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153 Capítulo 11 As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento Logo no início deste livro, abordamos a transformação da informa ção em conhecimento e vimos que a informação tem um caráter subje tivo; ela depende da interpretação. Voltamos agora a esse ponto porque, neste capítulo, iremos discutir a cultura organizacional e sua associa ção com a gestão do conhecimento. A cultura tem uma estreita relação com a interpretação e com as figuras e metáforas organizacionais, além das montagens dos modelos mentais que conduzem as decisões e os modos de enxergar e compreender o mundo de cada indivíduo. 154 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . A cultura organizacional é o que sustenta as ações organizacionais, e ela é construída pelas pessoas que integram a referida organização. A cultura irá influenciar a gestão do conhecimento, sendo considerada um dos grandes desafios para essa gestão. Por quê? Porque a cultura tanto pode ser um estímulo à mudança quanto uma barreira... Então, vamos nos aprofundar nessa discussão. Ao término deste capítulo, você irá relacionar o conceito de cultura organizacional e o de aprendizagem como ferramenta de gerencia mento da empresa. 1 A cultura organizacional – conceito Cultura organizacional é uma expressão muito rica de ideias e de abrangência. No âmbito das organizações, um dos primeiros autores que se preocuparam em definir o termo foi Pettigrew (1979), o qual de finiu cultura como um “sistema de significados pública e coletivamente aceitos por um dado grupo, em um certo período de tempo” (PETTIGREW, 1979 apud FERREIRA et al., 2002, p. 271). Outro autor muito conhecido quando o assunto é cultura organizacional é Edgar Schein. Com base em suas ideias, são apresentadas a seguir duas definições de cultu ra organizacional que muito irão ajudar a construir as associações que queremos neste capítulo. Vamos a elas: A primeira é da obra de Schein de 1985 e está citada em Vasconcelos e Mascarenhas (2007, p. 32). Schein conceitua a cultura como “um con junto de valores e pressupostos básicos que agem como elementos de comunicação e consenso por meio de sua capacidade de ordenar, atribuir significações e construir a identidade de uma organização”. Pressupostos devem ser entendidos como respostas que são aprendi das e decorrem dos valores comuns que as pessoas têm em uma orga nização. Esses pressupostos vão se fortalecendo, ao longo do tempo, e passam a ser considerados verdades sobre as quais não se espera contestação (FREITAS, 1991). 155As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. Aqui se destacam os termos que demonstram que a cultura permite dar sentido ao que se faz – quando Schein (1985), apud Vasconcelos e Mascarenhas (2007), cita a ideia de atribuir significações está clara mente demonstrando que a cultura é o construtor da liga que faz um grupo de indivíduos se sentir um grupo, em seu sentido mais completo. Não se trata de uma reunião de indivíduos sem vínculo, mas sim de um conjunto de pessoas unidas por um propósito. A cultura organizacional exerce o importante papel de dar a liga e ajudar na construção do que se chama identidade da organização. Novamente Schein (1986), agora citado por Fleury e Fischer (2015, p. 20), conceitua cultura organizacional como um conjunto de pressupostos básicos [...] que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com os proble mas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir, em relação a esses problemas. Identifiquemos mais alguns elementos importantes nesse conceito, associados ao que vem sendo estudado neste livro: primeiro, a cultura é algo que serve de guia e foi inventada por um grupo (compartilhar conhecimentos). Esse grupo, ao passar por um problema, o resolveu mediante a adoção de alguns princípios e ações (inteligência organi zacional e aprendizagem) e, por terem obtido êxito na resolução desse problema, geraram um registro a ser passado a outros como um modo de agir (gestão de conhecimento). Robbins (2002, p. 498) conceitua cultura como “um sistema de valo res, compartilhado pelos membros de uma organização”, que cria uma identidade própria, pois faz que uma organização seja diferente da outra. Embora seja distintiva, ou seja, ajude a criar um padrão próprio em cada organização, a cultura tem, ainda segundo Robbins (2002), algumas ca racterísticas que servem para identificá-la. São estas características: 156 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . Figura 1 – O sistema de valores da cultura Cultura / Sistemas de valores inovação e capacidade de assumir riscos 01 grau de atenção aos detalhes 02 orientação para resultados 03 orientação para as pessoas 04 orientação para a equipe 05 grau de competitividade 06 grau de estabilidade 07 Da combinação dessas características temse a cultura organizacio nal de cada instituição, que pode ser resumida no jeito como as pes soas, na organização, se comportam, em que acreditam, como fazem as coisas, pois esse conjunto reflete a forma com que os valores são compartilhados. IMPORTANTE A cultura organizacional é a criação de um grupo, de um coletivo – como tal, somente existe se houver, por parte desse coletivo, uma aderência a ela. Lembre-se: Nonaka e Takeuchi (2008) reforçaram que o comprome- timento é o motor que gera a criação de conhecimento. Os autores des- tacam que, ao trocarem ideias sobre os porquês de fazerem o que fazem, 157As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. as pessoas reforçam os valores e as crenças que as levam a crer no que creem e a verem o mundo como veem. Logo, a cultura é reforçada pelo comprometimento com as crenças e os valores organizacionais. Voltando à conceituação de Schein (1986), apud Fleury e Fischer (2015), ao considerar a forma de resolver um problema como a maneira “correta” de se pensar em algo, a organização estabelece um modo de agir que vai sendo passado aos novos integrantes da corporação. Esse modo correto de se pensar consolida as ideias em modelos mentais, usados pela organização para resolver os novos problemas que sur gem. A organização vai, portanto, estruturando, com o conhecimento de seus integrantes, seu modo comum de ver o mundo. PARA PENSAR O estabelecimento de um modo “correto” de fazer as coisas é bom, pois determina parâmetros e constrói uma identidade organizacional. Agora, pare e pense sobre essa visão “correta” de se fazer algo. Ela pode ter algum aspecto negativo no que se refere à gestão doconhecimento? Lembre-se do que estudamos nos capítulos anteriores e analise essa questão sobre o “jeito certo” de fazer algo. 1.1 Elementos constituintes da cultura A cultura é constituída de três elementos principais: os pressupos tos básicos, valores em comum e artefatos. Os pressupostos básicos, como já apresentado, são os valores mais arraigados, as crenças or ganizacionais que constituem o nível mais profundo da cultura; em se guida, vêm os valores em comum, que são divididos entre os membros da organização e servem como base para o estabelecimento de me tas, bem como das estratégias e filosofias que irão conduzir as ações 158 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . organizacionais; por fim, há os artefatos, considerados a parte estru tural e processual da organização. Essa proposição deriva de Schein e está apresentada em Freitas (1991) e em Ferreira et al. (2002). A figura 2 procura demonstrar a interação entre esses três elemen tos constituintes da cultura organizacional: Figura 2 – Elementos constituintes da cultura organizacional Pressupostos básicos = crenças e símbolos Valores mais profundos de uma organização; são pré-conscientes e considerados verdades a serem seguidas Artefatos (estruturas, processos, cerimônias realizadas) ou práticas da organização (seus rituais, heróis, palavras e gestos que fazem um sentido peculiar para a organização) Valores em comum = base para metas e estratégias São os que apresentam maior grau de consciência do que os pressupostos (as regras e normas) Fonte: adaptado de Freitas (1991); Ferreira et al. (2002). 2 A associação da cultura organizacional e a gestão do conhecimento – implicações e desafios para o gestor Ao estudar o conceito de cultura, no tópico anterior, você pôde cons tatar que tal conceito remete a um conjunto de normas que a organiza ção constrói, em seu ambiente, e que essas normas serão o balizador dos comportamentos na organização, isto é, as normas dirão o que 159As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. deve ser feito e como deve ser feito; o que é aceito e o que não é aceito, o que é esperado e o que não é bem-vindo. Essas normas abrangem crenças, padrões de comportamento, símbolos, enfim, os elementos que constituem a cultura. Braquehais et al. (2017) realizaram uma análise de publicações que abordam a cultura organizacional e seu papel na gestão do conheci mento e comentam que há uma relação entre cultura e impacto – po sitivo ou negativo – no que se refere à gestão do conhecimento. Basta relembrar que a gestão do conhecimento envolve práticas organiza cionais sustentadas pelo compartilhamento de ideias, pela redundân cia em seu sentido positivo, pela existência de um contexto capaci tante (Ba) que incentive os indivíduos a compartilhar o conhecimento adquirido e auxilie na transformação do conhecimento tácito em explíci to (NONAKA; TAKEUCHI, 2008). Onde entra a cultura? Ela permeia todo esse processo, uma vez que envolve todas as ações na organização, seja no nível mais visível, que é o dos artefatos, seja no nível mais pro fundo, o dos pressupostos. Perceba, então, pelo que foi estudado até este momento, quanto a cultura pode ser um fator que estimule a geração de conhecimento ou um fator que influencie negativamente sua criação. Se a cultura for aberta à criatividade e à inovação, ela será um poderoso instrumento de incentivo ao conhecimento, mas se for uma cultura mais burocrática e reticente às inovações, ela poderá inibir o conhecimento de ocorrer. Olhando para o comportamento do indivíduo na organização, pode -se destacar o que comenta Carvalho (2012). Ele relembra o problema das barreiras culturais que podem impedir a aplicação do conhecimen to. No caso específico citado pelo autor, a discussão gira em torno de o indivíduo se expor na busca de um conhecimento novo, e tal exposição poder deixálo vulnerável, pois se perceberá que ele desconhece algo. Essa vulnerabilidade poderá impedir a pessoa de querer aprender e im pedirá, consequentemente, a criação de conhecimento. 160 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo .Outro problema cultural é relatado por Alvarenga Neto (2008), que corresponde à resistência derivada do novo. Como estudado na ges tão da inovação, é preciso romper as barreiras relacionadas a modelos mentais que se arraigam na organização, criando verdadeiros muros de resistência ao novo. Um dos modelos mentais mais presentes nas organizações é o do paradigma industrial, que leva a organização a ter uma estrutura muito arraigada no controle e nas formas tradicionais de ação, com hierarquias e não redundância de comunicação, impedindo o conhecimento de florescer. No capítulo 7, você também estudou as barreiras e os promotores do conhecimento e, embora a ênfase dada estivesse no conhecimento, a questão da cultura não pode ser esquecida: observe que resistências à mudança são aspectos que envolvem a pessoa e a cultura, seja no nível individual (acomodação limitada e o processo de resistir ao novo), seja no nível mais macro (paradigmas organizacionais, que nada mais são do que pressupostos básicos que levam as pessoas a agir como agem, no ambiente organizacional, crendo em verdades inconscientes). Braquehais et al. (2017) compilaram informações sobre variáveis culturais que impactam a gestão do conhecimento e apresentaram, dentre outros modelos, um clássico que é o modelo de dimensões cul turais desenvolvido por Hofstede (1980). Há diversas discussões sobre o referido modelo e críticas quanto ao seu caráter determinista, mas o que se destaca nele e interessa ao propósito deste livro são os aspectos culturais que podem trazer um impacto positivo ou negativo à gestão do conhecimento. São eles: aversão à incerteza distância do poder binômio individualismo 161As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. 1. Aversão à incerteza: como a organização se posiciona perante o imprevisto – observe que quanto mais tolerante a organização for ao risco da incerteza, mais propícia ela será à criação de um ambiente favorável à troca de conhecimentos. Faz parte da cons trução do conhecimento o aceite ao “espaço do imprevisível” – recordese de que a inovação pressupõe o risco como parte do processo de aprendizado. 2. Distância do poder: qual a distância psicológica formada entre as pessoas e seus superiores hierárquicos – aqui, se a organização for muito hierarquizada, a tendência é haver mais barreiras à cria ção do conhecimento. Vale lembrar que o modelo de gestão que mais favorece a criação do conhecimento é o middle-up-down, que você estudou no capítulo 5, e, nele, há uma harmonia entreos vários níveis organizacionais. 3. Binômio individualismo-coletivismo: como a pessoa atua com re lação a ela mesma ou ao grupo ao qual pertence. O coletivismo é mais favorável à criação do conhecimento, como temos estuda do, pois permite que haja troca. Organizações que valorizam mais o individualismo tendem a ter menos espaços para a transforma ção do conhecimento tácito em explícito. Outro modelo muito utilizado para analisar o impacto de questões culturais na gestão do conhecimento é o de valores conflitantes, de Quinn (1996), apud Cavalcanti (2004), que se resume em abordar postu ras relacionadas: desenvolvimento de processos internos metas nacionais relações humanas sistemas abertos 162 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . 1. ao desenvolvimento de processos internos (como a organização documenta e administra a informação); 2. a metas racionais (qual o nível de objetividade e clareza; qual o grau de produtividade e realização); 3. às relações humanas (qual o nível de participação e abertura que há para os colaboradores, qual a flexibilidade que a organização tem e se ela possui um clima favorável ao comprometimento); 4. aos sistemas abertos (qual o nível de inovação e adaptação da organização ao ambiente). Em cada um desses eixos, pode-se identificar o papel da cultura na gestão do conhecimento: PAPEL DA CULTURA NA ORGANIZAÇÃO 1 2 3 4 EIXOS 1. Se a organização possui um sistema robusto de controle e disse minação da informação, por considerá-lo importante, isto é, parte de seu DNA, tenderá a ter um processo de gestão do conhecimen to mais eficaz. 2. Uma cultura que favorece o desenvolvimento de metas com dire ção e foco tende a ter mais produtividade na realização das tare fas e na gestão do conhecimento, pois este flui mais rapidamente dentre os canais de desenvolvimento e de registro do conheci mento organizacional. 3. Uma cultura que estimula a participação e dá abertura aos seus colaboradores é uma cultura mais favorável à criação e à gestão 163As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. do conhecimento; é mais simples gerenciar em um clima no qual o comprometimento é natural. 4. Se a organização estimula a inovação e entende a mudança como parte inevitável de seu processo de crescimento, ela ten derá a ter uma gestão do conhecimento mais efetiva, dado que a compreensão da organização como um sistema aberto e que troca com o meio ambiente é fundamental para ocorrerem a criação e a gestão do conhecimento. PARA SABER MAIS A compreensão dos modelos de administração facilita o aprofunda- mento nas discussões sobre gestão de conhecimento e o que são os agentes facilitadores desse processo tão dinâmico. Leituras sobre te- oria da administração favorecem muito esse aprofundamento. Veja de- talhes sobre as escolas da administração e os modelos e pressupostos que estão por trás desses modelos em Teoria geral da administração: da revolução urbana à revolução digital, de Antonio Cesar Amaru Maxi- miano, 2006. Floriano (2009), apud Barros et al. (2010), destaca que os valores organizacionais devem contemplar o compartilhamento do conheci mento. Acrescentamos a essa proposição a importância de olhar para a cultura organizacional como estratégica no estímulo ao conhecimento. Como já apresentado, um dos desafios para a gestão do conhecimento é quebrar as barreiras que podem surgir no meio de um processo de inovação ou que simplesmente retardam a organização em qualquer ação proativa ao compartilhamento do conhecimento. Uma compilação de obstáculos culturais ao compartilhamento do conhecimento feita pelo próprio Floriano (2009), apud Barros et al. (2010), exemplifica bem o que está sendo discutido neste capítulo. Essa compilação será apresentada a seguir, comparando as ideias com 164 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . a teoria estudada e com os princípios de Nonaka e Takeuchi (2008), Carvalho (2012), Probst, Raub e Romhardt (2002). Quadro 1 – Obstáculos e ações em prol do compartilhamento do conhecimento OBSTÁCULOS O PROBLEMA A SOLUÇÃO Estrutura da organização Estruturas fechadas levam ao não compartilhamento de informações. Desenvolver um sistema aberto, em que haja uma organização dialética, no dizer de Nonaka e Takeuchi (2008), favorecendo a troca de informações e a construção de Ba (contexto capacitante). Distância física Estruturas com paredes e compartimentação excessiva tendem a reduzir a troca e fortalecer o individualismo. Propiciar espaços de trabalho mais abertos, que fortaleçam o aspecto grupal das atividades e inibam barreiras físicas. Carvalho (2012) lembra que a liderança, ou seja, o gestor, desempenha um papel fundamental na quebra de barreiras. Status Organizações em que a distância entre as pessoas é grande porque há uma hierarquização muito forte tendem a realizar um julgamento do conhecimento com base nesse status, inibindo o desenvolvimento livre do conhecimento. A cultura, como relembra Carvalho (2012), é uma escolha organizacional. O temor de perder o status cria barreiras ao conhecimento, como destaca o próprio Carvalho (2012). Assim, dar ênfase ao valor do conhecimento, não importando de onde ele vem, em vez de ao status, permitirá à organização crescer e desenvolver o conhecimento de forma mais horizontal e harmônica, favorecendo a gestão do conhecimento. Desconfiança Organizações nas quais o relacionamento é pautado no olhar reticente e na desconfiança tendem a não desenvolver o conhecimento. É preciso criar uma relação de confiança e troca, como defendem Nonaka e Takeuchi (2008) em toda a sua obra. Cabe lembrar que o fundamento da criação do conhecimento está no cultivo de traços opostos, em que há espaço entre autoridade e hierarquia e respeito à ideia, além de haver como pressuposto a confiança para que haja a troca de conhecimentos sem reticências. Ter um ambiente no qual haja confiança e abertura à troca de informações é fundamental para a criação de conhecimento (PROBST; RAUB; ROMHARDT, 2002). Conhecimento como poder Em todo local em que há o conhecimento como símbolo de poder, a tendência é o não compartilhamento de conhecimentos. A organização que quer crescer deve quebrar o paradigma do “conhecimento é poder” visando o “compartilhamento é poder”. Somente a visão compartilhada sem medo de perda de status é que traz, de modo verdadeiro, geração de conhecimento e favorece a gestão desse conhecimento construído de forma coletiva. (cont.) 165As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. OBSTÁCULOS O PROBLEMA A SOLUÇÃO Motivação dos colaboradores Se o sistemacultural vigente dá ênfase à recompensa e a privilegiar os donos do poder, a tendência é a retenção de conhecimento nas mãos de poucos. A fim de compartilhar o conhecimento, a organização deve estimular a cultura da troca e do trabalho em equipe. Nonaka e Takeuchi (2008) dão muita ênfase ao que ocorre em empresas orientais no tocante à valorização da troca e do coletivo como valor organizacional. Se a troca é arraigada como cultura, a organização tende a crescer, e a gestão do conhecimento acontece de forma mais natural. Desconheci- mento de fonte e receptor Organizações que não têm comunicação fluida ou hierarquizam o conhecimento conforme o status têm a probabilidade de não criar nem gerir conhecimento, pois não se sabe quem o tem ou se desvaloriza a fonte. Deve-se incentivar a troca e a horizontalização das relações, reduzindo a distância cultural criada por status ou por preconceitos. Floriano (2009), apud Barros et al. (2010), recomenda a criação das chamadas redes de relacionamento, tanto formais quanto informais, e o uso de Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) nesse processo de compartilhamento de informações. A aplicação do modelo proposto por Nonaka e Takeuchi (2008), de redundância de informações, é recomendado para este caso, bem como as páginas amarelas e a construção de mapas e topografias de conhecimento (quem sabe o quê), de maneira gráfica (PROBST; RAUB; ROMHARDT, 2002). Fonte: adaptado de Probst, Raub e Romhardt (2002); Nonaka e Takeuchi (2008); Barros et al. (2010); Carvalho (2012). A questão principal está em que a cultura pode fortalecer a gestão do conhecimento ou desfavorecê-la. Assim, uma vez identificado o tipo de cultura e quão favorável à criação e à gestão do conhecimento ela é ou não, a organização deve adotar medidas a fim de fortalecer os valores culturais propícios ao conhecimento (CHMIELEWSKA-MUCIEK; SITKO-LUTEK, 2013) e adotar ações que favoreçam o compartilhamen to do conhecimento, conforme o quadroresumo apresentado. Senge (2013), ao abordar o que chamou de “fundações” para sua pro posta de organizações que aprendem, destacou um elemento que repu tamos como fundamental para o incentivo à mudança e, consequente mente, à gestão do conhecimento: a criação de uma cultura de diálogo, de reflexões e de conscientização de que uma organização é mais do que uma máquina de produtividade, ela é um espaço para crescimento e 166 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . desenvolvimento que deve trazer condições para que os indivíduos que nela trabalham encontrem o sentido do que executam. Logo, a gestão da cultura é condição importante para ocorrer o aprendizado organizacional que incentive e fortaleça a criação e a própria gestão do conhecimento. NA PRÁTICA Cruz e Ferreira (2015) realizaram uma pesquisa em 2009 e 2010 em seis hospitais portugueses, visando analisar qual a relação existente entre percepção de cultura e gestão do conhecimento em unidades hospitala- res que possuíam distintos modelos de gestão. As autoras aplicaram um questionário a 634 colaboradores e identificaram que, na prática, a teoria sobre a influência da cultura como fator crítico de sucesso nos proces- sos de gestão do conhecimento é constatada. Nas organizações hos- pitalares em que havia uma forte cultura de grupo (clã), a percepção de gestão do conhecimento teve o maior valor médio, e nas culturas hierar- quizadas essa percepção de gestão do conhecimento foi a mais baixa. Tem interesse em saber mais sobre esse estudo? Pesquise por “Percepção de cultura organizacional e de gestão do co- nhecimento em hospitais com diferentes modelos de gestão”, de Sofia Gaspar Cruz e Maria Manuela Frederico Ferreira. Considerações finais Neste capítulo, a cultura organizacional foi vista sob um prisma dis tinto do que normalmente se estuda. A ênfase foi em seu papel na ges tão do conhecimento. Como apresentado, a cultura envolve aspectos dos mais visíveis (artefatos) aos mais invisíveis da organização (cren ças profundas), e tanto os mais superficiais quanto os mais profundos impactam sobremaneira na criação e na gestão do conhecimento. O maior desafio da gestão do conhecimento está na questão cultural da organização. A cultura favorável ao conhecimento abre caminhos para a criação e a gestão do conhecimento, enquanto uma cultura fechada 167As interfaces entre cultura organizacional e gestão do conhecimento M aterial para uso exclusivo de aluno m atriculado em curso de Educação a Distância da Rede Senac EAD, da disciplina correspondente. Proibida a reprodução e o com partilham ento digital, sob as penas da Lei. © Editora Senac São Paulo. ao compartilhar, uma cultura arraigada no tradicionalismo e na burocra cia, tende a ser uma inibidora da criação e da gestão do conhecimento. A fim de que a gestão estratégica do conhecimento ocorra, a orga nização deve levar em conta esses aspectos culturais que permeiam todo o processo de criação e a própria gestão do conhecimento, como estudado. Tanto no modelo de Hofstede quanto no de Quinn, pode-se identificar que os elementos culturais são intensos e estão presentes tanto no nível individual quanto no coletivo. Organizações mais avessas à incerteza, mais hierarquizadas e individualistas tendem à criação de mais obstáculos à gestão do conhecimento, como aponta Hofstede; bem como os valores conflitantes, no modelo de Quinn, demonstram quanto a cultura está impregnada nos processos internos, nas metas, nos sistemas e nas relações humanas. As soluções ou os incentivos à gestão do conhecimento passam, necessariamente, por aspectos culturais, cabendo à gestão identificar as barreiras e transformálas em espaços que abram caminhos para o compartilhar e o construir conhecimento em toda a base organizacio nal. Nos próximos capítulos, daremos prosseguimento a um importante aspecto nessa construção do conhecimento: como lidar com inovação e competitividade, utilizando recursos derivados da tecnologia da infor mação a fim de que a gestão do conhecimento seja subsidiada e o co nhecimento seja compartilhado com eficiência e eficácia. Referências ALVARENGA NETO, Rivadávia Correa Drummond de. Gestão do conhecimento em organizações: proposta de mapeamento conceitual integrativo. São Paulo: Saraiva, 2008. BARROS, Jeanine da Silva et al. Gestão do conhecimento: ações e ferramentas para a superação de barreiras no compartilhamento do conhecimento. Ponto de Acesso, Salvador, v. 4, n. 2, p. 33-57, set. 2010. Disponível em: <https://por talseer.ufba.br/index.php/revistaici/article/viewFile/3933/3404>. Acesso em: 6 jul. 2017. https://por/ 168 Aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento Ma te ria l p ar a us o ex cl us ivo d e al un o m at ric ul ad o em c ur so d e Ed uc aç ão a D is tâ nc ia d a Re de S en ac E AD , d a di sc ip lin a co rre sp on de nt e. P ro ib id a a re pr od uç ão e o c om pa rti lh am en to d ig ita l, s ob a s pe na s da L ei . © E di to ra S en ac S ão P au lo . BRAQUELAIS, Antonio de Paula et al. O papel da cultura organizacional na gestão do conhecimento: revisão de literatura de 2009 a 2015. 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