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História geral e do Brasil - Vol 3 Claudio Vicentino-12

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a	crise	de	1929	e	o	naziFascismo	 89
Joseph Goebbels coordenou a propaganda na-
zista, ganhando o apoio de quase toda a nação aos 
grandiosos planos do Führer. A campanha racista 
criava um bode expiatório e aproximava a popula-
ção alemã dos nazistas ao propor a purificação racial 
por meio do extermínio dos judeus. Para cumprir seu 
plano de genocídio denominado “solução final”, os 
campos de concentração foram multiplicados e mi-
lhões de judeus, assassinados. Toda a sociedade foi 
envolvida no programa nazista do Terceiro Reich: das 
crianças aos adultos; nas escolas e instituições, todos 
eram induzidos a filiar-se à Juventude Hitlerista ou ao 
Partido Nazista.
A nazificação alemã completou-se com o arma-
mentismo e o total militarismo, que reativaram o de-
senvolvimento econômico baseado na indústria bé-
lica. A militarização da Alemanha visava à expansão 
territorial e à conquista do “espaço vital”, o que viria 
a constituir o estopim de um novo conflito europeu.
p	 Húngaros	de	ascendência	judaica	chegam	em	auschwitz-
-Birkenau,	um	complexo	de	campos	de	concentração	e	
de	 extermínio	 localizado	 na	 Polônia.	 repare	 na	 estrela	
de	davi,	 identificação	obrigatória	que	cada	pessoa	 judia	
deveria	portar.	Foto	de	1944.
p	 Propaganda	 de	 1935:	 “toda	 a	 alemanha	 escuta	 o	 Führer	
com	o	rádio	popular”.
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A pOpulAçãO AlEmã tiNhA cONhEcimENtO 
dO ExtErmÍNiO dOs judEus NOs cAmpOs dE 
cONcENtrAçãO?
Assim, tanto na Alemanha quanto nos países invadidos sabia-
-se que os judeus eram enviados em vagões ferroviários para algum 
lugar. Mas sabiam para onde e para o quê? É verdade que não houve 
ordem explícita de Hitler ou de Goebbels para o extermínio – argu-
mento muito utilizado pelos “revisionistas”. Mas não foi preciso. O na-
zismo tomou uma infinidade de medidas que, isoladas e justapostas, 
permitiu que os alemães ignorassem, ou desejassem ignorar, o que 
estava acontecendo, diz Ferro1. A compartimentação das atividades 
que envolviam o extermínio, desde o ponto de partida ao de chega-
da, assegurava que um profissional não soubesse a exata função do 
outro. Mas como os ferroviários poderiam desconhecer o destino dos 
passageiros amontoados nos vagões, os trabalhadores químicos não 
perceber para que fabricavam o gás cyklon, os juristas, os funcioná-
rios, os policiais, entre tantas outras categorias, ignorar a finalidade 
de suas funções? Sabemos que o nazismo tornou as câmaras de gás 
um segredo de Estado, mas a estratégia não impediu que milhares 
de pessoas conhecessem, ou ao menos suspeitassem, de sua exis-
tência. Se o número dos “executores diretos” do extermínio é calcu-
lado entre 300 000 e 400 000 pessoas, os “indiretos”, sem dúvida, são 
multiplicados em muitas vezes. Portanto, pelo menos na Alemanha, é 
difícil garantir que “poucos sabiam”.
FERREIRA, Jorge. Problematizando a Segunda Guerra Mundial. Disponível em: 
<www.historia.uff.br/tempo/resenhas/res1-2.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2013.
1 FERRO, Marc. História da Segunda Guerra Mundial. Tradução de Mauro Lando e Isa Mara Lando. São Paulo, Ática, 1995.
cyklon ou zyklon:	produto	à	base	de	ácido	cia-
nídrico,	 cloro	 e	 nitrogênio	 usado	 inicialmente	
como	pesticida	e	depois	como	o	gás	que	pro-
vocou	as	mortes	nos	campos	de	concentração	
alemães,	na	segunda	Guerra.
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90	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XX
pArA rEcOrdAr: A crise liberal do período entreguerras
AtiVidAdEs
com	base	no	esquema-resumo	e	nas	informações	do	capítulo,	faça	as	atividades	a	seguir:
1.	 explique	as	causas	da	crise	financeira	de	1929.
2.	 escreva	um	texto	coeso	e	coerente,	no	qual	apareçam	os	seguintes	termos:
 	 nacionalismo	–	nazifascismo	–	militarismo
após o democrata Woodrom Wilson
isolacionismo e 
liberalismo:
•	falências
•	desemprego
•	deflação
predomínio do Partido 
Republicano
F. D. Roosevelt
estados 
intervencionistas
nazifascismo
militarismo 
armamentismo e expansionismo
•	expansão da crise (exceto União Soviética)
•	fim das importações e repatriamento financeiro
•	redução do comércio internacional
•	elevado índice de desemprego
outros governos ditatoriais:
•	salazarismo
•	franquismo
•	neoliberalismo ou keynesianismo
•	atuação estatal
•	emissionismo e planejamento econômico
New Deal
•	1920 - Warren G. Harding
•	1924 - Calvin Coolidge
•	1928 - Herbert Hoover
quebra de Wall Street 
(Quinta-Feira Negra) 
24/10/1929
Segunda
Guerra Mundial
p
•	não ratificação do Tratado de Versalhes
•	boom econômico e financeiro
•	superprodução/subconsumo
•	especulação crescente
antecedentes
ESTADOS UNIDOS
EUROPA
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	 A	crise	de	1929	e	o	nAzifAscismo	 91
1	 Leitura	e	análise	de	gráficos
	 Observe	com	atenção	os	dois	gráficos	abaixo	e,	em	seguida,	responda	às	questões.
a)	 O	que	cada	um	dos	gráficos	mostra?
b)	Que	 relação	 há	 entre	 a	 quebra	 da	 Bolsa	 de	 Valores	 e	 a	 taxa	 de	 desemprego	 nos	 Estados	 Unidos?	
Justifique	sua	resposta	com	dados	dos	gráficos	e	com	base	em	seus	conhecimentos	de	História.
c)	 Estabeleça	uma	relação	entre	as	transformações	observadas	no	segundo	gráfico	e	a	política	econômica	
adotada	por	Franklin	Roosevelt.
2	 Leitura	e	análise	de	cartaz	de	propaganda
	 Observe	com	atenção	a	imagem	ao	lado	e	faça	as	atividades	propostas	a	seguir.
a)	 Pesquise	em	 livros	ou	na	 internet	sobre	o	cená-
rio	político	alemão	na	ocasião	das	eleições	parla-
mentares	de	1932.
b)	Com	 base	 no	 que	 você	 estudou	 neste	 capítulo,	
responda:	 quais	 foram	 os	 elementos	 mais	 mar-
cantes	da	ideologia	nazista?
c)	 Identifique	os	elementos	presentes	no	cartaz	re-
produzido	ao	lado.
d)	Descreva	cada	um	desses	elementos,	comentan-
do	sobre	a	maneira	como	foram	representados	e	
projetados	no	cartaz,	ou	seja:	qual	a	sua	cor,	qual	
o	seu	tamanho,	qual	a	sua	localização,	etc.
e)	 Com	base	em	seus	conhecimentos	sobre	a	época	
e	a	ideologia	nazista,	que	significados	podem	ser	
atribuídos	a	esse	cartaz?	Avalie	o	que	os	elemen-
tos	gráficos	que	o	compõem	(tamanho,	volume	e	
cor)	valorizam.
ExErcícios dE história
Movimentação da Bolsa de Valores 
de Nova York (1927-1933)
taxa de desemprego nos 
Estados Unidos (1929-1942)
Disponível em: <http://resistir.info/crise/imagens/stock_market_crash.jpg>. 
Acesso em: 20 jan. 2013.
Disponível em: <www.econmicro.com/images/urdep.png>. Acesso em: 20 jan. 2013.
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reprodução	de	um	cartaz	utilizado	na	campa-
nha	eleitoral	para	o	Parlamento	da	Alemanha,	
em	1932.	o	texto,	em	alemão,	diz:	O povo vota 
para a Lista 1: Nacional-socialistas.
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92	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XX
3 leitura e análise de artigo de jornal
	 Leia	o	artigo	abaixo,	de	autoria	de	João	Pereira	Coutinho.	Depois,	responda	às	questões	propostas.
A unanimidade é burra
SEMPRE tive horror a multidões. Não falo de multidões anô-
nimas em cidades anônimas. Dessas gosto. De me perder 
nelas e com elas. Falo das outras: multidões politicamente 
organizadas, que suspendem o raciocínio para seguirem um 
líder e uma causa. Nelson Rodrigues dizia, com simplicidade 
avassaladora, que toda unanimidade é burra. Confirmo.
A culpa é minha. A culpa é do meio onde cresci. O meu pai 
era um liberal clássico. Liberal, não: libertário. Se a liber-
dade é o valor supremo da existência humana, qualquer li-
mitação à liberdade seria objetivamente um dano. Drogas, 
prostituição, eutanásia o Estado que se afastasse. Só quan-
do existe invasão da liberdade alheia deve o poder político 
intervir. Caso contrário, o indivíduo é soberano.
Não para a minha mãe, que sempre gostou de se apresen-
tar, e de se olhar, como uma humanistade esquerda. Uma 
sociedade civilizada é uma sociedade capaz de cuidar dos 
mais pobres. O que implica a existência de um Estado sólido 
e generoso, capaz de distribuir a renda e garantir serviços 
básicos de decência.
E eu? Eu cresci entre os dois, escutando ambos e discor-
dando de ambos. Sim, a liberdade é um dos valores funda-
mentais. Não é o valor fundamental, perante o qual todos 
os outros se vergam. Valores como a igualdade, a justiça 
ou a segurança podem ter prioridade, e muitas vezes têm, 
para garantir a sobrevivência de uma comunidade política.
O mesmo para a senhora minha mãe: uma sociedade deve 
cuidar dos mais fracos; mas não deve permitir que o poder 
político cresça de forma intolerável e potencialmente perigo-
sa. O poder corrompe. O poder absoluto corrompe absoluta-
mente. Lord Acton “dixit”.
Foi assim que me tornei um conservador pluralista e céti-
co, avesso aos extremos e aos extremistas. E assim conti-
nuo: olho em volta e constato, sem surpresa, que os meus 
amigos se espalham generosamente pela esquerda e pela 
direita. Discordo muito deles. Mas, por causa deles, dou 
por mim a discordar várias vezes de mim próprio. Eles não 
existem para confirmar as minhas certezas. Eles existem 
para as testar. Malditos sejam. Abençoados sejam.
Agradeço-lhes publicamente. E agradeço também à revista 
spectator, que publicou artigo do cientista político Cass 
Sunstein que só reforça a minha gratidão. Sunstein publi-
cou livro recente, intitulado Going	 to	extremes:	how	 like	
minds	 unite	 and	 divide (“Ir aos extremos: como mentes 
semelhantes unem e dividem”). A tese é luminosa: pessoas 
que pertencem a grupos que pensam uniformemente da 
mesma forma tendem a radicalizar as suas posições.
Existem testes empíricos citados por Sunstein: na França, 
um grupo de cidadãos franceses foi dividido em grupos me-
nores para trocarem opiniões sobre o presidente francês e o 
papel dos Estados Unidos no mundo. Ponto de partida: todos 
os cidadãos, antes da experiência, tinham visão simpática do 
presidente e visão negativa dos Estados Unidos. Ponto de che-
gada: depois da experiência, os que gostavam do presidente 
francês passaram a gostar ainda mais. Os que não gostavam 
dos Estados Unidos passaram a gostar ainda menos.
O segredo, conta Sunstein, está na própria dinâmica da troca 
de informação: quando os outros reforçam as nossas verda-
des, eles não se limitam a justificar epistemologicamente o 
que pensamos. Eles conferem uma sensação de maior segu-
rança ao que pensamos, radicalizando as nossas atitudes. E 
basta que exista entre o grupo uma autoridade incontestada 
e incontestável para que o pensamento uniforme se trans-
forme em ação uniforme. É a receita para o desastre.
A história do extremismo, para Sunstein, é também a his-
tória de como certos grupos foram se afastando progres-
sivamente do pluralismo real das sociedades humanas. O 
Tratado de Versalhes, a falência de Weimar ou a Grande 
Depressão podem explicar Hitler e a ascensão do partido 
nazista. Não explicam tudo: é preciso entender os nazistas 
como um grupo homogêneo, impermeável à crítica externa. 
Uma realidade fechada onde os diferentes membros se re-
forçam mutuamente numa espécie de endogamia intelec-
tual e ideológica. Nós, os puros, contra os inimigos impuros: 
eis a mentalidade típica do extremista. De ontem e de hoje.
Não se iludam. Um esquerdista faz sempre falta numa reu-
nião de reacionários. Um direitista faz sempre falta numa 
passeata de Porto Alegre. Porque as sociedades livres, no 
essencial, não se distinguem dos casamentos felizes. E não 
há casamento que resista quando trocamos vozes distintas 
por monólogos entediantes.
COUTINHO,	João	Pereira.	A	unanimidade	é	burra.	Folha de S.Paulo,	São	Paulo,	7	jul.	2009.	Caderno	Ilustrada.
a)	 Por	que	João	Pereira	Coutinho,	o	autor	do	artigo	que	você	acabou	de	ler,	concorda	com	a	opinião	do	
dramaturgo	e	escritor	Nelson	Rodrigues	de	que	a	“unanimidade	é	burra”?
b)	O	artigo	de	João	Pereira	Coutinho	permite	uma	associação	entre	a	difusão	da	ideologia	nacionalista	e	o	
crescimento	do	nazismo	na	Alemanha?	Justifique	sua	resposta.
c)	 Em	sua	opinião,	que	contribuição	o	texto	proporciona	para	a	reflexão	acerca	da	ascensão	dos	regimes	
totalitários	na	Europa	às	vésperas	da	Segunda	Guerra	Mundial?
d)	Reúnam-se	em	grupo	e	elaborem	um	texto	argumentativo	sobre	a	seguinte	questão:	hoje,	a	sociedade	
valoriza	e	estimula	as	diferenças	ou	incentiva	os	indivíduos	a	buscar	a	uniformidade	e	a	isolar	aqueles	
que	são	diferentes?
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vargas de 1930 a 1945
CAPítulo
6
	 93
p	 getúlio	 vargas,	 chefe	 do	 movi-
mento	 que	 depôs	 o	 presidente	
Washington	luís,	é	 recepcionado	
no	 Palácio	 do	 catete,	 em	 31	 de	
outubro	de	1930.
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A construção de um mito
Getúlio Vargas é uma fi gura polêmica, fundamental para entender-
mos o século XX no Brasil. Isso não se deve apenas a suas realizações 
políticas, mas principalmente ao processo de construção pública de sua 
pessoa como um líder paternalista, pacifi cador das relações sociais, “Pai 
dos Pobres” e defensor intransigente dos interesses nacionais.
Alguns dos personagens da história brasileira foram consagrados ao 
longo dos anos. No entanto, hoje sabemos que a história é construída por 
homens e mulheres de diferentes condições sociais. Podemos afi rmar que 
a fi gura de Getúlio Vargas é um mito de nossa história. O que confi gura 
um mito? Como, por que e para que ele é criado? Neste capítulo você vai 
obter alguns elementos para pensar a respeito dessas questões.
PARA PENSAR HISTORICAMENTE
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94	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XX
O gOvernO prOvisóriO (1930-1934)
A Revolução de 1930, vitorio-
sa, foi responsável por algumas mu-
danças, ainda que limitadas sobre-
tudo ao campo político. Como você 
estudou, o governo que se seguiu à 
revolução, encabeçado por Getúlio 
Vargas, surgiu de um movimento 
que aglutinou diversas forças so-
ciais (oligarquias dissidentes, clas-
ses médias, setores da burguesia ur-
bana) e instituições (notadamente 
o exército), que reivindicavam par-
ticipação política em um cenário 
até então dominado quase exclusi-
vamente pela oligarquia cafeeira.
Embora os grupos oligárquicos (inclusive os apa-
rentemente derrotados cafeicultores) ainda tivessem 
um papel decisivo a representar no novo governo, não 
iriam mais exercer o poder de forma hegemônica. Nes-
se período, o Estado oligárquico brasileiro vivia uma 
crise. As disputas pelo exercício do poder abriam espa-
ço para a intermediação política, o que favoreceu o for-
talecimento do poder pessoal de Getúlio Vargas: bas-
tante habilidoso, soube transformar-se no árbitro das 
forças em disputa, ou, ainda, no único indivíduo capaz 
de manter coesa a aliança que havia se formado em 
1930. Não evitou, entretanto, descartar este ou aquele 
grupo político quando as circunstâncias exigiam.
A composição do novo governo já refletia a ne-
cessidade de satisfazer às diversas forças políticas: 
gaúchos e mineiros dominavam os ministérios. Políti-
cos do Partido Democrático (oposição em São Paulo) 
e da oligarquia paraibana também ocuparam cargos 
no governo recém-instaurado.
A força do governo, entretanto, estava nas lide-
ranças tenentistas que Getúlio tentou manter a seu 
lado a qualquer custo. Nomeou tenentistas para o car-
go de interventores, isto é, substitutos temporários 
dos governadores estaduais.
A limitação ideológica do tenentismo, que com-
batia a república oligárquica em nome de umas pou-
cas reformas e sem se filiar a nenhuma linha política 
ou partidária, levaria o movimento ao colapso. Como 
alternativa de sobrevivência, os tenentistas tiveram 
como opção abraçar um programa mais amplo, como 
Prestes já havia feito ao se converter ao comunismo.
Outros tenentes, por sua vez, simpatizaramcom 
o fascismo, então em ascensão em vários países. For-
maram as Legiões Revolucionárias, procurando 
atrair também os operários e os desempregados, cada 
vez mais numerosos, já que os efeitos da crise de 1929 
se aprofundavam. Essa ala direita do tenentismo or-
ganizou-se por meio do chamado Clube 3 de Outubro.
A divisão dos tenentes entre as tendências de 
esquerda e direita e o fortalecimento do poder pessoal 
de Getúlio Vargas levaram ao esvaziamento do te-
nentismo. Mais tarde, pouco restaria aos integrantes 
do movimento além de submeter-se ao presidente e 
incorporar-se à estrutura burocrática do novo Estado 
getulista, em gestação no início da década de 1930.
No momento da construção do governo revo-
lucionário e durante seus primeiros anos no poder, o 
presidente fez apelos às classes trabalhadoras urba-
nas, acenando-lhes com a possibilidade de criar leis 
favoráveis a elas e oferecendo-lhes outros benefícios.
Outra medida adotada para consolidar o novo 
governo foi atrair as antigas forças agroexportadoras 
paulistas, deixando claro que pouco poderia ser fei-
to sem os cafeicultores, que ainda formavam o grupo 
econômico mais poderoso do país.
A defesa do setor cafeeiro 
e o estímulo à indústria
Com o objetivo de apoiar os cafeicultores, Vargas 
lançou-se em defesa da cafeicultura, fortemente abala-
da pela Grande Depressão, crise mundial iniciada em 
1929. Para isso, buscou reeditar a velha política de va-
lorização do café, agora sob rígido controle do gover-
no central. Por meio do Conselho Nacional do Café 
(CNC), promoveu a compra e a estocagem do produto.
p	 População	comemora	a	vitória	da	revolução	de	1930,	em	são	Paulo.	no	novo	go-
verno,	esse	mesmo	povo	teria	bem	pouca	participação.
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	 vargas	de	1930	a	1945	 95
Como já foi visto, essa prática estava desgastada, 
pois a produção mundial de café aumentava, e com 
ela a concorrência. Consequentemente, a política de 
valorização do produto, apesar de aumentar ligeira-
mente os preços durante certo tempo, acabou por 
levar à formação de estoques imensos, para os quais 
não havia compradores externos. A partir de julho de 
1931, o governo decidiu queimar os estoques de café.
Essa política beneficiou a economia a curto prazo. 
O comprometimento do governo com a manutenção 
da demanda do produto ajudou a manter em funcio-
namento o restante da economia brasileira. A atividade 
cafeeira sustentou as atividades comercial e bancária, 
as ferrovias e até a pequena indústria nacional, uma vez 
que todos esses setores, de algum modo, dependiam dos 
recursos gerados pela cafeicultura. As marcas da crise de 
1929 tinham deixado no setor cafeeiro e industrial um 
desemprego de cerca de 2 milhões de trabalhadores e 
uma redução de salários em 20%.
dução de têxteis e processamento de alimentos, que 
requeriam investimentos menores e contavam com a 
utilização da capacidade ociosa. Desde o final do sé-
culo anterior, construía-se no país a base de uma in-
dústria leve que operava com capacidade ociosa des-
de pelo menos o final da Primeira Guerra Mundial. Foi 
justamente o emprego desse potencial não utilizado 
que fez a produção industrial brasileira dar um salto 
durante os anos 1930.
Os anos 1930 inauguraram o modelo de indus-
trialização por substituição de importações. Ape-
sar do predomínio da indústria leve, novos setores 
logo se desenvolveram, com a participação decisiva 
do Estado.
A Revolução Constitucionalista 
de 1932
Ao proteger a cafeicultura, o governo varguista 
procurou garantir o apoio dos fazendeiros paulistas, 
ao mesmo tempo que estimulava o processo de indus-
trialização. No entanto, a defesa do setor cafeeiro im-
plicava alguns riscos políticos para o presidente: uma 
vez fortalecida, a oligarquia cafeeira paulista poderia 
tentar retomar o poder perdido em 1930.
Vargas desagradou as elites paulistas ao no-
mear João Alberto, um interventor pernambucano e 
tenentista. Mesmo depois de nomear o interventor 
Pedro de Toledo, civil e paulista, a tensão continuava. 
Eternizando a situação do governo provisório, Vargas 
dava a entender que não se esforçaria por devolver ao 
país a normalidade constitucional.
Com um papel secundário no governo provisó-
rio, o Partido Democrático rompeu com Vargas. Jun-
tamente com o Partido Republicano Paulista, que re-
compunha suas forças, formou a Frente Única Pau-
lista e exigiu, além da nomeação de um interventor 
civil e paulista para o estado, a imediata reconstitu-
cionalização do país.
As promessas de Vargas referentes à redemocra-
tização e convocação de uma Assembleia Constituin-
te eram vagas e pouco consideradas. A Frente Única 
aproveitou-se da situação e passou a exigir a elabo-
ração de uma nova Constituição, atraindo o apoio 
popular. Embora parecesse modernizador e liberali-
zante ao propor a redemocratização, o movimento 
revolucionário de 1932, que se iniciava, era também 
reacionário, uma vez que a oligarquia cafeeira, que o 
liderava, pretendia retornar ao poder.
p	 o	 café	 usado	 como	 combustível	 de	 locomotivas.	 com	 a	
compra	dos	estoques	de	café	não	vendidos,	o	governo	pre-
servava	a	atividade	econômica	do	Brasil.	Foto	de	1931.
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Ao mesmo tempo, as importações caíram, uma 
vez que grande parte do café não era exportado, mas 
vendido ao governo. Dessa forma, reduzia-se a en-
trada de moeda estrangeira no país (moeda que de-
veria ser usada para pagar a conta das importações). 
Levando-se em consideração que a maior parte das 
importações era de produtos industrializados, surgiu 
a oportunidade de que essa produção passasse a ser 
realizada dentro do Brasil.
Entre 1933 e 1939, a indústria brasileira teve um 
crescimento expressivo, principalmente nos setores 
menos sofisticados: a indústria leve, baseada na pro-
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96	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XX
p	 Passeata	no	centro	da	cidade	de	são	Paulo	durante	a	revolução	constitu-
cionalista,	em	1932.
Em maio de 1932, após conflitos 
de rua que terminaram com a morte de 
estudantes paulistas, organizou-se um 
movimento que pregava a luta armada. 
Surgiu um grupo de enfrentamento de-
nominado MMDC, iniciais dos nomes 
das vítimas – Martins, Miragaia, Dráusio 
e Camargo. Em 9 de julho de 1932, os 
líderes paulistas romperam com o go-
verno Vargas: tinha início a revolução.
Iniciou-se a organização de um 
exército constitucionalista, com o alista-
mento voluntário de dezenas de milha-
res de jovens, principalmente da classe 
média. A mobilização foi grande no es-
tado de São Paulo, mas sem adesão sig-
nificativa dos operários.
A fragilidade do exército constitu-
cionalista, porém, logo se fez sentir, com 
carências de todo gênero. A indústria de São Paulo 
tentou suprir o movimento com armas e munições, 
já que a marinha, fiel a Vargas, havia bloqueado os 
portos paulistas, impossibilitando as importações.
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Foram produzidas inúmeras publicações sobre a Revolução 
Constitucionalista; muitas a apresentam numa versão épica, como 
exemplo de heroísmo. Leia as observações do historiador Marcelo 
Santos de Abreu, analisando o assunto.
É certo que a Revolução Constitucionalista não foi um movimen-
to da “plutocracia” apenas, ou da “oligarquia”, mas esteve muito longe 
da unanimidade que atravessava “todas as classes sociais” pretendida 
por seus memorialistas. Da mesma forma, [...] a “união sagrada dos 
paulistas” não era apenas a unidade em torno de um “ideal”, mas uma 
coalizão das facções da classe dominante ou das facções da elite po-
lítica tão débil quanto aquela que levara Getúlio Vargas ao poder em 
1930.De fato, a história representada no memorialismo aproxima-se 
do mito uma vez que insistia em ressaltar a coesão social resultante 
de uma crise. Esta análise preliminar do memorialismo revolucionário 
e da historiografia crítica torna evidente que a produção da história 
em qualquer registro é análoga à dinâmica da memória social, feita 
de lembrança e esquecimento. E que a preocupação de narrar, mobi-
lizando os recursos da memória para configurar um testemunho ou 
da razão para elaborar uma interpretação crítica dos acontecimentos 
socialmente relevantes, é feita de menção e silêncio.
ABREU, Marcelo Santos de. A Revolução Constitucionalista de 1932: memorialismo, historiografia, produção do silêncio. Disponível em: <http://revistadiscenteppghis.files.
wordpress.com/2009/05/marcelo-abreu-a-revolucao-constitucionalista-de-1932_-memorialismo-historiografia-producao-do-silencio.pdf>. Acesso em: 2 fev. 2013.
A Revolução ConstituCionAlistA Além dos memoRiAlistAs
A Constituição de 1934
Encerrado o movimento de 1932, a repressão do 
governo varguista aos líderes paulistas surpreendeu 
por sua relativa brandura. Limitou-se a algumas pri-
sões, deportações e cassação de mandatos (em julho 
de 1934 seria aprovada uma anistia geral). Na verda-
de, Vargas buscava uma composição com os paulistas 
derrotados, pois era impossível ignorar a elite paulista, 
e esta, por sua vez, aceitou a busca de entendimento.
Percebendo a força do apelo constitucionalista, Ge-
túlio decidiu acelerar o processo de redemocratização. 
Instituiu, em 1932, um Código Eleitoral, que introduzia 
o voto secreto, o voto feminino e a justiça eleitoral, além 
dos deputados classistas, isto é, eleitos pelos sindicatos. 
Nessas condições, foram realizadas as eleições para a 
Assembleia Constituinte em maio de 1933, aprovando-
-se uma nova Constituição em julho do ano seguinte.
Após três meses de combates às vezes intensos, 
com um saldo de 600 a 900 mortos, as tropas leais 
ao governo federal acabaram forçando os paulistas 
à rendição.
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