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gesto de um menino de doze anos, que parou diante dela, fitou-a e despejou confetes sobre seus cabelos, devolveu-lhe a certeza de que era, sim, uma rosa. A personagem principal de "O grande passeio" [2] é Mocinha — "Nome, nome mesmo, é Margarida" —, uma velha que perdeu o marido e os filhos e vive da caridade alheia. Um dia , a família que a hospeda enfastia-se de sua presença e a envia para que outros parentes a aturem, em outra cidade. Encaminhada para lá, é recusada pela nova "família". A dupla negação junta-se ao cansaço e à confusão da vida solitária, e a velha morre na estrada, encostada a um tronco de árvore. Revela-se aí o absurdo da situação de uma velha que nada produz e que não tem quem responda por ela, ou seja, ela não existe para o mundo pragmático. Igualmente absurda e desumana é a atitude da sociedade branca, limpa e rica, que descarta um estorvo social como se ele não existisse. "Uma esperança", [3] o inseto, pousou na parede. Para o filho da narradora, esperança não tem corpo, só tem alma, o que vale para o substantivo concreto e para o abstrato. A esperança se mostra indecisa, titubeante, tentando aprender seus caminhos. Súbito o inseto esperança é ameaçado por uma aranha. A empregada tem uma certa culpa: dificultara o caminho da esperança por não ter limpado direito a parede atrás do quadro. A esperança foi afinal salva pela vassourada na aranha. E o pouso da esperança foi vivenciado com profundidade por todos em casa. Essas são algumas das histórias de Felicidade clandestina, a confirmar o depoimento de Clarice de que seus livros não são superlotados de fatos, mas da repercussão dos fatos nos indivíduos. O clima dos contos é de permanente transformação, o primado da metamorfose: as coisas e os homens nunca são; apenas estão. E estando, vão se enredando, se superpondo, como a metáfora da rede no conto "Os desastres de Sofia" [4]: "Meu enleio vem de que um tapete é feito de tantos fios que não posso me resignar a seguir um fio só; meu enredamento vem de que uma história é feita de muitas histórias". Esse enredamento é feito de clarissonantes revelações e profundas decepções. FÓRUM Releia cuidadosamente os quatro contos de Clarice Lispector em cartaz neste tópico, e o que o autor destas aulas escreveu sobre eles. Faça comentários sobre o processo de criação da autora, a linguagem utilizada, e sua temática, abordando também outras categorias da narrativa, como narrador, personagens, enredo, tempo e espaço. Lembre-se de que a literatura tem que aceitar também afirmações do tipo "gostei" e "não gostei". Portanto, faça-as e comente-as. Participe! 15