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Aula 3 - Geografia Econômica Mundial

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GEOGRAFIA ECONÔMICA 
MUNDIAL 
AULA 3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Alceli Ribeiro Alves 
 
 
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CONVERSA INICIAL 
Nesta aula abordaremos outra perspectiva interessante acerca da 
globalização: a defendida pelo jornalista americano Thomas Friedman. Friedman 
(2005) divide a globalização em três períodos, chamados de Globalização 1.0, 
2.0 e 3.0. Veremos que cada um desses períodos apresenta mudanças 
importantes sob o ponto de vista do comércio internacional, seja para os países, 
seja para as empresas ou para os indivíduos. 
Em seguida, analisaremos algumas das principais inovações resultantes 
das revoluções industriais, desde a Primeira Revolução Industrial até as mais 
recentes, e trataremos das mudanças ocasionadas pela Quarta Revolução 
Industrial (Indústria 4.0). Nosso objetivo aqui é mostrar as novidades que 
surgiram a partir de determinadas fontes de energia e as tecnologias que, 
gradativa ou radicalmente, aprimoraram ou substituíram as mais antigas. Além 
disso, analisando as recentes inovações da Indústria 4.0, consideraremos os 
impactos dessas mudanças no mercado de trabalho e na sociedade de modo 
geral. 
Por último, analisaremos a aplicabilidade dos conceitos de fixos e fluxos 
(provenientes da geografia) na área de comércio exterior e discutiremos 
brevemente acerca da perspectiva da Supply Chain (“cadeia de suprimentos”), 
relacionando-a aos fixos e fluxos e com a globalização de modo geral. 
Boa aula! 
CONTEXTUALIZANDO 
A intensificação do processo de globalização, a Indústria 4.0 e a 
importância cada vez maior das cadeias de suprimentos e redes globais de 
produção têm colocado novos desafios e oportunidades para países, empresas 
e indivíduos. Essas mudanças ocorridas no primeiro quartel do século XXI nos 
revelam que este século irá nos proporcionar ainda muitas (e rápidas) 
transformações em diversas áreas. Isso envolve o surgimento de novas 
tecnologias, a criação de novas profissões e o desaparecimento de outras, o 
desemprego, a emergência de novos paradigmas ou, ainda, o retorno de velhos 
paradigmas com novas roupagens. 
Todas essas transformações, direta ou indiretamente, afetam e afetarão 
as relações de comércio entre países e, consequentemente, o comércio 
 
 
3 
internacional. Essas relações ocorrem devido à necessidade que os países e 
empresas têm de adquirirem ou venderem (difundirem) tecnologias, produtos, 
serviços etc. Tal necessidade (ou demanda) mobiliza uma ou mais cadeias de 
fornecimentos ou redes de produção em vários mercados regionais, dando 
origem a fluxos que partem de diversos tipos de fixos. 
É com este olhar sobre a globalização, as revoluções industriais e a 
cadeia de suprimentos que tentaremos entender um pouco mais sobre essas 
mudanças e relações na economia mundial. Utilizaremos conceitos e 
perspectivas que, acreditamos, podem nos ajudar nessa tarefa que será 
realizada ao longo da apresentação e discussão dos temas a seguir. 
TEMA 1 – GLOBALIZAÇÃO 1.0, 2.0 e 3.0 
1.1 Globalização 1.0 
Para Friedman (2005), a globalização passou por três grandes períodos. 
O primeiro é bastante longo e se estendeu de 1492 até cerca de 1800. Este 
período inicia quando o navegador italiano Cristóvão Colombo saiu da Espanha 
com o objetivo de chegar à Índia. Colombo tinha uma hipótese pouco provável à 
sua época: a de que o mundo era redondo, e que se ele navegasse para Oeste 
saindo da Espanha, chegaria ao destino estabelecido em seu objetivo. 
De fato, as viagens desse explorador e navegante italiano permitiram que 
um novo período de expansão, colonização e conquista de territórios ocorresse 
no Novo Mundo. Segundo Friedman (2005, p. 17), o mundo que parecia grande 
e desconhecido, “reduziu de tamanho, de grande para médio e envolveu países 
e músculos, é o período da Globalização 1.0”. Aqui, o autor admite que questões 
importantes foram levantadas no contexto da Globalização 1.0, sobretudo no 
âmbito do país. 
1.2 Globalização 2.0 
Para Friedman (2005), o período da Globalização 2.0 vai de 1800 ao ano 
2000. Neste período, o mundo passa a sofrer outra redução de tamanho, de 
médio para pequeno. Na perspectiva do autor, houve apenas uma breve 
interrupção neste período, que envolveu a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. 
Se na Globalização 1.0 os países foram os principais agentes de mudança, 
Friedman defende que foram as empresas multinacionais que tiveram esse 
 
 
4 
papel na Globalização 2.0. “As multinacionais se expandiram em busca de 
mercados e mão de obra, movimento encabeçado pelas sociedades por ações 
inglesas e holandesas e a Revolução Industrial” (Friedman, 2005, p. 18). 
Nesse mesmo contexto e período, o autor trata da ideia de inovação nos 
sistemas de transporte e comunicação, tema amplamente debatido na geografia 
econômica e industrial, e que também se faz presente nas seções seguintes 
deste texto. Nas palavras de Friedman (2005, p 18): 
Na primeira metade dessa era, a integração global foi alimentada pela 
queda dos custos de transporte (graças ao motor a vapor e às 
ferrovias) e, na segunda, pela queda dos custos de comunicação (em 
decorrência da difusão do telégrafo, da telefonia, dos PCs, dos 
satélites, dos cabos de fibra óptica e da World Wide Web em sua 
versão inicial). Foi nesse período que assistimos de fato ao nascimento 
e maturação de uma economia global propriamente dita, no sentido de 
que havia uma movimentação de bens e informações entre os 
continentes em volume suficiente para a constituição de um mercado 
de fato global, com a venda e revenda de produtos e mão de obra em 
escala mundial. 
Apesar da redução no tamanho do mundo e das transformações 
produzidas pelas globalizações 1.0 e 2.0, Friedman acredita que muitas barreiras 
ainda existiam no final da Globalização 2.0. Ainda no âmbito dessa segunda 
fase, o autor admite que questões importantes foram levantadas no contexto da 
globalização, sobretudo na esfera das empresas. 
1.3 Globalização 3.0 
Na terceira e última fase da globalização (atual), Friedman (2005) afirma 
que o mundo passou por um novo processo de encolhimento, de pequeno para 
minúsculo. O autor denomina essa fase ou era como Globalização 3.0. A grande 
diferença dessa fase em relação às anteriores é a de que nesta, diferentemente 
daquelas, o tamanho do mundo “não apenas está reduzindo, como também, ao 
mesmo tempo, está aplainando” (Friedman, 2005, p. 19). 
Além das questões levantadas até agora, outro ponto importante precisa 
ser destacado na obra de Friedman no que concerne à terceira fase da 
globalização. Para o autor, enquanto a força dinâmica na Globalização 1.0 foram 
os países e na Globalização 2.0 foram as empresas, “na 3.0 a força dinâmica 
vigente (aquilo que lhe confere seu caráter único) é a recém descoberta 
capacidade de os indivíduos colaborarem e concorrerem no âmbito global” 
(Friedman, 2005, p. 19). 
 
 
5 
Atualmente, segundo o autor, a força utilizada não é mais o músculo (da 
primeira globalização), ou o cavalo-vapor e o hardware (da segunda), a força 
agora são os softwares, os aplicativos, “conjugados à criação de uma rede de 
fibras ópticas em escala planetária que nos converteu, a todos, em vizinhos de 
porta” (Friedman, 2005, p. 19). 
É interessante notar que esse terceiro período nos permite admitir que os 
indivíduos, e por que não dizer também a coletividade, os grupos e as 
comunidades, podem assumir papel de maior relevância no processo de 
globalização atual, considerando as potencialidades e possibilidades que a 
tecnologia, a internet e as redes sociais envolvem e oferecem. 
TEMA 2 – REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS 
Ainda no século passado, no período que Friedman (2005) classifica 
como Globalização 2.0, Schumpeter (1942, p. 134) já dizia que “a energia 
humana se afastaria dos negócios”. Essa é uma realidade que se observa em 
diversos setores da atividade econômica e está se intensificando cada vez maisna atualidade, sobretudo com o surgimento da Indústria 4.0 e o aumento da 
competição entre países com o processo de globalização. Esse processo, impõe 
aos países e às indústrias a necessidade de inovar, melhorar as técnicas e as 
tecnologias, conquistar mercados etc. 
Analisaremos essas questões envolvendo a inovação um pouco mais 
adiante, quando tratarmos do conceito de inovação e das contribuições deixadas 
por Joseph Schumpeter. Por ora, vamos apenas utilizar essa citação de 
Schumpeter para tratarmos das revoluções industriais e das transformações 
mais recentes na indústria e nas tecnologias. Posteriormente, você irá perceber 
que tanto a globalização como as revoluções industriais ou tecnológicas têm 
forte relação com as perspectivas das Supply Chains, Global Value Chains, 
Global Production Networks etc. 
Existem diversas classificações ou periodizações envolvendo as 
revoluções industriais. O trabalho de Carlota Perez (2002), por exemplo, aborda 
essa questão apresentando cinco revoluções tecnológicas. Para a autora, a 
energia hidráulica utilizada para a fabricação de algodão em Derbyshire, na 
Inglaterra, marca a Primeira Revolução. 
 
 
6 
Uma das periodizações mais conhecidas é aquela que considera quatro 
grandes transformações ou inovações, principalmente nas áreas de manufatura, 
tecnologia e engenharia, conforme demonstra o Quadro 1. 
Quadro 1 – Principais características e inovações das revoluções industriais 
 Revolução Características Inovações 
Primeira 
Revolução 
Industrial 
(1760-1850) 
• Energia a vapor; 
• aço. 
• Energia a vapor utilizada para uso industrial 
e comercial (James Watt, 1776), substituindo 
a energia humana e hidráulica; 
• máquinas na industrial têxtil; 
• desenvolvimento dos transportes, 
inicialmente com os trens movidos a vapor. 
Segunda 
Revolução 
Industrial 
(1850-1945) 
• Energia elétrica; 
• produção em massa. 
• Petróleo; 
• nova fase de desenvolvimento dos 
transportes e das comunicações; 
• transportes: motores de combustão interna, 
produção em larga escala de automóveis; 
• aviões; 
• comunicações: rádio e telefone; 
• fordismo e taylorismo. 
Terceira 
Revolução 
Industrial 
(1945-1970) 
• Indústria petroquímica; 
• óleos, lubrificantes; 
• produção flexível; 
• compressão espaço-
tempo. 
• Produção de mísseis; 
• toyotismo; 
• desenvolvimento acelerado nos sistemas de 
transporte e comunicação; 
• trem-bala, computadores, internet. 
 
 
Quarta 
Revolução 
Industrial 
(1971-Hoje) 
• Revolução Técnico-
Científico Informacional; 
• alta tecnologia; 
• robôs cada vez mais 
substituindo humanos 
em tarefas repetitivas. 
• Robótica; 
• microprocessadores; 
• plataformas virtuais; 
• inteligência artificial. 
 
 
Fonte: Alves, 2015; Alves; Antunes, 2019. 
Segundo essa classificação, a energia a vapor faria parte de um primeiro 
momento entre as revoluções industriais ou tecnológicas, sendo introduzida 
principalmente na indústria têxtil. Esta foi uma das primeiras a experimentar 
inovações relacionadas à energia a vapor, empregando grandes quantidades de 
mão de obra e capital. 
A indústria têxtil geralmente é uma das primeiras indústrias a se instalar 
em um país quando este decide industrializar-se. A noção de barriers to entry, 
analisada no contexto das cadeias globais de valor, nos ajuda a compreender o 
porquê de essa indústria ser considerada pioneira no processo de 
industrialização em diversos países. Um dos motivos para isso é a facilidade com 
que competidores conseguem ingressar nesse tipo de atividade. As locomotivas 
 
 
7 
a vapor também são produtos que resultaram dessa primeira fase de 
transformações (Figura 1). 
A produção de automóveis em larga escala e o surgimento do avião estão 
situados na Segunda Revolução Industrial. O modelo de produção em larga 
escala ou de produção em massa seria mais tarde substituído pelo modelo de 
produção enxuta ou flexível, característicos do modelo toyotista de produção. 
TEMA 3 – A INDÚSTRIA 4.0 
A Indústria 4.0 pode ser considerada um desdobramento da Indústria 3.0 
ou da Terceira Revolução Industrial, e definida como uma revolução que produz 
constantes inovações principalmente nas áreas da robótica, da tecnologia e da 
inteligência artificial (Figura 1). 
Figura 1 – Classificação indicando quatro grandes revoluções industriais 
 
Crédito: ChickenDoodleDesigns/Shutterstock. 
Conforme pudemos constatar no Quadro 1 e na Figura 1, a Quarta 
Revolução Industrial não se trata de uma transformação muito recente. Mas o 
que gostaríamos de chamar a atenção é para o fato de ela ter produzido diversas 
inovações no campo da tecnologia, dos produtos e serviços, e rápidas mudanças 
nos mercados de trabalho e na sociedade de modo geral. 
 
 
8 
Contrariando os pressupostos de Jean Baptiste Say (1767-1832), que 
assume que a oferta cria a sua própria demanda, e de que a inovação 
tecnológica estimula o crescimento econômico e a geração de empregos de 
maneira constante, Rifkin (1996) argumenta que a situação dos trabalhadores e 
dos mercados de trabalho ao redor do mundo pode piorar significativamente nas 
próximas décadas, o que implicará num engajamento cada vez maior dos 
governos, das empresas e, sobretudo, do terceiro setor. 
No final do século XX e início do século XXI, parcela significativa do 
desemprego gerado em diversos setores da economia bem como o surgimento 
de novos empregos e profissões podem ser atribuídos aos impactos causados 
pela Quarta Revolução Industrial ou Indústria 4.0. 
Em diversos mercados de trabalho e setores da atividade econômica 
humanos e máquinas podem exercer determinadas tarefas ou atividades. Para 
algumas atividades, a máquina auxilia no trabalho a ser realizado por seres 
humanos e, muitas vezes, evita que acidentes de trabalho possam afetar a saúde 
e a vida dos trabalhadores. 
Por outro lado, para outras atividades a máquina substitui parcial, ou 
mesmo completamente, a energia humana, de modo que as máquinas realizam 
as tarefas que anteriormente eram realizadas por seres humanos. A imagem 
apresentada na Figura 2 nos permite pensar nessa relação entre máquinas e 
seres humanos quando tratamos de questões relacionadas, por exemplo, ao 
mercado de trabalho. 
Figura 2 – Humano versus robô: disputando postos no mercado de trabalho 
 
Crédito: pathdoc/Shutterstock. 
 
 
9 
O exemplo da indústria automobilística é um clássico entre os setores que 
fazem uso de robôs em suas linhas de produção. O trabalho que seria realizado 
por diversos trabalhadores ao longo de determinado tempo, já vem sendo 
realizado por braços mecânicos, como na soldagem e pintura de automóveis e 
na movimentação de peças e acessórios entre as linhas de produção. Indivíduos 
e máquinas compartilham o mesmo espaço na linha de produção e na fábrica, e 
certamente essa é uma relação que vem se naturalizando de maneira acelerada 
no início do século XXI. 
Mas, obviamente, outros setores e elos na cadeia de suprimentos, como 
a logística, também experimentam a introdução e a difusão dos robôs em suas 
operações há algum tempo. Tenha como exemplo os robôs que atuam na gestão 
de fluxos de materiais ou produtos em uma organização. 
Saiba mais 
Para saber mais sobre a atuação dos robôs no setor de logística ou 
mesmo na fabricação de automóveis, assista aos vídeos a seguir: 
FÁBRICA da Audi - Produção do Q5 2017. Motor1 Brasil, 10 out. 2016. 
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=eKwiFZIqsgk>. Acesso em: 
3 ago. 2019. 
ROBÔS autônomos na logística. Edson Miranda, 31 mar. 2019. Disponível em: 
<https://www.youtube.com/watch?v=KPXze2zcfto>. Acesso em: 3 ago. 2019. 
Alternativamente, é possível analisar outros setores da atividade 
econômica. Setores que até então pareciam inatingíveis pelo avanço das 
técnicas e tecnologias vêm observando a gradual inserção da robótica em suas 
atividades. É o caso, por exemplo, dos escritórios de advocacia.Agora, robôs 
fazem o trabalho que diversos advogados teriam de fazer para dar conta do 
volume de trabalho e de processos que teriam de ser encaminhados e 
acompanhados fisicamente e tecnicamente pelos advogados. 
Para Vasconcellos e Cardoso (2016), robôs têm realizado tarefas no lugar 
de humanos e o advogado só entra para tomar decisões estritamente jurídicas, 
e não mais para atuar na rotina burocrática. Segundo esses autores: 
para que 420 advogados deem conta de 360 mil processos, é preciso, 
matematicamente, que cada profissional cuide de 857 ações ao 
mesmo tempo. A conta dessa equação só fecha graças a um único 
fator: tecnologia. Foi com ela que o JBM Advogados, em um ano, 
cortou pela metade o número de profissionais da banca e, ainda assim, 
 
 
10 
aumentou a quantidade de processos do escritório [...] Imagine um 
caso clássico de pedido de indenização, a espera em fila de banco. Ao 
identificar o cadastro [...], o programa já monta uma defesa, 
preenchendo espaços [...] Substituindo o "copia e cola" das petições, 
cabe ao advogado simplesmente clicar nos trechos que serão 
aproveitados na peça em questão e dar o "ok", gerando uma assinatura 
e enviando a peça ao sistema. 
Atividades consideradas burocráticas, como localizar processos, 
acompanhar datas de julgamentos, fazer download de documentos e materiais, 
calcular os custos de um processo, cadastrar novos processos etc. são tarefas 
que cada vez mais passam a ser desempenhadas por máquinas. 
É claro que este exemplo da presença dos robôs na advocacia é apenas 
mais um daqueles que poderíamos utilizar para demonstrar o impacto das novas 
tecnologias na relação trabalho versus capital. Obviamente, alguns clicks ou 
comandos ainda são realizados por meio da atividade ou energia humana, mas 
não há como negar a influência cada vez maior das tecnologias e robôs nas 
atividades econômicas em particular, e em nossas vidas de modo geral. 
TEMA 4 – FIXOS E FLUXOS NA ECONOMIA MUNDIAL 
4.1 Os fixos e fluxos em comércio exterior 
A geografia faz uso de uma variedade de conceitos para tratar dos temas, 
questões e problemas da atualidade. Conforme já destacamos, os conceitos são 
ferramentas indispensáveis para o exercício da atividade intelectual e para a 
compreensão dos fenômenos. O conceito é uma construção social que surge no 
processo de compreensão da realidade. 
A Geografia Econômica não faz uso apenas de conceitos dessa mesma 
área. Eles são conceitos da geografia, mas também da economia, da sociologia, 
da administração, da biologia etc. Na medida em que o conceito é considerado 
útil na compreensão das relações que envolvem a interação entre o espaço e a 
sociedade, a geografia faz uso do conceito para analisar os fenômenos, as 
relações existentes e as transformações que possam surgir no espaço 
geográfico a partir dessas relações. 
É com essa preocupação em definir e estabelecer os conceitos que 
Santos (1999, p. 8) já nos alertava para a necessidade de esclarecermos, logo 
de início, “os termos do debate” que desejamos discutir. Para Santos (1978), por 
exemplo, o espaço geográfico pode ser concebido como um conjunto de fixos e 
 
 
11 
fluxos. Segundo o autor, pode ser também a configuração territorial (sistemas 
naturais + produção histórica dos sistemas naturais) somada às relações sociais 
(Santos, 1988) ou, ainda, um conjunto indissociável de “sistemas de objetos e 
sistemas de ações” (Santos, 1996, p. 51). 
Nossa perspectiva aqui faz uso da noção de fixos e fluxos, porque nas 
relações de comércio exterior, os fluxos (ex.: importações e exportações) sempre 
terão uma origem, e essa origem tem como fundamento e localização diversos 
tipos de fixos. Os fixos e fluxos também estão intimamente ligados a outra 
perspectiva importante em comércio exterior: a cadeia de suprimentos. Vamos 
entender inicialmente os conceitos de fixos e fluxos, para depois avançarmos 
com os estudos envolvendo a cadeia de suprimentos. 
4.2 Os fixos e sua relação com o comércio exterior 
Os fixos podem ser considerados como “coisas fixas” (Santos, 1997, p. 
77) ou estruturas fixas presentes nos lugares e que “permitem ações que 
modificam os próprios lugares” (Santos, 1996, p. 50). É partir dos fixos que 
partem os fluxos, tanto materiais como imateriais. 
Os portos marítimos são exemplos de fixos, mas seria possível considerar 
também a importância das hidroelétricas, das fábricas, dos aeroportos, das 
residências, das sedes de organizações etc. Outro exemplo de fixo é um 
barracão destinado para estocagem de soja (Figura 3), que será posteriormente 
destinada para exportação, ou seja, os fixos dão origem a diversos tipos de 
fluxos. 
Figura 3 – Armazém de grãos 
 
Crédito: Hennadii H/Shutterstock. 
 
 
12 
4.3 Os fluxos e sua relação com o comércio exterior 
Já os fluxos indicam movimento e interação. Neste caso, podemos citar 
como exemplo a difusão do conhecimento e das técnicas, que ocorre por meio 
da concentração e/ou dispersão do fluxo de informações e de ideias. 
Uma alternativa interessante para que possamos compreender a 
importância dos fluxos está na ideia de distribuição e circulação de produtos ou 
mercadorias entre os países através das relações de importação e exportação, 
ou ainda, na movimentação de mercadorias de um lugar para o outro. Os 
sistemas de logística e de transportes produzem e controlam diversos tipos de 
fluxos (Figura 4). 
Figura 4 – Sistemas de logística e transporte 
 
Crédito: Travel mania/Shutterstock. 
TEMA 5 – NOTAS SOBRE SUPPLY CHAIN/CADEIA DE SUPRIMENTOS 
Conforme discutimos, os fixos e fluxos estão intimamente ligados à cadeia 
de suprimentos. Ocorre que a cadeia de suprimentos é apenas uma entre as 
mais diversas perspectivas utilizadas para se compreender as relações 
funcionais e econômicas estabelecidas entre empresas e indústrias no espaço 
geográfico. Global Commodity Chains, Global Value Chains e Global Production 
Networks são igualmente importantes nesse contexto. Nesta aula vamos nos 
limitar aos estudos envolvendo apenas a perspectiva da cadeia de suprimentos, 
ou Supply Chain. 
 
 
13 
Segundo Ballou (2006, p. 29), “cadeia de suprimentos é um conjunto de 
atividades funcionais (transportes, controle de estoque etc.) que se repetem 
inúmeras vezes ao longo do canal pelo qual matérias-primas vão sendo 
convertidas em produtos acabados, aos quais se agrega valor ao consumidor”. 
Essa é uma percepção de cadeia de suprimentos que relaciona produção, 
logística e transportes. Nesse contexto, em que momento a cadeia de 
suprimentos se relaciona com o comércio exterior? 
De maneira sucinta, o comércio exterior põe em movimento toda uma rede 
de designers, produtores, fornecedores, consumidores etc. por isso a cadeia de 
suprimentos está diretamente relacionada às transações em comércio exterior 
(Figura 5). 
Figura 5 – Exemplo esquemático de cadeia de suprimentos 
 
Fonte: Brasil, 2018, p. 23. 
Tenha como exemplo a relação entre a cadeia de suprimentos e o sistema 
portuário, bastante utilizado em comércio internacional. Novaes e Vieira (1996, 
p. 290) discutem acerca dessa relação mencionando inicialmente o modelo 
tradicional de transportes e logística portuária. Para eles: 
o transporte de carga tradicional trata de deslocar produtos e insumos 
entre pontos diversos (escala espacial), considerando a escala do 
tempo de forma secundária. Até alguns anos atrás o salto conceitual a 
partir do transporte tradicional para o serviço logístico se apoiava 
fundamentalmente no seguinte aspecto: para se ter um bom serviço 
 
 
14 
logístico é preciso atender plenamente os compromissos pré-
estabelecidos de prazos de entrega, considerando não somente os 
prazos médios, como também sua variabilidade (confiabilidade dos 
prazos). 
Contudo, argumentam os autores, produção e distribuição precisam ser 
pensados de maneira integrada, articulando os setores de marketing elogística. 
Nesse sentido, Novaes e Vieira (1996, p. 291) afirmam que 
Nos últimos anos o conceito de Logística tornou-se mais exigente e 
mais complexo. Hoje fica difícil, em alguns casos, separar o processo 
de manufatura do processo logístico. Por exemplo, automóveis 
japoneses são embarcados nos navios, com destino à América do 
Norte, ainda não completamente montados. Operários realizam esse 
trabalho de montagem embarcados, aproveitando o tempo – antes 
desperdiçado – da viagem entre o Japão e os Estados Unidos. 
Nesse sentido, podemos afirmar que não apenas as relações espaciais 
são importantes, mas também aquelas que envolvem a dimensão temporal. 
Para Friedman (2005, p. 152), cadeia de suprimentos pode ser definida 
como “um método de colaboração horizontal (entre fornecedores, varejistas e 
clientes) com vistas à geração de valor”. De acordo com o autor, a cadeia de 
suprimentos ou de fornecimento pode ser considerada uma força niveladora ou, 
ainda, uma força que nos deixa a sensação de que o mundo é muito menor do 
que podemos imaginar. E, além de ser menor, deixa o mundo cada vez mais 
plano, conforme visto anteriormente na perspectiva da Globalização 3.0. 
A ideia de força niveladora surge, na obra do autor, como uma leitura ou 
uma percepção do processo de globalização. Percepção essa que, de certa 
forma, compara as mudanças atuais às inovações que ocorreram com o 
surgimento da imprensa, com Gutenberg, e a própria Revolução Industrial. 
A diferença, porém, segundo Friedman (2005, p. 59), é de que 
a introdução da imprensa levou décadas para se consolidar, e durante 
muito tempo sua influência restringiu-se a uma pequena parte do 
planeta. O mesmo pode ser dito da Revolução Industrial. O processo 
de achatamento está acontecendo à velocidade da luz e toca, direta ou 
indiretamente, muito mais gente em todo o globo. Quanto mais rápida 
e ampla for essa transição para uma nova era, mais dolorosas as 
rupturas, em oposição a uma transferência organizada de poder dos 
antigos vencedores para os novos. 
A grande questão que Friedman coloca é justamente a que impõe aos 
países, às empresas, às instituições, aos indivíduos etc. a necessidade de inovar 
e se preparar para as mudanças que ocorrerão no futuro. Certamente, todos 
esses agentes terão de direcionar seus objetivos e interesses considerando, 
direta ou indiretamente, o desenvolvimento de competências e habilidades que 
 
 
15 
serão fundamentais em um mundo cada vez mais globalizado, conectado e 
repleto de mudanças rápidas, principalmente no que concerne à tecnologia. 
TROCANDO IDEIAS 
Após ter analisado as discussões em torno das mudanças e inovações 
causadas pelo surgimento e difusão da Indústria 4.0, discuta com seus colegas 
sobre sua posição acerca do assunto. Você acredita que a Indústria 4.0 tende a 
gerar desempregos em diversos setores da atividade econômica? Ou possui 
uma opinião diversa dessa, compreendendo que o avanço e a introdução das 
máquinas e tecnologias são positivos e agregam na execução das tarefas mais 
complexas? Além disso, reflita sobre como essas mudanças em máquinas e 
tecnologias podem afetar as relações no âmbito do comércio internacional, ou 
seja, o que os países e as empresas devem fazer para estar preparados para as 
mudanças que ocorrerão nos próximos anos e décadas? 
NA PRÁTICA 
Para que você possa refletir mais sobre os conteúdos discutidos nesta 
aula e ampliar seus conhecimentos sobre o conceito de Supply Chain, propomos 
aqui uma atividade que lhe possibilite realizar diversas conexões envolvendo 
produção, distribuição e consumo. 
Considerando o conceito de cadeia de suprimentos defendido por Ballou 
(2006, p. 29) ou por Friedman (2005, p. 152) e tendo como auxílio o exemplo 
esquemático de cadeia de suprimentos apresentado neste texto-base, escolha 
um produto ou commodity comercializado no âmbito do comércio internacional e 
procure traçar os diversos caminhos pelos quais esse produto ou commodity 
percorre até chegar ao seu consumidor final. 
Trata-se de uma atividade prática relativamente simples, mas para auxiliar 
você nessa tarefa apresentaremos um exemplo que lhe permitirá compreender 
melhor a proposta desta atividade. Considere o produto “automóvel” da 
montadora Volkswagen (VW). Esses automóveis podem ser projetados (design) 
na Alemanha, produzidos no Brasil (produção) e transportados (distribuídos ou 
fornecidos) para a Argentina, que contará com uma quantidade significativa de 
clientes ou consumidores que aguardam a chegada desse produto (consumo). 
 
 
16 
FINALIZANDO 
Conforme analisamos, a globalização é um fenômeno que impõe 
desafios, mas também gera oportunidades para países, empresas e indivíduos. 
Constatamos que a Indústria 4.0 causou (e ainda irá trazer) inúmeras 
transformações na economia dos países, empresas, mercados de trabalho e, 
obviamente, nas relações de comércio exterior. Por isso, conhecer o fenômeno 
da globalização, identificar os agentes transformadores que mobilizam múltiplos 
tipos de fixos e fluxos na economia mundial e reconhecer o papel das tecnologias 
e das diversas redes de produção e cadeia de suprimentos que atuam nos 
mercados regionais são requisitos fundamentais a serem considerados pelos 
profissionais de hoje e do futuro, sobretudo no estabelecimento de estratégias e 
na tomada de decisão. 
 
 
 
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REFERÊNCIAS 
ALVES, A. R. Geografia econômica e geografia política. Curitiba: 
InterSaberes, 2015. 
ALVES, A. R.; ANTUNES, E. M. Geografia industrial. Curitiba: InterSaberes, 
2019. 
BALLOU, R. H. Gerenciamento da cadeia de suprimentos: logística 
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http://lattes.cnpq.br/9220842816771782
	Conversa inicial
	Contextualizando
	Crédito: Hennadii H/Shutterstock.
	Trocando ideias
	Na prática
	FINALIZANDO
	REFERÊNCIAS
	_____. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988.
	_____. Por uma geografia nova. São Paulo: Hucitec, 1978.

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