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REMUNERAÇÃO E SUAS REFLEXÕES CONTEXTUAIS Nos últimos anos se tem visto o desenvolvimento de um RH muito mais estratégico e menos burocrático. Isso se deve ao fato de que o capital intelectual tem crescido exponencialmente e, para ter vantagem competitiva as empresas precisam investir sem parcimônia no desenvolvimento de seus talentos. “Nenhuma organização consegue manter um bom nível de produtividade sem uma equipe de profissionais bem preparados”. (TACHIZAWA, 2001, p. 219). Se até os anos 90 o RH era um departamento mais ligado a processos de controle do contingente humano, cujas ações se limitavam aos fatores higiênicos e legais, há cerca de duas décadas começaram a haver mudanças significativas, muito mais estratégicas. Segundo Luiz Gonzaga Bertelli escreve no prefácio do livro Administração de Recursos Humanos – do operacional ao estratégico (MARRAS, 2013), “o papel do RH tornou-se estratégico demais para ser deixado em mãos burocráticas, passando a assumir sua principal tarefa: abastecer as empresas de talentos, o verdadeiro capital da economia globalizada”. Uma vez que as constantes transformações pelas quais todas as organizações têm passado têm exigido um investimento cada vez maior no desenvolvimento do potencial humano, não há como separar esse investimento das recompensas que lhe são inerentes, dentre as quais, a política de remuneração. E se a coisa toda é muito mais estratégica, faz sentido que a remuneração e com ela todos os demais subsistemas de gestão de pessoas, também o sejam. As mudanças nas condições de trabalho, nos fatores motivacionais e no próprio enfoque estratégico que tem sido dado ao sistema responsável pelos talentos da organização, demonstra as profundas transformações pelas quais empresas de todos os tamanhos têm passado nas últimas décadas. [...] as mudanças drásticas nas áreas econômica, tecnológica e de mercado [...] têm exigido dos executivos verdadeiros exercícios de criatividade e coragem para enfrentar mudanças de uma magnitude e a uma velocidade jamais imaginada. (MARRAS, 2013) 4 Mas, nem sempre foi assim. Na verdade, o ranço da Era industrial ainda está presente na maioria das organizações e com ele o seu modus operandi no que se refere ao tratamento das pessoas como apenas mais um recurso empresarial. Não à toa ainda domina o conceito de que as pessoas são recursos humanos. O desafio da transformação organizacional enfrentado atualmente por tantas empresas é, em muitos casos, resultado direto de sua incapacidade de reinventar seus setores e regenerar as estratégias específicas da empresa há uma década ou mais. (PRAHALAD, HAMEL, 2005). Os talentos atuais não buscam apenas ganhar mais, uma vez que os ganhos não são medidos apenas em termos monetários, mas também e, especialmente, em termos de valores, benefícios, qualidade de vida, bem-estar, desenvolvimento, crescimento e propósito. Significa dizer que para que as políticas de remuneração sejam coerentes a todas essas mudanças e que tragam resultados efetivos, é necessário também redesenhar a estrutura organizacional. “Denomina-se estrutura organizacional o conjunto de funções, cargos, relações e responsabilidades que constituem o desenho orgânico da empresa”. (MARRAS, 2013, p. 35). Segundo Idalberto Chiavenato, “o desenho organizacional retrata a configuração estrutural da empresa e o seu funcionamento”. (CHIAVENATO, 1995, p. 333). Em micro e pequenas empresas, pelo quadro de funcionários ser enxuto, é possível ter um maior controle sobre os subordinados, o que facilita a gestão, uma vez que, segundo o autor, “a amplitude de controle permite arranjos de componentes de estrutura organizacional que lhe dão um formato ou configuração peculiar” (CHIAVENATO, 1995, p. 365). Em grandes empresas é necessário haver um dimensionamento adequado para que cada gestor consiga desenvolver essa relação mais próxima de seu time a fim de trabalhar a missão, a visão e o propósito do time, levando significado e, obviamente, recompensando adequadamente. Esta amplitude e proximidade com os funcionários permite ao Gestor conhecer melhor sua equipe, nível de maturidade e competência e definir qual o melhor estilo de gestão deve ser aplicado. Para Chiavenato,[...] “o administrador 5 pode escolher a amplitude de controle adequada para proporcionar apoio ou autonomia que pretende conceder aos seus subordinados.”(CHIAVENATO, 1995, p. 367) Destacam-se, ainda, outras definições de autores importantes como Drucker, que diz que a empresa é “um grupo humano, composto por especialistas que trabalham em conjunto em uma atividade comum”. (DRUCKER, 1999, p. 27) Uma estrutura organizacional define como as tarefas são formalmente distribuídas, agrupadas e coordenadas (ROBBINS, 2002). “A estrutura de uma organização pode ser definida simplesmente como a soma total das maneiras pelas quais o trabalho é dividido em tarefas distintas e, depois, como a coordenação é realizada entre essas tarefas”. (MINTZBERG, 2006, p.12) Maximiano (2004) discorre que até meados dos anos 80 do século passado as corporações possuíam muitos níveis hierárquicos, no entanto houve uma mudança substancial nesse sistema, o que deixou as estruturas mais enxutas, de modo que o trabalho da gerência fosse muito mais de gestão e de habilidades; desta forma, mede-se o grau de eficácia e sucesso do cargo, bem como da organização no que tange à sua eficiência e, por conseguinte, adequam-se as políticas de remuneração a esse novo estilo de gestão mais descentralizado e horizontal. Outro aspecto relevante que deve ser considerado para se reestruturar uma organização estrategicamente com modelos de gestão e remuneração alinhados aos novos paradigmas organizacionais, diz respeito à motivação dos indivíduos. Pessoas engajadas e comprometidas produzem muito mais e também têm expectativas maiores. Esse é um dos motivos, inclusive, que fazem com que teorias clássicas de motivação ainda sejam pertinentes e muito úteis para redesenhar estrategicamente os modelos de gestão, desempenho e remuneração. Durante todo o século XX se discutiu sobre a motivação humana, em especial no universo corporativo, quando autores como Maslow, McGregor e Herzberg publicaram suas teorias. Segundo Maslow (1954, apud Marras, 2013), a motivação dos indivíduos objetiva satisfazer certas necessidades que vão desde as primárias (fisiológicas) – as mais simples – até as mais complexas ou psicológicas (autorrealização). 6 Para McGregor (1960, apud Marras, 2013), [...] complementa tais informações dizendo que essas necessidades encontram satisfação no próprio trabalho. Por fim, Herzberg (Herzberg 1959, apud Marras 2013), [...] afirmou que o maior fator motivacional para o homem encontra-se no interior do seu próprio trabalho. Impressionante quando nos aprofundamos na teoria de Herzberg quando trata dos fatos motivadores e higiênicos: • Motivadores (causam satisfação ou motivação), como o modelo de gestão, as oportunidades de crescimento e desenvolvimento, o ambiente e a cultura organizacional, por exemplo. • Higiênicos, (não motivam) como política de remuneração e benefícios, condições físicas e relacionais de trabalho, clima organizacional entre outras. Ora, se a política de remuneração não motiva, sua ausência causa desmotivação. Portanto, ter uma política de remuneração que também seja estratégica tal qual a expectativa do indivíduo atualmente é condição sine qua non para que o desempenho continue em alta. Na verdade, é mais preciso dizer que atualmente uma política de remuneração estratégica, que envolva os aspectos subjetivos já mencionados acima, sai da classificação de higiene e se encaixe na de motivação, para exemplificar com a teoria de Herzberg. Gestão, estrutura organizacional e motivação são elementos importantes para o desenho de uma excelente política de remuneração estratégica. Mas, ainda não garantem o seu pleno sucesso. Paraisso, é preciso levar em conta alguns outros subsistemas de gestão, tais quais o desenvolvimento das pessoas (aprendizagem organizacional) e a avaliação de desempenho, para citar alguns. Segundo Peter Senge em seu livro “A Quinta disciplina – A arte e a prática da organização que aprende”, uma vez que o mundo se torna cada vez mais interligado e os negócios mais dinâmicos e complexos, o trabalho precisa estar ligado à aprendizagem com profundidade. (SENGE, 2000) “Aprendizagem é o processo pelo qual uma organização exercita a sua competência e 7 inteligência coletiva para responder ao seu ambiente interno e externo”. (BOOG, 2001, p. 188) O objetivo da aprendizagem é uma combinação entre conhecimentos, habilidades e atitudes (HAMBLIN, 1978), assim, a eficiência é, portanto, resultado direto da combinação de tais elementos. Para Harvard Business Review (2000) as organizações que aprendem têm o hábito de cultivar a escuta ativa e seus gerentes são mais abertos a críticas. Para Senge (2000) ‘aprender’ não significa adquirir mais informações, mas sim expandir a capacidade de produzir os resultados que realmente se quer na vida, estar disposto a arriscar e experimentar uma nova forma de desenvolvimento. A organização da aprendizagem (learning organization) descrita por SENGE (apud PALMEIRA, 2004, p. 10) é uma “organização onde as pessoas expandem sua capacidade de criar resultados desejáveis, criando conhecimento e permitido que as pessoas aprendam a aprender juntas”. A aprendizagem em nível organizacional requer que os indivíduos vão além da simples execução de uma tarefa; é preciso fazer perguntas, questionamentos sobre ela, de modo a contribuir para o aperfeiçoamento da atividade exercida. [...] “Apreender e contribuir são fatores cada vez mais críticos se as organizações querem alcançar os resultados desejados do processo de gestão do conhecimento”. (BUKOWITZ; WILLIAMS, 2002, p. 147) Neste ponto se encontra o maior desafio das organizações, que é o de integrar a aprendizagem e a percepção das pessoas que nelas trabalham (BUKOWITZ; WILLIANS, 2002). “A percepção se refere ao processo ativo de perceber a realidade e organiza-la em interpretações ou visões sensatas”. (SOTO, 2001, p. 65) Dentro da estrutura organizacional e dos vínculos que ela estabelece, avaliar, construir e sustentar esses aspectos são imprescindíveis para a aprendizagem e o desenvolvimento de competências capazes de promover resultados significativos. Uma organização vencedora direciona grande parte de seus esforços para o fortalecimento desses vínculos entre todos os seus stakeholders, estimulando o entusiasmo, o orgulho e o comprometimento com a aprendizagem, o conhecimento e sua aplicação prática, bem como o senso de 8 realização pessoal e profissional, afinal, pessoas felizes geram melhores resultados. Segundo o Professor Idalberto Chiavenato: A aprendizagem obedece à lei da recentidade: o espaço de tempo entre a aprendizagem e o desempenho é muito importante. Se as práticas e exercícios não são frequentes, a aprendizagem cede lugar ao esquecimento. Para aprender e manter o novo comportamento, a pessoa precisa exercitá-lo com frequência e constância, para haver recentidade entre o aprendido e o efetivo desempenho (CHIAVENATO, 2009). Zelar pelos fatores higiênicos e motivadores é extremamente importante. Por outro lado, se todo o investimento em qualidade do trabalho, treinamento e desenvolvimento não estiver subsidiado por um acompanhamento constante, seu efeito perderá força ao longo do tempo. Equipes somente serão maduras e autônomas o suficiente se forem avaliadas periodicamente. A avaliação é um acompanhamento sistemático do desempenho das pessoas no trabalho.[...] Com sua evolução, a avaliação passou a considerar também o comportamento das pessoas[...] (MARRAS et al., 2012). Para Bukowitz e Williams (2002) avaliar consiste em desenvolver uma medida que demonstre se a organização está aumentando a sua base de conhecimento e lucrando com o seu investimento em capital intelectual. Não se trata de negar o avanço tecnológico e os benefícios da modernidade, mas de questionar quais aspectos são mais apropriados (CALDAS, MOTTA, 1997). O processo de avaliação deve ser utilizado não só para verificar o aprendizado, mas também para reforçar resultados aliados à criatividade e tecnologia da organização (BOOG, 2001, p.219), A ‘visão de avaliação’ valoriza o desenvolvimento de capacidades produtivas e reflexivas cultivadas em projetos em longo prazo. De acordo com essa visão, a avaliação deve ocorrer tão discretamente quanto possível durante o curso das atividades diárias, e a informação obtida deve ser fornecida aos ‘guardiãos dos portões’ de uma maneira útil e econômica. (HOWARD GARDNER, 2000, p. 157). 9 Por fim, é importante destacar que equipes bem avaliadas também são equipes mais motivadas, uma vez que as pessoas têm a oportunidade de saber como está seu desempenho em relação às metas e expectativas da organização quanto aos resultados esperados. Percebeu como não é possível tratar de políticas de remuneração sem discutir e redesenhar todos os demais subsistemas? Manter a remuneração à parte irá fazer com que haja uma dissonância entre as expectativas, as motivações e as recompensas, fazendo com que a organização mais perca do que ganhe no médio e no longo prazos. Nos capítulos seguintes vamos nos aprofundar e refletir um pouco mais sobre essas e outras questões a fim de garantir com que tenhamos, ao final dessa disciplina, subsídios suficientes para tomar as melhores decisões quando o assunto for a remuneração de pessoas.
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