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(Apost Logica 2023 2) 5 Direito e argumOK

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14
Unidade IV
O GIRO PRAGMÁTICO: 
TÓPICA E RETÓRICA
I. Raciocínio e argumento[footnoteRef:1] [1: ARISTÓTELES, Órganon. São Paulo: Edipro, 2019.] 
Nosso tratado [Tópicos] se propõe encontrar um método de investigação graças ao qual possamos raciocinar, partindo de opiniões geralmente aceitas, sobre qualquer problema que nos seja proposto, e sejamos também capazes, quando replicamos a um argumento, de evitar dizer alguma coisa que nos cause embaraços. Em primeiro lugar, pois, devemos explicar o que é o raciocínio e quais são as suas variedades, a fim de entender o raciocínio dialético: pois tal é o objeto de nossa pesquisa no tratado que temos diante de nós.
Ora, o raciocínio é um argumento em que, estabelecidas certas coisas, outras coisas diferentes se deduzem necessariamente das primeiras. 
(a) O raciocínio é uma "demonstração" quando as premissas das quais parte são verdadeiras e primeiras, ou quando o conhecimento que delas temos provém originariamente de premissas primeiras e verdadeiras: e, por outro lado 
(b), o raciocínio é "dialético" quando parte de opiniões geralmente aceitas. 
São "verdadeiras" e "primeiras" aquelas coisas nas quais acreditamos em virtude de nenhuma outra coisa que não seja elas próprias; pois, no tocante aos primeiros princípios da ciência, é descabido buscar mais além o porquê e as razões dos mesmos; cada um dos primeiros princípios deve impor a convicção da sua verdade em si mesmo e por si mesmo. São, por outro lado, opiniões "geralmente aceitas" aquelas que todo mundo admite, ou a maioria das pessoas, ou os filósofos em outras palavras: todos, ou a maioria, ou os mais notáveis e eminentes.
O raciocínio (c) é "contencioso" ou "erístico" quando parte de opiniões que parecem ser geralmente aceitas, mas não o são realmente, ou, então, se apenas parece raciocinar a partir de opiniões que são ou parecem ser geralmente aceitas. Pois nem toda opinião que parece ser geralmente aceita o é na realidade. Com efeito, em nenhuma das opiniões que chamamos geralmente aceitas a ilusão é claramente visível, como acontece com os princípios dos argumentos contenciosos, nos quais a natureza da falácia é de uma evidência imediata, e em geral até mesmo para as pessoas de pouco entendimento. Assim, pois, dos argumentos erísticos que mencionamos, os primeiros merecem realmente ser chamados "raciocínios, mas aos segundos devemos reservar o nome de "raciocínios erísticos" ou "contenciosos", e não simplesmente "raciocínios', visto que parecem raciocinar, mas na realidade não o fazem.
Mais ainda (d): além de todos os raciocínios que mencionamos existem os paralogismos ou falsos raciocínios, que partem de premissas peculiares às ciências especiais, como acontece, por exemplo, na geometria e em suas ciências irmãs. Com efeito, esta forma de raciocínio parece diferir das que indicamos acima; o homem que traça uma figura falsa raciocina a partir de coisas que nem são primeiras e verdadeiras, nem tampouco geralmente aceitas. Com efeito, o modo de proceder desse homem não se ajusta à definição; ele não pressupõe opiniões que sejam admitidas por todos, ou pela maioria, ou pelos filósofos – isto é, por todos, pela maioria ou pelos mais eminentes –, mas conduz o seu raciocínio com base em pressupostos que, embora apropriados à ciência em causa, não são verdadeiros; e seu paralogismo se fundamenta ou numa falsa descrição dos semicírculos, ou no traçado errôneo de certas linhas.
Síntese
	Raciocínios
	Características
	Demonstrativo 
	Premissas verdadeiras
	Dialético
	Parte de opiniões geralmente aceitas
	Erístico
	Contenciosos
	Paralogístico
	Falsos raciocínios
II. O conceito de argumentação[footnoteRef:2] [2: Cf. ATIENZA, Curso de Argumentação Jurídica. ] 
Assim como existem várias disciplinas que se interessam pela argumentação, também parece haver noções diferentes de argumentação. Por exemplo, os lógicos entendem os argumentos como cadeias de enunciados nos quais, a partir de alguns deles (as premissas), pode-se passar para outro (a conclusão). Mas outros enfoques podem consistir em ver a argumentação como uma atividade ou arte dirigida a estabelecer ou descobrir as premissas; como uma técnica destinada a persuadir alguém de determinada tese; como uma interação social, um processo comunicativo que ocorre entre sujeitos diferentes e que deve respeitar certas regras etc. Essa pluralidade de noções também pode ser observada no mundo do Direito. Por isso, como foi visto, há uma contraposição característica entre a maneira de ver a argumentação por parte dos “precursores” e dos autores que representam a teoria standard da argumentação jurídica. 
A complexidade da noção não deriva simplesmente de que a expressão “argumentação” (ou “argumentar”, “argumento”) seja ambígua. Ou seja, para esclarecer seu significado não basta mostrar em que sentidos distintos se fala de argumentar, mas deve ser também possível explicar que relação existe entre todos eles. E para consegui-lo, uma estratégia adequada pode consistir em utilizar a distinção que se faz entre conceito e concepção, ou seja, entre (a) uma noção muito ampla (um conceito), caracterizada por uma série de propriedades que deveriam estar presentes sempre que tenha sentido falar em argumentação, e (b) interpretações - concepções - distintas desses mesmos elementos. Conseguir-se-ia, assim, certa unidade na diversidade. 
Os elementos que configuram o conceito de argumentação (em um plano muito abstrato) seriam os quatro seguintes: 
1. Argumentar é sempre uma ação relativa a uma linguagem. Pode-se dizer que é um uso da linguagem que se caracteriza (frente a outros usos: descritivo, prescritivo etc.) pela necessidade de dar razões: argumenta-se quando se defende ou se combate uma determinada tese e se dão razões para tanto. Ademais, há argumentos, ou fragmentos de argumentos, que não consistem em um uso explícito da linguagem, ao menos da linguagem falada ou escrita. 
2. Uma argumentação pressupõe sempre um problema, uma questão (de índole muito variada), cuja resposta tem que se basear em razões apropriadas ao tipo de problema de que se trate. 
3. Uma argumentação supõe tanto um processo, uma atividade, como o produto ou resultado dessa atividade. Como atividade, a argumentação é tudo o que está entre a colocação do problema e sua solução. Como resultado, em uma argumentação cabe distinguir sempre essas três entidades: premissas, conclusão e inferência (a relação que se dá entre as premissas e a conclusão). 
4. Argumentar é uma atividade racional, no duplo sentido (a) de que é uma atividade orientada a um fim, e (b) de que há critérios para avaliar uma argumentação, ou seja, de que sempre parece fazer sentido perguntar se uma argumentação é boa ou ruim, melhor ou pior que outra, aparentemente boa, mas ruim na realidade etc. 
Síntese
	Argumentação
	Relativa a uma linguagem. 
	Justifica-se pela necessidade de dar razões.
	Defende-se ou combate-se uma tese. 
	Pressupõe sempre um problema, uma questão (de índole muito variada), cuja resposta tem que se basear em razões apropriadas ao tipo de problema de que se trate. 
	Supõe tanto um processo, uma atividade, como o produto ou resultado dessa atividade. 
	Atividade racional. 
III. Concepções de argumentação
Há três maneiras características de interpretar os elementos comuns que definem o conceito de argumentação e, portanto, é possível também falar de três concepções ou aproximações básicas da argumentação: material, formal e pragmática. 
A concepção formal vê a argumentação como uma série de enunciados sem interpretar, no sentido de que se abstrai o conteúdo de verdade ou de correção das premissas e da conclusão. Responde a problemas de natureza formal: se, a partir de certos enunciados - premissas - com determinada forma, pode-se passar a outro (conclusão), de outra forma diferente. Para isso, centra-se não na argumentação como atividade, mas como resultado: a lógica (a lógica standard ou clássica) não descreve como as pessoas argumentam, senãoque assinala certas condições que devem ser respeitadas para que o raciocínio possa ser considerado válido. Esses critérios de validade ou de correção são dados pelo que se chama regras de inferência, no sentido formal da expressão. Trata-se, em suma, da concepção característica da lógica, da lógica formal. Essa disciplina nos fornece esquemas ou formas de argumentos como, por exemplo, o modus ponens ou silogismo subsuntivo; se um raciocínio assume essa forma, então se pode dizer que é logicamente, formalmente correto, ainda que não seja, por isso, um raciocínio sólido ou persuasivo. 
Para a concepção material, o essencial não é a forma dos enunciados, mas aquilo que os torna verdadeiros ou corretos: os fatos naturais ou institucionais a que se referem esses enunciados. Responde ao problema sobre em que devemos acreditar ou o que devemos fazer. Ou seja, não problemas formais, mas materiais: explicar, descobrir ou prever um acontecimento, recomendar ou justificar um curso de ação etc. O centro da atenção não se põe na inferência, mas nas premissas (as razões para se acreditar em algo ou para realizar ou pretender realizar uma ação) e na conclusão. Seus critérios de correção não podem, por isso, ter um caráter puramente formal. Uma boa argumentação, conforme a perspectiva material, pressupõe a correção formal, mas tem que cumprir também certas condições de caráter substantivo, como as incorporadas em uma teoria sobre as fontes do Direito, sobre a interpretação ou sobre a prova. Um exemplo dessa maneira de entender a argumentação jurídica encontramos na “lógica material” ou logos de lo razonable de Recaséns Siches, na tópica de Viehweg ou na teoria interpretativa do Direito de Dworkin. 
Finalmente, a concepção pragmática contempla a argumentação como um tipo de atividade linguística, como uma série de atos de linguagem ou um ato de linguagem complexo. O que se privilegia, portanto, não é a dimensão sintática ou semântica da linguagem, mas a pragmática. O que desencadeia a argumentação são problemas relativos a obter a persuasão de um auditório ou à interação com uma ou mais pessoas para chegar a algum acordo a respeito de qualquer problema teórico ou prático. O que importa aqui é a argumentação vista como uma atividade, como uma interação. No transcurso dessa atividade se produzem, naturalmente, argumentos, mas suas premissas e conclusões já não são enunciados sem interpretação, nem enunciados interpretados como verdadeiros ou corretos, mas sim enunciados aceitos, pois, sem certos pontos de acordo, não seria possível levar a cabo essa atividade. 
Enquanto na concepção material (e na formal) a argumentação pode ser vista de certo modo em termos individuais (uma argumentação é algo que um indivíduo pode realizar sozinho), na concepção pragmática a argumentação é necessariamente uma atividade social (ou pressupõe que o indivíduo que argumenta nesta forma se desdobra em dois ou mais agentes argumentadores). O êxito da argumentação depende de que efetivamente se alcance (ou que se devesse alcançar) a persuasão ou a concordância do outro, respeitando certas regras. Dentro da concepção pragmática podem-se distinguir, por sua vez, dois enfoques. Um é o da retórica, centrado na ideia de persuadir um auditório que, na argumentação, assume um papel basicamente estático (os elementos básicos são orador, discurso, auditório e persuasão). O outro enfoque é o da dialética, em que a argumentação tem lugar entre participantes (proponente e oponente) que assumem um papel dinâmico: entre eles há uma interação constante.
Síntese
	Concepção 
formal
	Concepção 
material
	Concepção pragmática
	Dimensão sintática
	Dimensão semântica
	Retórica: persuasão
	Enunciados verdadeiros ou falsos do ponto de vista da forma
	Enunciados verdadeiros ou falsos do ponto de vista do conteúdo
	Dialética: interação entre os participantes
IV. Argumentação e fundamentação[footnoteRef:3] [3: PERELMAN, Chaim. Lógica Jurídica. São Paulo: Martins Fontes, 2007.] 
Para bem expor as características particulares da argumentação e os problemas inerentes a seu estudo, nada como contrapô-la à concepção clássica da demonstração e, mais especialmente, à lógica formal que se limita ao exame dos meios de prova demonstrativos. Na lógica moderna, oriunda de uma reflexão sobre o raciocínio matemático, os sistemas formais já não são correlacionados com uma evidência racional qualquer. O lógico é livre para elaborar como lhe aprouver a linguagem artificial do sistema que constrói, para determinar os signos e combinações de signos que poderão ser utilizados. Cabe a ele decidir quais são os axiomas, ou seja, as expressões sem prova consideradas válidas em seu sistema, e dizer quais são as regras de transformação por ele introduzidas e que permitem deduzir, das expressões válidas, outras expressões igualmente válidas no sistema. A única obrigação que se impõe ao construtor de sistemas axiomáticos formalizados e que torna as demonstrações coercitivas é a de escolher signos e regras que evitem dúvidas e ambiguidades. Cumpre que, sem hesitar e mesmo mecanicamente, seja possível estabelecer se uma sequência de signos é admitida no sistema, se ela tem forma igual a outra sequência de signos, se é considerada válida, por ser um axioma ou uma expressão dedutível, a partir dos axiomas, de um modo conforme às regras de dedução. Qualquer consideração relativa à origem dos axiomas ou das regras de dedução, ao papel que se presume que o sistema axiomático represente na elaboração do pensamento, é alheia à lógica assim concebida, na medida da em que ela sai do âmbito do formalismo em questão. A busca da univocidade indiscutível chegou a levar os lógicos formalistas a construírem sistemas nos quais não há preocupação com o sentido das expressões: ficam contentes se os signos introduzidos e as transformações que lhes dizem respeito ficam fora de discussão. Deixam a interpretação dos elementos do sistema axiomático para os que o aplicarão e terão de se preocupar com sua adequação ao objetivo pretendido.
Quando se trata de demonstrar uma proposição, basta indicar mediante quais procedimentos ela pode ser obtida como última expressão de uma sequência dedutiva, cujos primeiros elementos são fornecidos por quem construiu o sistema axiomático dentro do qual se efetua a demonstração. De onde vêm esses elementos, sejam eles verdades impessoais, pensamentos divinos, resultados de experiência ou postulados peculiares ao autor, eis questões que o lógico formalista considera alheias à sua disciplina. Mas, quando se trata de argumentar, de influenciar, por meio do discurso, a intensidade de adesão de um auditório a certas teses já não é possível menosprezar completamente, considerando-as irrelevantes, as condições psíquicas e sociais sem as quais a argumentação ficaria sem objeto ou sem efeito. Pois toda argumentação visa à adesão dos espíritos e, por isso mesmo, pressupõe a existência de um contato intelectual.
O ato de fundamentar uma tese envolve, para-além da argumentação e da demonstração, a referência a dados e/ou elementos que se supõe possam comprovar essa tese. Por exemplo, pode-se argumentar que determinada decisão é a acertada em uma situação específica com base na legislação vigente em precedentes jurisprudenciais. 
Síntese 
A argumentação jurídica serve para 
a) Justificar/Fundamentar a decisão a ser tomada;
b) Demonstrar racionalmente que é a melhor decisão no caso concreto.
	Argumentação
	Demonstrar 
	Dizer porque pensa-se desse modo.
Tornar algo evidente por meio de provas.
	Fundamentar 
	Dizer quais são as bases, os fundamentos de um modo de pensar
– bases que extrapolam o próprio raciocínio. Apoiar-se em.
V. Argumentação prática e argumentação teórica[footnoteRef:4] [4: SHECAIRA,/STRUCHINER. Teoria da Argumentação Jurídica. Rio de Janeiro: Contraponto, 2016. ] 
Há argumentos teóricos e há argumentos práticos. A diferença diz respeito ao tipo de conclusão que cada argumento pretende estabelecer. Argumentos teóricos procuram estabelecer conclusões teóricas,isto é, conclusões sobre como as coisas são, foram ou serão. Exemplos: 
A 
Caetano Veloso é brasileiro. 
Logo, 
Caetano Veloso gosta de arroz e feijão. 
B 
Alceu Valença é pernambucano. 
Logo, 
Alceu Valença nasceu no Brasil. 
C
Caetano Veloso inaugurou a Tropicália. 
Logo, 
Caetano Veloso será estudado pelas gerações futuras. 
A, B e C são argumentos teóricos porque pretendem estabelecer conclusões teóricas sobre como as coisas são (A), foram (B) ou serão (C). São conclusões sobre fatos (presentes, passados e futuros). Outras expressões usadas para falar de conclusões teóricas são "conclusões descritivas" e "conclusões factuais". Usamos todos esses termos como sinônimos: "teórico", "factual" e "descritivo". 
Argumentos práticos, por outro lado, são aqueles que procuram estabelecer conclusões práticas, isto é, conclusões sobre como as coisas devem ser, deveriam ter sido ou deverão ser. Exemplos: 
D 
Roberto Carlos é brasileiro. 
Logo, 
Roberto Carlos deve ter orgulho do seu país. 
E 
Roberto Carlos é uma figura pública. 
Logo, 
Roberto Carlos não deveria ter tentado impedir a publicação de sua biografia. 
F 
Roberto Carlos é o Rei. 
Logo, 
Roberto Carlos deve ser tratado com respeito. 
D, E e F são argumentos práticos. Chegam a conclusões sobre como as coisas devem ser (hoje, ontem ou amanhã). ...Também chamamos conclusões práticas de conclusões "normativas" ou "prescritivas". 
Nem sempre uma conclusão prática é explícita ou obviamente prática. Suponha-se que o controle de constitucionalidade de leis pelo Judiciário seja considerado antidemocrático. Quando dizemos que o controle de constitucionalidade é antidemocrático, não dizemos, com todas as palavras, que uma coisa ou outra deva ser feita em relação ao controle de constitucionalidade. Contudo, se não o dizemos explicitamente, pelo menos indicamos implicitamente que o controle de constitucionalidade deve ser evitado, substituído ou revisto de alguma forma. É difícil imaginar um contexto em que associaríamos termos avaliativos como "democrático" ou "antidemocrático" a uma instituição qualquer sem ter o intuito de sugerir que a instituição em questão deve ser mantida ou reformulada (respectivamente). Da mesma forma, quem diz, por exemplo, que as cotas raciais para ingresso no ensino superior são discriminatórias quer sugerir que elas não devem ser implantadas. Afirmações avaliativas implicam normalmente afirmações práticas, isto é, prescrições a respeito de como se deve agir. (...)
 Há quem rejeite hoje a distinção entre fato e norma, descrição e prescrição ou "ser" e "dever ser". Entretanto, essa é justamente a distinção que está na base da nossa discussão sobre argumentos teóricos e práticos: as conclusões dos argumentos teóricos estão no plano do "ser", e as conclusões dos argumentos práticos, no plano do "dever ser". Embora usemos a distinção, cabe reconhecer que é possível pecar pelo excesso de confiança na sua utilidade. Em primeiro lugar, deve-se manter em mente que certos termos (ditos "densos") têm conteúdo avaliativo ou prescritivo, ao mesmo tempo em que carregam informação factual. Seria perda de tempo tentar encaixar todos os termos existentes na língua portuguesa em duas categorias rigorosamente separadas: a categoria dos termos factuais e a categoria dos termos avaliativos ou prescritivos. Existem termos que transitam entre as duas categorias. É melhor admitir, portanto, que, em vez de dois tipos de termos, na verdade existem três:
1) termos puramente factuais (por exemplo, o racismo é antigo); 
2) termos puramente avaliativos/prescritivos (o racismo é ruim); 
3) termos mistos ou densos (o racismo é antiquado, o que transmite informação temporal, mas também tem conotação pejorativa). 
Para os nossos propósitos, são argumentos práticos aqueles cujas conclusões são do tipo 2 ou 3. 
A segunda ressalva não diz respeito à distinção entre fato e norma, mas a outro aspecto da definição de argumento prático. Argumento prático é definido aqui apenas em função da natureza da sua conclusão. É possível que surja a objeção de que um argumento que tem uma conclusão normativa também precisa ter ao menos uma premissa normativa, como no caso do silogismo jurídico, que sempre tem uma norma geral no lugar da premissa maior. É logicamente proibido, diz a objeção, partir de premissas puramente factuais para uma conclusão normativa (do "ser" para o "dever ser"). Alguns autores emprestam de G. E. Moore a expressão "falácia naturalista" e a usam para criticar esse tipo de argumento. Como a nossa definição de argumento prático exige apenas a presença de conclusões práticas, inevitavelmente incluímos na categoria de argumentos práticos uma série de supostas falácias. Por exemplo: 
H
"Roberto Carlos é brasileiro. 
Logo, Roberto Carlos deveria ter orgulho do seu país.[footnoteRef:5] [5: A começar por Carl Wellman (1971). ] 
Argumentos como esse são usados por todos nós rotineiramente e parecem razoáveis. Uma maneira natural de evitar a caracterização do argumento como falacioso é imputar-lhe uma premissa normativa implícita - por exemplo: "Todo brasileiro deveria ter orgulho do seu país." Isso é problemático, pois quem usa o argumento pode não acreditar em uma generalização tão ampla. Afinal, nem todo brasileiro - a exemplo daqueles que aqui nasceram mas logo emigraram - deve necessariamente ter orgulho do país. Devemos tomar cuidado na hora de atribuir premissas implícitas (sobretudo generalizações ambiciosas) a autores de argumentos que não as formularam claramente. A propósito, hoje há uma ampla e sofisticada literatura sobre a possibilidade de argumentos práticos baseados em premissas factuais. A expressão "falácia naturalista", usada sem maiores justificativas, é uma arma retórica que só deve assustar os desavisados. 
A argumentação teórica também tem papel importante no direito. Afinal, é de argumentos teóricos que o profissional do direito se vale sempre que precisa defender a premissa menor de um silogismo jurídico. Se o fato expresso pela premissa menor é o fato de que João dirigia sob a influência do álcool, a justificação dessa premissa poderia ser feita através de um argumento como o seguinte: "Quando detido, João apresentava dificuldade para falar e andar em linha reta. Logo, João dirigia sob a influência do álcool." Argumentos como esse surgem a todo momento nos tribunais. Isso basta para mostrar a importância que a argumentação teórica tem no mundo jurídico. 
Síntese
	Argumentação prática
	Argumentação teórica
	Como as coisas devem ser, deveriam ser ou deveriam ter sido
	Como as coisas são, foram ou serão 
	Dever-ser
	Ser
	Prescritiva, normativa
	Descritiva
	Norma
	Fato
	Conclusões prescritivas
	Conclusões factuais
	[plano da norma jurídica]
	[plano da ciência jurídica]
VI. Argumentação substantiva e argumentação institucional 
A argumentação prática é de dois tipos: argumentação prática substantiva e argumentação prática institucional.[footnoteRef:6] Como espécies da argumentação prática, ambas visam estabelecer conclusões sobre o que deve ser feito; mas, se elas compartilham um fim, não compartilham os meios. A argumentação substantiva e a argumentação institucional visam estabelecer suas conclusões práticas por meio de razões de tipos diferentes. [6: Emprestamos a terminologia de Neil MacCormick (1993). ] 
A argumentação substantiva apela livremente a razões de natureza moral, política, econômica, social etc. O cientista político, o filósofo moral, o jornalista que escreve um artigo, o leitor que manda a sua opinião para o jornal, o motorista de táxi, o amigo que bebe conosco uma cerveja no bar, todos costumam argumentar de maneira substantiva. Se algo lhes desagrada - o imposto de renda, por exemplo -, eles o criticam por ser injusto, ineficiente, inibidor da iniciativa privada ou algo do tipo. Se algo lhes agrada - a condenação de um político corrupto, por exemplo -, eles comemoram dizendo que a impunidade é um grande mal social, que o político lesou os cofres públicos, enganou o povo, e assim por diante.A argumentação institucional, por outro lado, não apela livremente a considerações morais, políticas, econômicas e sociais. Ela é mais burocrática, engessada e - alguns diriam - artificial. Quem argumenta institucionalmente não está preocupado em defender aquilo que parece mais justo, mais democrático ou mais eficiente no caso em questão. Quem argumenta institucionalmente, em geral, ocupa uma posição social que exige certo respeito em relação a regras e procedimentos previamente estabelecidos. Pense, por exemplo, em um juiz de futebol. Antes de saber se a marcação de um pênalti no final do campeonato poderá gerar uma briga violenta entre torcidas ou decepcionar toda uma geração de torcedores (resultados ruins do ponto de vista substantivo), ele quer saber se a conduta do jogador que provocou o suposto pênalti viola ou não alguma regra do jogo. Mesmo que o juiz tome uma decisão com base em considerações relativas ao bem-estar da torcida, dificilmente ele admitirá publicamente que essas considerações foram determinantes. A posição de juiz exige que suas decisões sejam justificadas institucionalmente. 
	Argumentação 
substancial
	Argumentação institucional
	Princípios morais, valores sociais, política etc. 
	Leis, regras, procedimentos estabelecidos
	Prescritiva
	Descritiva
VII. Argumentação judicial e argumentação jurídica[footnoteRef:7] [7: Cf. ATIENZA, ob. Cit.] 
Um defeito notório da teoria standard da argumentação jurídica (aquela que se desenvolve, a partir do final dos anos 90 do século XX, na obra de autores como Aarnio, Peczenick, Alexy e MacCormick), é que ela se concentra exclusivamente nas fundamentações das decisões tomadas pelos tribunais superiores. Isso quer dizer que permanecem fora do objeto de estudo numerosos contextos nos quais se argumenta juridicamente. 
Para começar, fica de fora um aspecto muito importante da própria argumentação judicial, a argumentação em matéria de fatos. Por razões conhecidas (e comuns a todos os sistemas jurídicos desenvolvidos), as questões que chegam aos tribunais superiores são questões "jurídicas", isto é, problemas de interpretação normativa (em sentido amplo) e, raramente, ou de turma muito limitada, questões de fato. Contudo, como destacou Jerome Frank já nos anos 30 do século XX, tomando-se em consideração o sistema judicial em seu conjunto, a maior parte das argumentações que realizam os juízes se refere a problemas fáticos. Todavia, essa "lacuna" já pode ser considerada colmatada, pois nas últimas décadas tem ocorrido uma intensa investigação neste campo, tanto no contexto da common law, como nos países de tradição romano-germânica. O que, entretanto, não conseguiu modificar a inércia dos juristas práticos (dos juízes) que, ao menos em países como a Espanha, acostumaram-se a incluir dentro dos "fundamentos do direito" as motivações destinadas a considerar como provado um determinado fato: uma forma, parece, de arrastar simbolicamente o tradicional preconceito de que somente as questões normativas, e não as fáticas, necessitam ser motivadas. 
Outra exclusão importante diz respeito à argumentação dos advogados. Certamente, se a figura e a função do advogado fossem vistas simplesmente como as de um "auxiliar" da justiça, então o déficit por parte da teoria standard seria mínimo, para não dizer inexistente: a argumentação dos advogados não se distinguiria muito da argumentação dos juízes. O que mudaria, não seria tanto a argumentação em si, mas sim suas consequências e efeitos. Algo, inclusive, que vale em relação à figura do "advogado geral" que atua no contexto do Tribunal de Justiça da União Europeia, mas não quanto aos advogados "de verdade" que, em geral, como é óbvio, não perseguem (ou não somente, ou não fundamentalmente) o interesse geral. 
A argumentação dos advogados é, essencialmente, a argumentação "de uma parte" (o que não significa ilegítima) que, por isso, difere em aspectos relevantes da argumentação do juiz. Alexy (e, em geral, os representantes da teoria standard) não parece entender dessa forma e defende, por exemplo, que a teoria do discurso racional é um modelo que se aplica também à argumentação dos advogados, os quais, em sua opinião, também constroem, em suas demandas perante os tribunais, uma pretensão de correção. Mas isso é a demonstração, em minha opinião, de uma concepção idealizada do Direito, na qual o fenômeno jurídico é observado única ou preferencialmente através da perspectiva dos tribunais superiores e da dogmática jurídica. 
Por razões parecidas, tampouco estão presentes nos estudos contemporâneos de argumentação jurídica aquelas situações que têm lugar no contexto da resolução não judicial de conflitos jurídicos: a negociação, a mediação e a arbitragem. Uma carência ligada, provavelmente, a um certo preconceito teórico que leva a identificar o Direito com o Direito estatal e a não considerar tudo aquilo que tem a ver com o que, em um sentido amplo, pode-se denominar "pluralismo jurídico". Obviamente, a negociação, a mediação e a arbitragem não são fenômenos que se desenvolvem totalmente à margem do Estado e das normas de Direito estatal. No entanto, as argumentações que se produzem nesses contextos (que, pelo menos em certa medida, são contextos jurídicos: as fronteiras entre o Direito e o não Direito nem sempre têm contornos nítidos) apresentam peculiaridades próprias e não podem equiparar-se, sem mais, às de caráter judicial. 
No que tange à argumentação legislativa, sua preterição por parte da teoria standard está ligada (como ocorre com as ausências anteriores) a certa deformação da teoria do Direito dominante durante os dois últimos séculos. Com efeito, o estudo do Direito (por parte da teoria do Direito ou da dogmática jurídica) esteve centrado na interpretação e aplicação do Direito e deixou de lado o processo de sua produção. Em outras palavras, este último tem sido visto, unicamente, através da perspectiva limitada das fontes do Direito. 
Tal situação começou a mudar nas últimas décadas (com o surgimento de um novo interesse pela teoria e pela técnica da legislação). mas os estudos sobre a argumentação legislativa não são abundantes nem contam, sobretudo, com um modelo teórico satisfatório. Contribui com isso, sem dúvida, o fato de que se trata de um tipo de argumentação muito mais aberta que a judicial e que, portanto, apresenta uma quantidade maior de dificuldades para sua análise. De todo modo, não se pode esquecer que ,1 argumentação legislativa corresponde, em boa medida, ao que na tradição retórica se denominou" gênero deliberativo". 
Tampouco são frequentes os estudos voltados para a argumentação dogmática (ou de teoria do Direito), devido, provavelmente, a duas razões. Uma, é que a argumentação da dogmática pode assemelhar-se (em maior medida que as anteriores: a argumentação dos advogados, dos mediadores, dos legisladores...) de caráter judicial. É o que faz, por exemplo, Alexy, que, como s disse, privilegia a argumentação dos tribunais superiores e da dogmática jurídica: para ele, uma das regras da argumentação jurídica - judicial - é a obrigação de utilizar argumentos dogmáticos. Em ambos os casos (na argumentação jurídica e na da dogmática), cabe afirmar que se constrói uma pretensão de correção ou que a coerência interna - e não a obtenção de certos objetivos" externos" ao Direito - é o critério fundamental de avaliação. A partir desta perspectiva, é suficiente caracterizar a argumentação dogmática (com relação à judicial) como uma argumentação mais abstrata e com menos limitações (de tipo temporal, de competência etc.) que a de caráter judicial. A outra razão é a tendência a configurar a dogmática mais como uma ciência (como uma empresa estritamente teórica, que persegue objetivos puramente cognoscitivos) que como uma técnica, uma prática dirigi da precisamente à produção de argumentações. 
Tudo o que foi dito anteriormente não esgota, entretanto, os contextos jurídicos em que se produzem argumentações. Deve-se fazer referência, também, por exemplo, a esses outros: 
1. A argumentaçãolevada a cabo pelos órgãos administrativos. A proliferação destas entidades é, seguramente, um dos traços mais característicos do Estado contemporâneo. Seu caráter é muito heterogêneo e, em alguns casos, poder-se-ia equiparar (mais ou menos), às argumentações dos juízes, dos advogados, dos legisladores, mas, naturalmente, só até certo ponto. Esse é, assim, um campo muito relevante de estudo a partir de uma perspectiva argumentativa, embora muito pouco cultivado; 
2. A argumentação dos tribunais constitucionais (não facilmente equiparável à do resto dos juízes); 
3. A argumentação levada a cabo em comissões de bioética e em outros tipos de órgãos nos quais se pretende trabalhar o conhecimento dos especialistas em um certo campo através de considerações de caráter jurídico e moral. Trata-se de órgãos administrativos, porém sui generis; 
4. A argumentação tal como é concebida pelos que desenvolvem sistemas especiais no campo do Direito ou que se interessam, em geral, pela argumentação jurídica na perspectiva da inteligência artificial; 
5. A argumentação dos notários, dos registradores, dos jurados...
VIII. A argumentação dos advogados
A posição institucional do advogado no sistema jurídico determina, como vimos, diferenças importantes entre a argumentação forense e a dos juízes. A produção de argumentos por parte dos advogados não tem lugar unicamente no trabalho de defesa ou de acusação que realizam nos tribunais, mas também na sua tarefa de assessoramento aos clientes e nos processos de negociação com outros advogados, com a promotoria etc. Também não é a mesma coisa (não argumenta igual), registre-se, o advogado que defende um interesse da parte motivado exclusivamente pela obtenção de um benefício econômico e aquele que embarca na defesa de causas, diríamos, de interesse geral (mais ou menos incidente com o que, na tradição retórica, chamou-se de causa digna ou honrosa), dirigidas à defesa dos direitos dos consumidores, do meio ambiente, das liberdades públicas... No entanto, em todo caso (embora em graus distintos), o caráter "partidário" da função dos advogados faz com que, em relação a suas argumentações (salvo em casos excepcionais), não tenha muito sentido falar de "pretensão de correção" . 
Às vezes, em casos excepcionais (o que Vergès chamou de "processos de ruptura" [Vergès, 1970]), o que pretende o advogado é mostrar a injustiça do sistema jurídico que os juízes devem aplicar e precisamente a impossibilidade de encontrar uma resposta correta dentro desse sistema. É interessante notar que, em tais situações, o juiz poderia, desde logo, renunciar a seu cargo, mas não poderia atuar, enquanto juiz, com uma atitude de "ruptura". E, normalmente, o que pretende o advogado é que a tese que defende (a favorável ao interesse de seu cliente) não transgrida as normas do sistema jurídico, em particular, as normas processuais, tampouco as de caráter deontológico, isto é, a regras morais de sua profissão. Naturalmente, é possível que essa tese coincida com o que seria a resposta correta ao caso (o que demonstraria, inclusive, que a tese do outro advogado não o seria), mas isso não supõe erigir uma pretensão de correção, no sentido, por exemplo, de que fala Alexy. E não o supõe porque, na defesa dessa tese (eventualmente correta), a argumentação dos advogados não está regida pelos princípios que caracterizam o discurso racional. Não se aplica, por exemplo, o princípio da sinceridade, ou seja, o advogado não tem obrigação de dizer a verdade, embora tenha certos deveres a esse respeito, como o de não introduzir provas falsas no processo. Da mesma forma, não possui, naturalmente, a obrigação de expor os possíveis argumentos que enfraqueceriam sua posição (e, se o faz, não será para apresentá-los em sua melhor luz) etc. 
Como consequência de tudo isso, parece óbvio que o modelo geral de argumentação dos advogados não é o da subsunção ou o da ponderação, mas sim uma argumentação instrumental (meio-fim) em que a premissa maior não é uma norma jurídica de fim (como ocorre em alguns casos de argumentos judiciais), mas sim a norma que estabelece que o advogado deve procurar satisfazer, na maior medida possível, os interesses do cliente (ou alguma especificação dessa regra). Para isso, o advogado sugerirá ao juiz (tratará de persuadi-lo para) que efetue uma subsunção, um argumento adequado ou uma ponderação de uma determinada forma. E, para tal finalidade, utilizará os mesmos tipos de argumentos que os juízes: argumentos por analogia, a fortiori, ad absurdum etc. 
Contudo, no caso dos advogados, trata-se de um uso estratégico desses argumentos. Ou seja, se, por exemplo, a solução de um caso depender de ele poder ser considerado análogo ou não a um anterior, o que fará o advogado, interessado em que se aplique a analogia, será: enfatizar as semelhanças existentes entre ambos os casos, dando motivos que mostrem que as possíveis diferenças entre ambos são irrelevantes; interpretar o suposto fático da regra estabelecida no caso precedente (a ratio decidendi) da maneira mais ampla possível, para facilitar que os fatos do novo caso possam se encaixar nele etc. E, naturalmente, o advogado da parte contrária tentará defender que não cabe utilizar a analogia, de maneira que sua estratégia será, precisamente, o sinal oposto à anterior, esforçando-se para destacar as diferenças existentes entre ambos os casos, por interpretar o suposto fático da maneira mais restritiva possível etc. 
Seria pouco realista supor que, na argumentação dos juízes, estes aspectos estratégicos não possuem nenhum papel e que, por exemplo, em uma motivação judicial, tudo ocorre segundo o modelo do discurso racional. Ainda assim, embora o que tivéssemos em ambos os casos fosse uma combinação de argumentação estratégica e de discurso puramente racional, as diferenças entre os dois tipos de argumentação, as diferenças quanto à ênfase em um extremo ou outro, são consideráveis. aso nos concentremos agora, em vez dos tipos de argumentos, no processo de resolução de um problema argumentativo, caberia dizer que o modelo, considerado em abstrato, é sempre o mesmo, porém as etapas que tínhamos diferenciado nesse processo podem ter características bastante diferentes, conforme se trate da argumentação judicial ou da argumentação dos advogados. 
Também é importante distinguir entre os diversos tipos de advogados, ou os diferentes modos de atuação dos advogados: não procedem da mesma maneira o advogado que prepara um caso para ser defendido na primeira instância e aquele que se depara com uma apelação ou um recurso etc. Por exemplo, a identificação e a análise do problema por parte do juiz (no capítulo anterior nos situamos, essencialmente, na perspectiva de um tribunal) são muito diferentes das que realiza um advogado quando um cliente lhe apresenta um problema. O advogado não se encontra diante do que poderíamos chamar um problema bem estruturado e de tipo binário. Em vez disso, pode-se dizer que, caso opte pela via judicial, o que deve fazer é precisamente traduzir em termos jurídicos um determinado conflito. 
Para isso, por sua vez, tem de realizar uma atividade complexa na qual se pode diferenciar vários passos: deverá realizar uma investigação sobre os fatos, consistente em reuni-los e analisá-los. Assim, terá que identificar as questões jurídicas apresentadas e ordená-las de uma certa maneira, encontrar o Direito aplicável e interpretá-lo. A etapa de proposta de uma solução se traduz em um pedido ao juiz para que tome determinada decisão. Posteriormente, procederá a comprovar e revisar tal pedido. E, finalmente, redigirá, por exemplo, uma petição seguindo, de alguma maneira, a estrutura que vimos. 
Os elementos retóricos, como várias vezes foi dito, são também mais importantes no caso da argumentação dos advogados que na dos juízes, embora convenha lembrar que os discursos, as argumentações, dos advogados podem ter uma finalidade preponderantemente persuasiva (os que são dirigidos aos juízes) ou preventiva (pareceres nos quais, em realidade, trata-sede prever o comportamento dos juízes). 
De toda forma, parece claro que o recurso a elementos emocinais é mais característico da argumentação forense que da Judicial, e que adquire uma intensidade especial se aqueles que julgam não são juristas profissionais, como ocorre nos tribunais do júri ou como ocorria nos tribunais populares da Grécia Clássica. As técnicas características do gênero judicial da retórica - repitamos uma vez mais - se desenvolveram a partir da perspectiva dos advogados. Não é de se estranhar, por isso, que muitos autores insistam em que esse modelo clássico, com algumas adaptações, é (e deve ser) o que utilizam os advogados em sua prática argumentativa e o que está por trás dos manuais dirigidos a ensinar-lhes a argumentar, independentemente de que tenham mais ou menos consciência disso. 
Por fim, o componente dialético da argumentação dos advogados está presente na estrutura do processo, especialmente quando se trata de sistemas nos quais prevalece o princípio acusatório e nos quais o juiz assume a posição de um árbitro encarregado de dirigir o debate entre as partes. Um tipo de diálogo, de argumentação jurídica, em que transparece vivamente o caráter de parte do advogado (um aspecto ou uma etapa do processo) é o interrogatório de testemunhas ou de peritos. Também aqui se poderia dizer que muitas das técnicas utilizadas são semelhantes às que se podem encontrar nos diálogos socráticos, especialmente quando Sócrates parece comportar-se, mais que como um filósofo, como um refinado sofista. 
A conclusão de tudo que foi dito anteriormente poderia ser a seguinte: as diferenças entre a argumentação que utiliza um juiz e um advogado não são relevantes (ou não existem) caso se considere a argumentação exclusivamente a partir de uma perspectiva formal. No entanto, adquirem importância notável quando se presta atenção à dimensão material (à pretensão de correção) e à pragmática (aos elementos retóricos e dialéticos). 
IX. A retórica jurídica[footnoteRef:8] [8: PERELMAN/OLBRECHTS-TYTECA. Tratado da Argumentação. São Paulo: Martins Fontes, 1997.] 
 
A formação de jovens juristas exige que o curso de lógica seja completado por um curso de retórica, que não é a arte de falar bem, num estilo florido e empolado: é a arte de persuadir e de convencer, que pode manifestar-se por um discurso ou por um texto escrito e que, para os juristas, consiste essencialmente no uso da argumentação. É por essa razão que me parece importante, para a formação dos estudantes de direito, completar o ensino tradicional de lógica, dedicado à prova demonstrativa, com um ensino daquilo que Aristóteles qualificara de provas dialéticas, que são argumentos utilizados tanto num discurso como numa discussão. 
A introdução desse novo ensino é uma manifestação da profunda transformação que se realizou, progressivamente, na concepção do direito e, mais especialmente, da atividade do juiz incumbido de aplicá-lo. 
Qual é o papel do juiz? Em que consiste o raciocínio jurídico de quem deve examinar um processo que lhe é submetido e redigir, como conclusão, uma sentença motivada? 
Se nos referimos aos símbolos que evocam a justiça em quase toda parte do mundo, - penso, em particular, na estátua que orna a praça da Justiça em Berna - vemos que a justiça é representada por uma mulher de olhos cingidos por uma venda, com uma balança na mão esquerda e uma espada na mão direita. A espada indica a sua determinação de executar a sentença, mas são a balança e a venda que simbolizam a maneira pela qual a justiça deve ser administrada. A balança em equilíbrio indica com precisão o que é devido a cada qual, a venda significa que a justiça deve ser imparcial, que não deve ver os jurisdicionados, não deve preocupar-se nem com o poder nem com a fraqueza deles, nem com a riqueza nem com a pobreza deles, que não deve conhecer nem amigos nem inimigos: a única coisa que importa é a pesagem e o fato de lhe amoldar a sentença. O juiz deve comportar-se como um instrumento de medição, e sua personalidade própria, com seus sentimentos, seus interesses e suas paixões - trate-se de piedade ou de temor, de simpatia ou de antipatia -, não deve perturbar a operação de justiça. 
Esse ideal de justiça impessoal, a mesma para todos, estrita aplicação da lei, constitui uma reação compreensível diante do que se teme acima de tudo, uma justiça arbitrária e corrompida, que favorece os poderosos em detrimento dos fracos e faz pender a balança do lado em que vê seu interesse. 
A Revolução Francesa quis que o papel do juiz se tornasse puramente passivo, que se limitasse a aplicar a lei, expressão clara da vontade nacional, que fosse como que um instrumento que executa de uma forma impessoal e uniforme a vontade do legislador. A Corte de Cassação, quando foi instituída, deveria desempenhar simplesmente o papel do policial encarregado pelo legislador de zelar para que os juízes não se afastassem de sua missão, violando a lei que são incumbidos de aplicar. Esperava-se que as decisões de justiça fossem tão impessoais e tão uniformes quanto um cálculo ou uma pesagem, pois dois mais dois são quatro para todos, e o resultado de uma pesagem não pode diferir de uma balança para outra. A intervenção do juiz devia ser proscrita, pois só poderia falsear o funcionamento da justiça. 
Essa concepção do direito, que dominou por cerca de cem anos e só começou a modificar-se por volta do final do século passado, não podia, teoricamente, dar nenhum lugar à teoria da argumentação, à arte de persuadir e de convencer, porquanto a personalidade do juiz não deveria desempenhar nenhum papel na administração da justiça. 
Tomemos um exemplo, o art. 393 de nosso Código Penal, em que se lê: "O homicídio com intenção de dar a morte é qualificado de homicídio doloso. Será punido com trabalhos forçados perpétuos." 
O papel do juiz consiste em aplicar a lei aos casos particulares. Analisava-se seu raciocínio como um silogismo (o que é, aliás, inexato tecnicamente), cuja maior era fornecida pela regra de direito, a menor pela constatação de que, na ocorrência, as condições de fato se acham ou não realizadas, fornecendo a conclusão a sentença e, se fosse o caso, a condenação do réu. Em lógica formal, poderíamos apresentar esse raciocínio da seguinte forma: para todo x, se fx, então gx. Ora, A está em condições que permitem pô-lo no lugar de x, logo, fA; daí resulta gA: isso quer dizer que, como a sentença deve amoldar-se à lei, A deve ser punido com trabalhos forçados perpétuos. 
Cumpre observar, de passagem, que a frase "será punido com trabalhos forçados", embora enunciada na forma de um indicativo futuro, é na realidade uma prescrição dirigida ao juiz, ordenando-lhe punir o homicídio doloso com trabalhos forçados perpétuos. 
O juiz, ao condenar o acusado, aplicou simplesmente as leis da lógica? É evidente que não, pois ele fez mais: deve constatar que tal regra é aplicável, que os fatos estão estabelecidos e que devem ser qualificados em conformidade com a lei; é então somente que pode aplicar o esquema de raciocínio da lógica formal. Existe, pois, um conjunto de condições, referentes tanto ao estabelecimento dos fatos quanto à regra aplicável, que vão além dos âmbitos da lógica formal. 
Para que a sentença seja justa, é preciso, antes de mais nada, que os fatos sejam estabelecidos. Não basta uma acusação para condenar o réu; cumpre ainda provar os fatos que lhe são imputados: cumprirá fornecer ao juiz todos os elementos que lhe possibilitarão adquirir a íntima convicção de que os fatos alegados sucederam efetivamente, o que é essencialmente um problema de prova. 
Constatamos, a esse respeito, que há uma diferença técnica entre o direito e uma ciência teórica. Quando se trata de ciência, em história por exemplo, toda asserção deve ser provada, pois tanto a afirmação quanto a negação de um fato não-estabelecido são postas em pé de igualdade. Não se dá o mesmo em direito, no qual as presunções intervêm constantemente para favorecer aqueles a quem elas aproveitam. Em nosso direito, como todohomem é presumido inocente até prova do contrário, ele não tem de provar sua inocência. E ao acusador, e em geral a quem quer modificar um estado de coisas existente, que incumbe o ônus da prova. 
Por outro lado, as provas em direito podem diferir das provas científicas, que se aceitariam da parte de um historiador, por exemplo. 
Há provas que o juiz não pode admitir, tal como a dos fatos prescritos por lei e aqueles relativos ao conteúdo de uma difamação. Em grande número de casos, a prova é regulamentada, sendo certos gêneros de prova considerados inadmissíveis; com efeito, a estabilidade da ordem social pode ser, em certos casos, considerada mais importante do que o estabelecimento da verdade. 
Há casos em que o que mais importa ao juiz é que sua sentença seja justa, mesmo que esta só possa realizar-se à custa de uma afirmação contrária à verdade. Por ocasião de um processo de grande repercussão, em que uma mãe era acusada de ter, com a cumplicidade de seu médico, matado seu filho recém-nascido monstruoso, o júri, conhecedor dos fatos, que eram incontestáveis, recusou ainda assim qualificar como homicídio doloso a morte em questão, quando havia certamente premeditação e se poderia mesmo dizer que se tratava de um assassinato. Deveremos dizer que o júri se enganou ou quis induzir a justiça em erro? É certo que não. Ele qualificou os fatos de modo que se seguisse a absolvição, tendo sobretudo piedade da mãe que viveu a horrorosa tragédia. Ele recorreu à ficção, para obter a absolvição da mãe, negando cientemente a existência das condições que deveriam ter acarretado a aplicação da sanção prevista pela lei. Assim é que os tribunais ingleses, no século XVIII, quando o roubo de objetos valendo mais de 40 xelins era punível com a pena de morte, estimavam regularmente em 39 xelins a importância de um roubo, mesmo que o valor real ultrapassasse tal montante. Não podendo modificar a lei, julgada injusta no caso, o juiz recorre à ficção para negar a existência de condições que deveriam ter acarretado a pena capital. Em outros casos, poderá ele, ao contrário, estender as condições previstas pela lei a casos novos. Assim é que, na Alemanha de antes de 1914, era passível de punição o fato de seguir em passeata uma bandeira vermelha no dia 1º. de maio. Tendo a polícia anotado a identidade dos manifestantes e lhes confiscado a bandeira, que devia servir de prova material da acusação, patenteou-se, no dia do processo, que a bandeira era cor-de-rosa, e não vermelha. Caberia absolver os manifestantes ou declarar, ao contrário, que o que a lei queria punir era a manifestação de uma intenção subversiva, ao seguir em passeata, no dia 1º. de maio, uma bandeira vermelha ou de cor assimilável ao vermelho? Esta interpretação não respeita a letra da lei a fim de estender suas condições de aplicação. 
Tomemos outro exemplo, o de um regulamento municipal que veda a circulação dos veículos automóveis dentro de um parque público. Baseando-se nesse regulamento, o policial de serviço deverá impedir a entrada no parque de uma ambulância chamada para socorrer um passeante fulminado por uma crise cardíaca? Seria esse o caso, se devesse ater-se à letra do regulamento. Mas ele pode também estimar que este último não deve aplicar-se a casos de urgência, como o que acabamos de mencionar. 
Esses diversos exemplos mostram que, muito amiúde, não basta constatar que as condições de fato previstas pela lei estão realizadas para disso tirar, por mera dedução, que devem advir as consequências jurídicas. 
Por outro lado, é inegável que o juiz se contentará, para dizer que os fatos estão estabelecidos, com provas bem menores quando se trata de estacionamento ilegal de um veículo do que quando se trata de um indiciamento por homicídio: é óbvio que ele será tanto mais exigente acerca da prova dos fatos, quanto mais graves forem as consequências jurídicas que deles decorrerem. 
Todos os exemplos que acabamos de dar concernem a textos que parecem suficientemente claros e precisos para que sua interpretação não dê muito azo à contestação, salvo em casos excepcionais. Mas com muita frequência os textos legais contêm expressões cuja natureza vaga e imprecisa é muito clara para todos, tais como ordem pública, equidade, falta, estado de embriaguez. Toda vez que dever aplicar semelhante lei a um caso particular, o juiz deverá dizer se os fatos são, sim ou não, conformes à ordem pública ou à equidade, constituem uma falta, permitem afirmar que o réu estava em estado de embriaguez. Quanto mais vagos e imprecisos são os termos da lei, maior é o poder de interpretação deixado ao juiz. Se o legislador, ao contrário, quiser restringir esse poder, precisará os termos da lei, substituindo, por exemplo, a expressão vaga "estado de embriaguez" por uma indicação mais precisa, de preferência quantitativa, tal como a taxa de álcool que se pode encontrar no sangue, e isto com a ajuda de testes técnicos que, a não ser que sejam contestados, quase não deixam ao juiz poder de apreciação quanto à qualificação dos fatos. 
Observe-se, a esse respeito, que o uso, em direito, de noções vagas não é necessariamente um defeito. A metodologia das ciências nos ensinou a dar um grande valor à clareza e à precisão. E essas são, efetivamente, qualidades indispensáveis à linguagem científica, mas podem apresentar inconvenientes quando se trata de prescrições legais. 
Com efeito, o juiz não é um autômato: concede-lhe um poder de apreciação, condição de seu poder de decisão. A qualidade que se exige dele é ter discernimento, ou seja, ser capaz de apreciar os diferentes aspectos de um problema, de pesar o pró e o contra. 
Se a justiça pudesse dispensar o julgamento, se se pudesse mecanizá-lo, as máquinas poderiam dizer o direito de uma forma muito mais rápida e muito menos onerosa do que o homem. Mas as máquinas não têm discernimento, sendo por isso que, em todas as situações delicadas, o recurso ao juiz é indispensável. 
Observe-se que não basta ao juiz fiar em seu senso de equidade: ele deve, na medida do possível, amoldar-se à legislação e levar em conta os precedentes judiciários. Isso porque a administração da justiça exige que o juiz seja guiado por regras suficientemente precisas, sem o que suas decisões seriam influenciadas por suas concepções políticas, e a insegurança que resultaria disso daria à ordem jurídica todas as aparências da arbitrariedade. Com efeito, ao lado do cuidado de equidade, inseparável da administração da justiça, o direito apresenta outra exigência, que é a da segurança jurídica. 
Vê-se que, se uma justiça sem juiz, puramente mecânica, é uma justiça sem equidade, uma justiça sem legislador é por demais arbitrária e priva o jurisdicionado da segurança jurídica. Ora, de fato, toda a administração da justiça é um vaivém constante, um ajuste incessante entre a segurança e a equidade, por exercício ilegal da medicina. Ele reconhecia os fatos, mas pleiteava, em sua defesa, que tratara e curara, em todo caso, doentes em perigo de vida para os quais os médicos nada mais podiam fazer; e resultava, de fato, dos debates, que ele preservara de um desfecho fatal crianças pequenas acometidas de poliomielite e de meningite. O julgamento reconheceu, aliás, que não se lhe podia censurar nenhum fato de charlatanice, nem nenhum fato contrário à probidade e à honestidade, que em geral ele agira sem espírito de lucro e com generosidade e mesmo que "obtivera grande número de curas espantosas". Um curandeiro dotado de qualidades tão extraordinárias, chamado à cabeceira de doentes graves, deverá recusar assistência a uma pessoa em perigo de vida, o que é punível em virtude do art. 63 do Código Penal, ou deverá expor-se a ser processado por exercício ilegal da medicina, em virtude do decreto de 24 de setembro de 1945? À perplexidade do réu corresponde a do juiz, que se vê defrontado com uma verdadeira antinomia. 
É nessa perspectiva que a teoria da argumentação adquire a importância que lhe concedemos. Pois é uma argumentação que, o mais das vezes, será determinante para estabelecera convicção do juiz, é ela que lhe permitirá motivar sua decisão. 
Com efeito, se a lógica é vinculada à verdade e à maneira pela qual esta pode ser corretamente deduzida das premissas para a conclusão, a argumentação diz respeito à prática, às decisões e à maneira de justificá-las. É óbvio que a atividade prática, a de decidir em matéria de justiça, não pode fazer pouco da realidade dos fatos nem da correção dos raciocínios, mas esses fatos devem ser apreciados para constituir razões, competindo ao juiz decidir o que é essencial ou acessório, o que é pertinente ou irrelevante num caso que lhe é submetido; numa palavra, ele deve julgar. 
Ora, a teoria da argumentação se caracteriza pelo fato de ser elaborada em função do auditório que se tem de persuadir e de convencer, nesse caso, o juiz que se tem de ganhar para a sua causa. É nessa perspectiva que cabe situar a atividade dos advogados das duas partes assim como a da doutrina, sendo a ambição dos autores influenciar a jurisprudência e medindo-se o êxito deles pela autoridade que tiverem adquirido perante as Cortes e os Tribunais. 
É verdade que existem, em direito, técnicas de argumentação específicas, isso a que se chama a lógica jurídica, que permitem ao juiz fundamentar suas decisões em direito, pois não basta aos juízes possuírem uma sabedoria prática, uma prudência, que lhes permitiria bem julgar, em conformidade com o senso comum, mas devem prolatar sua sentença em direito, em conformidade com a jurisprudência ou com a sabedoria prática dos juristas. A jurisprudentia necessita de um conhecimento prévio dos diferentes ramos do direito, e é por essa razão que o ensino da filosofia do direito e da lógica jurídica, do qual é encarregado meu colega e amigo Paul Foriers, se situa no final dos estudos. 
Mas a lógica jurídica, para ser bem compreendida, deve situar-se num âmbito mais geral, que é o da teoria da argumentação. A argumentação intervém, de fato, em todos os casos em que os homens devem tomar decisões, fazer escolhas refletidas, cada vez que devem deliberar ou discutir, criticar ou justificar. É por isso que o ensino que me cabe não se limitará à exposição dos elementos de lógica formal, mas os completará com aulas dedicadas à argumentação. 
Não é sem razão que a obra mais antiga consagrada à formação dos juristas é o tratado do jurista Quintiliano, chamada Instituição oratória. É esse, de fato, um dos objetivos que se propõe essa Retórica, a mais célebre, depois da de Aristóteles. 
Mas, por influência do crescente prestígio das ciências matemáticas e naturais, faz mais de três séculos o modelo dedutivo e experimental se impusera até ao pensamento dos juristas, que haviam perdido de vista a especificidade de sua disciplina. A ideia de um direito natural que forneceria a solução objetiva de todos os problemas de justiça, tão clara e tão segura como a dos problemas de matemática, se difundira já no século XVII. A ideia de que Deus conhece a resposta exata para todos os problemas, inclusive os de direito, incitou os melhores homens a investigar o que é justo aos olhos de Deus e que devia impor-se como justo a todos os seres de razão, do mesmo modo que o fato de que dois mais dois são quatro. 
Mas, se assim fosse, se houvesse, em questão de justiça, para cada problema uma solução a um só tempo necessária e única que pareceria tão evidente a todo ser dotado de razão quanto a solução de um problema de aritmética, chegando cada qual necessariamente à mesma resposta, não seria de modo algum necessário designar juízes para dizer o Direito. Mas sabemos quão utópicas são essas visões. A personalidade dos juízes desempenha um papel essencial na administração da justiça, e são necessários, num Estado bem-governado, juízes competentes e imparciais. É porque seu papel é tão importante que os Estados democráticos tomaram precauções contra a instauração de tribunais de exceção, cujos juízes poderiam ser designados por sua devoção ao Poder... Essa precaução, cuja sabedoria todos apreciam, só salienta a importância da personalidade do juiz na administração da justiça. 
Cada vez que o recurso à lógica basta para conhecer a resposta de uma questão, esta poderia ser fornecida por uma máquina programada para tanto, e o recurso ao juiz poderia ser evitado. Mas cada vez que uma decisão de justiça deve ser capaz de apreciar a importância dos valores em jogo, que deve poder pesar o pró e o contra, para chegar a uma decisão bem-motivada, que leve em conta, de uma forma equilibrada, as exigências da equidade e da segurança jurídica, o juiz não poderá limitar-se ao cálculo de um autômato, mas deverá recorrer a todos os recursos da argumentação, tanto em sua deliberação íntima, em sua tomada de decisão, quanto na redação de uma sentença que comprometerá sua responsabilidade pessoal. 
X. Tópica e sistema[footnoteRef:9] [9: VIEHWEG, Theodor. Tópica e jurusprudência. Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris Editor, 2008.] 
 
I. O aspecto mais importante na análise da tópica constitui a constatação de que se trata de uma técnica do pensamento que está orientada para o problema. Aristóteles tem ressaltado essa questão diversas vezes. Isto está dito nas primeiras palavras de sua Tópica (cf. supra, capítulo § 2, I, 2). E é em consonância com elas que também as classificações que propõe à tópica são classificações segundo as esferas dos problemas (cf. supra, § 2, I, 3). De fato, “as conclusões giram em torno dos problemas” (Aristóteles, Top. I, 4,2,2). Ele tem introduzido, ainda, no seu próprio trabalho filosófico, onde se encontra o próprio tratamento de uma exaurida discussão, este estilo de pensamento empregado pelos retóricos e pelos sofistas. As investigações de aporias no Livro III da Metafísica constituem um exemplo. Desta maneira surge, portanto, o seu célebre modo de trabalho aporético, que tem sido exemplar para a filosofia moderna. O termo aporia serve, propriamente, para designar a questão que se coloca e a qual não se esclarece, a “falta de um caminho”, a situação problemática que não pode ser apresentada em parte e que Boécio traduziu, ainda que não precisamente, com a palavra dubitatio. A tópica pretende proporcionar orientações e recomendações sobre o modo como se deve comportar numa determinada situação caso não se queira restar sem esperança. Essa constitui-se, portanto, a técnica do pensar problematicamente. 
Apenas o problema concreto ocasiona de modo evidente tal jogo de ponderação, que vem se denominando tópica ou arte de criação. Isso quer dizer, pois, segundo as palavras de Zielinski “a arte de evocar, em cada situação da vida, as razões que aconselham ou desaconselham dar um determinado passo, bem compreendidos ambos os sentidos dessas razões, portanto, tanto as razões favoráveis quanto as contrárias”. Concernente a isso, o autor ora citado assevera de um modo muito apropriado: “é um meio particularmente eficaz contra o simplismo... que persegue cegamente o objetivo” e, com relação ao problema da virtude [ele diz][footnoteRef:10]: “o modo de agir... resulta, aqui, como o penoso trabalho resultante de uma grande contraposição de movimentos prós e contras, em embate entre si; ao passo que, do reflexo tem decorrido a reflexão”. [10: a. a. O., p. 198. ] 
Face a tudo isso, é necessário reconhecer o problema mesmo, como já colocado e como guia atuante. Caso se pense num sistema explícito, evidentemente, isto não poderá subsistir. Nicolai Hartmann expôs de maneira eficiente essa contraposição entre o pensar problematicamente e o pensar sistematicamente. Entretanto, não se pode descurar que entre problema e sistema se sustentam implicações essenciais, que se tem como desiderato aludir com um pouco mais de detalhe. 
Caso se atribua o nome de problema e, isto é suficiente aos nossos fins, a qualquer questão que consinta aparentemente mais de uma resposta e que pressuponha, necessariamente, uma compreensão provisória, conforme a qual toma o cariz da questão que se deve levar a sério, justamente se buscará, pois, uma resposta única como solução. 
Numa perspectivaresumida, isto se desenvolve do seguinte modo: o problema é colocado mediante uma formulação adequada num dado nexo dedutivo mais ou menos explícito e mais ou menos extenso, da qual advém deduzida a resposta. Então, se ao nexo dedutivo se dá o nome de sistema, se poderá dizer, de modo mais resumido linguisticamente, que o problema decorre ordenado num sistema a fim de se chegar à sua solução. 
Se, no entanto, colocar-se o acento no sistema, o quadro que resulta é o seguinte: poderá apresentar-se o caso extremo de que só exista um sistema A, por meio do qual todos os problemas deverão ser reagrupados em problemas solúveis e problemas insolúveis, bem como, com relação a estes últimos, aqueles irresolúveis, poderão ser eliminados se considerados meros problemas aparentes, considerando-se que uma prova em contrário só seria possível por meio de um sistema B. A mesma coisa poderá valer no caso em que existam mais sistemas A, B, C, D etc. Tais sistemas selecionarão os problemas A, B, C, D pertinentes e, deixarão à orla o resto. Em outras palavras: procedendo-se de um sistema, tem-se como consectário, uma seleção de problemas. 
De modo contrário, se colocado o acento no problema, este busca igualmente um sistema que sirva de sucedâneo no consentimento de uma solução. Se existisse um único sistema A, que declarasse insolúvel o nosso problema (ainda que seja mais um simples problema aparente), seriam necessários outros sistemas para a sua solução. À mesma conclusão se poderá chegar no caso de mais sistemas A, B, C, D. Se nenhum desses sistemas permitem uma solução, será necessário outro sistema e outro ainda, pelo que se mantém sempre o caráter problemático. Em outras palavras: partindo-se de um problema se tem como consequência uma seleção de sistemas e, assim, se conduz normalmente a uma pluralidade de sistemas, sem que seja demonstrada sua compatibilidade num sistema compreendido. Além disso, os sistemas (aqui, no sentido de deduções) podem ser de pequeno ou de ínfimo alcance. 
Só se interroga, em último caso, de onde advêm a excepcional permanência do problema. Entretanto, evidentemente, é daquela mesma compreensão que se tinha devido a se pressupor previamente e da qual uma qualquer coisa se apresenta em geral, como uma questão a ser levada a sério. O problema tem, então, a sua origem num nexo de compreensão já existente, do qual não se sabe imediatamente se se trata de um sistema lógico, i.e., de um nexo dedutivo, ou de qualquer outra coisa, nem se isso possa ser, em geral, compreensível. 
É conveniente se ter em conta as implicações já aludidas entre sistema e problema quando se lê aquilo que Nicolai Hartamnn escreve do seguinte modo: “O modo de pensar sistemático se apreende a partir do todo. Aqui o elemento principal é a concepção e esta remanesce sendo o elemento dominante. Não há de se buscar, aqui, o ponto de vista, pois ele está dado desde o primeiro momento. É a partir dele que os problemas vêm a ser selecionados. Aqueles conteúdos problemáticos que não sejam compatíveis com o ponto de vista são rechaçados. Assumem o valor de questões falsamente propostas. Deve-se decidir preliminarmente, algo que seja relativo não à solução dos problemas, mas aos limites entre os quais a solução possa ser móvel”... “0 modo de pensar aporético procede ao inverso em tudo”. Sobre isso são incluídas considerações que terminam com a seguinte frase: “Ele (o modo de pensar aporético) não duvida do fato de que o sistema exista e seja no seu próprio pensar, o elemento determinante”. Por isso, tem certeza (do sistema), ainda que não o conceba assim. 
A tópica não pode ser compreendida se não se aceita o fato aqui aludido de ela estar incluída - por quanto se determine - numa ordem não concebida como tal, restando indistinto o modo como em particular se configure conceitualmente. Um tal modo de pensar só pode contar com sua consciência fragmentária. Platão dele se serviu nos seus Diâlogos. Aristóteles, como tem sido afirmou, tem utilizado em sua própria obra [este modo de pensar]. A tópica serve a este modo de pensar. 
Concretamente, como isso pode se dar? Naturalmente, se num problema há conflito em alguma parte, pode-se proceder, simplesmente, a se escolher livremente de modo tal a se aferir por meio de tentativas de pontos de vista mais ou menos ocasionais. Deste modo, busca-se as premissas que sejam adequadas e profícuas no mérito que permitam levar a consequências idôneas e que apresentem alguma coisa esclarecedora. A observação evidencia que na vida diária quase sempre assim se procede. Também nesses casos uma análise ulterior, mais precisa, conduz resultar em relativa orientação determinada por pontos de vista diretivos. Entretanto, eles não são explícitos. Em síntese, a esse procedimento se dá o nome de tópica de primeiro grau. 
A sua incerteza é evidente e se torna compreensível que se tenha de buscar um apoio, que de uma forma mais simples se tem num repertório de pontos de vista já disponíveis[footnoteRef:11]. Desta forma vêm a ser formados os catálogos de topoi, e um procedimento que se serve de tais catálogos, e denomina-se tópica de segundo grau. [11: André Lallande, Vocabulaire technique et critique de la philosophie, 1947, Vocábulo: 'Topica'.] 
III. A função dos topoi, e é indiferente que esses topoi se apresentem como topoi gerais ou como topoi especiais, consiste, pois, no fato de servir à discussão dos problemas. Disso decorre que eles devem ter uma especial importância enquanto se trata da esfera de problemas determinados, cuja natureza vem sendo o fato de não perder de todo o próprio caráter problemático. No alterar de situações e de casos particulares se deve encontrar, pois, cada vez mais, novas informações para se fazer tentativas de resolver o problema. Os topoi, intervindo em auxílio, recebem em tomo de si o próprio sentido do problema. Eles permanecem sempre essenciais pelo fato de que recebem uma ordem com relação ao problema. Em realidade, com relação ao problema que eles acompanham, uma compreensão não é imodificável, e na mesma medida nem adequada e conveniente ou inadequada. Eles devem ser entendidos funcionalmente, como possibilidade de orientação e como fios condutores do pensamento. 
XI. Argumentos jurídicos
1. Argumento ab auctoritate 
Argumento típico da retórica, foi de todos, talvez, o mais atacado no correr dos tempos. Trata-se de um argumento que procura provar uma tese qualquer, utilizando-se dos atos ou das opiniões de uma pessoa ou de um grupo que a apoia. O argumento de autoridade funda-se, sobretudo, no prestígio da pessoa ou do grupo invocado. A filosofia e a teoria da ciência sempre abominaram esse argumento, em nome da livre pesquisa da verdade. O fato, porém, é que ele sempre ressurge, de algum modo, nas argumentações, visto que, em muitos casos, a recusa do argumento de autoridade significa antes uma troca de autoridade, o ataque a uma em benefício de outra. De certo modo, a própria crença na objetividade da ciência representa uma forma de argumento de autoridade. 
O argumento de autoridade é tipicamente um topos de qualidade, pois é o prestígio pessoal do invocado que garante a tese sustentada. Vez ou outra, porém, ele toma a forma de um topos de quantidade, quando é o grande número das opiniões que favorece a tese defendida. Muitas vezes, qualidade e quantidade combinam-se, quando a força do argumento provém do prestígio de que goza uma autoridade (qualidade) e da maioria de seus membros (quantidade) em favor de uma tese. No primeiro caso a autoridade tem por função sustentar um acordo. No segundo, é o acordo mesmo das autoridades que fortalece a tese sustentada. Veja, aqui, por exemplo, a força da chamada “doutrina dominante” e de expressões do tipo: “sobre o assunto, a doutrina é pacífica”. 
No direito, é enorme a importância desse argumento. Basta pensar no valor da tradição, no papel dos jurisconsultos, na força da jurisprudência para ter-se uma ideia de sua presença. Por meio deles a própria doutrina, bastante discutida quanto a seu papel defonte ou não do direito, pode exercer, como de fato exerce, grande pressão na conformação, compreensão e decisão dos conflitos judiciais e extrajudiciais. Basta ver o papel exercido pelo parecer técnico, cuja força está não apenas na correção dos raciocínios, mas sobretudo no nome de quem o assina. 
Existem hierarquias de autoridades. Essas hierarquias são mutáveis historicamente e, também, de cultura para cultura. Autoridades universais são raras. Mesmo quanto ao campo de aplicação, as autoridades valem, em geral, para uma matéria específica. No direito moderno, a própria lei é considerada uma espécie de autoridade. A proibição da decisão contra legem garante-lhe a primazia. Entretanto, o princípio segundo o qual não há lei que não se submeta à interpretação faz crescer o prestígio da jurisprudência e da própria doutrina. De certo modo, pode-se mesmo dizer que a hierarquia das fontes do direito nada mais é do que uma disciplina do argumento de autoridade nas argumentações jurídicas. Ela indica, pela ordem, quais os fatores ou elementos que exercem influência na formulação, pelos tribunais, das normas em que se baseiam as decisões. Como as autoridades entram em conflito, o argumento é, por assim dizer, aplicável a si próprio, visto que o estabelecimento de uma hierarquia pode ter por critério de novo uma autoridade superior, que coordena e subordina as demais. As longas discussões no direito em torno do papel do Direito Natural em face do Direito Positivo nada mais são do que disputas que revelam uma argumentação ab auctoritate. Por essas razões, pode-se dizer mesmo que o argumento domina toda a argumentação jurídica, organizando-a e dando-lhe seu sentido próprio e específico.
2. Argumento a contrario sensu 
Ele não é apenas típico do direito, mas também de origem jurídica. Consiste, em termos simples, em concluir de uma proposição admissível, pela proposição que lhe é oposta. Por exemplo: se o legislador especificou taxativamente os casos de incidência do tributo, a contrario sensu os demais casos não estão abrangidos. Logicamente, ele é insustentável, pois uma consequência verdadeira pode resultar de um princípio falso, bem como duas hipóteses contrárias podem ter a mesma consequência. Seu estatuto de validade não é, pois, lógico, mas retórico (por exemplo, da proposição “a constituição não define empresa nacional” pode-se concluir, a contrario, tanto que o legislador é livre para defini-la, quanto que, ao fazê-lo, deve ater-se aos princípios constitucionais em geral). 
Na argumentação jurídica, o argumento toma, pois, a seguinte forma: se um caso dado preenche os pressupostos legais v, x, z, seguem-se para ele as consequências a, b, c; se, porém, o caso não preenche aqueles pressupostos v, x, z, então não se seguem para ele as consequências a, b, c. Nessa forma, o argumento aparece sobretudo nos casos de silêncio da lei (razão pela qual se fala, às vezes, em argumentum e silentio). Discute-se, nesse sentido, na lógica jurídica se, por meio do argumento a contrario, é possível chegar a uma qualificação jurídica de um caso não expressamente previsto. Hans Kelsen, como vimos, afirma que sim, em nome do princípio segundo o qual tudo o que não está juridicamente proibido está juridicamente permitido, o que significa, em última análise que, se um comportamento não está explicitamente vedado pela ordem jurídica, será a contrario sensu considerado como juridicamente permitido ou indiferente. Outros autores, como Amedeo Conte (1962:134), refutam a posição kelseniana, mostrando que do uso do argumento não é possível senão concluir pela inqualificação do comportamento contrário, visto que não lhe cabe qualquer qualificação jurídica, e nunca por sua permissividade ou indiferença jurídicas. 
Assim como o argumento per analogiam, também o argumento a contrario funda-se num princípio não lógico, qual seja o princípio da diferença, que exige um critério para dizer quando um caso é diferente do outro. Este, como o princípio da semelhança na analogia (ver item 5.3.1.1), tem um estatuto axiológico, isto é, não se trata de um juízo analítico, mas sintético que depende de uma avaliação pelo intérprete, conforme um juízo de valor. 
3. Argumento ad hominem
Conhecido também como ex concessis, corresponde a um argumento que limita a validade de uma tese ao que cada qual está disposto a conceder, aos valores que se reconhecem, aos fatos com os quais se está de acordo. Não se confunde com o argumento ad personam que consiste em desqualificar o adversário. O argumento ad hominem muitas vezes incorre em petição de princípio, quando o argumentador restringe o que está disposto a conceder exatamente pelas conclusões a que deseja chegar, postulando, assim, o que quer provar (por exemplo, admitido que a lei pune o ato x, então o ato x é ilegal). Nem sempre, porém, isso ocorre. O argumento é basicamente utilizável quando se pretende obter acordos prévios para uma discussão, estabelecendo-lhe as bases. Na argumentação jurídica, isto se dá no que diz respeito à concessão de fatos sem implicância da consequência jurídica, ou a presunções do tipo “ninguém é culpado até prova em contrário” etc. Por exemplo: admite-se que a lei é inconstitucional, mas, aceitando-se que não fosse (ad argumentandum), mesmo assim não se pode concluir, como o deseja a parte contrária, que determinado ato seja ilegal.
4. Argumento ad rem
Trata-se de argumento que, em oposição ao ad hominem, reputa-se válido para qualquer pessoa. Chama-se por isso também argumento ad humanitatem. O argumento ad rem concerne, nesses termos, às coisas mesmas e à verdade enquanto aceitas pressupostamente por todos, pelo auditório universal, no dizer de Perelman e Tyteca (1970). Na realidade, a expressão argumentum ad rem abarca uma série de outros referentes à força probatória daquilo que é estabelecido, observável como fato e como verdade. Portanto, está referido a provas que sustentam a validade de uma tese em função dos fatos e verdades em que ela se baseia. Entre a série de argumentos ad rem, incluem-se, por exemplo: o argumento a causa que deposita a validade da tese na demonstração das causas do fenômeno; o argumento a loco que privilegia ou enfraquece os comportamentos conforme o lugar onde ocorreram (veja-se a noção de agravantes criminais conforme o lugar do crime); o argumento a tempore que faz o mesmo que o anterior, em relação ao tempo; o argumento a modo que privilegia o aspecto ou modo como foi realizada uma ação qualquer, para atribuir-lhe maior ou menor peso na argumentação etc.
5. Argumento a fortiori
Outro argumento de origem tipicamente jurídica. Já o vemos em Ulpiano (Digesto, 50, XVII, 21): Non debet, cui plus licet, quod minus est non licere (Não deve ser proibido o menos a quem é lícito o mais). Representa a passagem de uma proposição para uma segunda, para a qual devem valer as mesmas razões da primeira, e ainda com mais força; diz-se também da passagem de uma quantidade a outra da mesma natureza, de tal modo que a primeira não possa ser atingida sem que a segunda o seja também. Perelman e Tyteca (1970) tratam do argumento como uma relação entre duplas hierarquias, permitindo-se que se apoie uma hierarquia constatada sobre outra admitida. O argumento a fortiori é usado, então, para determinar um limite a quo, como, por exemplo, no dito popular: quem pode o mais, pode o menos. Na argumentação jurídica, a fórmula é utilizada sobretudo para justificar regras de conduta (ninguém dá o que não tem, o que a lei não distingue não deve o intérprete distinguir etc.). Como outros, também esse argumento não tem um estatuto lógico, mas axiológico. Ele depende da construção de hierarquias (o que é mais e o que é menos), que, por sua vez, representam uma disposição ordenada de objetos, conforme critérios de valor.
a) Argumento a maiori ad minus
Trata-se de argumento por meio do qual, na argumentação jurídica, passamos da validade de uma disposição mais extensa para a validade de outra menos extensa. Por exemplo, pode-se raciocinar que se é justo e assentado

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