptores V1 presentes no músculo lisoda parede arterial), além de retenção renal de água livre (atuando em receptores V2 no túbulo coletor do néfron). A importância de tal sistema é que quanto mais grave for a queda do débito cardíaco maior será a secreção de ADH, causando hiponatremia. Assim, a hiponatremia (geralmente leve/moderada e assintomática por si só) serve como marcador de mau prognóstico na ICFER, por refletir a piora da função sistólica do ventrículo esquerdo! Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX ICFEN Pouco se sabe sobre os mecanismos fisiopatogênicos da ICFEN. As evidências apontam para a participação de fatores cardíacos (ex.: disfunção diastólica, por diminuição da complacência do tecido miocárdico e deficit de relaxamento ventricular) e extracardíacos (ex.: rigidez vascular periférica, disfunção renal) em sua gênese. Aqui o ventrículo esquerdo não se dilata, mas em geral sofre hipertrofia concêntrica, com grande aumento nas pressões de enchimento. Ao contrário da ICFER, onde o tratamento previne o remodelamento cardíaco e consegue prolongar a sobrevida do paciente, para a ICFEN até o momento não existe uma estratégia terapêutica que comprovadamente reduza a mortalidade!!! O que se faz é apenas o tratamento das doenças de base (ex.: HAS, dislipidemia, diabetes mellitus), aliado ao controle dos sintomas (ex.: diureticoterapia para alívio da congestão pulmonar). FATORES DE RISCO Fatores de risco para IC com fração de ejeção do ventrículo esquerdo preservada (FEVEp), têm-se idade, sexo feminino, obesidade, hipertensão arterial, diabete melito, doença coronariana, doença renal e estenose aórtica. Para a IC com FEVEr tem-se idade, sexo masculino, hipertensão arterial, doença coronariana, aterosclerose, diabete melito, obesidade, doença valvar, reação sorológica positiva para doença de Chagas, abuso de álcool/cocaína, uso de cigarro, dislipidemia, doença renal crónica, história de cardiomiopatia familiar, síndrome metabólica, albuminúria, quimioterapia para câncer, anemia, ephedra/tiazolidinediona, apneia do sono, vida sedentária, situação econômica desfavorável, estresse psicológico, características genéticas, frequência cardíaca elevada e aumento dos níveis de homocisteína. O carro-chefe é a dispneia (sensação subjetiva de falta de ar), inicialmente aos esforços, progressiva e, por fim, em repouso. Sua gênese é multifatorial, podendo ser encontradas isoladamente ou em conjunto em outras doenças e situações, como doença de Parkinson, seqüela de acidente vascular cerebral, demência/déficit cognitivo, anemia, hipotireoidismo, hipertireoidismo, síndrome da fadiga crônica, doença pulmonar crônica obstrutiva, outras patologias pulmonares, obesidade, doença hepática, hipertensão pulmonar, infecção, insuficiência renal, tromboembolismo pulmonar agudo e crônico, síndrome da imunodeficiência adquirida, senilidade e retenção hídrica. A presença de ortopnéia e dispnéia paroxística noturna, apesar de não serem patognomônicas, são sintomas mais específicos de IC. Dor torácica e palpitação são também queixas comuns. A dor torácica pode ser de característica anginosa, atípica ou ventilatório-dependente. A maior pressão de enchimento do ventrículo esquerdo (PDF) é transmitida retrogradamente para o átrio esquerdo e, daí, para as veias pulmonares, que vale lembrar não possuem valvas que impeçam o refluxo de sangue! A microcirculação pulmonar (no seu “lado” venocapilar) sofre aumento da pressão hidrostática causando transudação de líquido para o interstício pulmonar e alvéolos (edema pulmonar). Receptores J justacapilares são ativados pela diminuição da complacência pulmonar secundária ao edema, e contribuem para a percepção do sintoma. Além disso, o distúrbio vascular generalizado que acompanha a IC (remodelamento da macro e microcirculação) afeta os músculos respiratórios, favorecendo sua fatigabilidade! Com frequência (ex.: pela coexistência de desnutrição e/ou doença renal crônica) o paciente possui anemia, o que também diminui o limiar para o surgimento de dispneia. Ortopneia é a dispneia que surge com o decúbito dorsal, sendo uma queixa mais tardia na evolução da doença e que possui relativa especificidade para IC (na ausência de obesidade mórbida, ascite volumosa e/ou DPOC avançada, ortopneia indica IC até prova em contrário). Seu mecanismo é o aumento do retorno venoso ao decúbito (a partir dos membros inferiores e circulação esplâncnica), o que aumenta a pressão de enchimento do VE e agrava a congestão venocapilar pulmonar de forma rápida. O paciente obtém alívio com elevação da cabeceira (para dormir ele utiliza mais de um travesseiro, ou dorme sentado). Uma forma mais dramática de expressão destes mesmos fenômenos é a Dispneia Paroxística Noturna (DPN), na qual o paciente desperta 1-3h após se deitar, apresentando intensa tosse e falta de ar, com necessidade de se levantar da cama para melhorar. Diferentemente da ortopneia, onde a ortostase alivia de imediato a dispneia, na DPN o sintoma persiste por alguns minutos mesmo após o paciente se levantar. A piora aguda da função do VE, por qualquer motivo, pode desencadear Edema Agudo de Pulmão (EAP), um súbito agravamento da congestão pulmonar que pode evoluir com insuficiência respiratória aguda. Causas comuns no portador de ICFER são: (1) síndrome coronariana aguda; (2) aumentos súbitos da pós-carga, como na vasoconstrição periférica pelo uso inadvertido de simpatomiméticos; (3) arritmias, como a fibrilação atrial aguda – na fibrilação o miocárdio atrial não se contrai de forma organizada, “sobrando” mais sangue no interior do átrio esquerdo Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX de modo a aumentar a congestão venocapilar pulmonar. Além disso, na presença de taquicardia, o tempo de enchimento diastólico do VE diminui, o que também faz “sobrar” mais sangue no átrio esquerdo. Na maioria das vezes a IC afeta inicialmente o VE, causando a já citada congestão venocapilar pulmonar. O lado arteriocapilar da circulação pulmonar “reage”, primeiramente com vasoconstrição e, depois, com remodelamento (hipertrofia do músculo liso na parede das arteríolas). O estreitamento luminal aumenta a resistência vascular pulmonar, o que sobrecarrega o VD por aumento de pós-carga, elevando suas pressões intracavitárias. Com o tempo, o VD desenvolve insuficiência sistólica, tal qual o VE, e o quadro passa a ser de insuficiência biventricular. Curiosamente, a dispneia costuma diminuir neste momento, pois o VD bombeia menos sangue para os pulmões, de modo que a pressão hidrostática nos capilares alveolares diminui, reduzindo a transudação de líquido e o edema pulmonar. Pode surgir insuficiência tricúspide, pela dilatação do anel valvar e má coaptação de seus folhetos, o que diminui ainda mais o débito sistólico do VD. Assim, na evolução de uma Insuficiência Ventricular Esquerda (IVE), o quadro inicialmente marcado por sinais e sintomas de congestão pulmonar acaba se transformando num quadro com sinais e sintomas mais proeminentes de congestão venosa sistêmica (ex.: TJP, hepato megalia , derrame pleural, ascite, edema de membros inferiores). Outro sintoma cardinal da IC é a fadiga, cuja origem é igualmente multifatorial. A disfunção generalizada da musculatura esquelética devido ao remodelamento vascular predispõe à atrofia e fatigabilidade. A anemia, quando presente, é outro fator contribuinte. Por fim, a própria queda do débito cardíaco, ao hipoperfundir a musculatura, reduz a capacidade dos músculos em gerar energia. Tudo isso, aliado ao sedentarismo do doente (que intuitivamente tenta evitar a ocorrência de sintomas), à desnutrição (anorexia e má-absorção intestinal por congestão venosa do tubo digestivo), e ao estado inflamatório sistêmico que acompanha a disfunção endotelial (com aumento de citocinas como o TNF-alfa, que estimulao catabolismo tecidual), contribui para a perda de massa muscular, que pode culminar no estado de caquexia cardíaca. Queixas gastrointestinais são comuns, seja pela hepato megalia congestiva (dor no quadrante superior direito do abdome; anorexia, náuseas e saciedade precoce por restrição ao enchimento gástrico), seja pelo edema da parede intestinal (dor e distensão abdominal, má absorção de nutrientes e agravamento da desnutrição). Na ICFER avançada, em particular no paciente mais idoso, que com frequência possui arterioesclerose cerebral, manifestações neuropsiquiátricas (desorientação, alteração do ciclo sono-vigília e distúrbios do humor e da personalidade) podem refletir má perfusão cerebral. A noctúria (acordar para urinar > 2x) é secundária à exacerbação da secreção de peptídeos natriuréticos em resposta ao aumento do retorno venoso pelo decúbito, e contribui para a insônia do paciente. Ao exame físico, os achados incluem manifestações próprias da doença cardíaca no coração e outras manifestações sistêmicas secundárias à IC ou à doença de base. Salienta-se o desvio do ictus cordis para baixo e para a esquerda, a presença de sopros, elevação de pressão venosa jugular (especialmente se for superior a 4 cm do ângulo esternal), edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, refluxo hepatojugular, estertores pulmonares, derrame pleural, ascite, taquicardia, galope de terceira ou quarta bulhas, pulso alternante, tempo de enchimento capilar lentificado, taquipnéia e cianose. A persistência de terceira bulha e de pressão venosa central elevada em pacientes tratados com insuficiência cardíaca confere pior prognóstico. Os critérios mais utilizados para o diagnóstico de IC são os de Framingham e Boston (Tabelas I e II). O critério de cardiomegalia na radiografia de tórax, embora ainda importante, tem sido substituído pelos dados do ecocardiogarma ou de outros exames. Três quesitos são fundamentais para a possibilidade de diagnóstico de IC com fração de ejeção preservada: 1) presença de sinais ou sintomas de IC; 2) presença de função ventricular esquerda normal ou pouco alterada (fração de ejeção ! 45 a 50%); Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX 3) evidências de relaxamento anormal do ventrículo esquerdo ou distensibilidade reduzida. Ectoscopia e sinais vitais A aparência geral do paciente varia conforme a gravidade da IC. No início pode não haver anomalias, mas nas fases avançadas temos um indivíduo dispneico em repouso (que não consegue se deitar ou falar frases completas) apresentando franca caquexia (perda de massa muscular e aspecto debilitado). A PA pode ser normal ou alta nas fases iniciais, mas na IC avançada ela geralmente está diminuída, com baixa pressão de pulso (diferença entre PA sistólica e diastólica, devido à queda do débito sistólico)... Na ausência de tratamento, em função da hiperatividade adrenérgica, encontramos taquicardia sinusal e sinais de vasoconstrição periférica, como extremidades frias, pálidas e às vezes cianóticas (lentificação da circulação). O tempo de enchimento capilar estará aumentado nestes casos. Na ICFER muito grave pode surgir o clássico pulso alternans. Após uma contração sistólica eficaz a capacidade contrátil não se recupera de imediato, seguindo-se uma contração menos eficaz. A pressão de pulso passa a variar a cada batimento, o que pode ser percebido pela palpação (amplitude variável do pulso arterial). O pulso total alternans representa o extremo deste fenômeno, isto é, após cada batimento a contração subsequente não gera fluxo, o que faz a FC contada no pulso periférico ser a metade daquela contada no precórdio. Veias jugulares As jugulares internas podem estar ingurgitadas com o paciente inclinado a 45º (turgência jugular patológica - TJP), refletindo o aumento na pressão venosa central (pressão no interior do átrio direito). Este é o sinal mais importante para a identificação clínica de congestão circulatória sistêmica. A presença de onda v gigante no pulso venoso jugular indica insuficiência tricúspide. Nas fases iniciais da IC as jugulares podem ser normais, porém, a compressão da região mesogástrica durante cerca de 15 segundos pode desencadear TJP, um sinal conhecido como refluxo abdominojugular positivo. O termo “refluxo hepatojugular” foi abandonado, pois na realidade o aumento do retorno venoso com a manobra é oriundo de toda a circulação esplâncnica, e não somente do leito hepático. Para estimar a Pressão Venosa Central (PVC) no exame físico: (1) localize o ponto mais alto de oscilação da veia jugular interna (ponto acima do qual a jugular encontra-se colabada); (2) utilizando o ângulo esternal como referência (ângulo de Louis ou junção manubrioesternal) meça a altura daquele ponto; (3) ao valor medido, acrescente 5 cm (distância fixa entre o ângulo esternal e o centro do átrio direito). O resultado será expresso em cmH2O... O normal é uma PVC < 8 cmH2O. Ausculta pulmonar Estertores inspiratórios indicam a presença de fluido no interior dos alvéolos. Devido à força gravitacional os estertores predominam nas regiões dependentes (em ortostase = estertores bibasais). A altura dos campos pulmonares até onde os estertores são audíveis se relaciona com a intensidade da congestão (ex.: no edema agudo de pulmão pode haver estertores até nos ápices pulmonares). Sua qualidade acústica também se relaciona com a quantidade de líquido. Alguns autores utilizam os termos estertores “finos” ou crepitações (pouco líquido) e “grossos” ou bolhosos Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX (muito líquido). Vale dizer que os estertores só são esperados nas fases avançadas da IC... Mesmo com IC sintomática (dispneia) muitos pacientes não apresentam estertores, devido a um aumento adaptativo da drenagem linfática pulmonar! Logo, a ausência de estertores pulmonares no exame físico NÃO permite afastar o diagnóstico de IC. Na DPN e no EAP (edema agudo de pulmão) pode haver sibilos expiratórios (“asma cardíaca”). O diagnóstico de EAP é clínico, sendo estabelecido no paciente agudamente taquidispneico (com uso de musculatura acessória) que apresenta sinais e sintomas de congestão pulmonar grave (ortopneia, estertores acima da metade inferior dos campos pulmonares). Pode haver hipoxemia e cianose. Em casos extremos uma secreção rósea e espumosa é expectorada: trata-se do próprio transudato alveolar que está “inundando” os pulmões do paciente! Derrame pleural só costuma aparecer quando há insuficiência biventricular, pois a drenagem venosa das pleuras é feita tanto para a circulação pulmonar (comprometida na IVE) quanto para a circulação sistêmica (comprometida na IVD). O derrame costuma ser bilateral, porém, tende a ser maior à direita, pois a drenagem linfática das pleuras direitas é naturalmente menos abundante que a das pleuras esquerdas. Exame do precórdio A dilatação do ventrículo esquerdo desloca o ictus cordis (a “ponta” do VE, ou ponto de máximo impulso) para baixo e para a esquerda (abaixo do 5º espaço intercostal e à esquerda da linha hemiclavicular, respectivamente), o que em geral é acompanhado de aumento em sua área (ocupando > 2 espaços intercostais). Na HVE o ictus cordis se torna “sustentado” (mais forte e duradouro), sem necessariamente se deslocar. A dilatação e a hipertrofia do VD produzem uma elevação paraes-ternal esquerda difusa e sustentada (erroneamente chamada por alguns de “ictus de VD” – aqui não se está palpando a “ponta” do VD e sim sua parede anterior, logo, não é certo utilizar a palavra “ictus”, que significa ápice). A primeira bulha cardíaca pode se tornar HIPOfonética quando o VE perde força contrátil, e a segunda bulha costuma ficar HIPERfonética, devido à hipertensão pulmonar.A terceira bulha cardíaca (B3 ou galope protodiastólico) pode ser auscultada (e até mesmo palpada) na disfunção sistólica, enquanto a quarta bulha (B4 ou galope pré-sistólico) está presente na disfunção diastólica. Pode haver sopros de insuficiência mitral e/ou tricúspide secundária. Abdome e extremidades Hepato megalia (geralmente dolorosa, pela distensão da cápsula hepática) está presente nos quadros de congestão sistêmica importante. Pulsações perceptíveis na borda hepática (“pulso hepático”) indicam insuficiência tricúspide. A congestão hepática crônica pode causar hipóxia e necrose centrolobular, levando à cirrose cardiogênica. O paciente desenvolve ascite (congestão nas veias hepáticas e sistema porta, além das veias do peritônio) e icterícia (com predomínio de bilirrubina direta) como achados tardios. No indivíduo que deambula, a congestão venosa sistêmica provoca edema simétrico, mole, frio e indolor nos membros inferiores. Edema crônico dos membros inferiores pode resultar em dermatite ocre (pele dura e escurecida). No paciente acamado, o edema predomina na região sacral e no escroto/grandes lábios. CLASSIFICAÇÃO DA IC Com o objetivo de uma melhor estratégia no seu diagnóstico etiológico e tratamento, a IC pode ser classificada de várias formas. Essa classificação pode ser de acordo com a condição clínica, hemodinâmica, funcional ou a etiologia. 1 Duração: IC aguda, quando inferior, e crônica quando superior a 6 meses. Utiliza- se o termo “de novo” quando do seu aparecimento. Quanto maior a duração, mais completa pode ser a ativação neuro-hormonal e o remodelamento, com manifestações mais típicas de retenção hídrica. Inversamente, após um infarto agudo do miocárdio, pode não haver as manifestações crônicas. A aplicação típica dessa classificação é no raciocínio diagnóstico da miocardite. 2 Manifestação de ventrículo direito ou esquerdo ou mista: clinicamente, a IC esquerda caracteriza-se pela presença de sinais e sintomas de congestão pulmonar (dispnéia aos esforços, tosse noturna, dispnéia paroxística noturna, ortopnéia, crepitações pulmonares). A IC direita está relacionada aos sinais e sintomas de congestão sistêmica (estase jugular, edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, ascite). A disfunção do ventrículo esquerdo pode causar disfunção do ventrículo direito. Essa classificação tem importância no diagnóstico diferencial de certas causas de IC em que pode predominar umas das manifestações. Por exemplo: a doença de Chagas tem manifestação de esquerdo e direito; a doença Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX restritiva, com freqüência, tem ascite; cor pulmonale apresenta manifestações de ventrículo direito comprometido. 3 Débito cardíaco: pacientes com tireotoxicose, fístula arteriovenosa, beribéri ou anemia importante e/ou doença de Paget podem apresentar débito cardíaco com valores elevados associadamente a sinais e sintomas de IC, caracterizando uma síndrome de alto débito, que pode ser reconhecida pela perfusão aumentada de pele. Nesse caso, a estratégia terapêutica é totalmente diferente da de baixo débito, que se caracteriza por sinais de má perfusão (pele fria, sudorese) e congestão. 4 Fração de ejeção de ventrículo esquerdo ou direito: quando a fração de ejeção de ventrículo esquerdo/direito é comprometida, é chamada sistólica; inversamente, é chamada diastólica, quando não é comprometida (IC com fração de ejeção preservada). Na IC com fração de ejeção preservada (diastólica), há dificuldade de enchimento do coração ou enchimento com pressões elevadas. Essa classificação é importante, pois algumas etiologias manifestam-se predominantemente de uma forma ou de outra. Como fatores de risco para IC com fração de ejeção preservada, têm-se idade, sexo feminino, obesidade, hipertensão arterial, diabetes, doença coronariana, doença renal e estenose aórtica. 5 Classe funcional: correntemente utilizada na prática clínica, a classificação proposta pela New York Heart Association (NYHA) avalia a limitação de esforço em pacientes com IC. É útil na prática diária por ser de fácil aplicação e apresentar valor prognóstico (Tabela IV). 6 Estágios: mais recentemente, foi proposto um novo sistema de estadiamento baseado na evolução e na progressão da IC. Essa forma de categorização reflete o modelo fisiopatológico da IC, que considera essa síndrome como a via final comum a diferentes doenças cardíacas em indivíduos com fatores de risco. Essa representação da IC cardíaca com caráter contínuo possui implicações preventivas, prognósticas e também terapêuticas. 7 Estabilidade: de acordo com a estabilidade e as manifestações clínicas, a IC pode ser compensada, descompensada (“de novo” ou crônica que descompensou) ou persistentemente descompensada, quando os sinais/sintomas de descompensação persistem. Entendese por descompensação o aparecimento de sinais/sintomas, como edema ou hipoperfusão ou hipotensão, que determinam uma nova estratégia terapêutica de ambulatório ou a partir de admissão hospitalar. Seu reconhecimento tem importância para uma terapêutica adequada e possíveis fatores precipitantes devem ser investigados. 8 Perfil hemodinâmico: a partir da presença de congestão e da hipoperfusão, foi desenvolvida a classificação clínico-hemodinâmica, sendo dividida em 4 situações distintas que apresentam implicação terapêutica e prognóstica. Conforme o perfil do paciente, podem ser necessários diurético ou volume ou drogas inotrópicas ou drogas vasodilatoras. 9 Distúrbio mecânico: tem importância no diagnóstico e tratamento reconhecer se há obstrução ou disfunção mecânica das válvulas cardíacas, como estenose aórtica ou estenose mitral, insuficiência aórtica ou mitral, obstrução, como tromboembolismo pulmonar agudo ou crônico. Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX O diagnóstico de IC não costuma ser difícil quando o paciente apresenta sinais e sintomas clássicos e possui fatores de risco. No entanto, é importante salientar que os sinais e sintomas de IC não são sensíveis nem específicos, quer dizer, não estão presentes em todos os casos (principalmente no início da disfunção cardíaca), assim como eventualmente podem ter outras explicações que não a IC. Muitos portadores de disfunção sistólica do VE são assintomáticos (pois encontram- se na “fase compensada”). Desse modo, não raro é preciso um alto grau de suspeição clínica, solicitando exames complementares adequados. Mesmo nestes casos o tratamento deve ser instituído, a fim de evitar a progressão do remodelamento cardíaco! Alguns exames inespecíficos auxiliam (radiografia de tórax, ECG) e, nos casos duvidosos, certos métodos mais específicos são capazes de confirmar ou afastar o diagnóstico (BNP, ecocardiograma-Doppler, cintilografia Gated, cateterismo cardíaco). LABORATÓRIO Todo portador de IC deve realizar uma bateria mínima de testes laboratoriais, incluindo hemograma, hepatograma, lipidograma, função renal, eletrólitos, glicemia, dosagem de hormônios tireoideanos e EAS. Se houver história epidemiológica compatível deve-se incluir sorologia para doença de Chagas. ECG Um ECG normal essencialmente afasta a existência de disfunção sistólica do VE! Todo portador de IC deve realizar um ECG de 12 derivações a fim de verificar o ritmo cardíaco (ex.: fibrilação atrial?), a presença de sequelas de infarto (ex.: onda Q patológica?) e/ou sinais de sobrecargas camerais (ex.: HVE?). O padrão de alterações também pode sugerir etiologias específicas (ex.: BRD + HBAE = suspeita de cardiopatia chagásica). Outro dado importante é a duração do complexo QRS. Portadores de ICFER grave (FE ≤ 35%) e refratária ao tratamento clínico se beneficiam da terapia de ressincronização cardíaca se apresentarem QRS muito alargado (≥ 150 ms). RADIOGRAFIA DE TÓRAX Aradiografia simples em PA (posteroanterior) e perfil avalia a silhueta cardíaca, permitindo identificar aumentos camerais. A cardiomegalia é inicialmente denunciada pelo aumento do índice cardiotorácico (diâmetro transverso da silhueta cardíaca dividido pelo diâmetro transverso da caixa torácica), que fica acima de 0,5 (isto é, o coração ocupa > 50% do diâmetro do tórax). • Na incidência em PA: o Se a ponta do coração “mergulhar” na hemicúpula diafragmática esquerda teremos um aumento predominante do VE. o Se a ponta do coração se elevar (aspecto “em bota”), o aumento predominante será do VD. • Na incidência em perfil: o O aumento de VE é notado pela dilatação da borda cardíaca posterior (que ultrapassa em mais de 2 cm, em sentido posterior, a sombra da veia cava inferior). o O aumento de VD estará presente se a borda cardíaca anterior ocupar > 1/3 da porção inferior do espaço retroesternal. Os campos pulmonares podem apresentar sinais de congestão. A congestão produz diversas alterações no parênquima pulmonar: • Um sinal precoce é o surgimento das linhas B de Kerley pequenas linhas paralelas ao diafragma localizadas na região justapleural dos campos pulmonares inferiores (representam vasos linfáticos subpleurais ingurgitados). • Os septos interlobares também podem ficar espessados pelo edema. • Pode haver a chamada “inversão da trama vascular pulmonar”, isto é, os vasos sanguíneos ficam mais calibrosos nos ápices do que nas bases pulmonares, devido ao edema intersticial mais intenso nas regiões dependentes, o que comprime os vasos basais (o normal seria os vasos basais terem calibre 3x maior que os vasos apicais). • Um maior acúmulo de líquido passa a ser visto como um infiltrado intersticial bilateral (inicialmente peri-hilar) devido ao edema intersticial, ou até infiltrado alveolar (no EAP). • No edema pulmonar avançado, além de infiltrado intersticial evidencia-se a coexistência de infiltrado alveolar (líquido dentro do espaço aéreo). O derrame pleural, no paciente em ortostase, “apaga” os seios costofrênicos, e quando volumoso produz a parábola de Damoiseau. Se o paciente estiver deitado no leito (incidência em AP, ou anteroposterior) o derrame “se espalha por baixo dos pulmões”, produzindo uma hipotransparência homogênea e difusa por todo o campo pulmonar. Não se esqueça que na IC o derrame pleural costuma ser bilateral, mas é sempre mais intenso à DIREITA (no paciente deitado o pulmão direito fica difusamente mais hipotransparente que o pulmão esquerdo). Isadora Pedreira- Problema 4 Abertura. XIX O chamado tumor fantasma representa uma forma caprichosa de derrame pleural de formato arredondado em que o líquido se acumula nas cissuras interlobares. A diureticoterapia faz esse "tumor" desaparecer quando o Rx é repetido. Tal achado também é mais frequente à direita Eventualmente o Rx de tórax sugere causas não cardíacas para os sintomas (ex.: enfisema pulmonar). Vale lembrar que a ausência de sinais de edema pulmonar não afasta a possibilidade de IC, pois nas fases iniciais ocorre um aumento adaptativo na drenagem linfática. De modo análogo, a ausência de cardiomegalia não afasta a possibilidade de disfunção sistólica e/ou diastólica, pois nas fases iniciais o tamanho cardíaco pode se manter dentro da normalidade. ECOCARDIOGRAMA O ecocardiograma transtorácico é um exame obrigatório na atualidade para o manejo da IC, servindo como “divisor de águas” ao definir se o quadro é de ICFER ou ICFEN. Não só permite confirmar o diagnóstico (às vezes sugerindo uma etiologia específica) como também fornece informações prognósticas relevantes! Com ele consegue-se avaliar, de forma rápida e não invasiva, a estrutura do coração (aumentos camerais, hipertrofias, disfunções valvares, alteração global ou segmentar da contratilidade), bem como as funções sistólica (fração de ejeção) e diastólica (dopplerfluxometria transmitral e/ou tecidual). O pericárdio e os vasos da base (artéria pulmonar e aorta) também podem ser analisados. O “eco” ainda pode detectar a presença de trombos intracavitários (ex.: no interior do VE no pós-IAM recente). Recomenda-se que um ecocardiograma transtorácico seja obtido inicialmente em todo portador de IC, devendo-se repetir tal exame, em particular nos casos de ICFER, após um período de 3-6 meses de tratamento com drogas modificadoras de doença, a fim de demonstrar a ocorrência de “remodelamento reverso” e permitir uma reestratificação do prognóstico. Outra indicação de repetir o exame seria na vigência de mudanças evolutivas no quadro clínico, bem como durante as descompensações agudas. Contudo, é importante salientar que a repetição rotineira do ecocardiograma a intervalos regulares, num paciente clinicamente estável e aderente ao tratamento, NÃO É necessária! O ecocardiograma transesofágico só deve ser solicitado em situações específicas, como na presença de valvopatias (pois permite melhor detalhamento anatômico para o planejamento terapêutico), cardiopatias congênitas complexas, suspeita de dissecção aórtica ou endocardite infecciosa, e para afastar a presença de trombo na auriculeta do átrio esquerdo em pacientes com FA que serão submetidos à cardioversão elétrica. OUTROS MÉTODOS DE IMAGEM A ressonância magnética (“cardio-RM”) também permite uma avaliação não invasiva da estrutura e função cardíaca, e atualmente representa o método “padrão-ouro” para a quantificação dos volumes, da massa miocárdica e da fração de ejeção de ambos os ventrículos. Diferentes técnicas de obtenção da imagem podem auxiliar na elucidação da etiologia (ex.: revelando áreas de infarto/fibrose, depósitos amiloides, hemocromatose, etc.). A cardio-RM representa ainda o método de escolha para determinar viabilidade miocárdica nos casos de cardiopatia isquêmica (a presença de realce tardio, isto é, permanência do contraste em determinada porção do miocárdio, identifica a necrose irreversível num segmento que apresenta alterações de contratilidade). Maiores detalhes a esse respeito serão vistos na apostila de doença coronariana. Importante lembrar das principais limitações do método: (1) alto custo e baixa disponibilidade; (2) claustrofobia; (3) presença de próteses ou implantes com material ferrimagnético; (4) contraindicação do contraste (gadolíneo) em indivíduos com clearance de creatinina < 30 ml/min, pelo risco de fibrose sistêmica nefrogênica. BIOMARCADORES Os níveis séricos de BNP e NT-ProBNP (peptídeos natriuréticos) aumentam tanto na ICFER quanto na ICFEN (mais na primeira). Os pontos de corte em pacientes ambulatoriais são: BNP > 35-50 pg/ml e NT-ProBNP > 125 pg/ml. Sua grande utilidade é nos casos de dúvida diagnóstica, p. ex.: quando não fica claro, após exame clínico minucioso, se a causa da dispneia é cardíaca ou pulmonar (níveis reduzidos de BNP ou NT-ProBNP afastam causa cardíaca). A magnitude do aumento tem significado prognóstico (níveis mais altos = pior prognóstico). É importante frisar, todavia, que a dosagem desses marcadores não é obrigatória para o manejo terapêutico. A titulação da farmacoterapia pode ser feita observando-se apenas a resposta clínica: melhora dos sinais e sintomas. Não se recomenda ajuste na dose dos medicamentos somente pela evolução dos níveis de peptídeos natriuréticos. Ensaios clínicos de grande porte não mostraram qualquer vantagem com tal estratégia. Existem limitações para o uso de BNP e NT-ProBNP. Seus níveis também aumentam (independentemente da função do ventrículo esquerdo) na vigência de: (1) anemia; (2) DRC; (3) idade avançada; (4) sexo feminino; (5) falência isolada do VD. O uso de inibidores da neprilisina aumenta os níveis de BNP, mas não de NT-ProBNP! Logo, se um usuário de valsartansacubitril precisar dosar os níveis séricos de peptídeo natriurético, a escolha recai sobre o NT-ProBNP.
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