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84 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III Unidade III 5 O UsUáriO e O trabalhadOr sOb O enfOqUe da hUmanizaçãO 5.1 as representações sociais Para entendermos como se dá o relacionamento entre o usuário e o trabalhador, precisamos compreender como a ciência descreve essa relação. A Teoria das Representações Sociais (TRS) explica os fenômenos humanos a partir de uma perspectiva coletiva, porém, considerando as características individuais de cada ser humano. A realidade é construída de forma coletiva e o saber é individual de cada sujeito que, integrado à sua condição de inscrição em uma sociedade, operacionaliza um conceito de trabalho; o pensamento coletivo interage nessa dinâmica e diversidade. O conhecimento das representações sociais de um determinado objeto será imprescindível para a compreensão da produção de conhecimentos diversos que constitui e reforça a caracterização de cada grupo, influenciando em suas práticas e pensamentos. As representações sociais vão relacionar as ideias e os conhecimentos que são trazidos em um determinado sujeito, com suas crenças e valores preexistentes, de acordo com a sua cultura e, a partir de uma realidade comum coletivamente, há a construção desse conjunto social. No cenário da saúde, a construção dessas representações sociais terá uma complexidade maior, pois a diversidade de conhecimentos, saberes e vozes caracterizam os diversos grupos sociais que lá estão representados. A representação social considera a cultura, a linguagem e a comunicação, os valores, o contexto ideológico e histórico e a inserção social dos sujeitos – sua posição e filiação grupal – como influenciadoras na construção de um conhecimento compartilhado que passa a ser explicado pela complexa subjetividade humana. Essa complexa subjetividade pode ser definida pelo que não pode resumir‑se em uma ideia simples ou em uma palavra mestra. A complexidade terá como entonação o conhecimento multidimensional, compreendendo fenômenos aleatórios, incertezas, liberdade, criatividade, autonomia e individualidade. Dessa maneira, a compreensão da complexidade humana implica, entre tantas outras questões, a subjetividade, pois cada pessoa tem características próprias e deve ser valorizada como um ser global. Pode‑se dizer que há uma estreita relação das representações sociais com a complexidade humana. Ao abordarmos a humanização, identificamos a necessidade de articular elementos afetivos, mentais e sociais, integrando elementos da cognição, linguagem e comunicação, para evidenciar as relações sociais que afetam as representações e a realidade material, social e ideal sobre a qual elas vão intervir; desse modo, ela se torna concreta e alcançável. 85 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Uma grande diferença no setor de saúde é que, apesar do grande desenvolvimento tecnológico, a relação interpessoal sempre vai existir. Mesmo que o paciente faça uso da melhor tecnologia, precisará de um profissional que o acolha, explique e fique ao seu lado durante a sua necessidade. A necessidade pela fortificação da ampliação desse contexto da relação entre trabalhador e usuário se dá pela urgência de se tomar o usuário dos serviços de saúde como sujeito com direito de cidadania, digno de respeito e singularização. A importância do papel da interação com o profissional de saúde, em especial o enfermeiro, para além da atuação técnica, está associada à criação e manutenção de vínculo, à adesão ao plano de cuidados e à satisfação dos usuários. A isso se pode designar de coprodução de problematização, sendo imprescindível o reconhecimento por parte da equipe do poder das pessoas para interferirem na relação com a sua própria vida e o adoecimento. Ao analisarmos resultados de programas instituídos em alguns serviços, fica evidenciada a permanência de relações colonialistas no setor da saúde, percebendo que a proposta de emancipação dos sujeitos ainda é um trabalho a ser perseguido. A inclusão dos usuários nas decisões está atrás apenas da comunicação efetiva com os profissionais, que é condição para o diálogo. O acesso aos serviços de saúde e a preferência por um profissional que enxergue o usuário como sujeito, não somente como um corpo, também são sinalizados como objetivos a serem conquistados. O vínculo e a tomada de decisões compartilhadas, via de regra, são fundamentais para a adesão e a continuidade do tratamento. O colonialismo é considerado “a incapacidade de reconhecer o outro como igual, a objetivação do outro – transformar o outro em objeto” (SANTOS, 2007, p. 53 apud SCHIMITH, 2011, p. 494). A questão é: há hierarquia nos conhecimentos dos profissionais e usuários? Para construir a emancipação, é preciso “uma nova relação entre o respeito à igualdade e o princípio do reconhecimento da diferença” (SANTOS, 2007, p. 62 apud SCHIMITH, 2011, p. 494). Descolonizar nossas mentes é necessário para que possamos distinguir as hierarquias, levando em consideração as diferenças que ficarem depois disso. Reconhecer as diferenças pressupõe a luta pela igualdade, “porque o importante não é a homogeneização, mas as diferenças iguais” (SANTOS, 2007, p. 63 apud SCHIMITH, 2011, p. 494). 5.2 Comunicação e empatia Um dos nossos maiores desafios na área da saúde é a forma como reorganizar os serviços de modo que a relação entre os profissionais de saúde e os usuários seja realizada de uma maneira mais adequada e humanizada para os dois lados. A forma como o acolhimento é realizado durante a recepção do paciente ainda é uma das principais causas de sucesso ou de fracasso nessa relação. Quando todos os profissionais entendem desde o início que o acolhimento deve ser feito de uma forma humanizada e ouvem a demanda do nosso cliente, a relação já começa com sucesso. Porém, se esse acolhimento é realizado de forma impessoal, sem uma avaliação individualizada e personalizada do problema do paciente, começamos a gerar o primeiro de muitos obstáculos nessa relação entre profissional e trabalhador. 86 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III Para que esse acolhimento seja integral, o profissional tem de usar de uma ferramenta chamada empatia, que tem por definição colocar‑se no lugar do outro. A integralidade e a valorização da queixa do usuário, quando entendida por meio da empatia pelo profissional de saúde, fará com que ele deixe de controlar a situação‑problema e passe a observá‑la e avaliá‑la adequadamente e, assim, possa tomar uma decisão baseada na individualidade do caso. Desse modo, quando o usuário se sente singular, único, ele imediatamente começa a apresentar melhora de sua queixa, o que gerará uma sensação de satisfação nele e também no profissional. lembrete Com a empatia, o profissional iniciará uma relação profissional‑usuário com chances muito maiores de formação de um forte vínculo, construído em pilares de respeito, compromisso e cumplicidade. Quando o profissional de saúde baseia sua relação na construção de elos de afetividade e credibilidade, ele faz com o que o usuário avalie de forma muito mais positiva essa assistência. Por isso a importância de que se prometa ao seu cliente aquilo que poderá ser cumprido. A pequena possibilidade de frustração de uma expectativa será suficiente para que essa relação seja perdida, e, pela falta de confiança, a reconstrução será muito mais penosa. Vários estudos já demonstraram que quando esse vínculo é criado de forma positiva, a resolução do problema será muito mais favorável pela possibilidade de uma adesão maior por parte do usuárionas orientações dadas pelos profissionais de saúde. Entretanto, para que essa relação profissional‑usuário dê certo, apenas a empatia não será suficiente para a formação do vínculo esperado. Antes de sermos profissionais de saúde, somos seres humanos, que possuem as suas crenças, os seus valores e os seus conceitos de vida. Quando iniciamos o vínculo com o paciente e no primeiro encontro ouvimos a sua queixa, entraremos em contato com os seus valores e crenças. Nesse momento, poderemos entrar em conflito, se os nossos valores vão no sentido oposto àqueles que o paciente apresenta. Porém, temos de ter em mente que o nosso papel é o de nos colocarmos no lugar do paciente e entender o contexto particular daquela situação, por isso, julgamentos e preconceitos não poderão fazer parte da construção desse vínculo. O profissional de saúde pode não concordar com os valores e crenças do paciente, mas ele terá a obrigação de respeitar a decisão que o paciente venha a tomar baseada em suas crenças. A percepção de que o profissional respeita os valores do paciente, apesar de não ser participativo deles, fará com que ele valorize muito mais essa relação. Com a criação do elo de confiança, o paciente dividirá todas as condições que podem estar interferindo na sua tomada de decisão. Com a utilização dessas ferramentas e quando todos tratarem o outro como gostariam de ser tratados, abordando o paciente de forma holística e única, o atendimento humanizado dentro de uma instituição de saúde será natural. 87 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Para que esse atendimento seja realizado da maneira esperada, as instituições de saúde hoje buscam no mercado um profissional que, além de competência técnica e especializada, tenha capacidade de relacionamento interpessoal. Qual o seu grau de maturidade para que você possa integralizar todo o processo de saúde de seu cliente? A comunicação será a ferramenta do planejamento do processo de trabalho que fará a diferença na relação paciente‑profissional para que o atendimento aconteça de maneira eficaz. Quando a comunicação tem como sujeitos‑alvo os profissionais de saúde, ela apresenta algumas falhas e enfrenta dificuldades. Eles precisam se encontrar a fim de discutir e refletir sobre o cotidiano e compartilhar as angústias e satisfações, pois a possibilidade de dialogo é um fator importante para a humanização. A comunicação também é uma ferramenta de auxílio na organização dos serviços de saúde. Se a população fosse educada para identificar quais são as situações em que é necessário um atendimento de serviços de urgência e emergência, a resolutividade desses serviços seria maior, pois os casos que realmente necessitam do atendimento teriam mais disponibilidade por parte da equipe de saúde. Nesse caso, ficariam mais satisfeitos, tanto a equipe, por estar atendendo a real necessidade da população dentro daquele serviço, quanto o usuário, por ter resolutividade em um tempo mais seguro, que evitaria a complicação dos quadros. Dentro do hospital, quando dividimos com o paciente e seus familiares as informações e as decisões sobre a terapêutica, diminuímos os sentimentos de preocupação e, dessa forma, com a confiança aumentada, a terapêutica terá uma melhor resolutividade. Quando falamos de comunicação, não estamos apenas nos referindo à comunicação falada. É claro que a comunicação verbal é a principal forma, mas temos que nos preocupar em adequar, muitas vezes, a forma pela qual vamos nos comunicar com o paciente e seu familiar. Encontramos pacientes de diversos níveis socioeconômicos e com graus de instrução variados, por isso, uma mesma informação deverá ser repassada de forma diferente para diferentes pacientes. O uso de termos técnicos é um dos principais fatores de dificuldade nessa relação, pois explicamos para o paciente o que está acontecendo com ele como se estivéssemos conversando com outro profissional da área de saúde. Dessa forma, ele, que em condição de “paciente” depende exclusivamente dos seus cuidados, não consegue entender o que está sendo dito e, por medo de apenas fazer uma pergunta, fica completamente alheio à sua condição de saúde e tratamento. Outra forma de comunicação que pode influenciar muito na adesão do paciente ao seu tratamento é a não verbal. Olhar o paciente enquanto conversa com ele e tocá‑lo quando é percebido um momento de angústia pode acolhê‑lo melhor. O paciente já melhorará sua relação com o profissional quando este fizer o simples gesto de chamá‑lo pelo nome. Ao chamarmos o paciente pelo nome, diminuímos aquela sensação de que ele é apenas mais 88 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III um número na instituição. Porém, temos de ter cuidado com os familiares, pois, se utilizarmos termos como “mãezinha” para a mãe que está acompanhando seu filho, teremos uma linguagem que infantiliza o relacionamento e pode não favorecer a interação esperada. Transformar a interação entre profissional e paciente é um caminho difícil a percorrer. Como já discutimos anteriormente, os profissionais identificam‑se como os detentores do saber, e o paciente deve aceitar todas as decisões tomadas por ele. Um modelo de atenção à saúde que vem mudando um pouco o olhar nessa relação de poder é a estratégia Saúde da Família, criada para a reestruturação da atenção básica do país. Nessa estratégia, para que a equipe possa trabalhar com a população, ela precisa integrar‑se à realidade das famílias pelas quais é responsável. Isso se dá pelos conceitos descritos na Política Nacional de Humanização, em que a base desse processo vai acontecer, com a integralidade e a busca pela melhora da qualidade de vida dos sujeitos. O diferencial para que essa comunicação possa ser efetiva é que haja capacitação profissional, entendida como fundamental para superar qualquer dificuldade encontrada nas relações interpessoais, em razão das insuficiências da estrutura dos serviços. Portanto, a gestão da escuta qualificada direciona para um processo de trabalho mais humanizado, possibilitando, assim, que o período de internação desse paciente seja mais suportável. A integração dos saberes para que a atenção seja oferecida com qualidade e constantemente humanizada será a base dos profissionais, de forma a planejar o compartilhamento da assistência. O acolhimento, como discutido, é a estratégia essencial para a reorganização dos serviços, pois é preciso diferenciar o que é acolhimento de triagem e decisão de escolha de quem será atendido, por quem e como. O acolhimento é uma ação que deve ser executada por qualquer profissional da instituição de saúde, desde a recepcionista ou o porteiro da instituição até o profissional que está em cargos de direção mais elevados. Quando o paciente aborda um profissional para fazer um questionamento, geralmente, as pessoas se preocupam em perceber que a resposta àquela pergunta não é de sua responsabilidade, mas, se o ouvirmos de forma qualificada e o acolhermos, mesmo sem ter a resposta que ele deseja, sempre lhe daremos um retorno satisfatório. A comunicação profissional‑usuário ganha, no contexto do cuidado em saúde – no ambiente hospitalar –, a finalidade de ser compreensível ao usuário, atender às suas expectativas e esclarecer as suas dúvidas. Atualmente, os pacientes costumam buscar informações sobre a sua condição em ferramentas de busca virtual (internet), muitas vezes, para complementar ou garantir o conhecimento da sua situação de saúde. Apesar disso, esse uso de busca não deve substituir o diálogo com o profissional, que tem condições de falar particularmente sobre a condição daquela pessoa. Hojeem dia, nossa sociedade é extremamente informatizada e informada pelo amplo acesso às diversas bases virtuais, porém, elas não substituem a comunicação e a troca de informação que ocorre entre os profissionais e os pacientes. 89 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Nesse contexto, o acesso à informação é direito do paciente. Ter o conhecimento integral sobre o seu diagnóstico e tratamento constitui‑se uma das condições expressas na Política Nacional de Humanização para garantia da cidadania dos usuários. Identifica‑se que a relação profissional‑usuário transcende a comunicação verbal e é assim identificada como expressão de humanização pelos usuários. A demonstração de sensibilidade pelos profissionais não fica alheia à observação dos usuários, que registram tais manifestações como exemplos de expressão de humanização. A empatia e a facilidade em compartilhar momentos difíceis vividos pelos usuários e seus familiares contribuem para a construção e manutenção de laços afetivos interpessoais. Um exemplo de expressão humanizadora do cuidado, conseguida por meio da comunicação não verbal, é o da comunicação escrita, utilizada quando temos um usuário com a acuidade auditiva diminuída. Sua finalidade, conjunta com uma comunicação um tom mais alto, mas que mantém a calma, valoriza a condição especial do paciente e faz com que ele se sinta valorizado. Quando solicitamos uma avaliação do cuidado prestado pelos nossos funcionários a nossos pacientes e ela é positiva, temos uma aliança a outras condições, que reforçam a interação positiva da qualificação do cuidado no ambiente hospitalar. Com a utilização consciente e adequada das ferramentas das relações sociais, reforçamos a tendência majoritária dos usuários em conformar a humanização pautada em elementos subjetivos que constroem relações interpessoais de cunho afetivo e solidário. Expressões que denotam a não humanização, que se colocam em polos contrários, mostram a complexidade desse processo, na evidência do necessário investimento que se deve ter no campo das relações entre profissional‑usuário e na prática clínica do atendimento. 5.3 Categorias temáticas Analisando os temas do conteúdo sobre as teorias das representações sociais, dois pontos são determinantes como organizadores dos temas direcionados à humanização do cuidado: as relações humanas propriamente ditas e a política gestora da saúde‑assistência. Nesse sentido, a lógica de construção das ideias dos usuários sobre a humanização passa por questões de nível macro, que mostram o contexto maior no qual se insere a assistência, e também de nível micro, que mostram as relações entre o profissional e o usuário no cuidado. 5.3.1 A assistência e as práticas de cuidado: elementos da relação humana O contexto social e individual em que o paciente de um determinado serviço de saúde está inserido poderá interferir tanto no tratamento quanto na reabilitação do indivíduo. O processo de cuidado do paciente deverá ser negociado por ser uma dimensão importante a se considerar no campo da humanização, principalmente quando se observam quais são as condições 90 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III sociais, familiares e religiosas do usuário, pois terão influência direta nas decisões e na assistência a ser prestada. Um exemplo tradicional sobre a condição de respeito dos conceitos religiosos de um paciente é a necessidade de transfusão sanguínea, que para algumas religiões segue uma diretriz de proibição. Se o profissional que tem como cunho ético‑profissional a preservação da vida não entender a condição do paciente e não usar de empatia, teremos um momento de conflito posto. Com essa condição fica clara a necessidade, por parte do profissional, de utilizar a sua sensibilidade e manifestar sua compreensão sobre o contexto no qual esse indivíduo está inserido, de forma a proporcionar confiança e gerar tranquilidade para o curso do tratamento. O primeiro passo para uma relação interpessoal de respeito recíproco se dá quando compreendemos as necessidades inseridas no cenário social e familiar da vida cotidiana. Em um ambiente hospitalar, é comum que o paciente precise de diversos procedimentos, muitos deles de caráter invasivo ao seu organismo, entretanto, a sua condição cidadã e sua subjetividade não podem ser perdidas, devendo ele ser ouvido e participar das negociações necessárias ao tratamento. O conhecimento científico deve aliar‑se à visão holística e contextual do ser humano para que a relação desses atores seja satisfatória. O conhecimento científico é importante, porque é necessário saber sobre a reação físico‑química de um medicamento, por exemplo, que poderá apresentar reações diferentes em diversos pacientes. O holístico, por sua vez, ao olhar o paciente como um todo inserido naquele ambiente estranho à sua vida cotidiana, permite distinguir as diversas reações que podem surgir, diferenciando uma reação fisiopatológica de uma psicológica, relacionada ao ambiente em que está inserido. Observação A teoria de Florence Nightingale, conhecida como Teoria Ambientalista (HADDAD; SANTOS, 2011), introduziu o ambiente na análise de ações de prevenção de enfermidades, tratamento e recuperação de doentes, aplicando seu conhecimento na discussão da humanização do cuidado, com os aspectos nas relações sociais. Outro exemplo que mostra claramente a condição de situação de estresse para o paciente é o que acontece em situações de infecção hospitalar, que, em geral, comprometem em muito o estabelecimento de relações entre os profissionais e os usuários, já que implica a diminuição do contato físico, além de comprometer a frequência das visitas ao leito, limitadas às situações dos protocolos clínicos, que visam ao controle e à prevenção das infecções hospitalares. Situações como essa favorecem ao descontentamento do paciente, que pode se questionar se a situação ali imposta poderia, por exemplo, ter sido evitada, com a aplicação de outras medidas. 91 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar 5.3.2 Gestão, infraestrutura e organização Em relação à gestão, mesmo que tenhamos uma iniciativa de implantação dos preceitos propostos pela PNH na área hospitalar, o problema maior está no plano gestor e nas atividades gerenciais, tanto no nível macro das políticas como no microespaço do hospital. O profissional que cuida do paciente está na ponta de uma assistência que, se não for bem gerida por profissionais administrativos que conheçam as rotinas daqueles atendimentos e supram as necessidades com condições ideais de trabalho, pode ficar comprometida na sua operacionalização. As interferências, em relação à infraestrutura e organização, estão diretamente associadas ao conteúdo das práticas assistenciais: o horário para cuidar do usuário, administrar medicações e realizar procedimentos; organização e cuidado com o material; quantidade de profissionais; e condições de trabalho e atendimento. Uma das bases para que o usuário se sinta acolhido de maneira humanizada começa com a infraestrutura de um hospital, que deixará ou não o usuário satisfeito com a assistência prestada. Dessa infraestrutura fazem parte as condições de oferta da assistência, que envolvem tanto a quantidade e qualidade dos recursos humanos quanto materiais, e, em vista disso, observa‑se que, em algumas situações, é o usuário que precisa supri‑las para garantir a continuidade do tratamento. Quando transferimos para o paciente e para o familiar a responsabilidadede suprir materiais, por exemplo, para a continuidade do tratamento, a condição de humanizar o atendimento exigirá muito mais do papel acolhedor do funcionário. 5.3.3 As particularidades humanas na atenção à saúde Diante do cuidado do ser humano como um ser singular e integral, o desafio dos profissionais de saúde é no sentido de compreender a dimensão física, psíquica, social e espiritual, com compromisso e responsabilidade para com a vida em diferentes condições. Para que o indivíduo se sinta respeitado na sua dignidade e na sua particularidade, as ações baseadas nesses conceitos devem ultrapassar aquelas do cuidado técnico e prescritivo. O respeito, a dignidade e a cidadania começam com o compromisso e a valorização do ser humano como um todo, sem distinção de raça, cor, etnia, o que favorece um vínculo entre ambos, cuidador e ser cuidado. A humanização, diante dessas considerações, quando focada em um atendimento diferenciado, manterá a dignidade das pessoas em situações de cuidados ou atenção. Dessa forma, devemos propor ações que valorizem e qualifiquem a prestação de serviços de saúde, pois o conjunto de valores humanos e éticos criará condições para o aumento da credibilidade desses serviços, visto que a qualidade da assistência prestada será maior. Ao compreendermos o significado da proposta de humanização e destacarmos nossas atitudes por respeito à singularidade humana, incluindo não somente atribuições técnicas do profissional, mas também a capacidade de compreender o usuário como ser humano, com seus valores, crenças, desejos e perspectivas, conseguimos efetivar o cuidado no seu sentido mais humanizado, que se dá pelo processo 92 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III de aliviar o sofrimento do outro durante todas as fases da sua vida, seja a fase de tratamento, de reabilitação ou de cuidados paliativos. Todo ser humano tem o direito de ser cuidado com dignidade e de ter a garantia de que todas as suas necessidades básicas serão contempladas, como as de alimentação, eliminação e sono, e, em todas essas, deve ter assegurado o conforto para minimizar qualquer grau de sofrimento. Por isso, é importante apropriar‑se das necessidades – que são individuais – dos pacientes, para que sua tarefa de cuidado o valorize com a sua individualidade. A humanização pressupõe atitudes, valores e comportamentos que podem ser traduzidos em palavras simples, como “bom dia”, “obrigado” e “posso ajudar?”, e também o reconhecimento sincero por uma ação desenvolvida. Humanizar significa permitir que a nossa emoção se manifeste nas relações de trabalho; é favorecer a recuperação da comunicação, da integração e da participação entre a equipe de profissionais de saúde e o usuário. Essa condição irá aliar a competência técnica à emoção do profissional, manifestando uma relação de trabalho baseada na solidariedade, no respeito, no diálogo, na preocupação com o outro e na promoção de relações efetivas entre a equipe de saúde, considerando o paciente como a razão de ser e fazer. É a preocupação com o cuidado em todas as suas dimensões. Percebe‑se que o cuidado deve ser permeado pelo respeito ao outro, considerando suas limitações e necessidades. O comprometimento sensível deve ser valorizado eticamente, na compreensão do outro e na percepção do “eu” e da maneira como se cuida, como ser único, amoroso e ilimitado. Os profissionais de saúde têm consciência do seu compromisso como cuidadores e promotores da vida e da saúde. Entretanto, somente compreender e favorecer o cuidado humano não é suficiente, permanece a necessidade de reconhecer os sentimentos e trabalhar na possibilidade de novas perspectivas dessa realidade – tarefas fundamentais a serem observadas e seguidas pelos profissionais de saúde. Deve‑se compreender que não basta amenizar os sinais e sintomas do momento, mas ir além do instituído e consagrado. Ou seja, saber desvelar‑se e colocar‑se junto do usuário, sendo profissional, não “fazendo de conta”. O paciente tem de ser compreendido como único e singular, com potencialidades e fragilidades que devem ser avaliadas com comprometimento e conhecimento técnico e científico pelos profissionais de saúde. Estes estão desempenhando uma função significativa no ambiente do cuidado, promovendo ambientes dignos e humanos, comprometidos com a vida do ser humano, pela valorização das relações e interações subjetivas. O acesso e o acolhimento são imprescindíveis para o atendimento em saúde. Porém, a realidade ainda é precária, na maioria dos serviços, pois apresenta, por exemplo, áreas físicas inadequadas, materiais insuficientes, falta de equipamentos para atender as necessidades dos usuários, além de recursos humanos insuficientes e despreparados para a realidade da clientela do serviço. 93 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar 5.3.4 Diálogo e acolhimento como possibilidades interativas Nos processos de trabalho de uma instituição de saúde, a valorização do cliente deve começar oferecendo um acolhimento com diálogo aberto entre usuários e trabalhadores. Nesse momento, é importante que o funcionário tenha qualificação e capacitação para identificar os motivos que não estarão explicitados nas queixas do paciente. Para a identificação desses contextos, será importante que, com o uso de ferramentas de escuta qualificada, se consiga valorizar a queixa do paciente. É fundamental que a comunicação com o usuário atinja essa valorização. Por meio de um diálogo adequado, o funcionário que acolher o paciente deve ter condições de identificar quais condições de vida fizeram com que ele apresentasse as queixas pontuais naquele momento, associadas ao meio ambiente em que ele vive. Apenas dessa forma será será possível perceber as fragilidades do paciente e conseguir solucionar os seus problemas. A humanização, como já discutido em outros momentos, tem no respeito aos direitos, na seriedade e na qualidade de prestação de serviços ao cliente os princípios para que a privacidade do paciente e o sigilo profissional sejam mantidos. Quando essas diretrizes são respeitadas pela gestão da instituição, é possível ver que nesse ambiente adota‑se como filosofia organizacional a valorização do capital humano. Ao oferecermos dignidade, solidariedade e acolhimento por todos os trabalhadores de uma instituição de saúde, e não apenas pelos profissionais que fazem o atendimento clínico direto ao paciente, mostramos como a cidadania é respeitada. Ainda no que diz respeito a essa condição, o trabalhador, percebendo que a sua satisfação de cuidar é resgatada na prática diária, tem a sua valorização técnica e pessoal priorizada. Quando o funcionário entende e tem valorizado o seu lado acolhedor, ele percebe qual a condição que o paciente está vivendo naquele momento de vulnerabilidade e desconhecimento. Esse acolhimento deve ser entendido, então, como uma postura pessoal, e não profissional, já que para um atendimento acolhedor não se coloca em prática conhecimentos técnicos, mas sim as nossas habilidades sensíveis sobre o ouvir as angústias e demandas do outro. Assim, o acolhimento é algo que deve ser realizado por todos os profissionais da instituição, independentemente de esse profissional ser o que vai atender aquela demanda ou não. É nesse ambiente acolhedor que o paciente consegue criar o vínculo necessário para ter a confiança de que poderá expor a sua necessidade e de que haverá um posicionamento da equipe em ajudá‑lo a tomar as melhores decisões e, dessa forma, transformar o momento de angústia em um momento de esperança. 5.4 Pesquisas de satisfação Utilizar a avaliação do nosso clientede forma a identificar as necessidades de mudanças e/ ou melhorias do nosso atendimento é um dos objetivos que devem ser alcançados em pesquisas de satisfação do cliente. O consumidor hoje tem um perfil muito mais exigente e conhecedor dos seus 94 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III direitos, principalmente pela facilidade de informações disponíveis na sociedade e também por se sentir protegido por legislação específica de proteção a ele como consumidor. O cliente hospitalar se vê como consumidor de um serviço que deve garantir que a sua demanda será atendida e que não lhe fará sair do hospital com outro problema além daquele com o qual entrou. Assim, quando iniciamos uma política de pesquisa de satisfação do cliente, é preciso ter a consciência de que algumas convergências surgirão sobre os conceitos dos gestores, dos trabalhadores e dos usuários em relação à qualidade de atendimento à saúde. A Organização Mundial da Saúde, em 2000, fez uma mudança de olhar sobre os conceitos de satisfação utilizados em pesquisas. Nos serviços de saúde, o objetivo não deveria ser apenas buscar entender que um atendimento satisfatório era aquele relacionado ao contexto médico‑paciente, mas sim ver a necessidade de se fazer uma avaliação sobre todos os aspectos dentro da instituição em que o paciente tenha ficado, inclusive os não médicos. Por isso, existe a necessidade da avaliação de um conceito de responsividade. Com a mudança do paradigma constituído pela ideia de que a satisfação se dá apenas pela resolução do problema, entende‑se agora que ela está relacionada a uma metodologia que identifique a forma e o ambiente em que esse problema é relacionado. Esse conjunto de condições dará, então, a expressividade do conceito de humanização esperado, que leva em consideração a individualidade de cada paciente. A evolução da avaliação da qualidade e da assistência à saúde traz como implicações a correta identificação das necessidades avaliadas pelos clientes sobre as mudanças a serem feitas nos processos de trabalho da instituição, de forma que valores individuais e de cidadania sejam respeitados e observados como uma forma de melhoria no acesso à saúde de qualidade. Os conceitos de qualidade em saúde foram inseridos no contexto hospitalar primeiramente por Avedis Donabedian, um pediatra armênio erradicado nos EUA, que identificou que a qualidade sofre influência de três condições que são complementares, mas ao mesmo tempo independentes: a avaliação da qualidade prestada, a avaliação do médico e a avaliação da sociedade. Quando o elemento sociedade é inserido nesse contexto de avaliação, o paciente passa a ser entendido como um elo essencial dele, por não poder ser mais ignorado, e sim muito mais valorizado para o entendimento dos processos e resultados do serviço de saúde. Observação Não podemos nos esquecer da tríade da qualidade de Donabedian, que foi absorvida da Teoria de Sistemas: o controle da qualidade sempre estará associado à avaliação do processo, da estrutura e do resultado. 95 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Com a inserção da “satisfação do usuário”, passam‑se a denominar as pesquisas de satisfação como um conjunto amplo e heterogêneo, de forma a identificar a opinião dos clientes de serviços de um modo geral, sejam eles públicos ou privados. As dimensões avaliadas nessas pesquisas envolvem desde o cuidado à saúde e a relação médico‑paciente até a qualidade das instalações do serviço, passando pela qualidade técnica dos profissionais de saúde. Como já discutido, nos últimos anos, com a valorização da pessoa como cidadã, outros termos passaram a ser usados, paralelamente aos de paciente e usuário: consumidor e cliente. A ideia é defender que o termo consumidor confere maior dignidade ao relacionamento profissional‑paciente, ao contrário do tradicional termo paciente, que estaria associado à falta de poder e dependência em relação ao médico. Essa mudança de conceitos acontece em um momento político‑cultural de crítica às relações de poder manifestadas na linguagem, como “a relação médico‑paciente”, expressão em que se identifica uma relação de poder do primeiro termo (médico) e de subordinação do segundo termo (paciente). Com o amadurecimento dos movimentos de consumidores e usuários dos serviços, em especial os públicos, exigindo melhores produtos e atendimento, coloca‑se na agenda o empowerment dos sujeitos – entre os quais se encontram agora os “pacientes”. Estes passam, então, a ter também “empoderamento” sobre as tomadas de decisão. saiba mais Para complementar suas referências, é possível encontrar diversos documentos oficiais sobre os trabalhos de humanização com o usuário e o trabalhador. Entre no site a seguir e escolha a sua melhor leitura: <http://bvsms.saude.gov.br>. Recomendamos clicar na área temática Humanização. 6 hUmanizaçãO nO ambiente de trabalhO 6.1 definição de ambiente e trabalho Para iniciarmos nossa discussão sobre a necessidade de humanização no ambiente de trabalho, em primeiro lugar, precisamos discutir a definição desses termos. Definir trabalho não é uma tarefa simples, pois para cada pessoa ele pode ter um significado pontual, além de se dividir em diversas categorias. Essa palavra é originária do latim tripalium e sempre esteve associada a fardo, punição. 96 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III A associação da palavra trabalho a algo inferior surgiu há muito tempo, na época de Platão e Aristóteles, período em que já se tinha ideia de que o trabalho vinha sempre em primeiro lugar, antes de atividades de lazer, e por isso impedia os homens de possuírem virtudes. Ele também sempre esteve associado à necessidade de uma fonte de renda para garantir que todo homem tenha condições de se manter no grupo com o qual convive – família, amigos, sociedade. O trabalho passa a adquirir novo conceito quando começa a ser entendido como um conjunto de ações que trazem à pessoa uma realização naquilo que se está desenvolvendo. A partir daí, podemos discutir um pouco o conceito de emprego, que, diferente do de trabalho, passa a ser entendido como uma relação entre a pessoa e a organização de uma tarefa, e por conta da realização desta passa a receber um determinado honorário. Até a Revolução Industrial, o trabalho sempre foi visto como uma necessidade para que houvesse uma fonte de renda para subsistência humana; após esse momento, o trabalho começa a ser entendido como uma possibilidade de fonte de riqueza, e não apenas de subsistência. Começa‑se a pensar que o labor pode ser negociado – vendido ou trocado. Entretanto, esses novos conceitos passam a mostrar algumas situações que podem ser vistas como catastróficas. Os capitalistas, entendendo que o produto da força de trabalho é algo comprado, começam a utilizar‑se desse produto em seu benefício para a ampliação de seus lucros. Assim, o trabalhador, com esse novo modelo de produção e organização da sociedade – mais capitalista – começa a encontrar‑se em uma situação de desestrutura familiar, social e psicológica, pois, para que haja um aumento nos lucros das empresas, as condições de trabalho passam a ficar mais precárias, privando até mesmo os trabalhadores de alguns direitos. O gestor vê o trabalhador como algo que pode ser trocado e, portanto, pode ser comprado e vendido. Com isso, passamos a enxergar a manutenção da estrutura familiar associada ao trabalho de todos – homem, mulher e filhos –, com uma característica de administração de jornada de trabalho extensa(muitas vezes com mais de 18 horas de expediente), baixos salários e condições precárias no ambiente de produção. Nessas condições, não tardam muito a surgir problemas geradores de stress e da sobrecarga física, emocional e psicológica, além da insatisfação pessoal e quase nenhuma motivação. Esse modelo da sociedade industrial fica muito mais intensificado com o advento da Administração Científica, que dá ênfase à tarefa realizada, e, posteriormente, com o surgimento da Teoria Clássica, que dá prioridade à estrutura organizacional. Somente a partir de 1930, com o surgimento da Teoria das Relações Humanas, as organizações passam a colocar as pessoas e o seu convívio pessoal como objetivos organizacionais, que antes eram apenas técnicos e mecanicistas. Assim, passam a dar valor às características psicológicas e sociológicas, como podemos observar no quadro seguinte: 97 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Quadro 4 – Abordagem clássica e abordagem humanística da Administração Teoria Clássica Teoria das Relações Humanas Trata a organização como máquina Trata a organização como um grupo de pessoas Enfatiza as tarefas ou tecnologia Enfatiza as pessoas Inspirada em sistema de engenharia Inspirada em sistemas de psicologia Autoridade centralizada Delegação de autoridade Linhas claras de autoridade Autonomia do empregado Especialização e competência técnica Confiança e abertura Acentuada divisão de trabalho Ênfase nas relações entre as pessoas Confiança nas regras e nos regulamentos Confiança nas pessoas Clara separação entre linha e staff Dinâmica grupal e interpessoal Fonte: Chiavenato (2011, p. 107). É a partir da evolução das teorias humanísticas, ao longo do século XX, que se chega à preocupação em manter a qualidade de vida do empregado, com ações preventivas e participativas dentro e fora da empresa. 6.2 qualidade de vida Com o avanço dos modelos administrativos e a necessidade de todas as empresas, de qualquer ramo de atividade, em se adequar às demandas do mercado, percebemos que os profissionais de todas as áreas estão trabalhando cada vez mais, para produzir cada vez mais. Em alguns setores, percebe‑se que as pessoas estão trabalhando o dobro para produzir o triplo. Isso faz com que as pessoas cheguem ao final de semana com a sensação de não terem cumprido todas as suas tarefas, além da queixa principal de não conseguirem conciliar adequadamente a sua vida profissional com a pessoal e familiar. Atualmente, há muitas formas de entender o que é qualidade de vida no trabalho: podemos começar com a ideia de ausência de doenças da pessoa, até a satisfação da necessidade de recursos que possa atingir as demandas profissionais. Assim, podemos entender que o conceito de qualidade de vida no trabalho pode ser um conjunto de ações de uma instituição que busca fazer o diagnóstico e, posteriormente, a implantação de melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais dentro do ambiente de trabalho e, por que não, fora dele também, buscando, assim, a satisfação do desenvolvimento do trabalho pela equipe (ALBUQUERQUE; FRANÇA, 1998 apud ROCHA, 2012). Dessa forma, é comum falarmos sobre a necessidade de uma visão holística do ser humano, que concebe o indivíduo como sendo o seu corpo, que revela condições de vida e marcas das experiências vividas e desejadas. Segundo dados da OIT de 2013, as doenças profissionais representam um enorme custo – para os trabalhadores e suas famílias, bem como para o desenvolvimento econômico e social. A OIT estima que os 98 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III acidentes de trabalho e doenças resultam em uma perda de 4% do produto interno bruto (PIB) mundial, ou cerca de 2,8 trilhões de dólares, em custos diretos e indiretos por lesões e doenças (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2013). Ainda de acordo com a OIT, encontramos as seguintes estatísticas mundiais: Segurança e saúde no trabalho: • 2,02 milhões de pessoas morrem a cada ano devido a enfermidades relacionadas com o trabalho. • 321.000 pessoas morrem a cada ano como consequência de acidentes no trabalho. • 160 milhões de pessoas sofrem de doenças não letais relacionadas com o trabalho. • 317 milhões de acidentes laborais não mortais ocorrem a cada ano. Isto significa que: • A cada 15 segundos, um trabalhador morre de acidentes ou doenças relacionadas com o trabalho. • A cada 15 segundos, 115 trabalhadores sofrem um acidente laboral (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2013a). saiba mais Recomendamos a seguinte leitura: ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT). A prevenção das doenças profissionais. 2013. Disponível em: <http://www.oitbrasil. org.br/sites/default/files/topic/gender/doc/safeday2013%20final_1012. pdf>. Acesso em: 12 jan. 2014. Com esse cenário, o que as empresas devem fazer para melhorar a condição de trabalho de seus funcionários? É preciso garantir condições para que se consiga reter os talentos na empresa. Hoje, principalmente para os executivos, o equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal é o segundo motivo para se permanecer em uma empresa. E quando as empresas não oferecem condições para que haja esse equilíbrio, os funcionários sempre buscam um “plano B” para garantir, principalmente, a sua qualidade de vida. 99 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Em geral, sempre houve uma supervalorização do funcionário que trabalha excessivamente, extrapola os seus horários e abrevia o seu período de férias. Ele, muitas vezes, é considerado o funcionário mais produtivo da empresa. Esse modelo é o que chamamos de workaholics – pessoas muito produtivas, competitivas, eficazes, que vivem para a empresa. Porém, esses profissionais ao longo do tempo, começam quase sempre a apresentar algum tipo de distúrbio grave na sua saúde, associada sempre a essa sobrecarga de trabalho. Assim, é preciso que o gestor consiga diferenciar o profissional que está sendo produtivo daquele que está sendo compulsivo. Percebemos, então, que a qualidade de vida no trabalho vem ganhando expressão cada vez maior no cenário empresarial brasileiro dentro da estratégia de gestão de pessoas. A qualidade de vida no trabalho (QVT) não deve ser entendida apenas como a prevenção de doenças relacionadas ao trabalho, mas também como o comprometimento da empresa em conscientizar o profissional de que ele deve buscar meios de vida que possam proporcionar‑lhe a conciliação entre a carreira e uma vida saudável; esta deve ser baseada em relacionamentos estáveis e conquistas de objetos individuais. O fato é que, por meio de melhorias das condições de trabalho, que fazem parte do escopo dos programas de QVT, os resultados obtidos podem alcançar os objetivos empresariais, auxiliando a organização a enfrentar o ambiente competitivo e a comprometer as pessoas com o negócio da empresa. O desafio da QVT é aprofundar o reconhecimento da dimensão essencial do compromisso do ser humano com as organizações e gerar melhores condições de vida. Na nossa Carta Magna de 1988, o caput do artigo 225 prevê que: “todos têm direito ao ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (BRASIL, 1988a). Nesse contexto, devemos entender como meio ambiente o que está definido na Lei nº 6.938/81, em seu artigo 3º, inciso I: “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”(BRASIL, 1981b). 6.3 Psicologia do trabalho A psicologia do trabalho é o estudo do comportamento humano no processo de produção, distribuição e consumo de bens e serviços. Ela deverá contar com a aplicação de conceitos sobre: psicologia de pessoal, ergonomia, comportamento do consumidor e comportamento organizacional. Os objetivos da psicologia do trabalho são: • responder as necessidades psicológicas e sociais do trabalhador (qualidade de vida); • promover o desenvolvimento profissional do trabalhador; • contribuir para o aumento da produtividade. 100 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III O enfoque da psicologia do trabalho levará em consideração as seguintes diretrizes: • consciência; • crescimento por meio da competência; • contingência; • produtividade; • consciência sistêmica; • consciência ecológica; • não ser paternalista; • “ensinar a pescar, e não dar o peixe”. A psicologia do trabalho deve ter como premissas básicas a consideração de que os indivíduos são diferentes, que cada pessoa é um todo e que todo comportamento é motivado, além de pensar sobre a forma pela qual devemos valorizar as pessoas (garantindo a sua dignidade). Para tanto, devemos lembrar que a organização, ou instituição, é um sistema social e que deve ter como objetivo final o interesse mútuo. Assim, quando discutimos qualidade de vida no trabalho precisamos ter em mente que existirão conflitos entre ideias diferentes, já que todos fazem parte de um processo de pensar e executar. Para que o nosso funcionário, ou colaborador, perceba e sinta que tem uma qualidade de vida no trabalho adequada, precisamos sempre dar‑lhe um feedback o mais rápido possível diante de situações positivas e negativas, para que todos tenham orgulho de fazer parte da empresa. Considerando, então, que a economia globalizada exerce contínua pressão, exigindo das pessoas grande capacidade de adaptação dentro das empresas, o gerenciamento da qualidade de vida no trabalho ocorrerá por meio da implantação de programas organizacionais e do estímulo a ações individuais voltadas a um estilo de vida que permita viver mais e melhor. Na busca por uma vida melhor, é importante saber identificar as tensões geradas pelas pressões e cobranças internas, os níveis de estresse que ocasionam sintomas e doenças, bem como os estilos limitadores do bem‑estar. 6.4 qualidade de vida no trabalho – conceitos Como dito anteriormente, podemos definir como qualidade de vida no trabalho (QVT) um conjunto de ações de uma empresa no sentido de implantar melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais no ambiente de trabalho (ALBUQUERQUE; FRANÇA, 1998 apud ROCHA, 2012). 101 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar A qualidade de vida do indivíduo será influenciada pelo seu estilo de viver, que está condicionado à integração das necessidades individuais, familiares e profissionais de cada um. Nossa sociedade apresenta, hoje, novos modelos de modos de vida dentro e fora das empresas e, dessa forma, diversas áreas das ciências vêm acrescentado contribuições específicas, destacando‑se: • Saúde: é a ciência que busca preservar a integridade física e mental do homem, e não apenas trabalhar com o conceito de controle de doenças, gerando, assim, maiores possibilidades de aumento da expectativa de vida. • Ecologia: integra o homem e o entende como responsável pela preservação do ecossistema. • Ergonomia: estuda as condições de trabalho ligadas a quem executa. Tem como fundamento garantir o conforto durante a operação da ação e segue preceitos básicos ligados à medicina, à psicologia, à motricidade e à tecnologia industrial. • Psicologia: demonstrará a influência das atitudes de cada pessoa em seu ambiente de trabalho, bem como as perspectivas de vida e a importância do significado das necessidades de cada um para o envolvimento com o trabalho. • Sociologia: identifica como resgatar o que deve ser compartilhado e construído socialmente, demonstrando as consequências de cada ação realizada pelo que influencia e o que é influenciado dentro do conceito de cultura organizacional da instituição. • Economia: é a ciência que vai enfatizar a consciência de que os bens, recursos e serviços são finitos e estuda como envolver a equipe para a utilização equilibrada e com responsabilidade. • Administração: procura aumentar a capacidade de utilizar de forma mais adequada os recursos para que os objetivos sejam alcançados. • Engenharia: elabora, de maneira a flexibilizar a manufatura, melhorias no armazenamento dos materiais e estuda como utilizar a tecnologia e de que forma organizar e controlar os processos de trabalho. As contribuições dessas ciências facilitam a identificação de duas situações específicas na gestão da qualidade de vida no trabalho: a primeira refere‑se ao nível individual, caracterizado pelo aprofundamento da compreensão a respeito do stress e de doenças associadas às condições do ambiente de trabalho; a segunda refere‑se ao nível organizacional, a expansão do conceito de qualidade total, que procura não apenas restringir‑se aos processos e procedimentos da empresa, mas também incluir a preocupação com aspectos comportamentais e de satisfação das expectativas de cada um, buscando a realização dos objetivos da empresa. O termo qualidade de vida no trabalho (QVT) surgiu pela primeira vez na década de 1970, por meio do desenvolvimento de um projeto de desenho de cargos – a qualidade de vida como uma maneira de 102 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III propor o bem‑estar geral dentro da organização e a saúde dos colaboradores no desempenho de suas tarefas. Cronologicamente, a partir de 1973, surgem vários autores que conceituam a QVT sob diversas óticas, que trouxeram consideráveis contribuições à disseminação dessa abordagem. Em uma concepção mais moderna, houve uma definição de QVT mais subjetiva, porém muito enfática, afirmando os pontos favoráveis e desfavoráveis de um ambiente de trabalho para as pessoas. A proposta era desenvolver ambientes de trabalho que fossem bons para as pessoas como a saúde econômica para a empresa. De acordo com esse conceito, podemos entender que a qualidade de vida no trabalho é alcançada a partir da iniciativa empresarial em implantar ações que promovam ou melhorem o ambiente de trabalho em diversos segmentos: saúde, ergonomia, responsabilidade ambiental, responsabilidade social e psicologia, sem os quais o trabalho torna‑se oneroso e improdutivo. Na busca pelo alcance dos objetivos nesses segmentos, a QVT divide‑se em duas posições: o funcionário que reivindica o bem‑estar e o prazer nas atividades, sobretudo a promoção da saúde como um critério básico para a execução do trabalho, e o interesse dos gestores e líderes da organização em associar esses benefícios a ganhos estratégicos em produtividade e qualidade. As organizações procuram sempre por medidas que tragam um diferencial competitivo para o produto que ofertam, investindo em meios de produção tecnologicamente avançados e processos produtivos mais rápidos. Com isso, a necessidade de investir em pessoas dentro da organização tem se tornado fundamental. A adequada condição de trabalho é essencial para a manutenção da produtividade da empresa, por isso, é de responsabilidade do gestor criar um local em que as pessoas se sintam bem, com condições de desenvolver seu trabalho adequadamente. A QVT tem sido utilizada como indicador das experiências humanas no local de trabalho e do grau de satisfação daspessoas que desempenham o trabalho. O conceito de QVT implica profundo respeito pelas pessoas. Para alcançar níveis elevados de qualidade e produtividade, as organizações precisam de pessoas motivadas, que participem ativamente nos trabalhos que executam e que sejam adequadamente recompensadas pelas suas contribuições. A competitividade organizacional, a qualidade e a produtividade passam obrigatoriamente pela QVT. Para atender bem o cliente externo, as organizações não devem se esquecer de seu cliente interno. Isso significa que, para satisfazer os clientes que compram os seus serviços ou produtos, é imprescindível que os seus colaboradores, que são os responsáveis pelo produto ou serviço oferecido, percebam a importância do seu papel dentro da empresa, a partir do momento em que são motivados por se sentirem valorizados. Observação Pensamento do consultor dinamarquês Claus Möller: coloque seus empregados em primeiro lugar e eles porão os consumidores em primeiro lugar (CHIAVENATO, 2004). 103 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar A organização que investe diretamente no colaborador está, na realidade, investindo indiretamente no cliente. Assim, a gestão da qualidade total está direta e fundamentalmente ligada à otimização do potencial humano. E isso depende de as pessoas se sentirem bem trabalhando na organização. A QVT representa o grau em que os membros da organização são capazes de satisfazer suas necessidades pessoais através de seu trabalho na organização. A QVT envolve uma constelação de fatores: • A satisfação com o trabalho executado. • As possibilidades de futuro na organização. • O reconhecimento pelos resultados alcançados. • O salário percebido. • Os benefícios auferidos. • O relacionamento humano dentro da equipe e da organização. • O ambiente psicológico e físico de trabalho. • A liberdade de atuar e responsabilidade de tomar decisões. • As possibilidades de estar engajado e de participar ativamente (MATO..., 2014). A QVT afeta atitudes e comportamentos relevantes para a produtividade individual e de grupo, tais como: motivação para o trabalho, criatividade e vontade de inovar ou aceitar mudanças e, principalmente, capacidade de agregar valor à organização. O desempenho no cargo e o clima organizacional representam fatores importantes na determinação da QVT. Se a qualidade do trabalho for pobre, conduzirá à alienação do empregado, à insatisfação, à má vontade, ao declínio da produtividade e a comportamentos contraproducentes (como faltas, rotatividade, sabotagem). Qualidade de vida elevada conduz a um clima de confiança e respeito mútuo, no qual as pessoas tendem a aumentar suas contribuições e a elevar suas oportunidades de êxito psicológico enquanto a administração tende a reduzir mecanismos rígidos de controle social. Por outro lado, a importância das necessidades humanas varia conforme a cultura de cada indivíduo e de cada organização. Portanto, a QVT não é determinada apenas pelas características individuais ou situacionais, mas, sobretudo, pela atuação sistêmica dessas características individuais e organizacionais. Por essa razão, vários autores apresentam modelos de QVT. 104 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III Os três modelos mais importantes de QVT são os de Nadler e Lawler, de Hackman e Oldham e o de Walton. Para Nadler e Lawler, a QVT está fundamentada em quatro aspectos: 1) Participação dos colaboradores nas decisões. 2) Reestruturação do trabalho por meio do enriquecimento de tarefas e de grupos autônomos de trabalho. 3) Inovação no sistema de recompensas para influenciar o clima organizacional. 4) Melhoria no ambiente de trabalho quanto a condições físicas e psicológicas, horário de trabalho etc. (NADLER; LAWLER, 1983 apud CHIAVENATO, 2010, p. 488). Hackman e Oldham apresentam um modelo de QVT ligado ao desenho de cargos. Para eles, as dimensões do cargo produzem estados psicológicos críticos que conduzem a resultados pessoais e de trabalho que afetam a QVT. As dimensões de cargo são: • Variedade de habilidades: o cargo deve requerer várias e diferentes habilidades, conhecimentos e competências da pessoa. • Identidade da tarefa: o trabalho deve ser realizado do início até o fim para que a pessoa possa perceber que produz um resultado palpável. • Significado da tarefa: a pessoa deve ter uma clara percepção de como o seu trabalho produz consequências e impactos sobre o trabalho das outras. • Autonomia: a pessoa deve ter responsabilidade pessoal para planejar e executar as tarefas, autonomia própria e independência para desempenhá‑la. • Retroação do próprio trabalho: a tarefa deve proporcionar informação de retorno à pessoa para que ela própria possa autoavaliar seu desempenho. • Retroação extrínseca: deve haver o retorno proporcionado pelos superiores hierárquicos ou clientes a respeito do desempenho na tarefa. • Inter‑relacionamento: a tarefa deve possibilitar contato interpessoal do ocupante com outras pessoas ou com clientes internos e externos (HACKMAN; OLDHAM, 1975 apud CHIAVENATO, 2010, p. 489). 105 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Segundo o modelo de Walton, existem oito fatores que afetam a QVT e possuem respectivas dimensões, conforme representados no quadro a seguir: Quadro 5 Fatores de QVT Dimensões 1. Compensação justa e adequada • Renda adequada ao trabalho. • Equidade interna. • Equidade externa. 2. Condições de segurança e saúde no trabalho • Jornada de trabalho. • Ambiente físico (seguro e saudável). 3. Utilização e desenvolvimento de capacidades • Autonomia. • Significado da tarefa. • Identidade da tarefa. • Variedade de habilidades. • Retroação e retroinformação. 4. Oportunidades de crescimento e segurança • Possibilidade de carreira. • Crescimento profissional. • Segurança do emprego. 5. Integração social na organização • Igualdade de oportunidades. • Relacionamentos interpessoais e grupais. • Senso comunitário. 6. Garantias constitucionais • Respeito às leis e direitos trabalhistas. • Privacidade pessoal. • Liberdade de expressão. • Normas e rotinas claras da organização. 7. Trabalho e espaço total de vida • Papel balanceado do trabalho na vida pessoal. 8. Relevância social no trabalho • Imagem da empresa. • Responsabilidade social pelos produtos/serviços. • Responsabilidade social pelos empregados. Fonte: Walton (1973 apud CHIAVENATO, 2010, p. 491). Quando olhamos a QVT sob um conceito mais amplo, entendemos que ela constitui uma dosagem perfeita da aglutinação entre os talentos envolvidos e empoderados com a estrutura da empresa: o modo como se dá o trabalho em equipe, uma cultura organizacional amigável e envolvente e um estilo de gestão democrático e participativo. Também podemos salientar que a QVT parte do reconhecimento de que uma pessoa bem treinada e bem posicionada na empresa está em melhor condição de identificar problemas dificilmente localizáveis com relação à qualidade do produto ou ao modo como o trabalho deve ser feito. Assim, a QVT é essencial na criação de um espírito de cidadania organizacional, como nos programas de qualidade total nas organizações. Para tanto, é preciso entender a necessidade de implantação de programas de bem‑estar dos colaboradores. 106 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III 6.5 Gerenciandoo stress O stress pode ser definido como um estado de tensão do organismo em uma situação de pressão que gera diversos estados de ansiedade. Na nossa vida devemos levar em conta que níveis toleráveis de stress podem ser benéficos, estimulando as atividades; chamamos isso de eustresse. Porém, quando esses níveis se tornam nocivos pelas condições de trabalho, isso poderá gerar outros distúrbios psicossomáticos e é o que chamamos de distresse. Por isso, precisamos gerenciar os níveis de stress. Cada pessoa é um ser único de dimensão biológica, psicológica e social. O comportamento das pessoas apresenta variadas combinações e intensidades nessas três dimensões e pode ser mais acentuado em uma delas, embora todas sejam transdependentes. As diversas situações pelas quais passamos ao longo de nossas vidas geram respostas voltadas para a busca de uma melhor adaptação ao ambiente. Observação Nada é só psicológico ou só biológico, é sempre um conjunto de respostas que sinalizam o sofrimento, que deve ser diagnosticado e tratado. Quando queremos melhorar a qualidade de vida de nossa equipe, precisamos ter liderança para engajá‑la e envolvê‑la em um processo de mudança planejada, com inovação, foco nos resultados e geração de valores para chegarmos à satisfação do cliente com uma prestação de serviços com excelência. Para que nossa equipe pense em aceitar novos e maiores desafios, faz‑se necessária uma política de gestão que dê valor à educação permanente, que por consequência levará à melhoria da qualidade de vida no trabalho. Para a ocorrência do stress, precisamos de dois componentes básicos: a exigência e a capacidade. No contexto do trabalho, essa abordagem busca a ética da condição humana, em que são identificados, eliminados, controlados e neutralizados os riscos ocupacionais que podem ser observados no ambiente físico, bem como as relações de trabalho, além das cargas física e mental que são exigidas para cada atividade. Também é levado em consideração quais são as implicações políticas e ideológicas da empresa, como se dá a dinâmica da liderança e qual o significado do relacionamento e da satisfação no trabalho. Após essa reflexão inicial, é preciso lembrar que qualidade de vida tem um significado próprio, varia de pessoa para pessoa e tende a mudar ao longo da vida. Alguns fatores são determinantes para o conceito de qualidade de vida durante cada fase do ser humano: estado de saúde, satisfação com o trabalho e com a sua remuneração, relações familiares, condições de lazer, disposição e espiritualidade. Assim, por onde devemos começar para melhorarmos a qualidade de vida no trabalho? Precisamos sempre levar em consideração que cada pessoa é um ser único, que não pode ser repartido e cujo complexo biopsicossocial tem potencialidades que estão diretamente ligadas à sua condição de vida. 107 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar Com a globalização e o mundo competitivo, as empresas vivem e buscam resultados de forma cada vez mais desafiadora. Isso exige dos trabalhadores uma maior capacidade de suportar cobranças, além de adaptação ao ambiente que está sob constante pressão. Dessa forma, as empresas percebem a necessidade de investir em programas que melhorem a QVT, buscando favorecer o bem‑estar dos trabalhadores e focando nos resultados. Pesquisadores mostram, hoje, uma preocupação com a relação entre o trabalho e o bem‑estar do trabalhador. E o destaque das pesquisas vem na prevenção, como desenvolver e construir um ambiente que seja adequado para a produtividade das pessoas bem como a realização dessa construção. Dessa forma, a qualidade de vida no trabalho deve ser entendida como um trabalho constante entre o indivíduo e a organização; na busca pela excelência, a QVT deve ser trabalhada dentro do ambiente organizacional, para sanar os conflitos, oferecer capacitação, incentivar a competência e a motivação pessoal e valorizar o capital humano. 6.5.1 Ambiente organizacional O ambiente organizacional é constituído pela parte física – instalações, móveis, decoração etc. – e pela parte social da empresa – as pessoas que lá trabalham. Assim, não pode haver uma equipe que tenha que atingir bons resultados se ela não tiver condições e comodidades para atender as suas necessidades básicas. Portanto, acredita‑se que quanto melhor e mais bem atendidas as necessidades, melhor será o desempenho da equipe. 6.5.2 Conflitos no ambiente de trabalho Os conflitos estarão sempre presentes em qualquer relação de trabalho e eles podem ocorrer a qualquer momento, para isso, basta que um grupo de pessoas esteja reunido. Os conflitos fazem parte do nosso cotidiano e também precisam ser trabalhados sobre o foco da QVT. Quando eles não são administrados, podem colocar em risco a produtividade e trazer prejuízos para a organização. Porém, quando bem administrados, podem ser utilizados como um momento de crescimento e amadurecimento da equipe, já que poderão produzir debates e troca de ideias e experiências. 6.5.3 Capacitação profissional Possuir capacitação significa estar preparado para enfrentar as situações inerentes à sua função. Para tal, deverá ser realizada a aplicação de conhecimentos, para que a pessoa capacitada possa criar, resolver adversidades, dar sugestões e criar o seu ambiente adequado ao trabalho. Capacitar quer dizer dar autonomia, portanto, é muito mais do que treinar, pois, quando treinamos, sugerimos o desenvolvimento de uma habilidade específica, e, quando capacitamos, criamos autoconfiança e promovemos o progresso. 6.5.4 Competências profissionais A competência é um produto resultante de conhecimento, habilidade e atitude. Portanto, não podemos achar que gerar competência é apenas transmitir informações. Muito mais do que isso: uma 108 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III pessoa competente coloca em ação suas qualidades que, aliadas a uma base teórica, conseguem atingir resultados em tempo hábil e com esforço compatível. Portanto, competência não se transmite. O que podemos fazer é ajudar a construir a competência em outra pessoa, da mesma maneira que construímos conhecimento. 6.5.5 Motivação pessoal dos colaboradores A motivação é uma força essencial para o comportamento humano. Ela será a responsável por determinar quais serão os níveis de comportamento e de desempenho de uma pessoa dentro da empresa. Dessa forma, ela está diretamente ligada aos sentimentos de valorização e produtividade. Assim, quando priorizamos a motivação numa organização significa que estamos valorizando, implantando e mantendo uma boa comunicação entre a equipe, fortalecendo um alto nível de criação e prezando sempre por uma atmosfera de bom relacionamento entre os membros da equipe. Todos os tipos de incentivos e recompensas que as organizações oferecem para conseguir o desempenho esperado e a realização de todas as metas devem ser compreendidos como práticas motivacionais. Dentro das teorias das relações humanas, encontra‑se a Teoria da Motivação Humana de Maslow, que nos explica que a qualidade está intimamente associada à satisfação das necessidades humanas e a fatores motivacionais e higiênicos. Essa satisfação é baseada no modelo de hierarquia das necessidades humanas (Pirâmide de Maslow), caracterizada como excelente ferramenta de análise. Maslow salienta que a satisfação dessas necessidades configura‑se como agente motivador a partir do qual o homem participa com prazer de suas atividades e tarefas, fato que certamente repercute positivamente na percepção e na qualidade de vida que ele tem. Desafios mais complexos, trabalho criativo, autonomia, participaçãonas decisões. Autorrealização Autoestima Afetivo – Social Segurança Fisiológicas Ser gostado, reconhecimento, promoções, responsabilidade por resultados. Bom clima, respeito, aceitação, interação com colegas, superiores e clientes etc. Amparo legal, orientação precisa, segurança no trabalho, estabilidade, remuneração. Alimentação, moradia, conforto físico, descanso, lazer etc. Figura 7 – Pirâmide de Maslow 109 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar De acordo com essa teoria, o homem é dotado de necessidades e, após a sua satisfação, sempre surgirão outras novas. Esse processo é contínuo, não tem fim, desde o nascimento até a morte. As necessidades estão organizadas numa série de níveis, ou numa hierarquia de valor. O primeiro nível da pirâmide mostra que as nossas necessidades mais básicas são as fisiológicas, como: alimentação, moradia, conforto físico, lazer, descanso etc. Quando conseguimos satisfazê‑las, evoluímos para o próximo nível da pirâmide, que será satisfazer as necessidades de segurança, como: amparo legal, segurança no trabalho, estabilidade, remuneração e orientação precisa. O próximo nível a ser atingido será o afetivo‑social, que terá como necessidades a serem supridas as de respeito, aceitação, bom clima, boa interação com os colegas e com os superiores etc. Depois que conseguimos atender a essas demandas, atingimos o nível das necessidades de autoestima, que têm como características: o ser gostado, receber reconhecimento e promoções e assumir novas responsabilidades por resultados. E, por fim, chegamos ao último nível da pirâmide: as necessidades de autorrealização, que são as necessidades de desafios mais complexos, de trabalhos criativos e de ter autonomia e poder de participação de decisões. Dessa forma, entendemos que, para a garantia da qualidade de vida, precisamos levar em consideração parâmetros socioambientais como transporte, moradia, segurança, assistência médica, condições de trabalho e remuneração, condições de educação e lazer, além da sua interação com o meio ambiente; também consideraremos parâmetros individuais como hereditariedade, estilo de vida, hábitos alimentares, atividade física habitual, relacionamentos, controle do stress e qual o seu comportamento preventivo. Além desses parâmetros, encontramos alguns fatores negativos que podem ser modificados, por exemplo: vida sedentária, isolamento social, consumo de álcool e outras drogas (lícitas e ilícitas), controle do estresse e mudança de hábitos de esforços repetitivos. 6.5.6 Capitais intelectuais Como o mercado exige das empresas, cada vez mais, o investimento em capital humano qualificado, por agregar valor à organização, a valorização desse capital contribui para a melhoria da qualidade de vida dos funcionários e, dessa forma, conseguimos reduzir os índices de absenteísmo. Quando o funcionário se sente parte da empresa, ele sabe que é valorizado e se comprometerá muito mais; dessa forma, conseguirá atender as suas necessidades e as da empresa. No mundo pós‑moderno, o trabalho deixou de ser simplesmente uma fonte de prazer e de realização e passou a ser uma fonte de supressão da liberdade individual. Para muitos, o trabalho não representa um instrumento de crescimento e satisfação profissional e pessoal, mas sim um instrumento para a satisfação de suas necessidades mais básicas de sobrevivência. 110 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Unidade III saiba mais Para complementar seu conhecimento sobre a qualidade de vida no trabalho, em especial a do trabalhador da área da saúde, leia o seguinte livro: DINIZ, D. P. Guia de qualidade de vida: saúde e trabalho. Barueri: Manole, 2013. 6.6 retrospectiva histórica do direito à saúde do trabalhador Quando falamos em qualidade de vida no trabalho, pensamos no que é preciso para essa qualidade. E, claro, temos em mente que para garantirmos essa qualidade precisamos proteger nosso trabalhador. Essa preocupação do homem em proteger quem trabalha já vem desde a Grécia Clássica, período em que os flautistas usavam equipamentos de couro para proteger seus lábios, e os escravos que trabalhavam em minas já haviam elaborado uma espécie de máscara com bexigas para filtrar o ar que respiravam. Porém, apesar de haver registros antigos sobre essa preocupação, apenas com a Revolução Industrial os movimentos ganharam mais força, principalmente com o surgimento dos sindicatos, que começaram a unir a classe trabalhadora para exigir melhores condições de trabalho, melhor remuneração, carga horária justa e proteção ao trabalho infantil. Durante a Primeira Guerra Mundial, manifestações de trabalhadores levaram a Conferência da Paz de 1919 a criar, por meio do Tratado de Versailles, a OIT – Organização Internacional do Trabalho, e assim elaborar normas com o propósito de proteger a saúde e a integridade física dos trabalhadores. Em 22 de julho de 1946, a OMS – Organização Mundial da Saúde foi criada, e na sua constituição se estabeleceu o novo paradigma de que “saúde é o completo bem‑estar, físico, mental e social, e não somente a ausência de afecções ou enfermidades”, e que “é direito fundamental de todo ser humano gozar do máximo grau de saúde” (CONSTITUTION..., 1964). Com esse novo conceito, percebeu‑se que seria preciso agir nas origens das doenças e dos acidentes, realizando modificações no próprio ambiente de trabalho. Os trabalhadores iniciaram movimentos exigindo melhores condições nos ambientes laborais, muitas vezes já apontando quais mudanças eram necessárias, não apenas para que se minimizasse a dor do sofrimento, mas com o objetivo de identificar quais eram as causas de tais sofrimentos. A Conferência Geral da OIT aprovou, em 3 de junho de 1981, a Convenção nº 155, que tratava da segurança dos trabalhadores e, em 1985, a Convenção nº 161, a respeito dos serviços de saúde do trabalho. Assim, percebemos que primeiro houve uma preocupação com a segurança do empregado, para que os acidentes de trabalho fossem evitados; posteriormente surge a medicina do trabalho para curar as 111 Re vi sã o: C ris tin a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 14 /0 1/ 20 15 Políticas de Humanização e atendimento HosPitalar enfermidades ocupacionais. A preocupação em prevenir as doenças e garantir a saúde surge depois, com o objetivo de não esperar que as doenças aconteçam para curá‑las, mas sim buscar o bem‑estar físico, mental e social do trabalhador, de acordo com o conceito de saúde da OMS. Atualmente, o objetivo é avançar nesse modelo, tornando os trabalhadores seres humanos dignificados, satisfeitos com o seu labor e com qualidade de vida dentro e fora do seu ambiente de trabalho. Essa qualidade de vida não deve se resumir apenas à estrutura física e de recursos materiais de seu ambiente de trabalho, mas também deve estar presente na forma como o seu ambiente é administrado, organizado, como se dão as relações interpessoais, quais as condições de turnos de trabalho e qual a política de remuneração e de reconhecimento da instituição. Quando avaliamos todos esses conceitos, chegamos à conclusão de que quem ganha mal provavelmente morará em uma região mais distante de seu trabalho, muitas vezes, em condições precárias de saneamento básico e higiene. Essa pessoa necessitará de maior tempo de locomoção de sua casa para o trabalho, fazendo com que fique um período longo exposto ao contágio de várias doenças; consequentemente, ela ficará menos tempo com sua família e terá menos tempo para o descanso e lazer, e, dessa forma, entrará em uma reação em cadeia em que a pessoa
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