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PSICOLOGIA 
APLICADA 
AO CUIDADO
Fernanda Egger Barbosa
O paciente e a família: 
o afeto e o cuidado 
em saúde
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
 � Definir aspectos psicológicos e afeto.
 � Relacionar afeto, cuidados em saúde e prognóstico do paciente em 
acompanhamento.
 � Analisar a relação da família com a doença, com o familiar doente e 
com o entorno.
Introdução
O afeto é mais do que uma característica psíquica, como o pensamento, 
a linguagem, a inteligência, é como um motor, uma mola que nos lança 
em direção a algo que desejamos ou que nos faz refrear, se há algo que 
tememos. Ele é responsável pelas emoções, pelos vínculos que formamos. 
Segundo Tousseul (2012), ao contrário do que costuma afirmar a ciência 
nos moldes do pensamento cartesiano, de que os afetos atrapalham a 
razão, a dinâmica afetiva anima a lógica reflexiva. Sua hipótese epistemoló-
gica da reflexividade dos afetos está baseada na metapsicologia freudiana 
e na filosofia de Leibniz, principalmente no princípio da razão suficiente.
Neste capítulo, você estudará alguns aspectos psicológicos que de-
terminam e são influenciados pela dinâmica afetiva. Além disso, verá 
as relações do paciente, da família e dos profissionais de saúde com a 
recuperação do doente.
1 As dinâmicas do afeto e do psiquismo humano
O psiquismo humano é muito complexo, pois o ser humano é formado por 
um corpo biológico, anatômico, fisiológico, no qual podem ser identificados 
processos físico-químicos atuando o tempo todo na manutenção da vida. 
Contudo, também é um ser formado pela linguagem, uma linguagem inigualá-
vel em comparação com as demais espécies vivas, apresentando uma variedade 
infinita de significantes, uma vez que a língua está sempre em transformação. 
A linguagem é responsável pelas representações e, junto à capacidade do 
cérebro humano, pela memória, mantendo nossa história pessoal e cultural.
Os aspectos psicológicos presentes na vida anímica das pessoas são basi-
camente pontos de ligação entre o corpo e a mente. Ou seja, aspectos como 
percepção, emoção, inteligência, pensamento, linguagem e atenção estão 
presentes desde a constituição do sujeito, durante todo o seu desenvolvimento. 
São componentes que caracterizam o ser humano e possibilitam o seu agir no 
mundo. Esses aspectos psicológicos são influenciados e regulados pelo que 
alguns estudiosos do campo, como Tousseul (2012), chamam de dinâmica 
dos afetos.
Ventura (2006, documento on-line) descreve de modo sucinto os aspectos psicológicos 
mais básicos:
Uma importante parte da Psicologia é voltada para a compreensão dos 
fenômenos e processos que permitem ao indivíduo se relacionar com 
o ambiente, sobreviver e se reproduzir. Funções tais como sensação, 
percepção, memória, atenção, aprendizagem, são necessárias para co-
nhecer, se orientar e atuar sobre o ambiente. Moduladas por emoção, 
pelos diferentes estados de consciência, e pelas necessidades regulatórias 
do corpo, essas funções conduzem o comportamento e o pensamento. 
Controladas pelo sistema nervoso, sofrem influência das condições 
ambientais e afetam a relação do indivíduo com o ambiente físico e 
com seus coespecíficos. A intersecção entre Psicologia e Neurociências 
estuda essas funções, tanto em suas manifestações comportamentais, 
como nos mecanismos que são responsáveis por sua geração e controle. 
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde2
A vida anímica representa o animus, a energia que possibilita o movimento humano em direção à satisfação de seus desejos
A psicologia, enquanto ciência que estuda os aspectos psíquicos nas relações que 
o homem estabelece consigo mesmo e com o mundo do qual faz parte, não surgiu 
em um consenso. Existem várias correntes epistemológicas que conformam esse 
campo de saber, e, originalmente, algumas escolas propunham modelos específicos 
para o estudo dos aspectos psicológicos do homem, como a Gestalt (psicologia 
da forma), a psicologia comportamental, a psicologia cognitiva e a psicanálise.
Um dos principais nomes da psicologia que estuda os fenômenos mentais 
a partir da consciência é Wilhelm Wundt (1832–1920). Segundo Marcellos 
e Araújo (2011), Wundt empreendeu um prolongado diálogo com a tradição 
filosófica de seu tempo e conduziu dezenas de pesquisas acerca de fenô-
menos como apercepção, sensação, atenção, sentimentos, memória, entre 
outros. Todavia, não há consenso entre os teóricos sobre quais aspectos são 
básicos — ou, como o autor defendia, inatos — e quais são produzidos pela 
influência do meio, considerados aspectos mais complexos. O que se observa 
com frequência atualmente são estudos voltados para os aspectos cognitivos 
e afetivos e a linguagem, para tratar de assuntos como desenvolvimento, 
aprendizagem e memória.
Nesse sentido, Souza (2011) afirma que, para tratar dos aspectos afetivos 
e intelectuais ou cognitivos, confrontando-os a título de reflexão teórica, os 
quatro principais modelos tiveram sua construção no início do século XX: 
modelos construtivista de Piaget e sociolinguista de Vygotsky (entre os anos 
20–30); humanista-afetivo de Wallon (anos 1940); psicanalítico de Freud 
(1897–1900). “Este último parece ser o único a se adequar à afirmação de 
Sherer sobre o predomínio da ‘irracionalidade’, ao menos no que se refere 
aos seus trabalhos iniciais sobre o inconsciente [...]” (SOUZA, 2011, p. 250).
Segundo Pinto (2008), a complexidade do funcionamento psíquico deve-se a 
uma multidimensionalidade do ser humano, defendida por Araújo (1998, 1999, 
2007 apud PINTO, 2008), que, em sua proposta teórico-conceitual, afirma 
existir, na composição do ser humano psicológico, algumas dimensões que 
o constituem e podem afetar as relações que ele estabelece consigo mesmo e 
com o mundo físico, interpessoal e sociocultural em que vive.
Cezar e Jucá-Vasconcelos (2016) defendem, em uma abordagem gestál-
tica, que os fenômenos mentais correspondem a fenômenos orgânicos, mas 
que identificar as sensações básicas não é uma tarefa fácil. Polster e Polster 
(2001 apud CEZAR; JUCÁ-VASCONCELOS, 2016) aponta, que, se fosse 
possível fechar a distância entre as sensações básicas e o comportamento mais 
complexo, provavelmente haveria menos exemplos de ações incongruentes, 
devido às confusões que, mesmo entre os estudantes de psicologia, ocorrem 
entre sensações, sentimentos e emoções.
3O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Segundo os autores, as sensações são reações físicas perceptuais, a partir 
de uma estimulação a um órgão receptor, seja ele interno ou externo. Já os sen-
timentos são fenômenos muito mais complexos, pois requerem uma avaliação 
(compreensão) e um lugar de “encaixe” dentro das experiências dos sujeitos. 
Por fim, as emoções são a expressão do afeto, acompanhadas de reações 
orgânicas ou físicas e linguísticas, caracterizadas como descargas de tensão.
Pinto (2008) afirma que o ser humano, utilizando-se de seu intelecto, come-
çou a refletir acerca do mundo ao seu redor e, assim, construiu verdades sobre 
os mais variados objetos, tentando sempre dominar suas propriedades. Assim, 
os esquemas de ação descritos pela teoria de Piaget (cognitivistas) também 
podem ser entendidos como reguladores pertencentes ao sistema cognitivo.
Segundo Gonçalves et al. (2014), as neurociências cognitivas são um novo 
modelo de se pensar os fenômenos psicológicos, em uma perspectiva trans-
disciplinar entre psicologia, neurofísica, neuroanatomia e neurobioquímica. 
Devido a essa clivagem de propostas que incidem na discussão da superação 
do modelo tradicional, que propõe a descontinuidade mente–corpo, a maioria 
dos estudos disponíveis diz respeito aos aspectos das dinâmicas do afeto e 
sua relação com a cognição (inteligência) ou razão.
Segundo Souza (2011), o tema das relações entre afetividade e inteligên-
cia (razão e emoção) foi herdado pela psicologia da filosofia como campo 
de reflexão sobre a natureza humana. Trata-se, segundoo autor, de uma 
transformação radical da concepção do homem, fundamentando diferentes 
teorias psicológicas, principalmente aquelas que valorizavam a experiência 
e o comportamento do ser humano, que não estavam em harmonia com o 
modelo do homem-lógico (cartesiano), em que as emoções seriam lamentáveis 
imperfeições da máquina humana.
Nesse sentido, Tousseul (2012) afirma que, na ideação kantiana, o afeto 
prejudica a reflexão. No entanto, o autor defende que, com base na metap-
sicologia freudiana e na filosofia leibniziana, os afetos são necessários às 
reflexões. Para isso, o autor toma emprestado da filosofia clássica duas lógicas 
reflexivas: a lógica da equivalência e a lógica da indução. Para Tousseul (2012), 
a lógica da equivalência está relacionada ao princípio de identidade (uma 
coisa é igual a outra ou a ela mesma), a partir da concepção de ubiquidade 
(que ele considera um desejo humano de estar em todos os lugares ao mesmo 
tempo), justificada como “não podemos ter tudo o que queremos”, devido a 
barreiras sociais ou à impossibilidade de realizar o nosso desejo. Já a lógica da 
indução está balizada pelo princípio da razão suficiente (basta uma cópia para 
engendrar outra) defendido por Leibiniz. Assim, pode-se inferir uma coisa a 
partir de outra, mas o tempo de observação não é eterno, as coisas são finitas, 
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde4
nós somos finitos. A despeito da finitude ou transitoriedade, Freud (1996a) 
afirma que a exigência de imortalidade é um produto de nossos desejos, mas 
não podemos reivindicar seu direito à realidade.
Segundo Tousseul (2012), desde a Antiguidade Clássica, Aristóteles já 
analisava os discursos, avaliando que a lógica não precisa ser demonstrada 
senão pela própria linguagem. Então, Tousseul (2012) afirma que, na maior 
parte do tempo, não estamos conscientes de que refletimos logicamente. 
Quando pensamos em produzir um raciocínio lógico, é para não corrermos o 
risco de errar. Por isso, o autor defende que refletimos logicamente de forma 
inconsciente, e a psicanálise é uma ferramenta para acionar essa reflexão. 
Essa afirmação é um indício da limitação do conceito de Wundt, de que os 
processos mentais são governados pela consciência.
Pensar na afetividade como indissociável da cognição e da razão é uma 
tendência atual, contemporânea, ressaltada por diversos autores. Pinto (2008) 
afirma que se começa a questionar, nos dias atuais, se a afetividade e a cognição 
convivem na dinâmica psíquica, cada uma com suas dimensões particulares, 
mas certamente associativas. Assim, passa-se a olhar o ser humano enquanto 
produto dinâmico de processos intelectuais e afetivos. Tomando por base o 
conceito freudiano de pulsão, Tousseul (2012) afirma que é o afeto que lhe 
dá forma, e a representação (de um objeto) lhe dá o conteúdo. De forma 
análoga, em comparação com a reflexão enquanto processo psicológico, a 
lógica é quem dá forma à reflexão, e o discurso (a voz e o significado) dá o 
conteúdo à reflexão.
Em suma, para Freud (1996a) a pulsão é um conceito fronteiriço entre a 
mente e o corpo, podendo ser definida como uma representação psíquica de 
estímulos internos. Ao contrário do instinto (enquanto próprio da espécie 
animal), porque este é um fator hereditário, fixo e com um objeto determi-
nado, a pulsão não tem um objeto específico ou padrão de comportamento, 
expressando-se como afeto ou ideia. Além disso, ela não participa da dualidade 
consciente–inconsciente. O afeto determina a quantidade e a qualidade da 
pulsão, expressando-se em descargas, classificadas como sentimentos, e não 
pode ser recalcado, mas sofre consequências do recalcamento. As ideias são 
representações, catexias ideativas, traços de memórias, e podem ser recalcadas.
Para Freud (1996a), a pulsão (ou pulsões) possui fonte, pressão, finalidade e 
objeto. A fonte está localizada nas excitações corporais, sendo uma exigência 
de um trabalho de representação, simbolização. A finalidade é a satisfação. 
A pressão é a quantidade de força exercida para realizar a sua vicissitude e o 
objeto é a coisa por meio da qual o impulso tenta se realizar. Assim, a pulsão 
é o impulso que sustenta toda a vida anímica.
5O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Segundo Tousseul (2012), quando uma pulsão não pode realizar seu objetivo, 
ela fica livre, ou seja, o afeto fica livre, podendo se prender a outro objeto 
equivalente, na lógica da dinâmica afetiva que interfere em nossas reflexões. 
Assim, para que o afeto nos mova à uma reflexão, é preciso considerar que 
a noção de espaço nos diz que não podemos estar em todos os lugares, de 
modo que não podemos, desse modo, experimentar todos os objetos. Isso é 
um interdito da realização pulsional, denominada por Freud (1996a) como 
prova de realidade.
Assim, Tousseul (2012) defende que a representação (ideia) só ocorre 
mediante uma apresentação (em um dado espaço, em um dado momento). 
Por conseguinte, o não reconhecimento de um objeto causa angústia. Nessa 
concepção, a angústia é um afeto despertado na presença de objetos desco-
nhecidos, proibidos ou desagradáveis. Por essa razão, a representação desses 
objetos é afastada da consciência, tornando essas ideias inconscientes por meio 
do mecanismo de recalque, isto é, um mecanismo de defesa para que o ego não 
seja tomado pela angústia. O afeto livre busca outras fantasias e representações 
mais agradáveis para poder escoar (através do substituto equivalente). 
Desse modo, para Tousseul (2012), a angústia também é um afeto que 
impele o homem à reflexão, por meio da lógica reflexiva da equivalência e 
do princípio de identidade. Assim, o afeto que perdeu o objeto (para o re-
calcamento) se desloca para um substituto equivalente, aquele que se tornou 
inacessível à consciência.
Freud (1996a) aponta também outras saídas para o investimento afetivo 
em objetos, como faz com o ego (instância representativa do eu, relacionada 
com a satisfação narcísica da pulsão). Quando perde alguém importante, 
querido, frequentemente a pessoa fica desanimada, parece perder o interesse 
nas coisas do mundo, até mesmo pode transparecer uma perda da capacidade 
de amar, além de inibir-se de atividades diárias e diminuir os sentimentos de 
autoestima. Essas características podem ser normais e passageiras, mas podem 
também indicar uma patologia. 
Segundo Freud (1996b), quando a libido (ou pulsão afetiva) não pode mais 
encontrar o objeto na realidade, a tendência é prolongar psiquicamente esse 
objeto (sua representação, a ideia desse objeto). No caso do luto, esse fenômeno é 
visto como consciente e pode ser superado por meio de um processo de trabalho 
psíquico. No caso de uma forma patológica, como a que o autor chama de melan-
colia, a perda objetal é retirada da consciência, como uma perda desconhecida. 
Nesses casos, a catexia (o investimento afetivo) é feita em relação ao ego e não 
mais ao objeto perdido, por meio de uma identificação (identifica o ego com o 
objeto perdido). Freud (1996b) chama esse mecanismo de “identificação narcísica 
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde6
com o objeto”. Assim, o autor defende que a identificação é possível tanto na 
esfera afetiva com o objeto (libido objetal) quanto com o ego (libido do ego). 
Essa identificação com o ego parece ser deixada um pouco de lado na 
hipótese de Tousseul (2012), pois, para ele, a identificação sempre leva a um 
trabalho de substituição pelo viés afetivo, para fora, considerando a expressão 
artística e a reflexão como saídas possíveis para o escoamento da afetividade 
(sublimação). E parece também deixar de lado a descoberta descrita por Freud, 
em 1920, sobre a pulsão de morte.
O conceito de pulsão de morte de Freud (1996b) é um reposicionamento 
frente a muitas questões que apareciam na sua clínica e eram difíceis de ser 
elucidadas, como a dificuldade de encarar que uma pessoa possa fazer mal e 
sentir prazer afetando a si mesma. Para Freud (1996b), isso vai nacontramão 
do princípio do prazer, destino e finalidade de toda a pulsão, de todo o afeto. 
A pulsão de morte caracteriza exatamente o que não pode ser representado, ou 
seja, uma pulsão sem significantes determinados, ao mesmo tempo destrutiva 
e criativa. Em oposição à pulsão de morte, o afeto que se liga à consciência, ao 
contrário do que se espera e do que foi proposto no início de seus trabalhos, 
fixa o sujeito, fazendo ele passar a aderir exatamente aquilo que o faz sofrer, 
em um mecanismo de repetição (pulsão de vida). É exatamente nesse ponto 
que se desenvolverá toda a complexidade do trabalho psicanalítico.
Voltando ao tema otimista de Tousseul (2012) de que os afetos precisam 
escoar por meio da reflexão como comprovação de que o afeto não impede 
a cognição, o autor, então, considerará que, além do afeto–angústia e do 
espaço–tempo, a frustração também impele a reflexão. Para sustentar essa 
afirmação, o autor recorrerá novamente ao princípio da razão suficiente de 
Leibniz, em 1965. Como não podemos experimentar eternamente o mesmo 
objeto, isso pode nos causar frustração, mas, considerando as lógicas reflexivas, 
o princípio da razão suficiente implicará o princípio de identidade, em que 
um objeto pode implicar outro (p => q). Então, o princípio de razão suficiente 
influenciará na dinâmica afetiva de compensação, para que o afeto busque 
escoar por meio de um objeto semelhante ao que foi perdido.
Para Tousseul (2012), quando a frustração se exprime por meio de um 
comportamento, isso indica que o destino pulsional é a sublimação (p. ex., 
elaboração de uma produção artística). Entretanto, quando a frustração se 
expressa por meio de um discurso, significa que engendra uma lógica indutiva 
do princípio de realidade suficiente. Ambas as saídas expressas pelo afeto são, 
segundo o autor, caracterizadas pela mesma lógica afetiva de compensação. 
O que ele afirma, então, é que o discurso é a expressão de uma lógica indutiva 
movida por um afeto.
7O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Tousseul (2012) também defende a importância da linguagem e da linguís-
tica de Saussure para os processos psicológicos. O som (imagem acústica) e a 
representação (sentido) em uma linguagem possibilitam criar símbolos, que 
são utilizados para compreender a realidade. Na linguagem, criamos novos 
significantes para compensar a falta de um significado para descrever o mundo 
e as nossas necessidades. A linguagem é utilizada tanto no discurso como na 
produção artística, e ambos dependem do afeto.
Para concluir, Tousseul (2012) afirma que os afetos constituem o motor das 
reflexões. A reflexão só é possível a partir dos afetos, ou das pulsões freudia-
nas. A angústia diante da consciência de que não podemos experienciar tudo 
gera um movimento de tentar substituir algo com representações equivalentes 
àquilo que foi recalcado.
Para uma discussão mais pormenorizada das correntes psicológicas que conformam 
historicamente os estudos dos processos ou aspectos psicológicos do ser humano, leia 
o artigo “As relações entre afetividade e inteligência no desenvolvimento psicológico”, 
de Souza (2011). 
2 O afeto e o cuidado em saúde
O cuidado em saúde pressupõe uma primeira característica de trabalho: o 
acolhimento das demandas, das queixas, dos sintomas dos pacientes, que pode 
ser feito por qualquer profissional de saúde. Segundo Paula e Rocha (2019), 
o acolhimento é feito por meio de uma escuta diferenciada, humanizada, 
compartilhada pela equipe, de modo a atender de maneira mais resolutiva às 
demandas dos usuários, da família e da comunidade. É com o acolhimento 
que se inicia o cuidado em saúde.
Souza et al. (2005) defendem que o conceito de cuidado em saúde é amplo 
e muito diversificado, manifesta-se na preservação do potencial saudável dos 
cidadãos e depende de uma concepção ética que contemple a vida como um 
bem valioso em si. Quer dizer, solidarizar-se, evocando relacionamentos com-
partilhados entre cidadãos em comunidades, e, por conseguinte, parceria, dever 
e compromisso social, visto que cuidar implica colocar-se no lugar do outro.
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde8
resumo do conceito geral
Ballarin, Carvalho e Ferigato (2009) defendem que muitos estudos e tra-
balhos científicos avançaram em relação ao tema do cuidado em saúde e da 
humanização das práticas assistenciais a partir das transformações do conceito 
ampliado de saúde e da efetivação dos princípios e diretrizes do Sistema Único 
de Saúde (SUS), tendo o sentido de cuidar sofrido muitas alterações ao longo 
do tempo, algumas alterações no sentido etiológico do termo, outras no senso 
comum, que é empregado tanto em um sentido de vigilância quanto de zelo.
Souza et al. (2005) definem cuidado como desvelo, solicitude, diligência, 
zelo, atenção, como um modo de estar com o outro no que se refere a questões 
especiais da vida dos cidadãos e de suas relações sociais. Os autores afirmam, 
ainda, que compreender o valor do cuidado de enfermagem requer uma con-
cepção ética que contemple a vida como um bem valioso em si, começando 
pela valorização e respeito ao outro em sua complexidade, suas escolhas, 
incluindo a escolha da profissão.
Para Ballarin, Carvalho e Ferigato (2009), as reformas sanitárias, psiquiátricas 
e o movimento de reabilitação psicossocial e desospitalização na saúde mental 
influenciaram novas formas de pensar, tratar e cuidar em saúde mental. Segundo 
os autores, houve a estruturação de uma rede serviços e cuidados que envolve 
usuários, familiares, trabalhadores, gestores e a comunidade. Essas mudanças 
são compartilhadas na área da saúde mais geral, não só em saúde mental.
É preciso pensar nas relações que são possíveis de se estabelecer entre os 
agentes (profissionais, familiares, instituições, usuários, comunidade, Estado) 
que buscam alcançar o conceito da saúde em um completo bem-estar para 
formular medidas efetivas e amenizar sofrimentos, promovendo a qualidade 
de vida. Para pensar no cuidado, tem-se, em sua base, que falar em afeto. Na 
abordagem de Wallow (apud LOOS-SANT'NA; GASPARIM, 2013), afirma-se 
que a afetividade nasce com o sujeito e se expressa a partir do corpo, indicando 
satisfação ou não satisfação das necessidades de sobrevivência, a diferenciação 
daquilo que agrada ou desagrada, e, por meio do desenvolvimento motor, dos 
movimentos do corpo, dialoga com o mundo externo.
No campo do cuidado em saúde, a afetividade pode se expressar contra ou 
a favor do tratamento, da equipe médica, e os profissionais têm de observar 
essa dinâmica afetiva no cuidado com o paciente. Para Barbosa e Bosi (2017), 
a relação que se estabelece entre usuários de serviços de saúde e os profissionais 
que nele atuam é tema importante para o SUS. Na atenção básica, costuma-
-se usar a palavra vínculo para representar essa relação, estando destacada 
na própria política de atenção básica (PNAB) a importância do vínculo e a 
responsabilização entre equipe e população, para fins de um prognóstico 
mais confiante.
9O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Moura e Silva (2015) destacam, em seu trabalho de pesquisa, dilemas do 
papel duplo do agente comunitário de saúde (ACS) nos programas de saúde da 
família (PSF) na atenção básica e a importância do relacionamento reflexivo 
entre agente e usuário e a afetividade. Segundo os autores, Deleuze (2002), 
em uma releitura de Spinoza, relembra a noção de encontro, “[...] onde o 
encontro com um corpo que é conveniente ao nosso e nos afeta com alegria, 
suscita a formação de vínculos e composições entre eles [...]” (MOURA; 
SILVA, 2015, p. 994). 
Nesse sentido, Sawaia (2001 apud MOURA; SILVA, 2015) afirma que, 
para compreender as relações, especialmente em cenários de vulnerabilidade 
(como é o caso dos serviços de saúde, desde a atenção primária até os mais 
especializados), é preciso resgatar o conceito de afetividade como a emoção 
que impregna o existir humano e se apresenta ora como sentimentose reações 
moderadas de prazer e desprazer, ora como emoção, fenômeno afetivo intenso 
e breve, que interrompem o fluxo normal da conduta.
Vale lembrar que, mesmo ocorrendo moderações de humor e variações de 
conduta ou comportamentos que produzem ora aspectos positivos ora negativos 
nas expressões desses afetos e na relação com o outro — ou seja, aspectos 
que facilitem ou dificultem os prognósticos e tratamentos em saúde —, é o 
encontro que pode promover o enfrentamento e a resolução desses conflitos. 
Por isso, é tão defendido que o cuidado deve valorizar o afeto de forma ética, 
ou seja, valorizar a vida, respeitando as diferenças.
Pinheiro e Bonfim (2009) destacam, em sua pesquisa sobre a relação 
entre paciente e ambiente hospitalar, o tema da afetividade. Segundo Bonfim 
(2003), a afetividade, dentro de uma perspectiva histórico-cultural vigotskiana, 
apresenta-se como uma categoria de análise que integra as cisões do campo 
da psicologia, possibilitando uma compreensão mais global, sem dicotomizar 
a pessoa–ambiente. Para Vygotsky (1991 apud PINHEIRO; BOMFIM, 2009), 
não existe um pensamento sem sentimento e vice-versa, pois todas as funções 
psicológicas superiores estão inter-relacionadas, o sentimento, o pensamento 
e a vontade.
Em sua pesquisa, Pinheiro e Bonfim (2009) trabalharam com um instru-
mento gerador de mapas afetivos para estudar a relação entre os espaços e 
os afetos, na tentativa de superar a dualidade cognição–afeto na vivência do 
indivíduo, e consideraram que qualquer ambiente é um território emocional.
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde10
Para conhecer os resultados dessa pesquisa para caracterizar a dinâmica dos afetos 
relacionados à hospitalização (em um contexto de um hospital particular) e sua influ-
ência nos cuidados de saúde, leia a pesquisa de Pinheiro e Bonfim (2009), intitulada 
“Afetividade na relação paciente e ambiente hospitalar”.
Ballarin, Carvalho e Ferigato (2009) apontam que os profissionais de saúde 
que atuam principalmente nos serviços de cuidado à saúde mental se deparam 
com situações complexas e emergenciais no seu cotidiano, que expressam 
cenas em que o usuário em crise manifesta agressividade, mediante intenso 
sofrimento psíquico, e até mesmo atitudes de automutilação e angústia extrema, 
considerada pelos autores a expressão de sua singularidade. Essas vivências 
intensas exigem dos profissionais compreensão ética e disponibilidade para 
um cuidado abrangente. Contudo, o que costuma acontecer, na realidade, é 
que essa situação influencia uma postura defensiva e até compreensível de 
distanciamento, de modo que o diálogo e a reflexão crítica não encontram eco, 
retorno. Assim, o foco de atenção fica desviado para uma prática puramente 
institucional.
Os autores defendem que:
[...] é necessário salientar que as transformações que se efetivaram no campo 
da saúde mental objetivadas a partir da reabilitação psicossocial, buscam 
resgatar a cidadania dos sujeitos, a partir do incremento da consciência do 
paciente a respeito dos seus problemas, bem como sua autonomia afetiva e 
social [...] (BALLARIN; CARVALHO; FERIGATO, 2009, p. 220).
Ballarin, Carvalho e Ferigato (2009) defendem que essa realidade, guarda-
das algumas diferenças de continuidade ou intensidade, também estão presentes 
no cuidado em saúde em outras unidades dos setores primário, secundário 
e terciário. Os autores ainda afirmam que, nesses contextos, o ato de cuidar 
pressupõe do cuidador uma postura ativa que permita reconhecer o outro na 
sua liberdade, dignidade e singularidade.
11O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Os autores ainda diferenciam uma característica política relacionada ao cui-
dado em saúde que pode ser traduzida pelo direito de cidadania, contrapondo o 
de submissão, caracterizado pela lógica mais tradicional da assistência. Assim, 
Ballarin, Carvalho e Ferigato (2009) definem uma característica tríplice do 
cuidado: conhecer para cuidar melhor (compreensão do conceito socio-histórico 
das relações de poder), cuidar para confrontar (gerenciar as forças que efetivam 
o controle democrático) e cuidar para emancipar (desconstrução progressiva 
das assimetrias de poder). Assim, nessa perspectiva, ajudar e cuidar têm um 
sentido de fortalecer o usuário dos serviços, a família e a comunidade para sua 
autonomia. Autonomia não no sentido de deixar que façam por si mesmos, mas 
no sentido de parceria, de construir possibilidades de cuidado em conjunto.
Nesse sentido, Barbosa e Bosi (2017) defendem o vínculo entre os profissio-
nais de saúde como um importante conceito para o PNAB, em que o vínculo 
consiste na construção de afetividade e confiança entre usuário e trabalhadores 
da saúde, aprofundando o processo de corresponsabilização pela saúde e o 
potencial terapêutico, a fim de viabilizar a continuidade do cuidado.
Na mesma linha de raciocínio, Souza et al. (2005) afirmam que a ideia de 
ajudar os outros na solução de problemas ou de colocar-se no lugar do outro 
ainda permanece válida na noção de cuidado em enfermagem no século XXI. 
Essa ideia fundamenta-se em integrar as pessoas em torno do bem comum, 
mantendo o elo social. Assim, cuidar significa comprometimento e engajamento 
político-cultural, prevenindo rupturas na sociedade e promovendo o que se 
preconiza como conceito ampliado de saúde.
 Para os autores, o cuidado de enfermagem promove e restaura o bem-estar 
físico, psíquico e social e amplia as possibilidades de viver e prosperar, bem 
como as capacidades para associar diferentes possibilidades de funcionamento 
factíveis para a pessoa. Nessa perspectiva, o cuidar em enfermagem se revela 
na prática com um conjunto de ações, procedimentos, propósitos, eventos e 
valores que transcendem ao tempo da ação, acolhendo diferentes gerações e 
imprimindo-lhes realização e qualidade de vida.
3 O doente, a família e o entorno
Levando em consideração o que foi dito sobre o afeto e o funcionamento 
psicológico dos sujeitos, o afeto é o motor das expressões de angústias, frus-
trações, medos e dos mais variados sentimentos, mas também de reflexões e 
pensamentos elaborados. Além do reconhecimento da afetividade em si e no 
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde12
outro como um aperfeiçoamento técnico e ético do profissional de saúde, como 
podemos enxergar na prática como a enfermidade afeta o doente, a família e 
o entorno e que consequências trás para as suas vidas em sociedade?
O adoecimento sempre causa uma desestrutura na dinâmica familiar, afe-
tando todos os envolvidos e, para além da família, afeta também com alguns 
contextos sociais mais amplos, como a vizinhança, os amigos, as relações 
de trabalho. Pensando sobre a configuração de novos modelos assistenciais 
no espaço da saúde, Bastos e Trad (1998) defendem que os contextos sociais 
são historicamente criados por pessoas enquanto atores sociais, e as famílias 
ocupam esses espaços, lutando pela sobrevivência e pela reprodução da vida, 
estabelecendo relações de convivência, trocando experiência, acumulando 
saberes, habilidades, hábitos, produzindo e reproduzindo concepções e cultura.
Girardon-Perlini e Ângelo (2017) lembram que o adoecer é um evento natu-
ral, comum ao desenvolvimento humano, porém causa sofrimento, sentimentos 
de angústia, preocupação e medo. Assim, é um processo que influencia o modo 
como o usuário, os membros da sua família e o seu entorno vão se organizar 
e reorganizar para atender às novas demandas e conciliar o bem-estar. A 
dinâmica familiar diz respeito à convivência, aos vínculos, ao funcionamento 
da vida familiar em seu cotidiano, envolve elaborar afetos, posições de poder, 
conflitos e níveis de coesão. Assim, Bastos e Trad (1998) afirmam que o con-
texto familiar pode apresentar dinâmicas, deflagrando fragilizações mais ou 
menos adaptativas para a saúde. No entanto, diante de uma doença, a família 
pode desenvolver alguns mecanismos próprios de enfrentamento, que podem 
variar de acordocom os laços afetivos e as crenças culturalmente instaladas.
Martins et al. (2009) consideram que os avanços da medicina para o controle 
e a prevenção de doenças crônicas, do saneamento básico e dos hábitos culturais 
e de higiene são, hoje, fatores que resultam no prolongamento da expectativa 
de vida e, logo, na diminuição do índice de doenças crônicas. A família tem 
papel central nesse processo, pois necessita reelaborar sua organização, para, 
assim, enfrentar o diagnóstico, tratamento e prognóstico sem desarticular os 
vínculos familiares e sociais.
O gráfico da Figura 1 aponta para o índice de mortalidade prematura por 
doenças crônicas não transmissíveis, indicando um parâmetro sobre a diminui-
ção do índice de doenças afirmada por Martins et al. (2009), comparada com a 
queda da mortalidade, principalmente no quadro de insuficiência respiratória.
13O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
Figura 1. Coeficiente de mortalidade prematura por doenças crônicas não transmissíveis 
segundo o grupo de causas. Brasil, 2007 a 2016.
Fonte: Brasil (2018, documento on-line).
A experiência em cuidado de enfermagem possibilitou a afirmação de 
Bellato et al. (2016) de que a família cuida geralmente de seus entes, não 
apenas para prover ou restabelecer a saúde, mas para a vida. Segundo eles, a 
“responsabilização moral pelo cuidado” é derivada da história familiar e da 
socialização de seus membros. 
Os autores defendem que existe uma rede familiar e, muitas vezes, de amigos 
mais próximos que acaba alcançando os recursos para garantir o cuidado ao 
longo do tempo, além de ser uma rede mais distante, acionada pontualmente 
e constituída para garantir a manutenção do cuidado por profissionais e ins-
tituições de saúde. Então, existem vários níveis de cuidado que os autores 
classificam como pessoal, cuidado familiar e cuidado nas redes.
Bellato et al. (2016) consideram que a família tem limites para o cuidado, 
pois às vezes encontram-se em questão de vulnerabilidade e, ao longo de 
uma doença crônica, esses potenciais vão se exaurindo. Pensando na família 
como unidade primária de cuidado que também deve ser cuidada, considera-
-se que seus potenciais possam se constituir em importantes analisadores de 
vulnerabilidades, principalmente nas situações que requerem prover cuidados 
continuados, prolongados e renovados. Desse modo, os serviços de saúde 
precisam ser uma fonte segura para prover o cuidado do usuário e da família, 
num continuum que atenda ao longo do adoecimento, configurando uma 
permanente atenção do profissional de saúde, que os autores chamam de 
cuidado longitudinal.
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde14
Girardon-Perlini e Ângelo (2017) afirmam, em sua pesquisa, que o ado-
ecimento com diagnóstico de câncer acaba por trazer à tona alterações ao 
funcionamento familiar, seja pela trajetória da doença, por repercussões físicas, 
enfrentamento da finitude ou pelas fantasias e mitos que remetem à pessoa 
doente e seu tratamento. Nessa pesquisa, foi discutida não só a questão da 
doença, mas também a questão do entorno, que, por se tratar de um estudo 
desenvolvido em área rural, cria aspectos de vulnerabilidades variados em 
relação aos estudos do ambiente urbanos, pois os próprios valores de comu-
nidade e de família são diferenciados. Os autores concluíram que a experi-
ência do adoecimento por câncer nas áreas rurais configura-se como uma 
situação que compromete elementos simbólicos referentes ao mundo rural: 
“[...] a doença põe em risco a família como unidade, interfere na dinâmica 
do trabalho familiar, aumenta as exigências de cuidado e ameaça a terra [...]” 
(GIRARDON-PERLINI; ÂNGELO, 2017, p. 583). Essa ameaça aos elementos 
que simbolizam uma família acaba resultando em um sentimento de desamparo.
A proposta de Girardon-Perlini e Ângelo (2017) sugere para o enfermeiro 
nessa situação construir um modelo de cuidado que vise, junto à família, a 
aproximar-se de suas experiências, compreender seus medos, propor estratégias 
de cuidado que alinhem um contexto relacional cooperativo para o amparo 
dessas famílias. 
Alguns casos de adoecimento afetam o entorno de forma bem incisiva, 
como são os casos das epidemias, que parecem se proliferar na contempo-
raneidade. Segundo Barata (1987), o caráter distintivo das epidemias está 
na sua manifestação coletiva (enquanto fenômeno que atinge as massas) e 
singular (como ocorrência única em um determinado espaço–tempo). As 
práticas de intervenção e combate às epidemias defendida por Wirchow (1847 
apud BARATA, 1987) levou à conclusão de que elas possuem causas sociais, 
políticas e econômicas, mais do que biológicas e físicas, sendo um desajuste 
social e cultural.
Em geral, as epidemias atingem e se espalham mais facilmente em uma 
população mais vulnerável, onde as condições básicas de saúde e qualidade 
de vida são negligenciadas. Williamson (2018), em seu estudo sobre os casos 
de mães com crianças que tiveram sequelas com relação ao zikavírus na 
Bahia, considera que as preocupações sobre a própria morte precoce que nos 
surpreendem têm uma carga ainda mais pesada nesses prognósticos. 
15O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde
O autor atenta para o fato de que a maioria das mães em seus estudos 
pertence a setores da população brasileira, vivendo, desde sempre, infinitas 
incertezas ao longo de suas vidas, pois a maioria são negras e acabam tendo 
expectativa de vida inferior à de mulheres brancas menos pobres, devido ao 
racismo estrutural em nossa sociedade e ao acesso limitado a serviços de saúde. 
Além disso, elas estão sujeitas a comunidades violentas, e violentas também 
são as ações do Estado e a hegemonia paternalista que reserva às mulheres o 
cuidado dos filhos e das práticas domésticas. Essas mulheres, então, podem 
sentir-se ainda mais fragilizadas ao cuidar de um filho com síndrome congê-
nita associada à infecção pelo zikavírus (SCAIZV) (WILLIAMSON, 2018).
As epidemias causam pânico social por ainda serem um plus de problemas 
e sofrimentos ao que já enfrentam as populações menos favorecidas no seu dia 
a dia. E quem cuida dessa população menos afortunada? As práticas de saúde, 
nos moldes do que preconiza a OMS, defendem o investimento em ações que 
envolvam políticas de correção de desigualdades sociais.
Um estudo da OMS lembra que o Brasil experimentou, na última década, um cresci-
mento econômico significativo, com a criação de 10 milhões de empregos formais 
por meio dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, que, ainda 
segundo o documento, ajudou a melhorar as condições de vida nas áreas pobres. 
Para saber mais sobre esse assunto, procure por “Desigualdades em saúde persistem 
no Brasil, aponta OMS” na página da Fiocruz.
Seixas et al. (2019) propõem a construção do vínculo como potente es-
tratégia para a transformação das práticas cotidianas de saúde, a partir de 
um projeto ético-estético-político centrado nas demandas e necessidades em 
saúde dos usuários, em sua singularidade, e mediante relações de saber-poder 
simétricas. Nessa concepção, os dispositivos de gestão do cuidado em saúde 
têm de considerar os trabalhadores e usuários, a família e as comunidades 
como interlocutores válidos, e sua relação tem de ser de simetria. Assim, devem 
ficar explicitadas as tensões e dificuldades em engendrar-se as transformações, 
sem estar baseados em normas e orientações externas ao entorno do cuidado, 
e os afetos devem ser discutidos e refletidos para transformar efetivamente 
as práticas cotidianas.
O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde16
Os conflitos oriundos dessas práticas devem ser resolvidos para fortalecer os 
laços (na equipe) e o apoio aos trabalhadores na tarefa do cuidar. Essa proposta 
não pode se estagnar ou acabar, dizem os autores. A tentativa dessa prática é a 
de fugir do saber que aponta ao outro o que ele deve fazer de acordo com um 
juízo moral, por isso, deve haver a valorização dos saberesdos usuários, da 
família, da comunidade, seja no meio urbano ou no rural. Isso exige esforço, 
mas tem de ser tomado como um desafio para que as práticas no cuidado que 
levam em consideração o afeto e apoiam as condições de todos os agentes 
envolvidos de forma compartilhada incrementem um efeito mais produtivo 
na saúde.
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O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde18
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19O paciente e a família: o afeto e o cuidado em saúde

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