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Apostila - Capacitação em Recursos Terapêuticos no Contexto Hospitalar _ Instituto Fratelli

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APOSTILA DIDÁTICA 
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
Contextualização da Psicologia Hospitalar;
Olhares sobre as singularidades do Hospital e
do Setting Terapêutico;
Principais recursos terapêuticos para o
contexto hospitalar;
Demandas recorrentes;
Como elaborar um recurso terapêutico;
Estudo de caso: uma visão prática.
 29
A psicologia hospitalar e as equipes multidisciplinares 
Hospital psychology and multidisciplinary teams 
 
Luciana Barcellos Fossi1 ; Neuza Maria de Fátima Guareschi2 
 
 
____________________________________________________________________________________ 
 
RESUMO 
 
A psicologia hospitalar tem construído sua história, passo a passo, considerando que há menos de duas 
décadas, a atuação do psicólogo em instituições hospitalares não estava regulamentada como uma ampla e 
necessária práxis psicológica. Nos hospitais gerais, a escuta terapêutica com usuários e familiares é 
imprescindível. Este estudo pretende mostrar alguns aspectos da inserção do psicólogo nas equipes de 
saúde, bem como sua práxis profissional no contexto hospitalar. Para tanto, foram entrevistadas 6 
psicólogas de hospitais gerais de Porto Alegre para se compreender como o trabalho da psicologia está 
inserido junto aos de mais profissionais na equipe multidisciplinar de saúde. As psicólogas destacam 
diversos aspectos de sua atuação profissional que permearam a construção deste estudo. Dentre eles, 
foram salientados no discurso das entrevistadas, principalmente os seguintes aspectos: as relações de 
poder entre os profissionais da equipe multidisciplinar, o conceito de saúde e o discurso de humanização à 
atenção da saúde. As relações entre os profissionais da saúde das diversas disciplinas e o trabalho em 
equipe são fundamentais para um atendimento humanizado aos usuários de hospitais gerais. Por outro 
lado, os conceitos de saúde e de humanização da atenção à saúde se estabelecem de diferentes formas e 
estão quase sempre atrelados à área disciplinar do profissional. As equipes de saúde relatam que em 
alguns casos, somente a ajuda médica não basta para o tratamento ser bem sucedido: o ser humano é 
muito mais que um corpo físico, e assim, o atendimento integral a saúde é indiscutível. 
Palavras chave: Psicologia Hospitalar; Equipes Multidesciplinares 
 
 
 
 30
 
ABSTRACT 
Hospital psychology has been constructing its history step by step, being that two decades ago, the 
actuation of the psychologist in hospital institutions was not regularized as a broad and necessary 
psychological praxis. In general hospitals, the therapeutic listening of users and their relatives is essential. 
This article aims to point out some aspects of the psychologist insertion in health teams, as well as his or 
her professional praxis in the context of the hospital. For that, six general hospital psychologists from 
Porto Alegre were interviewed aiming to understand how the work of psychology is connected to the 
work of other professionals in a multidisciplinary health team. The psychologists bring out many aspects 
of their professional actuation that pervaded the construction of the present study. Among them, we could 
point out the following aspects: the power relations among professionals of multidisciplinary teams, the 
concept of health and the discourse of humanization of attention to health. The relations among health 
professionals of diverse disciplines and team work are fundamental for a humanized service to general 
hospitals users. On the other hand, the concepts of health and humanization towards attention to health 
are established in different ways and are almost always attached to the professional disciplinary area. The 
health teams say that in some cases, only medic help is not enough for the treatment to be successful: the 
human being is much more than a physical body, and therefore, integral service to health is 
unquestionable. 
Palavras Chave: hospital psychology; muldisciplinary teams 
 
 
 31
 
 
 
INTRODUÇÃO 
A psicologia hospitalar tem construído sua história, passo a passo, considerando que há menos de duas 
décadas, a atuação do psicólogo em instituições hospitalares não estava regulamentada como uma ampla e 
necessária práxis psicológica. Os profissionais aventuraram-se por este caminho, mas muitos já o 
trilhavam, delineando os rumos desta área como a conhecemos hoje. Assim, as atividades desempenhadas 
pelos psicólogos organizacionais e clínicos necessitam se moldar às demandas institucionais. Nos 
hospitais gerais, faz-se, então, necessário a escuta terapêutica com usuários, e, consequentemente, a 
escuta de seus familiares. Médicos e enfermeiros observam que diversos usuários acabam voltando ao 
hospital novamente “doentes”, solicitando atendimento e cuidados. As equipes médicas (e também outros 
funcionários do hospital) relatam que, em alguns casos, somente a ajuda médica não basta para o 
tratamento ser bem sucedido: o ser humano é muito mais que um corpo físico, e assim, o atendimento 
integral à saúde é indiscutível. Portanto, a integração da equipe de saúde é imprescindível para que o 
atendimento e o cuidado alcance a amplitude do ser humano, considerando as diversas necessidades do 
paciente e assim, transcendendo a noção de conceito de saúde, de que a ausência de enfermidade significa 
ser saudável. Dessa forma, o trabalho em equipe mostra-se fundamental para o atendimento hospitalar, 
na medida em que médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais e os demais 
profissionais envolvidos nesse atendimento estabeleçam uma integração, para que a pessoa seja tomada 
como um todo, para que ela possa ter um atendimento humanizado, contemplando assim, outras 
necessidades dos usuários. A contribuição da psicologia hospitalar não se limita ao usuário ou à 
instituição, mas a especificidades que auxiliam todo o trabalho da equipe médica. A experiência da 
multidisciplinariedade proporcionou a continuidade da construção da identidade do psicólogo, enquanto 
um profissional do campo da saúde. 
 32
 
Este estudo pretende mostrar alguns aspectos da trajetória do psicólogo em instituições hospitalares não 
psiquiátricas, a inserção deste profissional, bem como sua práxis profissional nas equipes 
multidisciplinares no Rio Grande do Sul, mais especificamente em hospitais gerais de Porto Alegre. Para 
tanto, questões teóricas, históricas e atuais, vinculadas à psicologia hospitalar, serão contempladas e 
discutidas tendo como base alguns estudos teóricos e as falas de psicólogas entrevistadas. 
 
 
 
METODOLOGIA 
Este estudo foi realizado em seis hospitais gerais públicos e particulares, da cidade de Porto Alegre. 
Foram entrevistadas3 seis psicólogas, cada uma de um hospital. Através de uma entrevista semi-
estruturada, procuramos buscar informações sobre o início do trabalho da psicologia nos hospitais, o 
desenvolvimento das primeiras atividades, bem como as atuais, e o contexto atual de trabalho nos 
hospitais gerais. As psicólogas destacaram diversos aspectos de sua atuação profissional que permearam a 
construção deste estudo. Através da emergência de determinados enunciados na fala das psicólogas, 
foram situados algumas questões como: a inserção do trabalho da psicologia no hospital, a psicologia 
hospitalar e as relações da equipe multidisciplinar de saúde. Os enunciados desses discursos foram 
organizados pelos tópicos dessas questões da pesquisa e sobre os quais se fez a discussão dos resultados. 
Os resultados dessa pesquisa estão organizados da seguinte forma: primeiro serão contextualizados, 
brevemente, alguns aspectos relacionados ao início da psicologia hospitalar4, para, em um segundo 
momento, se discutir a participação do trabalho da psicologia nas equipes multidisciplinares, abordando 
principalmente as relações de poder. Nas considerações finais, questionamos a concepção do conceito de3 As bolsistas Luciana Redivo e Mariana Lorenzoni realizaram 5 entrevistas. 
4 Pesquisa apresentada no XIV Salão de Iniciação Científica da UFRGS pelas bolsistas Luciana Redivo e Mariana Lorenzoni, 
com orientação de Neuza Guareschi. 
 33
saúde implicada no modo de trabalho das equipes de saúde e apontamos para aspectos deste conceito que 
consideramos fazer parte da prática da psicologia nos hospitais gerais. 
 
O início das atividades da psicologia hospitalar 
Na década de 1980, a instabilidade econômica do país gerou um mercado de trabalho saturado de 
profissionais liberais e uma baixa nas ofertas de emprego. Essa situação econômica se fez presente no 
início da trajetória profissional de psicólogas que iniciaram sua atividade profissional no hospital: “Eu ia 
me formar e obviamente não tinha emprego e ela perguntou se eu queria trabalhar lá (no hospital) e eu 
adorei.” No entanto, pouco se sabia sobre o psicólogo hospitalar, suas funções não haviam sido 
preestabelecidas, e ainda não existiam muitos estudos teóricos sobre o tema. A motivação para o 
desenvolvimento de um trabalho comprometido com a demanda também decorre do âmbito do 
conhecimento e da formação específica do profissional, o que sugere um despreparo por parte dos 
profissionais recém formados, sendo necessária a ampliação dos conhecimentos adquiridos na graduação. 
As psicólogas inseriram-se nesse contexto considerando as necessidades da instituição relacionadas à 
psicologia. As primeiras atividades estavam relacionadas com o funcionamento da instituição, buscando 
criar novos serviços e qualificá-la, investigando as necessidades e estabelecendo objetivos: "Então nós 
fizemos um levantamento das necessidades e toda uma pesquisa para o levantamento das necessidades, 
estabelecendo prioridades, daí fizemos um projeto de trabalho daquelas necessidades [...] apresentamos 
para a direção. A direção aceitou a nossa proposta e nós estamos desde 1979...”. No entanto, a demanda 
hospitalar não era unicamente clínica, mesmo considerando que esta prática tenha sido o marco da 
afirmação profissional do psicólogo. Portanto, questões relativas ao funcionamento institucional 
mereceram a atenção do profissional da psicologia, proporcionando uma escuta que transcende a clínica, 
ressaltando a necessidade de se dedicar "a instituição como um todo, no seu funcionamento para que ela 
desempenhe da melhor forma possível a tarefa saúde, no cuidado com a saúde", que pode também ser 
 34
contemplada nas seguintes atividades: "Então eu fazia seleção do pessoal, treinamento de funcionários, 
fazia avaliação do trabalho junto com as chefias...". 
 
A implementação de uma área nova dentro da psicologia suscitou a utilização de recursos técnicos e 
metodológicos de diversas áreas do saber psicológico, não se restringindo apenas a clínica, mas também a 
organizacional, social e educacional (Fongaro e Sebastiani,1996). Assim, foram criando um 
conhecimento mais específico sobre a área, possibilitando uma maior união entre o psíquico e o 
biológico, dentro do contexto hospitalar. Nesse sentido, faz-se necessário comentar a importância de estar 
instrumentalizado para realizar um bom trabalho. "Então foi aí que eu comecei, fui buscar supervisão, fui 
trabalhar e aí a coisa começou.". Estas falas ilustram a necessidade de se desenvolver materiais que 
expliquem e contextualizem o trabalho do psicólogo nesta área e a dinâmica da instituição hospitalar ( 
Fongaro e Sebastiani, 1996). 
 
A psicologia hospitalar e a equipe multidisciplinar 
A Psicologia Hospitalar não pertence unicamente a área clinica, pois ela também abrange áreas como a 
organizacional, social e educacional, utilizando-se de recursos técnicos, metodológicos e teóricos de 
diversos saberes psicológicos. A Psicologia Hospitalar busca comprometer-se com questões ligadas à 
qualidade de vida dos usuários bem como dos profissionais da saúde, portanto, não se restringindo ao 
atendimento clínico, mesmo este sendo uma prática universal dos psicólogos hospitalares. O pressuposto 
que permeia as atividades do psicólogo no hospital geral mostra outra visão de indivíduo, não 
fragmentada, mas como um todo, como um ser biopsicossocioespiritual com o direito inalienável à 
dignidade e respeito. (Fongaro e Sebastiani, 1996) 
 
A equipe hospitalar é composta por diversos profissionais, incluindo aqueles que não assistem as pessoas 
hospitalizadas diretamente, tais como equipe de higienização, radiologista, anestesista, dentre outros. No 
 35
entanto, consideraremos aqui a equipe multidisciplinar formada pelos profissionais que assistem 
diretamente os indivíduos: médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionista, assistente social, 
fisioterapeuta. Cabe salientar que a equipe multidisciplinar tem sua formação centrada nas necessidades 
da pessoa, portanto, ela não é pré-organizada. A demanda do enfermo é que fará com que os profissionais 
da saúde se integrem, com o propósito de satisfazer as necessidades globais da pessoa, proporcionando 
seu bem-estar. 
 
No entanto, serão os médicos os protagonistas do manejo hospitalar, pois são eles que decidem sobre 
técnicas, medicações, cura, internações e altas (Angerami-Camon, 1987). Portanto, os demais 
profissionais se adequam, primeiramente, a demanda orgânica do indivíduo e às definições do médico, 
para posteriormente, integrar sua prática ao atendimento hospitalar. Porém, o aparecimento de inúmeras 
especialidades da área da saúde impossibilita que um único profissional englobe todos os conhecimentos 
produzidos em sua área de atuação. As múltiplas situações difíceis e inesperadas que fazem parte da 
realidade dos usuários dos hospitais gerais refletem no trabalho da equipe multidisciplinar, o que mostra 
que uma única especificidade profissional não consegue dar conta dessa gama de fatores intrínsecos a 
doença e a hospitalização (Chiattone, 1996). Em relação aos valores pessoais permeiam as relações 
profissionais, assim, acredita-se que a neutralidade médica exemplificada pelo relacionamento padrão 
estereotipado, estabelecido com os demais profissionais da saúde, bem como com os beneficiários dos 
serviços de saúde, implicam alguns questionamentos, principalmente por parte da equipe, tendo em vista 
que o saber médico é pouco compartilhado. A neutralidade médica pode ser explicada, mas não 
justificada, pela necessidade de esvaziamento dos conteúdos e representações de vida e morte, já que a 
relação entre os médicos e a pessoa em sofrimento é repleta de ansiedades e fantasias (Zaidhaft, 1990). A 
postura médica é conseqüência da formação profissional, que pouco enfoca as relações humanas e que 
tem uma visão de ser humano como objeto de estudo, não considerando as emoções subjacentes ao 
manejo médico (Kubler-Ross, 1999). Os membros da equipe, especialmente os médicos, que tiverem sua 
 36
auto-estima atrelada ao seu desempenho profissional, podem perder a noção realista das condições de 
recuperação de determinados casos, sendo a recuperação completa a única alternativa possível (Leão, 
1998). 
 
A inserção dos serviços de psicologia é privilegiada em instituições onde há espaço para reuniões entre os 
diversos profissionais da equipe multidisciplinar, pois nestas ocasiões, o psicólogo evidenciará a 
importância da valorização do conjunto dos aspectos emocionais do indivíduo. A equipe médica de saúde, 
então, busca humanizar as condições do indivíduo no seu período de hospitalização. O vínculo entre o 
indivíduo e a equipe multidisciplinar tem de ser considerado no manejo psicológico. É indispensável que 
o psicólogo saiba detalhadamente das atividades desenvolvidas pelos demais profissionais, bem como os 
limites de cada um, possibilitando uma atuação integrada, com manejo único. A multidisciplinariedade 
corre o risco de fragmentação entre os setores, e consequentemente, a fragmentação do paciente. O 
relacionamento precário entre a pessoa e aequipe de saúde pode acarretar mais sofrimento do que o 
esperado para determinados quadros. Entretanto, é a trajetória hospitalar do indivíduo que definirá o 
enfoque de seu atendimento psicológico, que poderá ser pré ou pós-operatório, ambulatorial, ou de 
enfermaria. É através desta consideração que o trabalho do psicólogo será delineado e implementado, 
considerando as necessidades individuais da pessoa (Angerami-Camon, 1987). 
 
De acordo com Santos e Sebastiani (1996), a discussão sobre as equipes multidisciplinares é de suma 
importância, pois mesmo a proposta do atendimento integral ao usuário sendo óbvia, na prática, tal 
obviedade não é efetivamente posta em ação. Ainda percebe-se dificuldades de interação entre os 
profissionais, disputas de poder (tanto objetivas quanto subliminares), falta de conhecimento sobre a 
ajuda que outras especialidades podem dar à equipe e ao indivíduo. 
 
Relações de poder e os profissionais de saúde 
 37
É impossível pensar em qualquer relação humana sem pensar nas relações de poder que permeiam, 
induzem, formam saberes e produzem discursos. É o que Foucalt nos ensina em microfísica do poder 
(1979/1984). Cabe ressaltar que poder não é um objeto e sim uma relação, e que também não é sempre 
negativo, ele é mais que uma instância repressiva, ou seja, o poder pode ser também positivado pelos 
sujeitos. Um aspecto importante do poder é sua tendência a ocultar-se, inclusive negativisar-se, 
apresentando-se como uma exigência natural ou razão social, de acordo com Martins (2003). Para que 
haja a manutenção de um discurso dominante em uma instituição, são necessárias práticas que o 
legitimem e operem no sentido de reprimir manifestações contrárias. Desta forma, os profissionais da área 
da saúde tornam-se (re)produtores de uma postura médica que não é imposta, mas sim “indicada” como 
um padrão a ser seguido, sem crítica alguma. É neste momento que fica claro o exemplo das relações de 
poder nas relações estabelecidas nas equipes multidisciplinares. Tal poder se estabelece no cotidiano 
através do exercício da medicina, ou de outra disciplina da área da saúde, ele controla o saber e o fazer 
médico, normatizando os profissionais. (Martins, 2003) Um exemplo disso pode ser o fato de o médico 
versar sobre o seu trabalho com uma linguagem específica e técnica, pouco acessível aos leigos (inclusive 
ao psicólogo), demonstrando uma relação de poder, já que principalmente os usuários ficam inibidos 
frente à autoridade de um saber médico. 
 
Na prática do psicólogo, as relações de poder são estabelecidas através de seu campo de saber ou 
conhecimento. O psicólogo no hospital escuta o usuário, a família do usuário, os outros membros da 
equipe e a opinião médica, portanto, é viável que ocorra através da apropriação de um modelo da 
psicologia, enquanto uma área de saber científico, o exercício das relações de poder, que de acordo com 
Martins (2003) é vivenciado no âmbito mais amplo de trabalho nos hospitais. O poder pode ser produzido 
nas instâncias imediatas e cotidianas, como, por exemplo, na relação com a equipe de saúde. Entretanto, a 
inserção do psicólogo nos hospitais gerais pode, assim, também contradizer a ordem estabelecida de 
normatividade da medicina que vê a cura somente pelo aspecto orgânico, físico ou biológico. 
 38
 
As vezes, os profissionais da saúde, conforme Guedes (2003), posicionam-se frente ao usuário de maneira 
indisponível. A escuta médica, às vezes, por exemplo pode estar unicamente interessada nos dados 
específicos da doença, portanto, a atitude de rejeição do médico perante a pessoa faz com que ela se 
remeta a outras relações insatisfatórias que foram estabelecidas em sua vida. O restabelecimento do 
enfermo pode, desta forma, ser prejudicado pela hostilidade, muitas vezes inconscientes, que perpassam 
as relações médico-paciente. As atitudes da equipe de saúde podem ser terapêuticas ou não, podendo 
produzir configurações maléficas ou benéficas no curso do adoecer (Guedes, 2003). 
 
No dia-a-dia do hospital os psicólogos muitas vezes ocupam o lugar de tradutores entre os médicos e os 
usuários, podendo tomar-se o entendimento de que as questões subjetivas são exclusivas do psicólogo e 
as orgânicas do médico. Entretanto, o ser humano não é só somático ou psíquico, ou seja, a fragmentação 
do atendimento à saúde pode não contemplar a complexidade do ser humano, devido aos diferentes 
campos de saberes e poderes envolvidos no atendimento ao usuário. Contudo, a linguagem técnica da 
equipe de saúde pode não ser o único empecilho no atendimento. Qualquer orientação dos profissionais 
do campo da saúde pode, muitas vezes, ser incompreensível ou inadequada às condições de vida da 
pessoa. Por exemplo, uma pessoa que necessita de diversos medicamentos, em diversos horários e que 
não é alfabetizada necessitará de uma orientação diferente de uma pessoa alfabetizada. A própria cura 
precisa ser contextualizada, pois no momento em que o médico diz que a pessoa pode levar uma vida 
“normal”, ele precisa conhecer o dia-a-dia dela. Um pedreiro, por exemplo, nem sempre poderá carregar 
peso imediatamente após sua alta. 
 
Assim, a equipe de saúde, pode, nem sempre se mostrar aberta, pelo menos, em um primeiro momento, ao 
trabalho do psicólogo: "As equipes aceitam muito bem o trabalho, solicitam bastante, agora a gente já 
tem um espaço aqui dentro, não precisa mais pedir "há tem uma criança?”. Devido a isso, pode-se 
 39
pensar que, em algumas situações, o atendimento psicológico pode ser visto como algo desnecessário 
àqueles usuários que não apresentam comportamentos considerados não prioritários para o atendimento à 
saúde, ou ser considerado secundário por se tratar de uma demanda subjetiva. Porém, a inserção do 
trabalho do psicólogo no contexto hospitalar pode mudar a dinâmica de atividades de toda equipe de 
saúde, uma vez que a dinâmica das relações de poder entre os diferentes saberes do que é saúde passam a 
ser estabelecidas de outras formas, alterando o entendimento sobre atenção à saúde, tanto por parte da 
equipe médica, como por parte dos usuários. Isto, leva a uma maior preocupação por parte da equipe 
multidisciplinar, na clareza e eficácia da comunicação entre os profissionais da saúde e os usuários, 
buscando evitar discórdias e desentendimentos entre esses. 
 
Um exemplo do processo de comunicação entre os profissionais da equipe de saúde é o prontuário: 
"...cada um tem que falar o que observou para tentar fazer um manejo único com o paciente, evitando 
uma dupla mensagem. Eu constatei uma coisa, o médico outra. Isso mesmo em uma linguagem não 
verbal, vai causar muita confusão e dúvida". O discurso por parte das profissionais da saúde de 
psicologia sobre o prontuário é de que este é o processo comunicacional mais importante entre os 
profissionais das diferentes áreas disciplinares da saúde. Em alguns casos, posterior a esta forma de 
relação, através deste mecanismo de comunicação, podem ocorrer discussões sobre o manejo e o 
entendimento da demanda dos usuários sobre o tratamento e questões relacionadas a sua internação. 
Entretanto, é possível pensar que a discussão dos casos dos usuários, que envolvem uma área disciplinar 
do profissional no desenvolvimento do trabalho, nem sempre está livre da necessidade de proteger o saber 
de sua área como superior. Isto mostra-se contrário a preocupação de alguns profissionais das equipes de 
saúde que se propõem em manter uma unidade de informações aos usuários, procurando transmitir uma 
imagem homogênea do entendimento que a equipe multidisciplinar possui sobre o seu estado de saúde. 
 
 40
Do ponto de vista da psicologia, o trabalho das equipes multidisciplinares só se tornarão válidos e 
enriquecedores para os usuários, se cada profissional se responsabilizar por sua área de cuidados em 
relação à saúde: "...o dentista, o psicólogo, médico, nutricionista, [...], tem quehaver esta troca. E a 
gente sempre tentou e eu acho que deu certo, é não ocupar o lugar do outro, respeitar o espaço do outro 
para que ele também respeite o teu. Se isso é trabalho do médico, então não explica, chama o médico que 
ele vai explicar [...] Então eu acho que este é o melhor sistema de trabalhar, é integrar, respeitando o 
outro e também sendo respeitado”. No entanto, responsabilizar-se por sua área de saber, segundo as 
profissionais da psicologia, não significa evitar a troca entre os diversos profissionais integrantes da 
equipe, mas sim manter a clareza nas informações sobre os usuários: "A troca é necessária para que haja 
uma melhora nos atendimentos, para que a saúde do ser humano possa ser contemplada no seu todo, ou 
em pelo menos, algumas partes dela". 
 
Considerações finais: o conceito de saúde e o trabalho da psicologia hospitalar 
Ao analisarmos os temas propostos neste artigo, sentimos emergir, dessas discussões o entendimento do 
conceito de saúde pelos profissionais dessa área. Ao inserir o trabalho da psicologia nas equipes 
multidisciplinares de saúde, propomos que a psicologia passe a pensar a saúde como um conceito 
complexo, que possa se situar em modelos que venham a promover formas de vida e de ser que englobem 
a dimensão do sujeito como cidadão na esfera pública e na esfera privada. Ao voltar a preocupação com o 
usuário para o auto-conhecimento, para o indivíduo, corremos o risco de situar o trabalho da psicologia 
dentro de um enfoque individual, como as atividades dessa área no espaço privado. A psicologia deve 
diminuir essa dicotomização entre o público e o privado, a fim de entender e atender o sofrimento 
psíquico do ser humano como um todo, e não na sua individualidade, integrando tal entendimento ao 
atendimento e às preocupações da equipe multidisciplinar de saúde. (Guareschi, 2003) 
 
 41
Os sentidos que a palavra saúde pode adquirir são muitos, dentre eles, uma face normativa, prescritiva, 
que faz referência à uma espécie de conjunto de atributos para uma pessoa ser considerada saudável. Esse 
sentido de saúde, o trabalho da psicologia deve evitar. Pensamos que a psicologia nas suas práticas em 
hospitais, encarando a saúde como uma perspectiva que o conceito de saúde interpele, passa contemplar 
os direitos básicos do cidadão: o direito à moradia, ao trabalho, à segurança e à saúde, ou seja, o conceito 
de saúde do SUS. Desta forma, precisamos desnaturalizar a perspectiva medicalizada que freqüentemente 
é utilizada pelos profissionais da saúde, como se essa só contemplasse ausência de doenças. 
 
A psicologia tem como desafio para articular a questão da saúde em suas práticas junto às equipes 
multidisciplinares de forma incisiva, perguntar-se, principalmente, que concepção de sujeito e de 
sociedade está como pano de fundo para as práticas psicológicas nos hospitais gerais. O trabalho da 
psicologia nas equipes multidisciplinares deve ser tomado como algo mais complexo, merecendo uma 
discussão também complexa que, no mínimo, consiga ser problematizadora de questões contemporâneas 
que envolvem essas práticas psicológicas sobre doença e saúde. Não há exercício profissional que 
dispense uma perspectiva de sujeito e de realidade. Em toda prática psicológica existe a necessidade dessa 
discussão, e ações que constituam o trabalho da psicologia. Assim, para o profissional da psicologia, não 
estão restritas somente as atividades concernentes à saúde mental; todo o trabalho que seja exercido no 
campo de trato da coletividade com a finalidade da promoção do bem-estar e da saúde e que seja possível 
o trabalho da psicologia serão de interesse, ou seja, o profissional da saúde também deve estar presente na 
formulação, organização e desenvolvimento das políticas públicas e sociais de saúde. 
 
BIBLIOGRAFIA 
ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.) (1988). A psicologia no hospital. São Paulo: Traço 
 
 42
CHIATONNE, Heloísa B. (1996). A criança e a morte. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a 
psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira, 
 
FONGARO, Maria Lúcia. SEBASTIANI, Ricardo W. (1996). Roteiro de avaliação psicológica aplicada 
ao hospital geral. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a psicologia entrou no hospital. São 
Paulo: Pioneira, 
 
GUARESCHI, Neuza. (2003). Interfaces entre psicologia e direitos humanos. In: GUERRA, A. , KIND, 
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do campo social 
 
KLUBLER-ROSS, E. (1999). Sobre o morte e o morrer. Martins Fontes 
 
LEÃO, Nilza. O paciente terminal e a equipe interdisciplinar. In: ROMANO, Belkiss W. (1998). A 
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MARTINS, Sueli. (2003, janeiro/junho.) Processo Grupal e a questão do poder em Martín-Baró. 
Psicologia & sociedade. Vol. 15 nº1 
 
SANTOS, Cláudia T. SEBASTIANI, Ricardo W. (1996). Acompanhamento psicológico à pessoa 
portadora de doença crônica. In: ANGERAMI-CAMON, Valdemar (Org.). E a psicologia entrou no 
hospital. São Paulo: Pioneira 
 
ZAIDHAFT, S. (1990). Morte e formação médica. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 
 
 
 43
 
 
 
 
Endereço para correspondência: 
1 Bolsista do Programa de Educação Tutorial 
2 Professora/Pesquisadora do PPGP – Faculdade de Psicologia da PUCRS. Coordenadora do Grupo de Pesquisa “Estudos 
Culturais, Identidade/Diferenças Teorias Contemporâneas” 
nmguares@pucrs.br 
 
 
 
Psicologia e Saúde em Debate 
ISSN-e 2446-922X 
 
 
Rev. Psicol Saúde e Debate. Dez., 2017:3(2):53-61. 
53 
 
O Setting Terapêutico na realidade do 
Psicólogo Hospitalar 
DOI: 10.22289/2446-922X.V3N2A5 
Résia Silva de Morais1 
Amanda Flávia Gonçalves Lima 
Daniele Tavares de Oliveira 
Ian Cesar Pereira 
Jéssica Cristina Tiago da Silva 
Laiane dos Reis Custódio 
Leticia Gomes de Azevedo Soares 
RESUMO 
Este artigo tem como objetivo apresentar uma revisão integrativa de estudos realizados nos 
anos 2005 a 2016 visando discutir sobre o setting terapêutico do Psicólogo dentro de uma 
instituição hospitalar A revisão bibliográfica foi realizada a partir de artigos, dissertações e 
teses disponibilizados nas bases de dados Scielo, Pepsic e BVS, sendo utilizado o descritor 
“setting terapêutico”, em língua portuguesa. Foram selecionados apenas estudos empíricos 
realizados no território brasileiro. Os resultados foram apresentados a partir das vivencias de 
profissionais da Psicologia que atuam dentro dos hospitais. Numa perspectiva geral, os 
estudos revelaram que mesmo diante de algumas dificuldades, o trabalho do Psicólogo é 
indispensável para auxiliar no cuidado com o paciente, seus familiares e os funcionários que 
trabalham dentro dos hospitais. Os estudos mostram ainda que o papel do Psicólogo vai além 
do seu papel como terapeuta, pois ele faz parte de uma equipe multidisciplinar onde todos 
precisam ajudar uns aos outros para possibilitar melhores resultados aos usuários do serviço. 
Observou-se ainda que apesar de ser de extrema importância, existem poucos trabalhos 
discutindo sobre esse tema. 
 
Palavras-chave: Instituição, Psicólogo, Atuação, Hospitais. 
 
ABSTRACT 
This article aims to present a systematic review of studies conducted in the years 2005 to 2016 
to discuss the therapeutic setting of the Psychologist within a hospital institution. The 
bibliographic review was carried out from articles, dissertations and theses available in Scielo 
databases, DOAJ, Pepsic and VHL, using the term "therapeutic setting" in Portuguese. Only 
empirical studies carried out in Brazil were selected. The results were presented based on the 
 
Endereço eletrônico de contato: resiamorais@gmail.com 
Recebido em 29/09/2017. Aprovado pelo Conselho Editorial e aceito para publicação em 14/11/2017. 
 
Estudo Teórico 
 
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experiences of Psychology professionals working within the hospitals. In a general 
perspective, the studies revealed that even in the face of some difficulties, the work of the 
Psychologist is indispensable to assist in the care of the patient, his relatives and the 
employees who work inside the hospitals. The studies also show that the Psychologist's role 
goes beyond his role as a therapist because he is part of a multidisciplinary team where 
everyone needs to help each other to enable better results for the users of the service. It was 
also observed that although it is of extreme importance, there are few papers discussing this 
topic. 
Keywords: Institution, Psychologist, Acting, Hospitals. 
 
1 INTRODUÇÃO 
Houve um tempo que o paciente era visto como um todo, tanto pela Medicina quanto 
pela Psicologia, misturando-se a natureza, em combinação com as divindades, nessa época 
não se diferenciavam filosofia, doenças e nem forças da natureza. As práticas utilizadas para 
solucionar qualquer irregularidade, eram basicamente focadas em rituais e crenças e somente 
a partir do século XII, após Descartes Newton assumir o analítico como princípio básico da 
ciência, é que se separou corpo e alma e assim foi possível identificar a existência de duas 
forças distintas, provenientes do corpo e do psíquico diante da manifestação da doença 
(Romano,1999). 
Apesar da Psicologia ter chegado para ficar no Brasil em 1956, ela só ganhou espaço 
na rede hospitalar pública após a VIII Conferência Nacional da Saúde (CNS) em 1986, que foi 
um evento onde definiram as bases do projeto de Reforma Sanitária Brasileira. Até esse 
momento a Psicologia se restringia a atuar em instituições ambulatoriais e hospitais de saúde 
mental (Paulin & Luzio, 2010). 
A origem da psicologia clínica e suas representações foi marcada por alguns 
aspectos ao longo da história, entre eles o próprio termo clínica que significa à beira do leito, 
evidencia a presença do modelo médico nessa área de atuação do Psicólogo, trazendo como 
foco de atenção a compreensão e o tratamento da doença, onde buscam o profissional para 
apresentar a sua queixa e esperam uma solução rápida e eficaz do seu mal psíquico, 
comparando um sofrimento causado por desordem do psicológico e do simbólico à doenças 
físicas que são tratadas através de medicamentos como faz o médico. Esse padrão acabou 
levando Psicólogos a uma forma de atuação limitada a ambiente fechado por muitos anos, 
uma relação onde era praticada a escuta daqueles que de certa forma são excluídos e 
incompreendidos (Dutra, 2004). 
Com o passar do tempo o modelo clássico de psicologia clínica já não atendia todas 
as demandas, pois as necessidades mentais se expandiram para o campo da saúde e dos 
 
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hospitais obrigando os profissionais da Psicologia a se movimentarem e buscar meios de atuar 
nesses lugares. 
A Psicologia da Saúde e a Psicologia Hospitalar possuem semelhanças no que tange 
às formas de atuação prática dos especialistas dessas áreas. Uma tarefa que pode ser 
desenvolvida nos campos da psicologia clínica, hospitalar e da saúde é que a Psicologia 
clínica propõe um amplo trabalho de saúde mental nos três campos de atuação, primário, 
secundário e terciário, a Psicologia da saúde também abrange nesses níveis, mas é aplicada 
no âmbito sanitário, priorizando as implicações psicológicas, sociais e físicas da saúde. O que 
difere a Psicologia Hospitalar das outras duas, é o fato dela limitar-se à instituição-hospital e, 
tendo como consequência, o trabalho de prevenção secundária e terciaria (Castro & 
Bornholdt, 2004). 
A necessidade da presença de Psicólogos nos hospitais cresce a cada dia, porém a 
quantidade de profissionais se disponibilizando para esse tipo de função não é muito 
animador, desde a formação acadêmica, é possível notar que a preferência é a clínica 
clássica, pois o modelo que as universidades ensinam durante todo o período letivo, está 
voltado para esse tipo de atuação. Isso seria um dos fatores responsáveis por essa 
especialização tão importante estar em falta no mercado, outro fator seria a dificuldade que o 
profissional dessa área enfrenta para conseguir desempenhar o seu papel institucional, pois 
é muito frequente que mesmo ocupando a vaga de Psicólogo Hospitalar ele se encontre em 
setores administrativos exercendo papéis que não coincidem com a sua real finalidade 
(Almeida & Malagris, 2015). 
O papel do Psicólogo hospitalar consiste em dar apoio aos pacientes e aos seus 
familiares, isso envolve questões emocionais e pessoais, o que acaba exigindo um manejo 
de forma diferenciada por parte do profissional, pois acaba limitando processos importantes 
como o sigilo, fazendo com que em muitos casos seja necessário uma intervenção na 
presença de outras pessoas e episódios como esse gera uma série de angústias tanto no 
indivíduo que recebe o atendimento quanto naqueles que acabam presenciando a cena, 
sendo assim, cabe ao profissional a sensibilidade de encontrar um meio que amenize 
situações como essas (Azevedo, Morais & Marafon, 2017). Esse contato direto com os 
usuários do serviço, nem sempre é desempenhado pelo Psicólogo, muitas vezes tem 
enfermeiros especializados em saúde mental, ou até mesmo a área da psiquiatria entra em 
ação. A interdisciplinaridade, ocorre quando vários profissionais atuam em prol da melhora do 
paciente, e é de extrema importância quando executado com eficiência (Carvalho, & Lustosa, 
2008). 
O presente estudo tem como objetivo apresentar uma revisão bibliográfica de 
 
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estudos publicados em português, realizados nos últimos 10 anos (2007 a 2017) visando 
discutir o setting terapêutico do Psicólogo clínico e institucional, levantando questões que 
implicam a dificuldade enfrentada para adaptação na transição de uma área para a outra. 
 
2 MÉTODO 
O estudo parte através do método da revisão integrativa da literatura e que tem como 
finalidade sintetizar resultados obtidos em pesquisa fornecendo informações mais amplas, 
permitindo assim, um corpo de conhecimento. 
O levantamento do material foi empreendido a partir de artigos, disponibilizados entre 
2007 e 2017 nas bases de dados Scielo, Pepsic e BVS, sendo utilizado os descritores 
“Psicologia Hospitalar, Setting Terapêutico e Psicólogo Clínico” em língua portuguesa. 
 Inicialmente, foram analisados os títulos dos artigos com o intuito de eliminar 
referências repetidas, em cada busca. Em seguida, os resumos anexados foram selecionados 
e uma leitura prévia dos mesmos determinou a seleção do material necessário para as 
revisões. Para a inclusão dos artigos, foram empregados os seguintes critérios: estudos 
empíricos realizados no território brasileiro e publicados na íntegra que retrataram, as 
vivências de um Psicólogo no ambiente institucional, como ele foi inserido nesse meio e as 
dificuldades enfrentadas para a realização dessa mudança. 
Os resultados serão apresentados em forma integrativa do conteúdo conforme as 
análises dos resultados, discussão e conclusão. 
 
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 
 
Foram selecionados 13 artigos, dos quais dois artigos foram usados como base de 
referência sobre a atuação do psicólogo no contexto hospitalar. O primeiro Azevedo & 
Crepaldi (2016), narra que o trabalho do psicólogo no ambiente hospitalar pode ser 
considerado uma ação ou caminho da psicologia da saúde que está concentrada na atenção 
terciaria de saúde, com a possibilidade de várias práticas de atividades e intervenções que 
devem ocorrer de acordo com a abordagem teórica utilizada por cada profissional da 
psicologia. O mesmo autor relata que o trabalho desempenhado visa o acompanhamentodos 
pacientes em momentos de adoecimento auxiliando-os na aceitação, adaptação e 
compreensão do momento que está sendo vivenciado. Deve-se considerar a importância da 
família e toda a equipe profissional que englobam todo o contexto em que o paciente está 
vivenciando. Todas essas pessoas que estão neste contexto englobam muitas significações. 
 
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Além disso, relatam que a atuação acontece baseando-se na promoção de saúde e 
as intervenções podem acontecer dentro das diversas áreas do contexto hospitalar como: 
medicação, enfermaria, pediatria, unidades e centros de terapias intensivas, blocos cirúrgicos 
e outros (Azevedo & Crepaldi, 2016). 
Já para Carvalho (2013), há diversos modelos de atendimentos dentro dos hospitais 
que se diferem em atuação clínica ou integral. A primeira acontece em um local isolado do 
hospital em que os pacientes podem ser atendidos individualmente. A atenção integral 
engloba a família e toda a equipe de profissionais da saúde e o trabalho pode acontecer em 
qualquer local do hospital não possuindo um local fixo de atendimento. Portanto, é de suma 
importância que estas intervenções sejam realizadas de forma ética baseada no saber 
técnico. 
Foi encontrado um estudo focando as vivencias de médicos e psicólogos 
hospitalares. No artigo de Romano (1999), comprovam a necessidade de deixar claro que o 
paciente não pode ser apenas aquele que é objeto do conhecimento científico onde todos 
enxerguem a doença e não a pessoa que está doente, é necessário que o paciente entenda 
o motivo que o levou aquela situação e estar ciente do quadro em que se encontra, para que 
ele se comprometa a participar diretamente do seu processo de cura, pois só assim essa terá 
a chance de acontecer, nos casos que não tem solução é esse comprometimento quem 
ajudará no processo de aceitação do paciente. 
Romano (1999), relata que é normal existir comparação do papel desempenhado 
pelo Psicólogo com o do médico. As funções médicas consistem em diagnosticar um quadro 
orgânico do paciente, estudar a evolução da doença, visando exclusivamente aspectos 
físicos, para então fazer um plano de tratamento que atuará no combate dos sintomas 
apresentados. Já o Psicólogo atua tratando o ser como um todo, questões culturais, 
emocionais, sociais e toda a simbologia que o envolve. Enquanto a medicina trabalha com a 
lógica física, a psicologia atua na singularidade individual. Ambos têm participação importante 
no tratamento da mesma doença, porém, um nos aspectos concretos e outro nos aspectos 
simbólicos/subjetivo. 
Além disso, apesar de serem funções distintas, é de suma importância que esse 
trabalho seja feito em conjunto, por isso foram criadas as equipes multidisciplinares, 
compostas por toda a equipe que trabalha dentro do hospital, visando melhor atendimento 
aos usuários do serviço e até mesmo para melhor execução do trabalho dos que ali atuam. 
Uma equipe multidisciplinar bem organizada, facilita a cansativa jornada de trabalho, além de 
colaborar para a diminuição dos agravantes do stress das equipes atuantes (Romano, 1999). 
 
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Sobre o setting, apenas três artigos foram encontrados. O estudo de Fossi, & 
Guareschi (2004) foi realizado em seis hospitais gerais, públicos e particulares da cidade de 
Porto Alegre, através de uma entrevista com seis psicólogas que atuam no campo hospitalar. 
Baseado nos depoimentos, alguns relatos apresentaram discussões sobre o setting 
terapêutico e a atuação de profissionais da área. 
Após anos atuando em salas fechadas que favoreciam a construção do vínculo entre 
terapeuta e paciente, o Psicólogo se viu obrigado a expandir as suas ações para o campo 
hospitalar, onde não é possível atuar com a mesma tranquilidade que nos consultórios 
convencionais. Foi necessário que se moldassem de acordo com as necessidades da 
instituição, dos profissionais que ali atuam e dos usuários que precisam do serviço, ou seja 
um setting que antes era restrito na relação paciente e terapeuta, agora envolve um número 
indefinido de participantes. O papel do terapeuta não pode ser mudado em relação a escuta 
e intervenções, mas é preciso desenvolver técnicas todos os dias para conseguir lidar com as 
adversidades de cada caso apresentado (Fossi & Guareschi, 2004). 
Segundo Moreira, & Esteves (2012), na clínica tradicional o conceito setting 
terapêutico se constitui de regras pré-determinadas e combinações especificas de cada dupla. 
Sendo marcado e definido por um contrato inicial, onde deve conter os papéis de cada um, 
deixando claro que poderá acontecer alterações de acordo com o caminhar do tratamento. O 
terapeuta atua como uma espécie de guardião desse setting para que possa auxiliar no 
processo durante todo o tratamento. O que nos deixa uma brecha para entender que no 
contexto hospitalar também possa ter a construção desse setting, onde o profissional 
encontrará meios para que isso se torne possível, sem deixar o encanto da terapia se perder. 
Quando se pensa em tratamento psicológico em espaço aberto, a primeira barreira 
que é citada é a questão da preservação do sigilo do paciente, tarefa difícil, mas também não 
é impossível. Apesar das limitações que o setting hospitalar envolve, existem formas onde o 
profissional da Psicologia dá o suporte necessário para o paciente e seus familiares sem 
precisar expor os assuntos mais delicados, é verdade que não existe receita pronta para fazer 
isso funcionar perfeitamente, pois vai depender de fatores que devem ser observados de 
acordo com o ambiente social o qual o hospital pertence. Uma tarefa delicada que exige um 
feeling especial por parte do profissional que ali está atuando, pois de maneira alguma se 
deve colocar a dificuldade na frente de um bom serviço. 
Simonetti (2004) afirma em seu estudo que no setting hospitalar o terapeuta não atua 
considerando apenas as doenças psicológicas classicamente conhecidas como 
“psicossomáticas”, e sim em todas as doenças, pois toda doença traz em si aspectos 
psicológicos, quando não estão diretamente ligados à sua causa estão relacionados com a 
 
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própria forma do indivíduo lidar com ela e seu significante, ou seja o foco do Psicólogo 
hospitalar é o aspecto psicológico em torno do adoecimento. Aspectos esses que são 
encontrados nos doentes, nos familiares deles e no ambiente em que vivem. 
Em Ribeiro & Morais (2017), o aprimoramento das técnicas de enfrentamento da 
hospitalização envolve uma série de estratégias em que o profissional pode estar fazendo uso 
para auxiliar nesse processo dentro do contexto hospitalar de forma que seja possível diminuir 
o sofrimento do paciente, permitindo que ele expresse verbalmente, fazendo com que ele 
traga para o concreto aquilo o que ele está vivendo emocionalmente naquele momento para 
que assim ele consiga ter autonomia e domínio sobre a sua situação. Entre essas técnicas 
envolve o brincar para a criança, que ao ser introduzida com o cuidado na escolha do 
brinquedo, pode trazer benefícios muito importantes para que o tratamento apresente 
melhores resultados. 
 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Portanto o estudo mostra que a psicologia hospitalar vem ganhando seu espaço e 
mostrando sua importância, para a promoção e prevenção de doenças físicas e metais. Ao 
identificar e compreender os problemas emocionais dos pacientes o psicólogo juntamente 
com os outros profissionais da saúde, ajuda o paciente a enfrentar a doença, diminuindo o 
sofrimento dele e de sua família. 
Saúde física e mental anda juntos, um auxiliando o outro, os dois precisam estarem 
bem para que o paciente fique bem,papel desenvolvido pelo psicólogo no intuito de ajudar o 
paciente a lidar e entender o significado do que está acontecendo durante o processo de 
adoecimento e auxiliando a família a compreender todo esse momento. 
O papel do psicólogo hospitalar não e só com o paciente, mas é necessário trabalhar 
as equipes de saúde e os familiares dos pacientes; ambos necessitados de um suporte 
psicológico. Ao promover uma boa relação entre equipe profissional, família e paciente, o 
Psicólogo Hospitalar consegue trabalhar e acolher o problema no todo das relações. 
Do mesmo modo, é um trabalho que apresenta muitos obstáculos, pois não está 
ligado a uma clínica fechada, em um consultório, ela está aberta, e precisa ser flexível e 
continuar preservando o sigilo mesmo em um espaço institucional. 
Essa relação delicada entre paciente e terapeuta que por muitos anos foi a porta 
fechadas, agora deverá ser feita em campo aberto onde não só o paciente precisa ser 
cuidado, mas todos que participam direta ou indiretamente daquele cenário. Era esperado que 
 
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esse assunto fosse mais discutido através de estudos, porém ao desenvolver o trabalho 
apresentado foram encontradas diversas referências sobre a atuação da psicologia no 
contexto hospitalar, mas muito pouco se encontrou sobre o setting terapêutico no contexto 
hospitalar sendo este de suma relevância na atuação profissional, 
Portanto, mesmo com a pouca exposição do tema e enfrentando muitas dificuldades 
para se adaptar, o setting terapêutico se mostra de maneira versátil dentro da organização 
hospitalar, sendo de suma importância manter um ambiente saudável para a intervenção, 
preservando as questões éticas profissionais mesmo em um ambiente hostil. Onde o principal 
foco precisa ser o usuário do serviço e as pessoas que ali atuam, sem deixar que a doença 
passe na frente do indivíduo adoecido. 
 
6 REFERÊNCIAS 
 
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Introdução da arte na psicoterapia: enfoque clínico e hospitalar
Introduction of art in psychotherapy: clinical and hospital
approaches
Erika Antunes VASCONCELLOS1
Joel Sales GIGLIO2
Resumo
Este artigo visa discutir a introdução da expressão artística em contextos terapêuticos, procurando focalizar também o
desenvolvimento da arteterapia com pacientes oncológicos. O tema foi discutido através de revisão bibliográfica, considerando-
se diferentes enfoques teóricos. Primeiramente, nos referimos à compreensão da arte como expressão subjetiva e à utilização de
recursos artísticos no diagnóstico e na intervenção terapêutica. Em seguida, contextualizamos o tema, considerando também o
ponto de vista da psicologia analítica junguiana com relação à linguagem imagética e à sua aplicação na psicoterapia. Por último,
abordamos a arteterapia na assistência aos pacientes com câncer, destacando o enfoque hospitalar. Esse assunto tem sido pouco
abordado na literatura científica em publicações nacionais, apesar da importante expansão nos grandes serviços de saúde. Trata-
se de um campo que ainda requer maior fundamentação teórica, principalmente no contexto institucional e na adequação à
realidade brasileira.
Unitermos: arte-terapia; neoplasias; oncologia; psicologia; psicoterapia.
Abstract
This article brings up the artistic activity as a therapeutic practice for patients from oncology area. The theme is discussed through a bibliographic
revision considering tree different focus. In the first one we refer to the understanding of Art as a subjective and symbolic expression and to the
use of artistic resources during Psychotherapy. Secondly, we consider the Analytical Psychology position in relation to the imagery language.
Last, we consider the application of Art Therapy in the assistance of oncology area patients. This issue has been undervalued in Brazilian
scientific publications in spite of the growing practice of Art Therapy at Medical Centers in our country as a psychodynamic diagnosis or
therapeutic resource. This field needs a better theoretical basis, mainly in the specific cultural and institutional Brazilian context.
Uniterms: art therapy; neoplasmas; oncology; psychology; psychotherapy.
1 Universidade Estadual de Santa Cruz, Departamento de Filosofia e Ciências Humanas. Campus Soane Nazaré de Andrade, Rod. Ilhéus, km 16, Itabuna, 45662-
000, Ilhéus, BA, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: E.A. VASCONCELLOS. E-mail: <erikaantunes@uol.com.br>.
2 Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas, Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria. Campinas, SP, Brasil
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Estudos de Psicologia I Campinas I 24(3) I 375-383 I julho -.setembro 2007
Neste artigo, abordaremos a importância da arte
como expressão da subjetividade, enfocando a prática
clínica e hospitalar especialmente no que se refere ao
cuidado destinado ao paciente com câncer.
Primeiramente, destacaremos sua valorização em
contextos terapêuticos, no campo da saúde mental,
enfatizando também a perspectiva da psicologia
analítica junguiana sobre a experiência imagética como
expressão do inconsciente. Discutiremos, em seguida,
a utilização da via artística no processo psicoterapêutico
de pacientes oncológicos, delineando a prática da
arteterapia no campo da psiconcologia.
Expressão artística e mundo subjetivo
A relação entre elaboração artística e expressão
do mundo subjetivo passou a ser estabelecida como
um importante foco de interesse de estudiosos
representantes do meio científico e de integrantes do
meio artístico a partir do final do século XIX, tendo maior
repercussão a partir do início do século XX. Nesse
período, portanto, algunsestudos considerados
pioneiros demarcam o início das pesquisas na área.
Ferraz (1998), em seu livro “Arte e Loucura”,
descreve o momento histórico que se caracteriza pelo
entrelaçamento entre áreas distintas, vislumbrando a
interseção entre arte, psicologia, psiquiatria e psicanálise.
Ela menciona vários importantes pesquisadores que
inicialmente abordaram a interface: arte e saúde mental,
dentre os quais podemos citar: Tardieu, em 1872; Simon,
em 1876 e 1888; Lombroso, em 1889; Mohr, em 1906;
Rejà, em 1907 e Prinzhorn, em 1922.
Com relação a esses pesquisadores,
destacaremos aqui dois deles: Mohr e Prinzhorn. Mohr
recebeu maior notoriedade científica após a publicação
de um trabalho sobre a produção gráfica de doentes
mentais. Ele influenciou vários outros estudos que
contribuíram com a elaboração de alguns testes
projetivos amplamente difundidos no campo da
psicologia e da psicanálise. Prinzhorn, por sua vez,
publicou em 1922 o livro cujo título em português é “A
expressão da loucura”. Essa publicação teve na época
importante repercussão, valorizando as elaborações
artísticas dos doentes mentais como produções de arte
verdadeiramente reconhecidas, ressaltando a
preservação das possibilidades criadoras desses
indivíduos em detrimento da desintegração psíqui-
ca, característica dos transtornos mentais (Ferraz,
1998).
É interessante observarmos que, nesse momento
histórico, o movimento psicanalítico também começou
a eclodir, havendo confluência de interesses, já que a
psicanálise, especialmente Freud, também buscava
nessa época a compreensão da dinâmica psíquica a
partir de estudos sobre as obras de alguns artistas
consagrados, tanto nas artes plásticas (Freud, 1910/1970
e 1914/1974) como na literatura.
Na década de 20, entretanto, a arte começou a
ser vista sob um enfoque mais amplo, contemplando
não somente a possibilidade de diagnóstico, mas
também sendo destacado seu aspecto terapêutico. Jung
passou a introduzir a arte como parte do processo
psicoterapêutico de seus pacientes, como veremos no
próximo tópico.
Posteriormente, então, a esses primeiros estudos,
a partir dos anos 40, a arteterapia foi realmente
sistematizada, tendo como precursora Margareth
Naumburg, nos Estados Unidos, que foi bastante
influenciada pela abordagem freudiana; a autora
trabalhou com a produção da arte espontânea durante
a psicoterapia, considerando que as imagens
espontaneamente projetadas nas produções gráficas e
plásticas permitem a expressão do inconsciente.
O processo de arteterapia se baseia no
reconhecimento de que os pensamentos e os
sentimentos mais fundamentais do homem, derivados
do inconsciente, encontram sua expressão em imagens
e não em palavras. As técnicas da arteterapia se baseiam
no conhecimento de que cada indivíduo, treinado ou
não em arte, tem uma capacidade latente de projetar
seus conflitos internos em forma visual. Quando os
pacientes visualizam tais experiências internas, ocorre
freqüentemente que eles se tornam mais articulados
verbalmente (Naumburg, 1991, p.388).
Outros autores desenvolveram importantes
trabalhos que contribuíram com a sistematização da
arte no processo terapêutico. Podemos citar aqui Edith
Kramer, desenvolvendo trabalhos na década de 50,
Françoise Dolto, trabalhando com crianças na década
de 70, Janie Rhyne, introduzindo a concepção da Gestalt-
Terapia no trabalho com arte nos anos 70 e Natalie
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Rogers, aplicando a concepção da Teoria Centrada na
Pessoa, desenvolvida por seu pai Carl Rogers, também
na década de 70 (Andrade, 2000).
A arteterapia, entretanto, vem sendo considerada
uma modalidade terapêutica com características
próprias, abarcando em si algumas distinções técnicas
e conceituais, diferenciando-se através de duas linhas
de atuação: arte como terapia (art as therapy) e arte
psicoterapia (art psychotherapy). Na primeira delas, o
foco principal da terapia está no processo artístico,
considerando suas propriedades curativas. Na segunda
vertente, os recursos artísticos são utilizados
amplamente durante o processo psicoterapêutico,
acrescentando a via imagética e pictórica na
comunicação entre paciente e psicoterapeuta (nesse
caso, com a utilização de técnicas de artes plásticas).
Nessa segunda linha de atuação, o fazer arte ocorre
dentro de um enquadre psicoterapêutico específico,
seguindo princípios, técnica, embasamento teórico e
objetivos que visam fundamentalmente o de-
senvolvimento emocional do indivíduo, repercutindo
na ampliação de potencialidades criativas (Andrade,
2000).
Sobre essa diversidade, Pain e Jarreau (1996)
esclarecem a necessidade de adequação da terapêutica
adotada (referindo-se à linha de atuação em arteterapia)
à população de pacientes (em função das indicações
terapêuticas) e ao próprio ambiente disponível. Esses
pontos são discutidos, enfatizando-se a possibilidade
dessa intervenção ser realizada no contexto institucional,
como no caso da prática hospitalar, na qual as condições
de atendimento e a dinâmica assistencial poderão
dificultar a preservação do enquadre psicoterapêutico,
sendo indicada uma atitude terapêutica mais flexível,
por exemplo, com relação aos horários e duração das
sessões, à possibilidade de entrada e saída de integrantes
nos grupos terapêuticos e ao local de realização dos
atendimentos. Além disso, devemos também pontuar
que a arteterapia não é uma prática exclusiva do
psicólogo, visto que profissionais com outras formações
acadêmicas têm se especializado nessa área,
desenvolvendo intervenções mais adequadas às suas
formações de origem e, nesses casos, não seguindo as
peculiaridades da técnica pertinentes à psicoterapia.
De maneira geral, essa revisão da bibliografia
sobre o tema aqui discutido nos mostra que o alcance
da arteterapia é bastante amplo, pois como intervenção
visa desenvolver recursos físicos, cognitivos e
emocionais, propiciar o desenvolvimento de
habilidades e de potencialidades, favorecendo a
utilização de recursos internos na resolução de conflitos,
e estimular a livre expressão, oferecendo espaço
continente para a externalização de aspectos conscientes
ou não do mundo subjetivo.
No entanto, como veremos adiante,
considerando nosso intuito de abordar neste artigo a
introdução da arte na psicoterapia, enfatizamos a visão
psicodinâmica do processo arteterapêutico. Nessa
perspectiva, visamos compreender os aspectos
simbólicos que se manifestam na elaboração de uma
produção artística (contidos também na produção final),
analisados como conteúdos projetados durante as
sessões de arteterapia, podendo ser integrados à
consciência, desencadeando um processo de
transformação intrapsíquica.
No Brasil, o enfoque psicodinâmico
fundamentou os trabalhos pioneiros na introdução da
arte como proposta terapêutica realizada junto a
pacientes psiquiátricos institucionalizados. Esses
trabalhos foram desenvolvidos por Osório César em São
Paulo e por Nise da Silveira no Rio de Janeiro,
repercutindo profundamente na proposta atual do
arteterapeuta.
Osório César, baseando-se no referencial
freudiano, é considerado o precursor da perspectiva
terapêutica da arte no Brasil. Sua prática foi realizada
com pacientes internos do Hospital Psiquiátrico do
Juqueri e seu primeiro artigo sobre esse tema, datado
de 1925, intitula-se: “A Arte Primitiva nos Alienados”
(Ferraz, 1998).
Já Silveira, orientada sob a perspectiva junguiana,
também desenvolveu e coordenou ateliês de arte com
pacientes psiquiátricos internados, sendo autora de
duas obras de suma importância: “Imagens do
Inconsciente” (1981) e “O Mundo das Imagens” (1992).
Ela rompeu barreiras, trazendo inovações com suas
propostas terapêuticas e recebendo notoriedade
nacional e internacional, principalmente após manter
contato com Jung, que valorizou a importante dimensão
de seu trabalho. Esse contato ocorreu quando Nise da
Silveira passou a observar um grande número de
mandalas entre as produçõespictóricas de seus
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pacientes, enviando correspondência a Jung, em 1954,
com o objetivo de obter mais informações sobre tais
produções circulares. A partir de então, houve um
estreitamento na relação entre os dois, abrindo portas
inclusive para a exposição de obras produzidas pelos
pacientes do Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro,
intitulada: “A Esquizofrenia em Imagens”, que ocorreu
em Zurique em paralelo ao II Congresso Internacional
de Psiquiatria (Silveira, 1981).
A partir desses trabalhos pioneiros, que tiveram
repercussão nacional e internacional, outros focos têm
surgido e, pouco a pouco, tem-se ampliado a utilização
terapêutica da arte para outros seguimentos da saúde,
voltando-se a populações com diferentes comprome-
timentos e doenças.
Arte na psicoterapia sob a perspectiva da
psicologia analítica junguiana
Como temos visto, os estudos de Jung
influenciaram amplamente o campo da arteterapia,
trazendo à tona discussões mais profundas em torno
da importância do mundo imagético na compreensão
do psiquismo e, conseqüentemente, valorizando a
análise das imagens simbólicas projetadas nas
produções artísticas dos pacientes dentro do enquadre
psicoterapêutico. Suas descobertas e reflexões abalaram
os paradigmas do pensamento ocidental pela inclusão
de novos enfoques a respeito dos processos psíquicos
e da dimensão transcendente do ser humano.
Segundo Jung, o princípio originário que rege a
natureza humana é o mundo das imagens e, portanto,
toda experiência humana tem seu desdobramento a
partir dessa premissa. Ele atribui à imagem arquetípica
- que também foi nomeada como imagem primordial -
papel fundamental na constituição de todos os
processos mentais, considerando que aí se configuram
as vivências primordiais da humanidade (Kugler, 2002).
Jung (1921/1991, p.418) estabelece diferenciação
entre imagens de caráter pessoal e de caráter impessoal.
A primeira nos remete a conteúdos do inconsciente
pessoal e da experiência consciente. A última,
entretanto, diz respeito à imagem primordial quando
representa manifestação de ordem coletiva,
apresentando características mitológicas. Nessa
perspectiva, ele define o fenômeno imagético como
“uma expressão concentrada da situação psíquica como
um todo”, distinguindo-o de qualquer manifestação
patológica (onde costuma ocorrer distorção da
realidade), sendo um processo interno. A expressão
imagética, portanto, agrega apenas conteúdos do
inconsciente constelados naquele momento, visto que
a seleção dos conteúdos relevantes e irrelevantes à
formação da imagem é um processo consciente.
Quanto aos arquétipos, esses apresentam certa
autonomia e carga energética que atrai conteúdos do
consciente que lhes revestem com roupagens
adequadas à época e à circunstância pela qual são
evocados. São, portanto, “elementos estruturais
numinosos” que dão a fôrma para que conteúdos do
consciente se moldem e, assim, possam tornar-se
perceptíveis. Dessa maneira, considerando o limiar entre
inconsciente coletivo, inconsciente pessoal e
consciente, vislumbramos a formação da imagem
simbólica. Aliás “nunca se pode encontrar o arquétipo
em si de maneira direta, mas apenas indiretamente,
quando se manifesta no símbolo ou no sintoma ou no
complexo” (Jacobi, 1995, p.73).
Portanto é importante destacar que arquétipo e
símbolo não são conceitos equivalentes. O arquétipo é
o centro energético que poderá ser constelado ao
emergir na forma de símbolo. Esse último, entretanto,
requer um esboço arquetípico, exercendo função
transformadora da energia psíquica. O símbolo também
agrega função terapêutica que não se restringe à
imagem em si, contemplando o significado que
transcende a própria imagem (Tommasi, 2003).
Estando ligado à vida e ao ser vivo, o arquétipo
condensa imagem e emoção, sendo conseqüentemente
revestido por sentimento e dinamismo. Nesse sentido,
sua compreensão apenas é possível levando-se em
consideração a maneira indicada pelo sujeito que o
constela, não podendo ser isolado e nem entendido
arbitrariamente (Jung, 1935/1998).
Ao interpretarmos um símbolo, procuramos
decifrar a realidade invisível que se oculta através do
que nos é perceptível. No entanto, mesmo sendo
interpretado, os significados nele implícitos nunca se
esgotam, pois quando seu significado é completamente
decifrado, ocorre a morte do símbolo (Kast, 1997a).
Na história da humanidade, a presença de
símbolos sempre foi marcante. Tudo é passível de se
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tornar símbolo, desde os elementos da natureza ou os
próprios produtos da ação humana, até os elementos
abstratos. Jaffé (1964), ao abordar o simbolismo nas artes
plásticas, retrata o longo trajeto histórico dessa forma
de expressão, identificando aspectos simbólicos desde
a pré-história, a partir dos registros de pinturas rupestres,
até os tempos atuais.
Nas artes, em geral, observam-se inúmeras
projeções do simbolismo humano, nos remetendo às
imagens pessoais e impessoais (arquetípicas) descritas
tão amplamente por Jung, o que justifica a grande
influência do pensamento junguiano no desenvolvi-
mento das práticas arteterapêuticas.
Tanto na produção de um artista quanto na
produção de um paciente dentro de um contexto
psicoterapêutico, a imagem que emerge durante o
processo expressivo reúne aspectos da psique do sujeito
que são constelados naquele específico momento
(Giglio, 1992; Zimmermann, 1992).
O próprio Jung experienciou a arte tanto na vida
pessoal (Jung, 1963/1984) quanto na intervenção com
seus pacientes em psicoterapia. Segundo ele:
Os elementos pictóricos que não correspondem a
nenhum lado externo devem provir do ‘íntimo’...
Como esse ‘íntimo’ é invisível e inimaginável mas
pode influenciar a consciência de um modo muito
eficaz, levo os meus pacientes, sobretudo os que
sofrem de tais efeitos, a reproduzi-los da melhor
maneira possível, através da forma pictórica. A
finalidade desse ‘método de expressão’ é tornar os
conteúdos inconscientes acessíveis e, assim,
aproximá-los da compreensão. Com essa terapêutica
consegue-se impedir a perigosa cisão entre a
consciência e os processos inconscientes. Todos os
processos e efeitos de profundidade psíquica,
representados pictoricamente, são, em oposição à
representação objetiva ou ‘consciente’, simbólicos,
quer dizer, indicam da melhor maneira possível, e
de forma aproximada, um sentido que, por
enquanto, ainda é desconhecido (Jung, 1935/1985,
p.120)
Como podemos compreender a partir dos
estudos de Silveira (1992), as imagens internas são
subjetivas por retratarem a realidade psíquica em sua
amplitude (consciente e inconsciente pessoal), mas
podem ser universais, pois muitas vezes apresentam
motivos arquetípicos compartilhados com toda a
humanidade (inconsciente coletivo).
Essa autora valorizou a análise da série de
produções artísticas de pacientes psiquiátricos (como
Jung propunha com a análise da seqüência de sonhos),
observando a repetição de motivos e a presença do
fluxo de imagens do inconsciente carregadas de energia
psíquica, inclusive na representação de temas
mitológicos.
Outra autora que estudou os aspectos
terapêuticos do ato de pintar e desenhar foi
Zimmermann (1992). Ela destacou que neste processo
terapêutico ocorre a canalização da energia contida por
meio da catarse, podendo desencadear a redistribuição
da energia psíquica durante a elaboração artística,
mencionando a oportunidade de oferecimento de
espaço continente às projeções de conteúdos
inconscientes durante o processo expressivo, discutindo
também a questão da análise e interpretação das
produções dos pacientes. Sobre esse último tema,
considera que uma imagem pictoricamente produzida
não é possível de ser compreendida e, portanto,
interpretada de maneira adequada, se não tivermos
informações prévias sobre a históriade vida do sujeito
que a elaborou (Zimmermann, 1992).
Arteterapia no cuidado ao paciente com
câncer
Como temos observado até aqui, a expressão
imagética através da linguagem gráfica e pictórica (pela
via das artes plásticas) vem sendo reconhecida pelos
profissionais de saúde mental pelas suas
potencialidades terapêuticas. A utilização desses
recursos também tem atraído cuidadores de pacientes
portadores de doenças somáticas. Como conseqüência,
a utilização da arte no processo psicoterapêutico
também tem sido aplicada não só em hospitais e clínicas
psiquiátricas com indivíduos que sofrem de transtornos
mentais, mas também nos hospitais gerais e nas clínicas
de outras especialidades, sobretudo com indivíduos que
apresentam doenças crônico-degenerativas.
No campo da psiconcologia, considerando as
várias modalidades terapêuticas, devemos destacar a
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arteterapia, pressupondo-se a importância da
transformação psíquica gerada pela experiência criativa
que pode ser propiciada ao indivíduo que adoece com
câncer, ajudando-o a elaborar conflitos e a enfrentar
experiências de dor, perda e luto decorrentes da doença
e do próprio tratamento. Identificamos aqui um dos
pontos de conexão que focalizamos neste artigo,
considerando a interseção entre arte, psicologia e
oncologia. Esse enfoque pode estar vinculado à subárea
denominada “arteterapia médica” (Medical Art Therapy),
conceito que não é utilizado no Brasil, mas que se refere
à abordagem arteterapêutica de pacientes com doenças
somáticas.
O artista inglês Adrian Hill é considerado um
dos pioneiros nessa área. Ele desenvolveu, já na década
de 40, o trabalho de arte com tuberculosos internados
em um sanatório, aplicando o termo arteterapia para
designar a intervenção baseada na elaboração de
trabalhos artísticos com pacientes em isolamento,
visando promover ação terapêutica ao oferecer recursos
expressivos que contribuíssem com a redução dos
sintomas depressivos nessa população (Luzzatto &
Gabriel, 1998; Malchiodi, 1999; Wood, 1998). Na Inglaterra,
esse trabalho pioneiro teve importantes repercussões
e, pouco a pouco, essa área de interesse foi sendo
compartilhada por outros profissionais, tendo se
constituído em 1993 em uma subárea dentro da
Associação Britânica de Arteterapeutas (British
Association of Art Therapists - BAAT), denominada The
Creative Response, voltada ao desenvolvimento da
arteterapia nos cuidados paliativos, atuando, portanto,
na assistência integral ao paciente fora de possibilidades
terapêuticas de cura e ao paciente em fase terminal
(Wood, 1998).
Atualmente, podemos observar que os grandes
centros de oncologia vêm gradualmente incluindo em
seus programas de assistência a concepção de
interdisciplinaridade. As tendências atuais na área da
saúde têm caminhado para a ruptura de antigos
paradigmas que encaravam a doença como algo que
pudesse ser tratado independentemente da atenção ao
sujeito que adoece (Vasconcellos, 2000).
Estudos científicos voltados ao processo saúde-
doença têm focalizado a qualidade de vida e a saúde
mental do paciente oncológico, mostrando que o
objetivo terapêutico oferecido a esse doente não deve
ter como meta, exclusivamente, a cura, a redução do
tumor, o aumento da sobrevida ou o alívio da dor física;
mas deve incluir a melhoria da qualidade de vida e a
possibilidade de resgate da dignidade e da motivação
para o viver (Carvalho, 1994; Holland, 1998).
Temos observado, a partir de alguns estudos
baseados em nossa prática clínica, que o processo
artístico propiciado ao paciente com câncer pode
favorecer a ressignificação da própria vida, na medida
em que facilita o encontro de algumas diretrizes para se
lidar com a difícil realidade vivenciada durante a
trajetória de doença e tratamento, num movimento de
reconstrução da história pessoal e de contato com os
próprios sentimentos e fantasias (Vasconcellos, Perina
& Vanni, 1996; Vasconcellos & Perina, 2002; Vasconcellos
& Giglio, 2003; Vasconcellos, 2004).
A experiência de adoecimento e de realização
do tratamento oncológico (quimioterapia, radioterapia,
cirurgia) gera limitações e conflitos no paciente e em
seus familiares, mobilizando inseguranças, temores e
angústias. A expressão de tais vivências que representam
aspectos do mundo interno é um dos principais focos
da arteterapia com essa população uma vez que, além
dos conteúdos intencionalmente externalizados nas
produções (aspectos conscientes), lidamos também
com conteúdos simbólicos (aspectos inconscientes) de
extrema relevância para todo o processo de
transformação e ressignificação, sendo esses fatores
imprescindíveis à proposta arteterapêutica em sua
perspectiva psicodinâmica.
Na área de cuidados paliativos, existem algumas
peculiaridades do trabalho arteterapêutico em função
das características da população atendida, sendo
alcançados alguns resultados bastante expressivos. Com
relação a esse tema, Wood (1998) destaca que essa
intervenção pode objetivamente auxiliar o paciente a
compreender sua real situação, enfrentar mudanças
relacionadas à imagem corporal, amenizar a dor
emocional pertinente ao processo do adoecer e do
morrer; aumentar sua autonomia e confiança,
fortalecendo algumas habilidades para enfrentar a
situação de doença, facilitar a expressão de sentimentos
e fortalecer a relação com a equipe de saúde.
Luzzatto e Gabriel (1998) descrevem duas
abordagens no campo da arteterapia: uma delas voltada
às propriedades curativas do processo intrapsíquico
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criativo e outra voltada à utilização terapêutica das
relações interpessoais no processo artístico. Essas
autoras têm desenvolvido trabalhos no campo da
arteterapia aplicada à oncologia e, sendo assim,
consideram que tal intervenção permite ao profissional
maior flexibilidade por poder utilizar recursos artísticos
em abordagens psicoterapêuticas com ênfase no apoio
psicológico, no trabalho cognitivo ou nos processos
psicodinâmicos, levando em consideração que a
população de pacientes oncológicos não é homogênea,
apresentando demandas bastante distintas que poderão
ser supridas mais amplamente.
Como podemos ver, considerando o enfoque
psicodinâmico, os processos inconscientes também
podem ser compreendidos e elaborados durante a
arteterapia com pacientes portadores de doenças
somáticas, especialmente no campo da oncologia. Nessa
perspectiva, Dreifuss-Kattan (1990) refere-se à postura
do arteterapeuta diante do paciente oncológico,
valorizando a atitude de acolhimento. Ele deverá ser
capaz de acolher as imagens projetadas durante o
processo criativo, mostrando continência aos conteúdos
do mundo interno desse sujeito: suas ansiedades,
angústias, temores e desejos, tornando possível que a
figura do arteterapeuta seja introjetada por ele como
objeto bom. Essa autora ressalta ainda que a
possibilidade de expressão da realidade interna e a
conscientização de alguns aspectos intrapsíquicos
poderão auxiliar o sujeito com câncer em seu processo
de auto-reparação, destacando também que as
produções artísticas desses pacientes têm significado
especial, representando a fantasia de imortalidade e a
permanência de um vínculo positivo que sobrevive
mesmo após a morte ou o término do tratamento.
Luzzatto (1998) estabelece importante
diferenciação entre atuação arteterapêutica no campo
da psiquiatria e atuação destinada aos pacientes com
câncer. Na primeira área citada, a intervenção tem como
foco o mundo interno do paciente que sofre de um
transtorno psíquico. Na segunda área, considera-se a
existência do comprometimento físico e da dor também
de origem orgânica, que se expressam através do
sofrimento psíquico e vice-versa. Assim, a proposta
terapêutica deverá reconhecer a dimensão corporal,
atendendo necessidades de alívio, de relaxamento e de
experiências

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