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Conflito aparente de normas

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Conflito aparente de normas 
 
Pertence ao capítulo da tipicidade o exame do problema do conflito aparente de 
normas. Quando a um mesmo fato supostamente podem ser aplicadas normas 
diferentes, da mesma ou de diversas leis penais, surge o que é denominado conflito 
ou concurso aparente de normas. Dois são seus pressupostos: a) a unidade de fato; 
b) a pluralidade de normas que (aparentemente) identificam o mesmo fato 
delituoso. Como é impossível que duas normas incriminadoras venham a incidir 
sobre um só fato natural, o que é vedado pelo princípio non bis in idem, é 
indispensável que se verifique qual delas deve ser aplicada ao caso concreto. 
Embora ainda não se tenham conseguido soluções teóricas para todas as dúvidas 
sobre o conflito aparente de normas, a doutrina tem fixado quatro princípios para 
resolvê-lo: o da especialidade; o da subsidiariedade; o da consunção e o da 
alternatividade. 73 O princípio da especialidade consiste na derrogação da lei geral 
pela especial. A norma é especial quando acrescenta à norma geral um ou vários 
requisitos. O infanticídio (art. 123), por exemplo, é norma especial com relação ao 
homicídio (art. 121), uma vez que, além dos elementos deste, exige que a autora 
seja a mãe da vítima e esteja sob a influência do estado puerperal e que o ofendido 
seja recém�nascido. Quando o crime de lesão corporal culposa é praticado na 
direção de veículo automotor, a norma especial a ser aplicada é a do art. 303 do 
Código de Trânsito Brasileiro, que anula, no caso, o art. 129, § 6º, do Código Penal 
(lei geral). A adequação ao tipo especial afasta a possibilidade de aplicação do tipo 
geral. O princípio da subsidiariedade consiste na anulação da lei subsidiária pela 
principal. Aplica-se a norma subsidiária, que é uma espécie de tipo de reserva, 
apenas quando inexiste no fato algum dos elementos do tipo geral. Haverá apenas 
o crime de ameaça (art. 147) quando não é proferida para forçar alguém a não fazer 
o que a lei permite ou a não fazer o que ela não manda, o que caracteriza o crime 
de constrangimento ilegal (art. 146), ou a não se submeter à conjunção carnal 
violenta, o que tipificaria o estupro (art. 213) etc. São casos de subsidiariedade 
tácita ou implícita porque decorrem apenas da falta de adequação típica do fato ao 
tipo geral. Também ocorre a aplicação da norma subsidiária quando esta prevê 
expressamente sua incidência no caso de não constituir o fato um crime mais grave 
(subsidiariedade expressa). Aplica-se o art. 132 (perigo para a vida ou à saúde de 
outrem) quando o disparo é efetuado sem que o agente tente o homicídio ou cause 
lesão; ocorre o delito de simulação de casamento (art. 239) se o agente não 
pretende, por exemplo, obter vantagem ilícita do fato, o que consubstanciaria o 
delito de estelionato (art. 171) etc. 74 O princípio da consunção (ou absorção) 
consiste na anulação da norma que já está contida em outra; ou seja, na aplicação 
da lei de âmbito maior, mais gravemente apenada, desprezando-se a outra, de 
âmbito menor. Pode ocorrer que o tipo consumido seja meio de um crime maior, 
como no caso do delito de violação de domicílio (art. 150), praticado para proceder-
se ao furto (art. 155). (46) É possível que o crime menor seja componente de outro, 
como nos casos de crime complexo: o de roubo (art. 157) inclui o de furto (art. 155) 
e o de lesões corporais (art. 129) ou ameaça (art. 147). Pode ocorrer a absorção no 
crime progressivo, como nas hipóteses de homicídio (art. 121), que anula a 
aplicação do art. 129 (lesões corporais); de crime de lesões corporais e de tentativa 
de homicídio que consomem o crime de perigo para a vida ou saúde de outrem (art. 
132) etc. Já se decidiu pela absorção do porte ilegal de arma utilizada na prática de 
homicídio (47) e de lesões corporais. (48) O princípio da alternatividade indica que 
o agente só será punido por uma das modalidades inscritas nos chamados crimes 
de ação múltipla, embora possa praticar duas ou mais condutas do mesmo tipo 
penal. Exemplificando: se instigar alguém ao suicídio e, em seguida, auxiliar a 
vítima na prática do ato, o agente somente responderá por instigação ou auxílio, e 
não pelas duas condutas. O mesmo ocorrerá nos casos dos arts. 150, 161 do CP, 
33 da Lei nº 11.343, de 23-8-2006 (Lei de Drogas) etc.

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