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2
Unidade V
TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
I. Dedução, indução e abdução[footnoteRef:1] [1: ATIENZA, Manuel. Curitiba: Alteridade, 2017.] 
Vimos antes que a diferença entre um argumento dedutivo e outro indutivo é que só em relação aos primeiros pode-se dizer que é impossível que as premissas sejam verdadeiras (ou possuam algum outro valor: como a correção ou validez normativa) e a conclusão não o seja (não se transmita esse valor). No caso das induções, o que queremos dizer é que é provável (em um grau maior ou menor) que se os fatos são verdadeiros (ou as normas válidas ou corretas), então o seja também a conclusão. Assim entendida, uma indução não é necessariamente um argumento que vai do particular ao geral; no exemplo dado (que concluía com a afirmação de que B tinha sido o autor da morte de A), a passagem se produz do particular ao particular. 
Também podemos analisar as induções, naturalmente, de um ponto de vista formal. Assim, a forma desse argumento indutivo: “p; q; r; portanto, s”; ainda que coubesse considerar também que nele há uma premissa implícita que diz algo como “se p e q e r, então é provável s”. Outro exemplo de forma indutiva (de indução amplificadora, que vai do particular ao geral) é este: “a é um membro da classe A e tem a propriedade P; b é um membro da classe A e tem também a propriedade P....; n é um membro da classe A e tem a propriedade P; portanto, todos os membros de A têm a propriedade P”. E também podemos considerar como uma indução o argumento por analogia: “no caso C, a solução deve ser S; C' é um caso semelhante a C; portanto, no caso C' a solução deve ser também S”. 
Agora, assim como a validade dedutiva de um argumento depende exclusivamente de considerações formais, na indução não ocorre o mesmo. O esquema formal de uma indução nos diz muito pouco na hora de avaliar os argumentos indutivos; o que aqui importa são, sobretudo, questões materiais e contextuais. Por exemplo, em relação com a analogia, a chave está em se as propriedades que têm em comum o caso C e o caso C' são realmente as propriedades essenciais. 
Também são induções os argumentos de probabilidade, no sentido quantitativo da expressão, como a frequência relativa de um fenômeno, dadas certas circunstâncias; em seu sentido qualitativo, todas as induções são argumentos de probabilidade (a passagem das premissas à conclusão é provável e não necessária). Desempenham um papel mais ou menos importante no Direito (depende do contexto que se considere), porém deve-se ter em conta que, além da limitação de poucas vezes dispor dos dados pertinentes para efetuar o cálculo probabilístico, o argumento probatório (a justificação externa da premissa fática) não termina com uma afirmação do tipo “com uma probabilidade X, o acontecimento A ocorreu”, mas sim da forma “A ocorreu”. Ou seja, é necessária uma premissa adicional que estabeleça qual é o grau de probabilidade (o standard de prova) para considerar como provado um fato. 
Questiona-se, por vezes, se a classificação dos argumentos em dedutivos e indutivos tem caráter exaustivo. Peirce mencionou uma terceira categoria de argumentos a que chamou abdutivos e que se diferenciariam dos outros porque com a abdução surge uma nova ideia. Os melhores (ou pelo menos os mais chamativos) exemplos de abduções se extraem dos romances policiais. Um deles, que tem sido usado com certa frequência em livros de argumentação, é tirado de um relato de Sherlock Holmes (que, inclusive, não fazia deduções, mas sim abduções), intitulado, no original em inglês, Silver Blaze: “O roubo do cavalo se produziu durante a noite; ninguém ouviu latido de cães durante a noite; os cães habitualmente latem para os forasteiros; portanto, o ladrão do cavalo não foi um forasteiro mas sim alguém da casa”. Pois bem, parece óbvio que, do mesmo modo que os detetives e a polícia, também os promotores de justiça ou os juízes e o resto dos mortais raciocinam desta maneira nas condições apropriadas. 
Não obstante, a posição institucional de um juiz pode fazer com que um argumento como o anterior não seja aceitável no contexto da motivação de uma sentença, pois do juiz se exige que respeite o princípio de presunção de inocência e um standard de prova que, em matéria penal, é particularmente exigente, pois requer que os fatos sejam considerados verdadeiros “além de toda dúvida razoável’. 
Pois bem: o argumento abdutivo é, em realidade, uma indução, que se caracteriza por cumprir uma função heurística (se usa para conjecturar algo) e porque tem caráter derrotável, revisável, pois, quando se fala em abdução a referência é mais à atividade de argumentar que ao argumento visto como um resultado: Sherlock Holmes modificaria, por exemplo, sua conclusão se obtivesse uma nova informação que, no exemplo utilizado, o levasse a pensar que alguém havia ministrado um narcótico aos cães. 
II. Subsunção, argumentação finalista e ponderação[footnoteRef:2] [2: ATIENZA, Manuel. Curitiba: Alteridade, 2017.] 
Costuma-se dizer que o silogismo subsuntivo, a subsunção, é o esquema geral de argumentação na justificação judicial. Ou, dito em outros termos, constitui a justificação interna do raciocínio judicial. Isto é aproximadamente certo, na medida em que a premissa normativa (final) do raciocínio judicial é, em geral, uma regra de ação que tem a forma: “se ocorrem as circunstâncias ou condições de aplicação X (um caso genérico), então alguém pode, deve ou está proibido de realizar uma determinada ação Y”. A partir daqui tudo o que se necessita é classificar ou subsumir certa realidade no suporte fático dessa norma. Pode haver problemas interpretativos ou problemas de tipo fático, porém uma vez que sejam resolvidos (realizada a justificação externa), o que fica é esse esquema classificatório. 
Mas nem sempre é assim. Em certas ocasiões, a premissa normativa do argumento judicial não é uma regra de ação, mas uma regra de fim, que, sob certas circunstâncias, ordena, proíbe ou permite que alguém procure alcançar um certo fim. Por exemplo, na maioria dos sistemas jurídicos existe uma regra segundo a qual, no caso da separação ou divórcio, o juiz deve conceder a custódia dos filhos menores de maneira que se obtenha o maior benefício para estes últimos. Para aplicar esta norma, o juiz não pode se limitar simplesmente a classificar, mas tem que efetuar um raciocínio finalista: se decide, por exemplo, que os filhos devem ficar com a mãe, é porque entende que essa é a maneira como se satisfaz melhor a finalidade estabelecida na norma. O esquema, então, poderia ser este: “se ocorrem as circunstâncias X, o juiz deve procurar alcançar F; se ocorrem as circunstâncias X, a ação M é um meio adequado para obter F (ou, quiçá melhor: só se M, então se procurará F); portanto, o juiz deve realizar M”. 
É importante atentar para as diferenças existentes entre ambos os esquemas. O esquema finalista é mais aberto, deixa mais discricionariedade ao juiz: como as regras de ação se orientam ao passado, na premissa fática do raciocínio subsuntivo ou classificatório se trata de estabelecer simplesmente que tenha ocorrido um fato. Porém, as regras de fim direcionam-se ao futuro, de maneira que no esquema argumentativo correspondente uma premissa que enuncia um juízo preditivo sobre o que ocorrerá ou não ocorrerá no futuro; e o futuro é mais aberto e (em geral) mais complexo que o passado. Por isto, o esquema finalista desempenha um papel excepcional no raciocínio judicial, enquanto é central no raciocínio que efetuam os legisladores, os órgãos da administração ou os advogados quando aconselham uma linha de ação a seus clientes. 
Há, ademais, ocasiões em que os juízes não dispõem de uma regra (nem de ação, nem de fim) que possam aplicar para resolver um caso. Isso pode ocorrer porque se trata de uma lacuna normativa (o caso para o qual o sistema e regras jurídicas não oferece uma solução), de uma lacuna axiológica (o caso está regulado por regras, porém de maneira insatisfatória) ou porque há dúvidasobre se o caso está ou não resolvido por regras. Nessas situações, os juízes têm que recorrer a princípios e o esquema argumentativo que devem utilizar é o da ponderação. 
Se se pensa, por sua vez, que existem dois tipos de princípios: uns que são normas de ação (princípios em sentido estrito) e outros que consistem em normas de fim (diretrizes), então haverá, por sua vez, dois tipos de ponderação. A ponderação entre diretrizes é um processo de concretização dos objetivos que levam a cabo, fundamentalmente, os legisladores e os órgãos administrativos. O papel dos juízes costuma ser aqui o de controlar que esse processo ocorra de maneira adequada. A ponderação entre princípios em sentido estrito (e, em algum caso, entre princípios em sentido estrito e diretrizes) tem também (ou deveria ter) um caráter excepcional em relação aos juízes de hierarquia mais baixa, porém ganha notável importância nas argumentações que realizam os tribunais superiores, sobretudo os constitucionais. Especifiquemos um pouco mais em que consiste esta segunda forma de ponderação. 
Ainda que às vezes se contraponha de maneira radical a ponderação à subsunção, isso pode ser enganador. A ponderação é, na realidade, um tipo de argumentação em dois passos: o primeiro consiste em passar dos princípios às regras, e o segundo é precisamente uma subsunção. Um exemplo servirá para esclarecer. Um antigo membro das SS[footnoteRef:3] fez declarações em uma revista negando o holocausto, o que levou uma mulher judia, cujos familiares haviam sido exterminados em Auschwitz, a ingressar com um processo, por entender que as declarações atentaram contra sua honra. Não existe uma regra específica que resolva o caso, mas sim dois princípios: o que protege a liberdade de expressão e o que tutela o direito à honra. O Tribunal Constitucional espanhol (em sua sentença 101/1990) entendeu que, dado o conteúdo xenofóbico e racista das declarações, elas ultrapassavam o âmbito da liberdade de expressão. A ação em questão era uma ação ilícita, proibida. [3: Schutzstaffel, grupo armado de elite da Alemanha nazista (NR). ] 
Primeiro passo: em relação com o caso, são de aplicação, prima facie, dois princípios de significado contraposto: um, permite realizar uma ação A e outro a proíbe; nas circunstâncias concretas do caso (X), e dado que concorre ademais a razão R (tratava-se de declarações de conteúdo xenofóbico e racista), o segundo princípio prevalece sobre o primeiro; portanto, se ocorrem as circunstâncias X e concorre a razão R, então está proibida a ação A. O segundo passo é já uma subsunção: se ocorrem as circunstâncias X e concorre a razão R; portanto, está proibida a ação A. Aqui, dão-se as circunstâncias X e a razão R; portanto, a ação A está proibida. 
É mais ou menos óbvio que a dificuldade desse tipo de raciocínio se encontra na segunda premissa, a que estabelece que, dadas determinadas circunstâncias, um princípio prevalece obre outro. Alexy construiu um esquema formal, ao que chama “fórmula do peso”, que pode ser considerado como uma espécie de “justificação externa” dessa premissa. O que vem a dizer, essencialmente, é que, para determinar que um princípio “pesa” mais que outro, deve ser considerada uma série de fatores: o grau de afetação de cada um dos princípios no caso concreto, peso abstrato dos princípios, a maior ou menor certeza que se tenha com relação às avaliações empíricas e (se o resultado da consideração desses fatores for um empate) certas regras sobre a carga da argumentação como, por exemplo, a que estabelece o dever de deferência ao legislador ou de outorgar prioridade à liberdade. 
III. Racionalidade de meios e fins[footnoteRef:4] [4: POSNER, R. Problemas de Filosofia do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007.] 
O meteorologista informa que há previsões de chuva, e eu devo decidir se levo um guarda-chuva ao sair de casa. Considero (mesmo que rapidamente e, talvez, de maneira inconsciente) a probabilidade de a previsão estar correta, o desconforto de tomar chuva, o incômodo de carregar um guarda-chuva e a probabilidade de esquecê-lo em algum lugar. Esse tipo de análise, chamada de análise de custo-benefício pelos economistas e de racionalidade meio-fim (às vezes, de deliberação) pelos filósofos da razão prática, é importante em todos os níveis do pensamento e, com certeza, no raciocínio jurídico. A escolha entre regras jurídicas alternativas, em geral, depende da decisão de qual atinge de maneira mais adequada um objetivo subjacente; isso foi visto quando discutimos interpretação. Porém o processo decisório é de análise ética ou de análise de políticas públicas, em vez de ser algo singular à lei. Quando há concordância quanto ao objetivo e está claro qual regra, interpretação ou aplicação é a mais indicada para se alcançar tal objetivo, então aquilo que chamo de análise ética ou análise de políticas públicas nos conduzirá a um determinado resultado - que é aceitável, porém não caracteriza um método distinto de raciocínio jurídico. 
Considere-se a antiga história de filosofia do direito relativa a saber se o beneficiário de um testamento que tenha matado seu testador deva ou não ter direito à herança[footnoteRef:5]. Esse caso é, às vezes, analisado com um conflito entre o princípio de que as disposições testamentárias devessem ser honradas e o princípio de que ninguém pode valer-se de sua própria torpeza[footnoteRef:6]. Uma abordagem alternativa resolve o conflito e mostra tanto a utilidade da racionalidade meio-fim no raciocínio jurídico quanto a estreita relação entre ela e a imaginação, a faculdade vital para explorar possíveis visões de mundo alternativas[footnoteRef:7]. A abordagem consiste em perguntar, caso o testador houvesse pensado sobre a possibilidade de ser assassinado por seu herdeiro, se teria acrescentado ao testamento uma cláusula que deserdasse seu assassino. (Veja-se a analogia com o método usado no capítulo anterior ao se determinar se aquele que salva a vida de outrem ou sua propriedade deve ou não ter direito a ser reembolsado pelo beneficiário no que tange às despesas gastas para tanto.) É bem provável que o testador tivesse incluído tal cláusula, assim suas disposições testamentárias seriam honradas ao se proibir que o herdeiro recebesse a herança, e não há conflito entre os princípios jurídicos. (Trata-se aqui de uma "reconstrução imaginativa" não muito óbvia.) Embora altamente satisfatória, essa conclusão nada fica a dever, em sentido algum, ao raciocínio jurídico. Outra abordagem alternativa também ilustra a racionalidade de meios e fins. Perguntemos se excluir o assassino da sucessão é um complemento adequado às outras sanções por homicídio. Cada uma das abordagens fornece uma estrutura para que possamos responder a futuras perguntas sobre se o herdeiro devesse ser excluído, caso matasse o testador acidentalmente e não intencionalmente. [5: O mais conhecido dos casos de homicídio praticado por herdeiros é Riggs vs. Palmer, 115 New York Reports 506, 22 North Eastern Report 188 (1889). ] [6: Ver, por exemplo, Ronald Dworkin, Law's Empire 15-20 (1986); para uma crítica do livro de Dworkin, ver Charles Silver, "Elmer's Case: A Legal Positivist Replies to Dworkín", 6 Law and Philosophy 381 (1987). ] [7: Uma boa discussão da dimensão imaginativa da deliberação pode ser encontrada em John Dewey, Human Nature and Conduct: An Introduction to Social Psychology 189-209 (1922). 
] 
Abordei o problema do herdeiro-assassino como um modo de ajustar dois princípios concorrentes do common law, porém a própria análise do caso Riggs (nota 5) é complicada pelo fato de que o assassino era o herdeiro testamentário e não um herdeiro necessário, isto é, pessoa que herda se não houver testamento. A vítima havia observado todas as formalidades legais para o legado, e a lei não continha cláusula que proibisse tais legados ao assassino do testador. A fim de decidir contra o assassino, o tribunal teve de interpretar a lei como se previsse uma cláusula implícita nesse particular. Na realidade, o que o tribunalfez foi enxertar uma exceção à lei para melhor realizar m moldes aristotélicos - o voto vencedor no caso Riggs cita a discussão de Aristóteles sobre a epieikeia (equidade) - os desejos que os legisladores teriam tido ao considerar a questão, caso a tivessem previsto. 
Vincent Wellman argumenta que a adequação dos meios aos fins é, como não poderia deixar de ser, o método de justificativa empregado no direito. A fidelidade ao precedente é apenas outra consideração - uma outra política ou princípio – a ser colocada na balança ao se decidir se um determinado resultado seria um meio adequado ao fim judicial.[footnoteRef:8] Até aqui, tudo bem. Wellman, porém, acredita ter identificado o que é, ao mesmo tempo, uma forma adequada e distintiva de argumentação jurídica, quando na verdade o que ele fez foi descrever a elaboração de juízos sobre políticas públicas sob condições de frequente e extrema incerteza. Como tais decisões, tomadas sob tais condições, não são confiáveis, ninguém se surpreenderá ao vê-lo reconhecer que sua teoria de direito como razão prática "nega que as formulações jurídicas sejam verdadeiras ou falsas"[footnoteRef:9]. Seu artigo ilustra ambas as partes de minha tese: a de que o raciocínio jurídico não é especial, e a de que, em geral, não produz resultados conclusivos. [8: Ver Vincent A. Wellman, "Practical Reasoning and Judicial Justification: Towards an Adequate Theory", 57 University of Colorado Law Review 45, 87-115. ] [9: Id., p. 108. 
Precedent in English Law 194 (3a. ed., 1977). O título completo do livro de Cross é pertinente; como veremos no capítulo seguinte, os juízes ingleses não precisam emitir juízos sobre políticas públicas com a mesma frequência de seus pares norte-americanos. 
] 
Considerando a identidade da racionalidade de meios e fins em relação à análise de custo-benefício e a estreita relação, observada no capítulo 1, entre o raciocínio lógico e os modelos econômicos, tal como a fórmula de negligência de Learned Hand, podemos compreender por que a economia fez tais incursões no direito nos últimos anos: a estrutura implícita de quase todo raciocínio jurídico é econômica. A resistência a esse desenvolvimento é compreensível também. Os advogados e juízes relutam em admitir a intensidade na qual o raciocínio jurídico está permeado por considerações sobre políticas públicas, considerações econômicas e outras. Rupert Cross afirmou que "quando um juiz realmente considera os prós e os contras de cada uma das partes (num caso não informado por precedentes), não há nome reconhecido para o raciocínio?", A característica desconcertante desse método analítico que não ousa falar seu nome é que diferentes juízes estão aptos a ponderar os prós e os contras de maneira diferente. 
Até mesmo a lógica pode ser colocada sob a égide da racionalidade meio-fim. O uso crítico que os advogados fazem da lógica é um método de promover a consistência. A consistência é valorizada – a lógica é valorizada – pois ajuda a adequar os meios aos fins. Tal adequação é o cerne da racionalidade, e a lógica e a racionalidade estão intimamente relacionadas. Embora o termo não seja familiar à maioria dos advogados e juízes, a racionalidade meio-fim está mais próxima do cerne a empreitada jurídica do que a lógica, um termo empregado pela profissão sem muita cautela. Ou mais próxima do que o raciocínio por analogia. Um passo essencial, ao se decidir se a regra de captura deveria limitar-se a coelhos e raposas ou ser estendida para óleo e gás também, ou se o direito à recompensa por parte daquele que salva uma vida deveria existir também no caso de salvar uma propriedade, é extrair um objetivo de casos anteriores ou de outras fontes e, então, determinar que decisão no novo caso conduzirá a esse objetivo de maneira mais eficiente e menos dispendiosa. 
Classifiquei a racionalidade meio-fim sob a égide de raciocínio prático; porém, uma classificação alternativa, que deveria agregar interpretação, analogia e autoridade com lógica, e observação exata com racionalidade meio-fim, irá nos ajudar a distinguir entre raciocínio formalista e pragmático. Os advogados esperam que os métodos do primeiro grupo lhes permitam empregar o conhecimento existente para responder a uma nova pergunta com o mínimo de investigação a respeito da nova pergunta. Se todos os As são Bs, e C é um A, concluímos, portanto, que C é um B sem examinarmos o C para vermos se é um B. Ou, se interpretarmos uma lei para proibir a conduta X, então decidir se a lei se aplica a Y, basta-nos determinar se Y é lima instância de X, e podemos determinar isso por meio de um exame apenas superficial de Y. Se realmente confiássemos no raciocínio por analogia, poderíamos decidir que óleo e gás natural estão sujeitos à regra da captura sem conhecermos qualquer outra coisa a seu respeito além de que fluem e que não ficam quietinhos num único lugar. Por outro lado, a racionalidade meio-fim e a observação exata preveem um escrutínio direto da nova questão, embora o conhecimento existente nos forneça o indispensável ponto de partida para tal escrutínio dois grupos de métodos de raciocínio diferem, assim, no que diz respeito à disposição em confrontar a nova questão propriamente dita em vez de insistir em responder a ela exclusivamente com base em experiência antiga. No primeiro caso, trata-se de olhar para o que passou (retrospectiva), à maneira de Blackstone; no segundo, de olhar para o que virá (prospectiva), à maneira de Bentham. Os advogados tendem a olhar para o que passou. É por isso que tendem a valorizar precedentes judiciais como autoridade, em vez de uma instância de testes, ou seja, consideram como a razão para agir e não como uma informação potencialmente útil ao se decidir como agir. 
IV. Justificação externa[footnoteRef:10] [10: ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica – A teoria do discurso racional como teoria da fundamentação jurídica. Trad. Zilda Hutchinson Schild Silva. Rio de Janeiro: Forense, 2017.] 
Nos discursos jurídicos trata-se da justificação[footnoteRef:11] de um caso especial de proposições normativas, as decisões jurídicas. Podem distinguir-se dois aspectos da justificação: a justificação interna (internal justification) e a justificação externa (external justification).[footnoteRef:12] Na justificação interna verifica-se se a decisão se segue logicamente das premissas que se expõem como fundamentação[footnoteRef:13] é o objeto da justificação externa é a correção destas premissas.[footnoteRef:14] [11: No lugar de "justificação" [Rechtsfertigung] aqui caberia falar também de "fundamentação" [Begründung]. Sobre o caráter amplamente intercambiável desses conceitos, confira supra, Parte III. ] [12: Sobre esses conceitos, confira J. Wróblewski, Legal Syllogism and Rationality of Judicial Decision, em: Rechtstheorie 5 (1974), p. 39 ss.; ibid., Legal Decision and its Justification, em: Le Raisonnement Juridique, Akten des Weltkongresses for Rechts - und Sozialphilosophie, ed. H. Hubien (Bruxelas, 1971), p. 412 ss. ] [13: Confira ibid., Legal Decision and its Justification, p. 412: "Internal justification deals with the validity of inferences from given premises to legal decision taken as their conclusion".] [14: Ibid., p. 412: "External justification of legal decision tests not only the validity of inference, but also the soundness of premises".] 
Isso aumenta a possibilidade de reconhecer e criticar erros.[footnoteRef:15] Acrescentar ou apresentar regras universais facilita a consistência da decisão e contribui, por isso, para a justiça e para a segurança jurídica. [15: Confira R. A. Wasserstrom, The Judicial Decision, p. 173. 
] 
(J.1.1) e (J.1.2), assim como (J.2.1)-(J.2.5), asseguram por isso, sem dúvida, uma certa medida de racionalidade. A racionalidade que garantem é certamente relativa à racionalidade das premissas. O juízo sobre a racionalidade de uma decisão pertence, pois, ao campo da justificação externa. Disto vai-se tratar agora. 
O objeto da justificação externa é a fundamentação das premissasusadas na justificação interna. Ditas premissas podem ser de tipos bastante diferentes. Pode-se distinguir: 
(1) regras de direito positivo,
 (2) enunciados empíricos e 
 (3) premissas que não são nem enunciados empíricos nem regras de direito positivo. 
A estes diferentes tipos de premissas correspondem distintos métodos de fundamentação. A fundamentação de uma regra de direito positivo consiste em mostrar sua conformidade com os critérios de validade do ordenamento jurídico. Na fundamentação de premissas empíricas pode recorrer-se a uma escala completa de formas de proceder que vão desde os métodos das ciências empíricas, passando pelas máximas da presunção racional, até as regras de ônus da prova no processo. Finalmente, para a fundamentação das premissas que não são nem enunciados empíricos nem regras de direito positivo aplica-se o que se pode designar de “argumentação jurídica”. 
Há múltiplas relações entre esses três procedimentos de fundamentação. Assim, na fundamentação das premissas que não têm um caráter jurídico-positivo nem empírico, desempenham papel considerável as regras do direito positivo e os enunciados empíricos. Na fundamentação de uma norma segundo os critérios de validade de um ordenamento jurídico pode ser necessário interpretar as regras que definem os critérios de validade. Isso tem especial importância se, entre os critérios de validade, encontram-se limites constitucionais; por exemplo, um rol de direitos fundamentais.[footnoteRef:16]A argumentação jurídica pode ser de importância decisiva não só na interpretação de uma norma válida, mas também no estabelecimento da validade dessa norma. Finalmente, isso vale também para o estabelecimento de fatos empíricos. Assim, o que se considera como fato na fundamentação pode depender da interpretação de uma regra do ônus da prova. Precisamente, estas variadas inter-relações tornam necessário, não se quer confundir tudo, distinguir cuidadosamente os três métodos de fundamentação mencionados. Só assim se podem analisar suas interconexões. [16: Confira sobre isso, H. L. A. Hart, The Concept of Law, p. 102 s. ] 
Na exposição que segue se ressaltará a fundamentação das premissas que não são nem regras de direito positivo nem enunciados empíricos. Quando no que se segue se falar de “justificação externa”; por tal se estará referindo à justificação destas premissas. 
1 	Os seis grupos de regras e formas de justificação externa 
As formas de argumentos[footnoteRef:17] e as regras de justificação externa podem classificar-se, grosso modo, em seis grupos: regras e formas [17: Sobre o conceito de forma de argumento, confira supra, Parte 1.1.3.5.] 
(1) de interpretação,
2) da argumentação da Ciência do Direito (dogmática), 
(3) do uso dos precedentes, 
(4) da argumentação prática geral e 
(5) da argumentação empírica,[footnoteRef:18] assim como [18: A argumentação empírica serve tanto diretamente para a justificação dos enunciados empíricos empregados na justificação interna. como também para a justificação dos enunciados empíricos empregados na justificação externa de enunciados não empíricos.] 
(6) das chamadas formas especiais de argumentos jurídicos.[footnoteRef:19] [19: Para a classificação das regras e formas da justificação externa, confira Fr. Müller, que distingue os seis grupos seguintes de elementos de concreção: (1) elementos metodológicos, (2) elementos normativos, (3) elementos dogmáticos, (4) elementos de teoria, (5) elementos de técnicas de solução de problemas e (6) elementos de política constitucional e jurídica (Fr. Müller, Juristische Methodik, p. 266, 146 ss.). ] 
Para designar estes grupos com uma só palavra, pode-se eleger as palavras: 
(1) lei, 
(2) Ciência do Direito, 
(3) precedente 
(4) razão, 
(5) empiria e 
(6) formas especiais de argumentos jurídicos. 
A tarefa de uma teoria da justificação externa é, em primeiro lugar, a análise lógica das formas de argumentação que se reúnem nestes grupos. O principal resultado desta análise é a compreensão da necessidade e possibilidade de sua vinculação. A investigação das interconexões entre argumentos de diferentes formas deve esclarecer, sobretudo, o papel da argumentação empírica e da argumentação prática geral no discurso jurídico. 
2 A argumentação empírica 
A argumentação empírica em si mesma não pode ser examinada aqui detalhadamente. Só pode apontar-se sua relevância, que consiste em que quase todas as formas de argumentação jurídica - igualmente quase todas as formas de argumentação prática geral - incluem enunciados empíricos. Devem-se considerar enunciados de tipos completamente diferentes. Assim, algumas formas de argumentação pressupõem enunciados sobre fatos singulares, sobre ações concretas, motivos dos agentes, acontecimentos ou estados de coisas. Em outros se requerem enunciados sobre regularidades das ciências naturais ou das ciências sociais. Também se pode distinguir entre enunciados sobre ações, acontecimentos ou estados de coisas passados, presentes e futuros. Estes enunciados podem corresponder de novo a diversas áreas da ciência, como a Economia, a Sociologia, a Psicologia, a Medicina, a Linguística etc.[footnoteRef:20] [20: Para uma análise dos enunciados empíricos usados pelo Tribunal Constitucional Federal, confira K J. Philippi, Tatsachenfeststellungen des Bundesverfassungsgerichts, Köln/Berlim/ Bonn/München, 1971. Sobre os diferentes tipos de conhecimento necessário para a argumentação jurídica, confira também C. Starck, Empirie in der Rechtsdogmatik, em: IZ, 1972, p. 614. Sobre a importância do conhecimento científico-social da extensa literatura, apenas se citará: K-D. Opp, Soziologie im Recht, Reinbek, 1973, p. 79 ss., e W. Naucke, Ober die juristische Relevanz der Sozialwissenschaften, Frankfurt a. M., 1972, p. 34 ss. ] 
Isso evidencia que uma teoria que leve em conta a argumentação empírica necessária nas fundamentações jurídicas tem de se ocupar de quase todos os problemas do conhecimento empírico,[footnoteRef:21] cuja inclusão na argumentação jurídica só se pode resolver mediante uma cooperação interdisciplinar.[footnoteRef:22] [21: Aqui se teria de referir a toda a teoria da ciência, assim como a toda a literatura psicológica que se ocupa do processo de conhecimento. ] [22: A capacidade de cooperação interdisciplinar pressupõe sempre uma adequada formação. Sobre isso, confira por todos K.-D. Opp, op. cit., p. 219 e ss. ] 
Na teoria do discurso prático geral, a importância do conhecimento empírico fica expressa por meio da regra de transição (6.1): 
"Para qualquer falante é, em qualquer momento, possível passar a um discurso teórico (empírico)". 
Essa regra vigora também no discurso jurídico. Assim como no discurso prático geral, também aqui permanece a questão de como se deve proceder no discurso empírico. 
Tanto no discurso prático geral como no discurso jurídico surge o problema de que frequentemente não se pode obter o conhecimento empírico necessário com a certeza desejável. Nesta situação são necessárias regras de presunção racional. Ao mesmo tempo, a relevância do conhecimento empírico para as argumentações jurídicas dificilmente pode ser subestimada.[footnoteRef:23] Em numerosas discussões jurídicas, a apreciação dos fatos desempenha papel decisivo. Se há acordo sobre os enunciados normativos que se devem aceitar, a decisão depende unicamente de quais fatos se devem tomar como base. [23: Sobre isso, confira, por exemplo, R. Rottleuthner, Rechtswissenschaft als Sozialwissenschaft, p. 205 ss. ] 
Indubitavelmente, é equivocado pensar que se pode reduzir o discurso jurídico a um discurso empírico. Isso é inviável no caso do discurso jurídico como no discurso prático geral. As razões que se expõem para isso na teoria do discurso prático geral valem também para o discurso jurídico. 
Ainda que nas considerações que se seguem seja sempre ressaltada a relevância dos argumentos empíricos, o ponto essencial está na relação das formas de argumentação prática geral e as formas de argumentação jurídica. Pretende-seanalisar nesta perspectiva a interrelação das diferentes formas de fundamentação. 
3 Os cânones de interpretação 
Os cânones da interpretação têm sido, desde Savigny,[footnoteRef:24] objeto de muitas discussões. Até hoje não há acordo quanto ao seu número, sua formulação precisa, sua hierarquia e seu valor. Não faz sentido tomar postura nesta disputa sem saber o que são esses cânones. Por isso, deve-se tratar em primeiro lugar de sua estrutura lógica. [24: Fr. C.v. Savigny, System des heutigen Römischen Rechts, vol. 1, Berlim, 1840, p. 212 ss. ] 
É conveniente discutir a estrutura lógica dos cânones mediante um modelo o mais simples possível de justificação interna. No que se segue se utilizará a expressão abreviada de (J.1.2). 
(J.1.2) .(1) (Tx ORx) (R) 
 .(2) (Mx Tx) (W) 
 .(3) Ma 
 	.(4) ORa 	(1)-(2) 
A partir de (1), a norma R, e de (2), a regra de uso das palavras, W, se segue a norma concreta R'. 
 (2') (Mx ORx) 
R' pode-se designar como "interpretação de R através de W' (Irw). 
Uma das tarefas mais importantes dos cânones consiste na fundamentação de tais interpretações. Porém, sua função não se esgota aqui. Podem-se utilizar também diretamente na fundamentação de normas não positivas, assim como na fundamentação de muitos outros enunciados jurídicos. 
A discussão a seguir sobre os cânones não tem a finalidade de realizar uma análise nem completa nem detalhada das formas de argumentação que se sintetizam tradicionalmente com os argumentos interpretativos. Seu sentido consiste simplesmente em tornar mais clara a função destas formas de argumentação no discurso jurídico. De tal modo, é suficiente destacar algumas características típicas de algumas formas. Para isso, os cânones podem-se agrupar em seis grupos: os da interpretação semântica, genética, histórica, comparativa, sistemática e teleológica.[footnoteRef:25] Será mostrado que estes grupos constituem classes e argumentos de formas diferentes. [25: Para outras classificações, confira supra, Introdução.] 
3.1 As formas concretas de argumentos 
(1) Pode falar-se de argumento semântico quando se justifica, se critica ou se afirma como possível, com referência ao uso da linguagem, uma interpretação R' de R. A regra W deve entender-se aqui como uma especificação da linguagem natural ou de uma linguagem técnica, em particular a da Ciência do Direito. Se W pressupõe uma determinação[footnoteRef:26] da decisão por uma destas linguagens, então não há nenhum argumento semântico, pois tal determinação não se pode justificar por referência a um uso existente. Para isso são necessários outros argumentos adicionais. [26: Sobre os conceitos de especificação [Festsellung] e determinação [Festsetzung] de uma linguagem, confira E. v. Savigny, Grundkurs im wissenschaftlichen Definieren, Munique, 1970, p. 22 s. ] 
Os argumentos semânticos podem ser usados para justificar, criticar, ou mostrar que uma interpretação é admissível, ao menos semanticamente. De acordo com isso, podem-se distinguir três formas de argumentos: 
(J.3.1) R' deve ser aceita como interpretação de R, com base em Wi. 
(J.3.2) R' não pode ser aceita como interpretação de R com base em Wk. 
(J.3.3) É possível aceitar R' como interpretação de R e é possível não aceitar R' como interpretação de R, pois não regem nem Wi nem Wk.
O uso dos argumentos desta forma implica a afirmação da validade ou da não validade de Wi e ou Wk. Aqui não há de se discutir sobre como se pode fundamentar a afirmação de que uma regra semântica tenha ou não validade. Podem imaginar-se tantas formas diferentes quantas diversas forem as invocações do falante à sua competência linguística, à investigação empírica e à referência à autoridade de dicionários. 
Os argumentos da forma (J.3.1) e (J.3.2) são definitivos se, com base em a regra semântica, se estabelece que A rege-se pela norma R ou que não é este o caso. O argumento semântico é suficiente aqui para a fundamentação de uma decisão por meio de R.[footnoteRef:27] A situação é bastante distinta no caso da aplicabilidade de (J.3.3). Aqui, a interpretação semântica leva ao resultado de que, apenas com meios semânticos, não se pode alcançar nenhuma decisão.[footnoteRef:28] Pode-se determinar que T é vago e que A entra nesse campo da vagueza de T.[footnoteRef:29] A questão de A se enquadrar em T não pode ser contestada por meio de uma especificação da linguagem, mas por uma determinação. As formas de argumentos que agora serão discutidas servem, entre outras coisas, para justificar tais determinações. [27: Argumentos da forma (J.3.1) e (J.3.2) sustentam a fundamentação de uma decisão só relativamente a uma norma R (aqui, R1)' Se não se quer aceitar este resultado fundamentado por meio de argumentos semânticos das formas indicadas, é possível modificar R1. A aplicabilidade indesejada de RI pode ter lugar limitando R1 (Ix) [T1x ORx]), mediante uma característica F adequada para A, (AR2 (x) [T1x Fx ORx]), 
(redução teleológica). Em caso de inaplicabilidade indesejada de R1 é possível, por exemplo, por meio da forma de argumento por analogia, fundamentar uma norma R3 (Ix) [T2x ORx]), que se enquadra em T2 de forma diferente do que em TI' Pode-se estabelecer por isso de maneira geral que, quem quer argumentar contra uma decisão fundamentada por meio de (J.3.1) ou (J.3.2), deve estar em condições de fundamentar uma norma não jurídica-positiva como R2 ou R3.] [28: Confira sobre isso a pertinente observação de Savigny sobre o conhecimento da vagueza: "Mas, precisamente por isso, termina com a clara compreensão da natureza da dúvida existente e ao mesmo tempo não se fecha com sua dissolução" (Fr. C. v. Savigny, System des heutigen Römischen Rechts, vol. 1, Berlim, 1840, p. 228). ] [29: Sobre o conceito de vagueza, confira W P. Alston, Vagueness, em: The Encyclopedia of Philosophy, vol. 8, p. 218 ss.; com mais bibliografias. ] 
(2) Há um argumento genético quando se justifica uma interpretação R' de R, porque ela corresponde à vontade do legislador. Podem-se distinguir duas formas principais de argumentos genéticos. A primeira, quando se diz que Irw = R' é o objeto direto da vontade do legislador; a segunda, quando se afirma que o legislador perseguiu com R os fins Z1, Z2, ...Zn na combinação K ([Z1, Z2..., Zn]K), e a validade de R na interpretação Irw é necessária para a realização de (Z1, Z2, Zn)K. Esta segunda forma fundamental é uma variante do argumento teleológico. Se se escreve (Z1, Z2, ...Zn)K abreviadamente como Z, então ambas as formas têm a seguinte estrutura: 
(J.4.1) .(1) R'(= Irw) é querido pelo legislador 
 (2) R' 
(J.4.2) .(1) Com R o legislador pretende alcançar Z 
 .(2) R'(= Irw) Z 
 (3) R' 
Nem em (J.4.1) nem em (J.4.2), R' se segue logicamente da ou das premissas mencionadas. Em (J.4.1) é necessária uma premissa adicional ou regra de inferência[footnoteRef:30] que tenha, por exemplo, o seguinte conteúdo: [30: Sobre a questão de se as regras como (a)-(c) devem classificar-se como premissas ou como regras de inferência, confira supra, Parte. 1.1.3.3.4.] 
(a) É uma razão para a validade de R' que o legislador deseje que R se interprete mediante W(=Irw +R') 
Mais interessantes são as premissas ou regras de inferência pressupostas em (J.4.2): 
(b) Que o legislador persiga com R o fim Z é uma razão para que na aplicação de R seja obrigatório perseguir Z. 
(c) Se é obrigatório perseguir o fim Z, então também é obrigatório qualquer meio necessário para a realização de Z. 
(a) e (b) estão formulados de forma relativamente fraca. A vontade do legislador é só uma razão para uma interpretação. Isto abre possibilidade a razões contrárias. Mais interessante é a regra de inferência (c) que se baseia no esquema.[footnoteRef:31] [31: Um argumento da forma (S) pode-se reduzir sem dificuldades a uma forma como (4.2) ou (4.3). No caso de (4.2), apresenta-se, por exemplo, como razão para N a consequência F de uma ação a que através de N, se afirma comoordenada. A descrição da consequência F em (4.2) corresponde a Z em (S). Em (4.2) R significa que uma ação está ordenada se tem como consequência F. Isto se expressa em (S) não se acrescentando uma regra, mas por meio de OZ. A premissa M Z está pressuposta em (4.2), ao afirmar que F é uma consequência de A. Em (4.2) N significa que A está ordenado. Em (S) a correspondente A está ordenada enquanto meio M para Z (OM). 
Deve-se destacar uma vez mais que tanto (4.2) como também (S) são as formas básicas mais simples. Não só podem-se distinguir muitas outras formas, mas estas mesmas formas podem ser analisadas de modo consideravelmente mais detalhado. Aqui é importante apenas o fato de que argumentos sob as formas mencionadas anteriormente (S), como também (J.4.2), podem transformar-se, da maneira descrita, nas formas correspondentes a (4.2) ou (4.3). Isso vale também para as outras formas de argumentos jurídicos, ainda por elaborar, que se baseiam em (S).] 
(S) . (1) OZ 
 (2) M Z 
 .(3) OM 
Na linguagem ordinária, (S) se pode formular, entre outras, da seguinte forma: 
(1) É obrigatório alcançar o estado de coisas Z.
(2) Se não ocorre M, então não se alcança Z (isto é, M é uma condição para Z). 
(3) É obrigatório que ocorra M. 
Pode se ver (S) como variante de um silogismo prático.[footnoteRef:32] Para provar a validade de (S), seriam necessárias considerações fundamentais em relação tanto à lógica deôntica como à teoria da relação meio-fim. Tais considerações não devem efetuar-se aqui. A intuitiva plausibilidade de (S), porém, permite supor que tais investigações levariam a muitas precisões, modificações e limitações que, porém, não afetariam basicamente a validade de (S).[footnoteRef:33] Com essa restrição pode-se aceitar (S) e, portanto, (c) e (J.4.2). [32: Sobre os diferentes significados deste conceito, confira supra, parte I.I.3.3.4. ] [33: Para um esquema como (S), confira O. Weinberger, Rechtslogik, Viena/Nova York, 1970, p. 219 s., que considera tal esquema “bastante convincente, ainda que não esteja acima de dúvidas”.] 
As formas da interpretação semântica incluem enunciados sobre a validade das regras semânticas; as da interpretação genética, enunciados sobre a vontade do legislador. Estes enunciados não são frequentemente explícitos. firma-se simplesmente que uma determinada interpretação expressa o teor da norma, a vontade do legislador ou o fim da norma. Em tal caso, o argumento é incompleto. Para completá-lo são necessários enunciados do tipo indicado. Isso pode chamar-se "requisito de saturação”. A validade dos argumentos nas diversas formas depende da validade dos enunciados que se estabelecem para dita saturação. Para fundamentar a validade desses enunciados, são necessários argumentos de novas formas. 
A fundamentação dos enunciados necessários para a saturação das formas do argumento genético é às vezes muito difícil e, com frequência, impossível. Isso se une ao fato de que, por um lado, não é claro quem se deve considerar como sujeito da “vontade do legislador”, por outro lado, frequentemente não é possível determinar precisamente o conteúdo desta vontade. É a totalidade dos parlamentares o sujeito da vontade em questão? Se é assim, o que ocorre se a maioria dos parlamentares não tem nenhuma ideia sobre uma determinada prescrição de um dos temas a ser legislado? Devem adotar-se as interpretações dos que, por exemplo, em um ministério, redigiram a lei e debateram nos diferentes comitês e comissões? O que ocorre se expressaram diferentes opiniões e a própria expressão destas opiniões deve ser, por sua vez, interpretada?[footnoteRef:34] [34: Sobre esses problemas, confira K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p. 315 ss., bem como A. Mennicken, Das Ziel der Gessetzesauslegung. Bad Homburg v. d. H./Berlim/Zurique, 1970, p. 30 ss, com inúmeras dicas literárias.] 
 Essas perguntas evidenciam as dificuldades das argumentações genéticas[footnoteRef:35]. Aqui só pode se afirmar que, tanto na determinação da vontade dos que participam no processo e na legislação como na especificação de um uso da linguagem o que se busca é o estabelecimento de fatos.[footnoteRef:36] Por isso, a argumentação semântica e a genética se apresentam como casos especiais da argumentação empírica. [35: Para um caso típico de argumentação crítica genética, confira J. Esser, Bemerkungen zur Unentbehrlichkeit des juristischen Handwerkzeugs, em: lZ, 1975, p. 555 ss.] [36: Confira por exemplo Fr. Wieacker, Über strengere und unstrenge Verfahren der Rechtsfindung, p. 432, que fala da "intenção empírica do legislador histórico".] 
(3) Fala-se de argumento histórico quando se expõem fatos que se referem à história do problema jurídico discutido, como razões a favor ou contra uma interpretação. Aqui se aludirá a uma forma especialmente interessante de argumento histórico. Consiste em demonstrar: 
(1) Já se deu uma vez determinada solução para o problema discutido; 
(2) esta conduziu à consequência F; 
(3) F é indesejável; 
(4) as situações não são entre si tão diferentes para que F não ocorra hoje, e
(5), portanto, a solução em questão não é aceitável hoje. Trata-se aqui de um caso de aprendizado da História. 
O importante é que o argumento desta forma não pressupõe só conhecimento histórico, sociológico e econômico, mas que, com (3), inclui-se também uma premissa normativa, que deve ser fundamentada. (4) Nos argumentos comparativos se toma como referência, não um estado de coisas jurídicas anteriores, mas o de outra sociedade. A forma de argumentação acima mencionada pode transformar-se, mediante uma pequena modificação, em uma do tipo comparativo. A forma de argumento comparativo inclui, como na do argumento histórico, além de numerosas premissas empíricas, pelo menos uma premissa normativa. 
(5) Com a expressão argumento sistemático se compreende tanto a referência à situação de uma norma no texto legal,[footnoteRef:37] como a referência à relação empírica ou teleológica de uma norma com outras normas, fins e princípios. Aqui se tratará da última questão. Quando entram em jogo relações teleológicas, está-se diante de um argumento sistemático-teleológico.[footnoteRef:38] Esses argumentos são melhor entendidos no contexto da argumentação teleológica. No sentido estrito, só devem considerar-se como argumentos sistemáticos aqueles que se referem unicamente às relações lógicas entre normas. [37: Para esta argumentação a partir do sistema externo, confira K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p. 313.] [38: Para a conexão entre os argumentos sistemáticos e teleológicos, confira K. Larenz, op. cit., p. 315; K. Engisch, Einführung in das juristische Denken, p. 79. ] 
A forma mais importante de argumento sistemático nesse sentido estrito é a indicação de uma contradição normativa.[footnoteRef:39] Se a interpretação de R1 por meio e W1R1 contradiz a norma R2 que se deve reconhecer como válida, então se deve abandonar R1. A indicação de uma contradição somente ocorre se todas as interpretações de R1 forem excluídas por outras normas. Com frequência, não é este o caso. [39: Os argumentos relacionados com o impedimento de contradições normativas são casos de aplicação da regra geral do discurso (1.1). Confira supra, parte II, 4.] 
(6) Um esclarecimento completo do conceito de argumento teleológico pressupõe uma análise detalhada dos conceitos de fim e de meio, assim como dos conceitos vinculados aos de vontade, intenção, necessidade prática e fim.[footnoteRef:40] [40: Para uma análise deste tipo, confira W Stegmüller, Probleme und Resultate der Wissenschaftstheorie und Analytischen Philosophie, vol. 1, Wissenschaftliche Erklarung und Begründung, reimpressão revisada, Berlim/Heidelberg/Nova York, 1974, p. 518 ss.; G. H. v. Wright, On So-Called Practical Inference. Acta Sociologica 15 (1972/73), p. 39 s. Na literatura jurídica, confira como posição crítica R. Dreier, Zum Begriff der "Natur der Sache", Berlim, 1965, p. 103 ss. ] 
Aqui não se pode empreendertal análise detalhada. Porém, é possível, inclusive sem uma investigação completa, efetuar algumas considerações sobre a estrutura da argumentação teleológica, que são importantes para este trabalho. 
No contexto da discussão sobre a interpretação genética se mostrou que há argumentos teleológicos em que aqueles que argumentam podem aludir diretamente aos fins do legislador histórico. Aqui se consideram aqueles argumentos teleológicos em que isso não é possível. Segundo Larenz, denominam-se "teleológico-objetivos"[footnoteRef:41]. [41: Confira K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p. 322.] 
Os argumentos teleológico-objetivos são aqueles em que quem argumenta se refere não a fins de pessoas realmente existentes no passado ou no presente, mas a fins "racionais" ou “prescritos objetivamente no contexto do ordenamento jurídico vigente”. Com isso surge a questão de que fim se deve contemplar como racional ou como prescrito objetivamente no ordenamento jurídico vigente. A resposta da teoria do discurso consiste em afirmar que são aqueles que estabeleceriam quem deve tomar decisões considerando-se o ordenamento jurídico vigente com base em uma argumentação racional. A comunidade de quem deve tomar decisões levando em conta o ordenamento jurídico vigente, baseando-se na argumentação racional, é o sujeito hipotético dos fins propostos nos argumentos teleológico-objetivos. As afirmações finalistas dos intérpretes são hipóteses sobre os fins estabelecidos por este sujeito hipotético. Sua correção deve fundamentar-se por meio da argumentação racional. 
Os fins de que se trata na interpretação teleológica não são por isso fins que se determinem empiricamente, mas fins caracterizados normativamente. Por fim caracterizado normativamente deve entender-se aqui um estado de coisas prescrito ou um fato prescrito.[footnoteRef:42] [42: Sobre os conceitos "estado de coisas" e "fato", confira G. H. v. Wright, Norm and Action, p. 25 ss. ] 
A prescrição de um estado de coisas ou um fato pode simbolizar-se mediante "OZ". A necessidade da interpretação Irw=R' para alcançar Z (portanto, sua apresentação como um meio para Z),[footnoteRef:43] pode indicar-se por meio de uma expressão da forma R' (= Irw) Z. [43: Ser I = R' um meio para Z pode significar várias coisas: (1) a aplicação de R' num caso concreto é um meio para Z, (2) o cumprimento geral de R' é um meio para Z, (3) a validade de R' é um meio para Z. Aqui se considerará que a validade de R' é um meio para Z.] 
A expressão mais simples de um argumento teleológico tem por isso a seguinte forma: 
(J.5) 	 .(1) OZ 
 .(2) R' (= Irw) Z.
 .(3) R' 
(J.5) se relaciona com a forma de argumento genético (J.4.2) com a diferença de não ser Z querido pelo legislador, mas afirmado como algo objetivo.[footnoteRef:44] O esquema geral em que se baseia, precisamente como em (JA.2), é [44: (J.5) se relaciona com a combinação das formas de argumento analisadas por Dreier sob a denominação de argumentação "prática técnica" e "argumentação prática objetiva a partir da natureza da coisa”. (J.5) é prática técnica porque (J.5) inclui a proposição de que, se R deve servir ao fim Z, então R deve estar investido da propriedade "interpretado através de W' (confira R. Dreier, Zum Begriff der "Natur der Sache", p. 106 ss., 108 ss., 120 ss., 124).] 
(S) 	 .(1) OZ 
 .(2) M Z 
 .(3) OM 
(J.5) pressupõe a validade de duas premissas completamente diferentes “OZ” (1), é um enunciado normativo, e “M Z”; (2), um enunciado empírico. Para fundamentar a verdade de (2) é necessário o conhecimento de legalidades empíricas. Os argumentos teleológicos remetem por isso a argumentações empíricas. Se, o que não é raro, não existe discussão sobre (1), então a decisão depende só de argumentos empíricos. Isto mostra a considerável importância as argumentações empíricas no discurso jurídico. 
Aqui só interessa a fundamentação de (1). (1) é quase sempre fundamentação conforme a norma a aplicar-se. Afirma-se que, sendo R válida, está prescrita a realização do estado de coisas Z. Frequentemente, Z se fundamenta não com referência a uma única norma, mas a um grupo de normas. Em nenhum dos casos, porém, Z se segue logicamente das normas a que alude na sua fundamentação. São necessários, por isso, novos argumentos. Só não é assim se uma norma prescreve diretamente a consecução de Z. 
Usualmente ocorre que a uma norma ou um grupo de normas pode-se atribuir não um fim, mas diversos fins que ou se excluem entre si ou só se podem realizar mediante sua limitação recíproca.[footnoteRef:45] Aqui é necessário mostrar como obrigatória uma determinada combinação de fins ([Z1, Z2, Zn] K). Isto pressupõe a aplicação de regras de preferência. [45: Para a compreensão de que uma norma nunca está ordenada a um só fim, confira J. Esser, Vorverständnis und Methodenwahl in der Rechtsfindung, p. 102; K. Engisch, Einführung in das juristische Denken, p. 80.] 
Os problemas mais difíceis da argumentação teleológica surgem se Z ou (Z1, Z2, Zn) K - a seguir, mais uma vez, só se falará de Z - não se podem descrever unicamente por meio de expressões empíricas. Este é o caso quando Z é um estado de coisas que é definido de maneira que nele regem determinadas normas.[footnoteRef:46] [46: Confira sobre isso, supra, Parte II.4.4.] 
Um caso limite de tal estado de coisas se dá quando Z é determinado por um estado de coisas regido pela norma que fundamenta R'. Neste caso, a referência a Z só pode cumprir a função de esclarecer o que significa a validade de R'.
Geralmente, para a descrição de tal estado de coisas são necessárias normas de tipo geral ou princípios.[footnoteRef:47] Z é então o estado de coisas regidos pelos princípios P1, P2, ..., Pn. A argumentação teleológica se torna, com isso, argumentação a partir de princípios.[footnoteRef:48] O problema da argumentação a partir de princípios não consiste tanto na justificação dos princípios, mas especialmente no fato de a norma a ser fundamentada não se seguir em geral diretamente dos princípios. É necessária uma concreção dos princípios com a ajuda de novos enunciados normativos. [47: Por princípios deve-se entender aqui proposições normativas de um alto nível de generalidade como: "deve-se respeitar a dignidade humana”, "devem-se tratar igualmente os iguais" e "cada um deve responder pelas deficiências em seus círculos comerciais". Devido ao seu alto grau de generalidade, estas proposições não são utilizáveis diretamente para fundamentar uma decisão. São necessárias premissas normativas adicionais. Sobre o conceito de princípio, confira J. Esser, Grundsatz und Norm in der richterlichen Fortbildung des Privatrechts, Tübingen, 1956, p. 87ss.; ibid., Vorvertändnis und Methodenwahl in der richterlichen Rechtsfindung, p. 42; C. W. Canaris, Systemdenken und Systembegriff in der Jurisprudenz, p. 48 ss.; K. Larenz, op. cit., p. 458. Sobre o conceito de generalidade, confira R. M. Hare, Principles, p. 2 s.] [48: Confira, por exemplo, K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p. 323 ss., que - sem distinguir entre estados de coisas e princípios - inclui princípios como o de igualdade de tratamento e princípios éticos entre os "critérios de interpretação teleológico-objetivos". Confira ademais, K. Engisch, op. cit., p. 81, que, pelos motivos mencionados, define a ideia de que a denominação "interpretação a partir de razões" seria mais adequada que a de “interpretação a partir de fins”.] 
3.2 O papel dos cânones no discurso jurídico 
Para esclarecer o papel dos cânones no discurso jurídico, devem-se distinguir seis pontos: 
(1) o campo de sua aplicabilidade, 
(2) seu status lógico, 
(3) o requisito de saturação, 
(4) as diversas funções das diversas formas, 
(5) o problema de sua hierarquia e (6) a resolução do problema da hierarquia na teoria do discurso jurídico. 
(1) As diferentes formas de argumentos foram consideradas como formas de argumentos a favor ou contra uma determinada interpretaçãoI de uma norma R pressuposta, por meio de uma regra de uso das palavras, W (Irw = R'). 
Com exceção da interpretação semântica, todas as formas de argumentos podem também se utilizar numa multiplicidade de novos contextos. Tais contextos são, em particular, o conflito de normas, a restrição do campo de aplicação das normas e a fundamentação de normas que não se podem deduzir da lei. Assim, por exemplo, num conflito de normas pode-se afirmar que o legislador atribuiu especial importância a uma norma. Em caso de fundamentação de uma interpretação restritiva, são possíveis referências a legislações paralelas e seguidas já em outros Estados, e em caso de fundamentação de uma norma que não se extrai do direito positivo pode se apresentar como argumento um fim que se deve perseguir. A caracterização tradicional das formas de argumentos que se discutem dentro dos cânones da interpretação é muito estreita. 
(2) Qual é o status lógico dos cânones é uma questão discutida. Rottleuthner nega que tenham caráter de regra. Só podem ter a função de "informar pontos de vista relevantes, indicar linhas de investigação”.[footnoteRef:49] Hart os designa como “regras gerais para o uso da linguagem”.[footnoteRef:50] Müller fala de "elementos de concreção" e de "momento(s) de um processo único de interpretação”.[footnoteRef:51] Larenz, de “pontos de vista retores a que se confere peso variável”.[footnoteRef:52] [49: H. Rottleuthner, Richterliches Handeln, p. 30; ibid., Rechtswissenschaft als Sozialwissenschaft, p.197.] [50: H. L. A. Hart, The Concept of Law, p. 123.] [51: Fr. Müller, Juristische Methodik, p. 145.] [52: K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p. 332.] 
As considerações anteriores mostraram que as formas distintas de argumentos não são, na realidade, regras. Não indicam o que se deve fazer ou o que - deve alcançar condicionada ou incondicionalmente. Por outro lado, são mais e simples pontos de vista ou linhas de investigação. A melhor forma de designá-las, para usar um conceito de Perelman, é como esquemas de argumentos schêmes d'arguments).[footnoteRef:53] Trata-se de esquemas de enunciados de uma maneira determinada, a partir dos quais se segue logicamente um enunciado de forma determinada ou este enunciado pode ser fundamentado de acordo com uma regra pressuposta. Por esta razão, são designados “formas de argumentos”[footnoteRef:54]. [53: Ch. Perelman; L. Olbrechts-Tyteca, Traité de L’argumentation, p. 252.] [54: Sobre o conceito de forma de argumento, confira supra, Parte 1.1.3.3.5.] 
Como formas de argumentos, os cânones caracterizam a estrutura do ordenamento jurídico. Uma análise completa de todas as formas de argumentos possíveis no discurso jurídico resultaria em algo como uma gramática da argumentação jurídica. Para prosseguir com a analogia, isso certamente não determina nada ainda sobre o que se deve afirmar por meio da linguagem construída segundo esta gramática. Não obstante, mostra como se deve proceder para alcançar um resultado racional. 
(3) Um argumento de uma forma só é completo se contém todas as premissas pertencentes a esta forma. A isto se chama o requisito de saturação.[footnoteRef:55] As premissas que precisam ser saturadas são de diferentes tipos, o que gera maneiras completamente diferentes de fundamentação. [55: Confira supra, Parte III.II.2.3.1.] 
Papel relevante desempenham as fundamentações empíricas. Devem fundamentar-se empiricamente a especificação de um uso da linguagem, as afirmações sobre a vontade do legislador ou das pessoas que participam no processo de legislação, sobre estados anteriores de coisas jurídicas ou sobre o estado do Direito em outros Estados, assim como as hipóteses que servem de base às afirmações sobre consequências. 
Além dos enunciados empíricos, as formas de argumentos contêm premissas normativas que não se extraem da lei. Isto vale, por exemplo, para as formas de interpretação histórica, comparativa e teleológica, que pressupõem a caracterização de estados de coisas. Na fundamentação destes pressupostos normativos não se deve recorrer sempre, diretamente, ao meio do discurso prático geral. Assim, para determinada fundamentação, pode utilizar-se principalmente um argumento comparativo. Para a fundamentação da valoração pressuposta neste argumento pode-se fazer referência a fins que estão unidos a outras normas. Só neste ponto podem ser necessários argumentos práticos de tipo geral. 
A exigência de saturação assegura a racionalidade do uso dos cânones. Isso exclui a simples afirmação de que um argumento pode ser o resultado de uma determinada interpretação literal, histórica ou finalista da norma. Sempre é necessário apresentar premissas empíricas ou normativas, cuja verdade ou correção pode ser objeto de novas discussões a qualquer momento. A regra: 
(J.6) Deve ser saturada toda forma de argumento que houver entre os cânones da interpretação, impede por isso falas vazias. 
(4) As diferentes formas cumprem diferentes funções. As formas da argumentação semântica e genética se referem à vinculação dos órgãos decisores, respectivamente, ao teor da lei e à vontade do legislador. As formas históricas e comparativas permitem a incorporação da experiência do passado e de outras sociedades. A interpretação sistemática serve, entre outras coisas, para eliminar contradições no ordenamento jurídico. Finalmente, as formas teleológicas dão espaço à argumentação prática racional de tipo geral. Com isto se caracteriza respectivamente uma função proeminente em cada uma das diferentes formas. 
(5) A função específica de cada uma das diferentes formas esclarece que argumentos de formas distintas podem levar, no contexto da discussão de um problema, a soluções completamente diferentes. Disto resulta uma dupla insegurança no uso dos cânones. Uma forma pode ser saturada de diversos modos e podem-se empregar formas distintas para a fundamentação de conclusões diferentes. 
A questão da relação entre os argumentos de formas diferentes é discutida como um problema de estabelecimento de um catálogo de graus ou uma hierarquia dos cânones. Até hoje, nenhuma proposta de tal catálogo encontrou conhecimento geral.[footnoteRef:56] A possibilidade, e também a necessidade, de tal ordenação é valorizada de diferentes maneiras. Segundo Esser, deve-se "julgar fracassada a esperança de que se possa indicar um catálogo de graus nas etapas interpretação”.[footnoteRef:57] Kriele apresentou sobre isto uma série de importantes argumentos.[footnoteRef:58] Larenz se esforça por conseguir uma certa determinação da relação entre os cânones, mas também chega à conclusão de que não há "uma ordem variável entre as distintas formas. Estão em uma relação de reciprocidade e seus pesos respectivos se determinam de acordo com o que ocorre em cada caso”[footnoteRef:59]. Müller fundamenta uma superioridade dos argumentos semânticos e sistemáticos na perspectiva do Estado de Direito.[footnoteRef:60] Engisch considera que se a determinação da ordenação dos métodos de interpretação é "simplesmente impossível de resolver”; então não há em absoluto nenhuma vaga confiança na superação dos problemas da aplicação do Direito.[footnoteRef:61] Ele traz para a discussão m catálogo de prioridades segundo o qual, em primeiro lugar, de acordo com a teoria subjetiva, deve ser decisiva a vontade do legislador, e só se esta não se puder determinar com segurança são pertinentes argumentos teleológico-objetivos.[footnoteRef:62] Porém, limita o valor deste catálogo ao declarar que a polêmica entre a teoria objetiva e a subjetiva da interpretação “ainda não foi definitivamente resolvida e, como todos os verdadeiros problemas de fundamentos, nunca poderá se resolver de maneira definitiva”.[footnoteRef:63] [56: Confira Fr. Müller, Juristische Methodik, p. 198. ] [57: J. Esser, Vorverstündnis und Methodenwahl in der Rechtsfindung, p. 124 s. ] [58: M. Kriele, Theorie der Rechtsgewinnung, p. 85 ss.] [59: Larenz, Methodenlehre der Rechiswissenschaft. p. 334 s.] [60: Fr. Müller, op. cit., p.202 ss. ] [61: K. Engisch, Einführung in das Juristische Denken, p. 225 (nota 82 d).] [62: Ibid., p. 230 ss.] [63: Ibid., p. 96. Sobre a discussão entre a teoria subjetiva e objetiva da interpretação, confira A. Mennicken, Das Ziel der Gesetzeauslegung, p. 30 ss., p. 75 ss.] 
(6) A teoria do discurso também não pode oferecer uma solução do problema, por exemplo, mediante a elaboração de um catálogo de graus, colocando-se a favor da teoria objetiva ou subjetiva da interpretação ou mediante a construção de uma fórmula que relacione ambas. Mas pode dar uma contribuição para a solução do problema ao mostrar de que maneira deve-se usar oportunamente as diferentes formas de argumentos. 
São então vantajosas duas características da teoria do discurso. A primeira consiste em que a teoria do discurso considera também a dimensão pragmática da fundamentação; a segunda, em que ela não pretende proporcionar critérios tão fortes para a determinação com segurança de um resultado simplesmente com base no seu conhecimento.[footnoteRef:64] O que se indicam são regras e formas cujo cumprimento ou utilização faz com que aumente a probabilidade de que numa discussão se chegue a uma conclusão correta, isto é, racional. Mas apenas com base nestas regras e formas não se pode dizer - fora dos casos de necessidade discursiva - qual é o resultado. Para isso deve-se proceder a uma discussão real ou imaginária. [64: Sobre isso, confira, supra, Introdução e parte 11.5.] 
Para assegurar a vinculação desta discussão ao direito vigente, deve-se exigir que os argumentos que expressam uma vinculação tenham prima fade um maior peso. Se um proponente (P) apela, na proposta de solução, ao teor literal ou à vontade do legislador histórico, e o oponente (O), ao contrário, estabelece um fim racional na sua proposta de solução divergente, então os argumentos de P devem prevalecer, a não ser que O possa apresentar não só boas razões em favor de suas afirmações, mas também boas razões demonstrando que seus argumentos são mais fortes que os de P. Na dúvida, as razões de P tem preferência. A seguinte regra de carga da prova na argumentação rege, portanto, como regra pragmática: 
(J.7) Os argumentos que expressam uma vinculação ao teor literal da lei ou à vontade do legislador histórico prevalecem sobre outros argumentos, a não ser que se possam apresentar motivos racionais que deem prioridade a outros argumentos. 
Esta regra deixa aberta a questão de quando há motivos racionais para atribuir um menor peso aos argumentos que expressam uma vinculação. Isto fica livre para os participantes no discurso jurídico. Porém, não significa que esta decisão seja arbitrária. Somente são motivos racionais os que possam justificar-se numa discussão jurídica racional. Numa discussão sobre o uso dos argumentos jurídicos são admissíveis todos os argumentos possíveis no discurso jurídico. Certamente desempenharão papel decisivo os argumentos práticos de tipo geral, pois os argumentos jurídicos sobre os quais se discute não podem ser em- pregados nesta discussão. O problema da hierarquia aparece por isso como um problema a ser resolvido, sobretudo, por meio da argumentação prática geral. 
O fato de delegar a decisão à razão daqueles que argumentam não significa que a determinação da relação entre os cânones esteja sempre aberta e deva efetuar-se de novo em cada caso. As determinações de peso aferidas pelos participantes no discurso nos diferentes contextos de interpretação valem, porque devem ser obtidas a partir de razões, não só para o caso discutido, mas para todos os casos iguais nos aspectos relevantes.[footnoteRef:65] O princípio da universalidade, como princípio básico da teoria do discurso, exige que a relação entre as formas de argumentos estabelecida segundo regras seja fundamentável racionalmente. Surge por isso a regra seguinte como variante do princípio da universalidade: [65: Confira supra, Parte 1.1.3.2.2. ] 
(J.8) A determinação do peso de argumentos de diferentes formas deve ocorrer segundo regras de ponderação. 
Tais regras só podem desenvolver-se em determinados contextos de interpretação e em determinados setores do Direito. Além disso, visto que os conos de interpretação e os setores do Direito mudam, nunca se chega a uma certeza definitiva. 
(J.8) é uma regra do discurso prático geral que diz respeito ao uso dos cânones. Pode-se especificar ainda de maneira análoga outra regra geral do discurso. 
(2.2.a) e (2.2.b) asseguram, com a exigência de liberdade de discurso, admissibilidade de todos os argumentos. Em relação à argumentação jurídica, isto significa que se deve levar em consideração todo argumento que seja possível formular. Rege por isso a regra: 
(J.9) Devem-se levar em consideração todos os argumentos possíveis e que possam ser incluídos por sua forma entre os cânones da Interpretação.[footnoteRef:66] Pode-se dizer, em suma, que os cânones não oferecem a garantia de que se "encontre o único resultado correto... com uma segurança relativamente grande”,[footnoteRef:67] mas são também mais que simples instrumentos de legitimação secundária de uma decisão, a qual se pode encontrar e fundamentar de diferentes maneiras. São formas de que tem de se servir a argumentação jurídica se se quer cumprir a pretensão de correção que se afirma nela e que, diversamente do que ocorre no discurso prático geral, se refere também de maneira especial à vinculação à lei. [66: Sobre uma exigência paralela, confira K. Larenz, Methodenlehre der Rechtswissenschaft, p.335. ] [67: Confira M. Kriele, Theorie der Rechtsgewinnung, p. 85. ] 
4 A argumentação dogmática 
4.1 Conceito de dogmática jurídica 
Para descobrir o que são os argumentos dogmáticos e que papel desempenham no discurso jurídico, é necessário determinar o que se deve entender por "dogmática jurídica" ou "dogmática do Direito”. E isto é tudo, menos algo claro. Há um número crescente de publicações sobre este tema, mas não há uma teoria da dogmática jurídica aceita de maneira geral. 
Se se adota o uso das palavras dominantes entre os juristas, por "dogmática jurídica" ou "dogmática do Direito" deve-se entender a Ciência do Direito em sentido mais estrito e próprio,[footnoteRef:68] tal como é elaborada realmente por eles.[footnoteRef:69] Esta Ciência do Direito no seu sentido mais estrito e próprio é uma mescla de, ao menos, três atividades: (1) a descrição do direito vigente, (2) sua análise sistemática e conceitual e (3) a elaboração de propostas para a solução de casos jurídico-problemáticos. Disso resulta claramente que a dogmática jurídica é uma "disciplina pluridimensional”[footnoteRef:70]. [68: Confira sobre isso, G. Radbruch, Rechtsphilosophie, 7a. ed., Stuttgart, 1970, p. 209. ] [69: Em vez de partir da terminologia atual e dos objetos para cuja designação se usam as expressões "dogmática jurídica" e "dogmática do Direito" poder-se-ia começar com uma análise do conceito de dogmática, com uma investigação sobre sua história e sua utilização em outras disciplinas, particularmente na teologia. Este é o caminho empreendido por uma série de autores (confira, por exemplo, U. Meyer-Cording, Kann der Jurist heute noch Dogmatiker sein? Zum Selbstverständnis der Rechtswissenschaft, Tübingen, 1973, p. 7 ss., H. Albert, Erkenntnis und Recht, Die Jurisprudenz im Lichte des Kritizismus, em: Jahrbuch für Rechtssoziologie und Rechtstheorie, vol. 2 [1972], p. 82 ss., E. J. Thul, Die Denkform der Rechtsdogmatik, em: ARSP 46 [1960], p. 241 ss., confira ainda, D. de Lazzer, Rechtsdogmatik als Kompromissformular, em: Dogmatik und Methode, Festschrift f. J. Esser, Kronberg, 1975, p. 87). Uma combinação de considerações analítico-conceituais, histórico-conceituais e comparativas pode certamente proporcionar perspectivas importantes para se chegar à decisão sobre o que é dogmática jurídica. Tais considerações, porém, só têm sentido se se elaboram com a suficiente profundidade. Isso não pode ser feito agora, mas se efetuará no momento devido. ] [70: R. Dreier, Was ist und wozuAllgemeine Rechtstheorie?, Tübingen, 1975, p. 15; confira também U. Meyer-Cording, Kann der Jurist heute noch Dogmatiker sein?, p. 41, que fala de uma “mescla de muitas atividades diferentes”: bem como K. Adomeit, Zivilrechtstheorie und Zivilrechtsdogmatik - com uma contribuição para a teoria do direito subjetivo, em: Jahrbuch für Rechtssoziologie und Rechtstheorie, vol. 2 (1972), p. 504, especialmente nota 8, que tenta dar conta do "caráter misto" da dogmática jurídica num "modelo de 8 operações”.] 
Em correlação a estas três atividades podem-se distinguir três dimensões, uma empírico-descritiva, outra analítico-lógica e outra prático-normativa.[footnoteRef:71] Em cada uma destas dimensões há diferentes modos de proceder. Na dimensão empírico-descritiva pode-se distinguir, sobretudo, a descrição da práxis dos tribunais e a averiguação da vontade fática do legislador.[footnoteRef:72] A dimensão analítico-lógica inclui tanto a análise dos conceitos jurídicos como também a investigação das relações entre as diferentes normas e princípios. Finalmente, procede segundo uma dimensão prático-normativa, por exemplo, quem propõe e fundamenta a interpretação de uma norma, uma nova instituição, ou quem critica uma decisão judicial quanto a seus defeitos práticos e elabora uma contraproposta. Entre estas três dimensões há numerosas relações. Assim, a descrição do direito vigente pressupõe um determinado instrumental conceitual. A análise lógica do direito vigente não é possível sem sua descrição e, para elaborar propostas de normas e de decisões, visto que elas ocorrem no âmbito do ordenamento jurídico existente, é necessário o conhecimento desse ordenamento jurídico. [71: Em alguns autores se encontra, em lugar de uma divisão tripartida, uma divisão bipartida, por exemplo, entre uma dimensão teórico-descritiva e uma prático-normativa (confira R. Dreier, op. cit., p. 15), ou entre as proposições que informam e as que propõem algo (confira K. Adomeit, op. cit., p. 503 e ss.). Realmente o trabalho lógico-analítico é necessário para a descrição e para a elaboração das propostas de normativização. Por outro lado, deve-se atentar que, embora a dimensão lógico-analítica seja claramente distinguível delas na dogmática jurídica, indubitavelmente é ligada a outras dimensões. ] [72: Confira R. Dreier, Zum Selbstverständnis der Jurisprudenz als Wissenschaft, em: Rechtstheorie 2 (1971), p. 41 ss., que distingue nesse sentido a função da Ciência do Direito de descrição da jurisprudência e da legislação.] 
O cerne da atividade dogmático-jurídica pode distribuir-se de forma diferente nessas dimensões. Sua distribuição depende dos interesses práticos do dogmático ou cientista do Direito, de suas concepções de Teoria do Direito e as peculiaridades do campo de trabalho. Assim, um dogmático que escreve para práticos aborda, sobretudo, a descrição da prática dos tribunais, ao passo que quem empreende uma investigação sobre o conceito de declaração de vontade dá especial ênfase a considerações analíticas. Para quem entende que só é Direito no sentido estrito a vontade do legislador, os argumentos práticos de tipo geral desempenham um papel completamente diferente do que para quem concebe o Direito sobretudo como um ordenamento racional da vida em comum dos homens. 
Ao lado deste conceito muito amplo de dogmática jurídica, que compreende todo o campo da Ciência do Direito no seu sentido mais estrito e próprio, há uma série de conceitos mais estritos. Aqui interessam especialmente aqueles que podem ser designados por expressões como "conceitual", "lógica" e "sistemática"[footnoteRef:73]. Se se buscam, por exemplo, caracterizações mais específicas destes conceitos mais estritos de dogmática, então se tropeça com expressões como "a matemática social da dogmática jurídica" ou "o instrumental argumentativo considerado com absoluta lógica”[footnoteRef:74]. [73: Destaca-se em particular a relação do conceito de dogmática com o de sistema. Assim, Wieacker fala do "conceito de sistema que (é) o constituinte formal da dogmática” (Fr. Wieacker, Zur praktischen Leistung der Rechtsdogmatik, p. 319, nota 22). Esser declara que a "dogmatização de uma matéria jurídica... (estimula) a construção de um sistema" (J. Esser, Vorverständnis und Methodenwahl in der Rechtsfindung, p. 97) e Raiser substitui a expressão "dogmático-jurídica” por "Ciência do Direito sistemática" (L. Raiser, Wozu Rechtsdogmatik? em: DRiZ, 1968, p. 98).] [74: S. Simitis, Die Bedeutung von System und Dogmatik - dragestellt an rechtsgeschäftlichen Probleme des Massenverkehrs, em: AcP 172 (1972), p. 132.] 
A dogmática como matemática social foi praticada em sua forma mais pura pela Jurisprudência de Conceitos do século XIX e que é exemplarmente mostrada nas seguintes observações de Windscheid: "Se a interpretação terminou sua tarefa, fica o desenvolvimento dos conceitos contidos nas proporções jurídicas obtidas através deles. A própria noção de proposição jurídica é representada também em conceitos, isto é, em agrupamentos de elementos de pensamento; trata-se de decompor os conceitos nas suas partes constituintes, de mostrar os elementos de pensamento contidos neles. Pode-se ir mais ou menos longe nesta operação; os elementos descobertos podem por sua vez apresentar-se como uma combinação de outros elementos mais simples, e assim sucessivamente. A nova Ciência do Direito tem a tendência de ir o mais longe possível na decomposição dos conceitos. E nisso consiste seu mérito. Pois, de fato, da exaustiva compreensão do conteúdo dos conceitos contidos nas proposições jurídicas depende não só a total compreensão do Direito, mas também a segurança na sua aplicação. A decisão final é resultado de um cálculo, cujos fatores são os conceitos jurídicos; o cálculo, evidentemente, produzirá um resultado tão mais seguro quanto mais determinado o valor dos fatores. Ao mesmo tempo, é óbvio que só a partir da completa compreensão dos conceitos jurídicos se pode revelar o verdadeiro sistema do Direito, a união interna de suas proposições”[footnoteRef:75]. [75: B. Windscheid, Lehrbuch des Pandektenrechis, 9. ed., elaborado por Th. Kipp, vol. 1, Frankfurt a. M., 1906, p. 110 s., P. Laband, Das Staatsrecht des Deutschen Reiches, 2. ed., em: Handbuch des Offentlichen Rechts, vol. 2, Freiburg/Leipzig, 1894, p. 1-276, prefácio.] 
A dogmática tem então três tarefas: (1) a análise lógica dos conceitos jurídicos, (2) a recondução desta análise a um sistema, e (3) a aplicação dos resultados desta análise na fundamentação das decisões jurídicas. 
Esse modelo de dogmática jurídica foi objeto, desde Jhering, de numerosas críticas.[footnoteRef:76] A objeção mais importante consiste em que unicamente com os meios da análise lógica e da dedução lógica não se podem alcançar novos conteúdos normativos. O uso pela Jurisprudência de conceitos, de formas e de procedimentos aparentemente lógicos para fundamentar decisões e normas que não podem ser extraídas imediatamente da lei significa encobrir as premissas normativas que são necessárias para a fundamentação concludente do ponto de vista lógico. Isso é o que tinha em mente Jhering quando se voltou contra o "culto da lógica que pretende transformar a Jurisprudência numa matemática do Direito"[footnoteRef:77]. [76: Confira, por exemplo, a documentação no artigo de W. Krawietz, Artikel: Begriffsjurisprudenz, em: Historisches Wörterbuch der Philosophie, vol. 1, Basel, 1971, p. 809 ss.] [77: R. v. Jhering, Der Geist des Römischen Rechts, 3ª. parte, 3ª. ed., Leipzig, 1877, p. 311 s. Confira também E. Ehrlich, Die juristische Logik, Tübingen, 1918, p. 299 ss., bem como Ph. Heck, Begriffsbildung und Interessenjurisprudenz, Tübingen, 1932, p. 94 ss.] 
No entanto, da constatação da insuficiência da exclusividade da análise lógica do direito vigente não se infere que a utilização de argumentos sistemas conceituais na argumentação jurídica seja supérflua ou inclusive nociva. Mais ponderado é considerar que o uso de argumentos sistemático-conceituais, junto

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