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Respostas e adaptações neuromusculares e esqueléticas Não existe exercício sem movimento e não há movimento sem contração muscular. Ou seja, exercício é a contração muscular em si. Para que o movimento ocorra, vários sistemas do organismo atuam em conjunto para que as células musculares possam produzir e usar a energia necessária para contração e produção de força. A expressão da força humana depende não somente de fatores inerentes aos músculos, mas também de fatores neurais e psicológicos. Quando pensamos em atletas é fácil entender como a força é fundamental, mas não só para esse grupo essa valência física é importante. A força é necessária para a execução adequada dos movimentos do dia a dia e para a manutenção de boa postura. No envelhecimento, a perda da força é um dos principais fatores físicos que levam à perda de autonomia. Assim, o entendimento dos mecanismos de contração muscular e desenvolvimento da força é indispensável para o sucesso de um programa de treinamento de resistência, tanto para o desempenho esportivo, como para a saúde e reabilitação. Objetivo Ao final desta unidade, você deverá ser capaz de: • Avaliar as possíveis causas da fadiga e dor muscular em diferentes tipos de exercício. • Reconhecer os mecanismos da contração muscular e do desenvolvimento da força a partir do treinamento de resistência. • Empregar o conhecimento dos mecanismos que levam a adaptações esqueléticas e musculares na prescrição de exercício. Conteúdo Programático Esta unidade está organizada de acordo com os seguintes temas: • Tema 1 - Tipos de fibras musculares, contração muscular, fadiga e dor muscular • Tema 2 - Controle neural da contração muscular • Tema 3 - Mecanismos de desenvolvimento da força • Tema 3 - Adaptações esqueléticas e musculares ao treinamento Não importa a idade, sexo ou modalidade praticada por um atleta, pois a força sempre será necessária. Seja para realizar as atividades diárias, para evitar lesões ou obter melhores resultados esportivos, as adaptações neuromusculares e esqueléticas sempre serão bem-vindas. Para saber mais sobre o assunto, leia: Adaptação do músculo esquelético ao exercício físico: considerações moleculares e energéticas. https://www.scielo.br/j/rbme/a/nrVqz5ncsFTpzBrnvwhYfng/ https://www.scielo.br/j/rbme/a/nrVqz5ncsFTpzBrnvwhYfng/ Tema 1 Tipos de fibras musculares, contração muscular, fadiga e dor muscular Quais os princípios da contração muscular? Fibras musculares As fibras musculares, células cilíndricas que formam o músculo, podem ser divididas em dois grupos de acordo com suas características contráteis e suas características metabólicas. As fibras de contração lenta (Tipo I) geram energia predominantemente pelo sistema aeróbico (fibras oxidativas) e possuem como características maior quantidade e tamanho de mitocôndrias, velocidade de encurtamento lenta e capacidade glicolítica pouco desenvolvida. Essas características tornam esse tipo de fibra mais resistente à fadiga, sendo bastante eficiente para atividades de longa duração. Já as fibras de contração rápida (Tipo II) possuem alto potencial anaeróbico para produção de energia (fibras glicolíticas) e têm como características alta capacidade de transmissão de potencial de ação, liberação e captação rápidas de Ca2+ e alta taxa de renovação das pontes cruzadas. A ativação dessas fibras de contração rápida predomina em atividades de alta intensidade, quando contrações musculares vigorosas são realizadas com energia proveniente basicamente do metabolismo anaeróbico. Todas as fibras musculares têm capacidade de produzir energia tanto por processo anaeróbico (glicolítico) como aeróbico (oxidativo). A diferença metabólica entre os tipos de fibras se dá pelo predomínio de um ou outro. Todas as fibras musculares têm capacidade de produzir energia tanto por processo anaeróbico (glicolítico) como aeróbico (oxidativo). A diferença metabólica entre os tipos de fibras se dá pelo predomínio de um ou outro. As fibras do tipo II são subdivididas em: IIa, IIb e IIx. Fibras IIa Fibra tipo IIb Fibra do tipo IIx Possuem boa capacidade de geração de energia também por via aeróbica, sendo chamadas de fibras oxidativas glicolíticas rápidas. Possui maior potencial anaeróbico e baixa capacidade oxidativa, podendo ser considerada como a “verdadeira” fibra glicolítica rápida. Possui características intermediárias entre as fibras IIa e IIb. Para ver mais informações sobre as características dos diferentes tipos de fibras musculares, acesse a Biblioteca Virtual – Minha Biblioteca e consulte a Tabela 18.2 da página 382 do livro: MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. ISBN: 9788527730167. Todos os músculos do corpo são formados tanto por fibras de contração lenta como por fibras de contração rápida como se fossem um mosaico. A proporção de cada tipo de fibra muscular irá variar não apenas de uma pessoa para outra, mas também de um músculo para outro em um mesmo indivíduo. A maior proporção de fibras musculares de contração lenta é encontrada nos músculos responsáveis pela sustentação postural, como os eretores da espinha. A genética tem papel importante na variação do tipo de fibra muscular entre as pessoas, mas é importante ter em mente que o treinamento pode gerar algumas mudanças. A distribuição de fibras musculares de acordo com suas propriedades contráteis (lentas ou rápidas) é determinada pela genética e não pode ser alterada. Entretanto, diversas evidências mostram que o treinamento pode mudar as características metabólicas da fibra, como maior concentração de enzimas e armazenamento de substrato. Assim, o treinamento pode aumentar o potencial oxidativo das fibras do tipo II. Poderíamos dizer então que, considerando o tipo de fibra muscular predominante, quem nasce para ser velocista pode se tornar um maratonista, mas quem nasce para ser um maratonista jamais será um velocista? Contração muscular A contratilidade é uma das características do músculo e refere-se à capacidade que ele tem de se encurtar em resposta a um estímulo. É esse encurtamento do músculo, ao qual chamamos de contração muscular, que gera força. Quando a força gerada atua sobre um objeto ela é denominada tensão muscular, enquanto a força que o objeto exerce sobre o músculo é chamada de carga. A carga e a tensão muscular são forças em oposição. Toda contração de um músculo esquelético acontece em resposta a um sinal vindo do sistema nervoso, que resulta na produção de tensão dentro do músculo, mas nem todas as contrações são iguais. Quando a contração do músculo produz movimento ela é chamada de contração dinâmica. Se essa contração dinâmica produzir tensão (força) durante o encurtamento ela é chamada de contração concêntrica. Já se a produção de tensão se der durante o alongamento será chamada de contração excêntrica. As contrações concêntricas resultam em trabalho externo positivo e são responsáveis pela aceleração do movimento, enquanto as contrações excêntricas resultam em trabalho negativo e são responsáveis principalmente pela desaceleração do movimento. Você sabia que uma contração excêntrica consegue produzir mais força do que uma concêntrica e ainda tem um custo energético menor? Para saber mais a respeito, consulte a Minha Biblioteca e leia: PLOWMAN, S. A.; SMITH, D. D. Fisiologia do exercício para saúde, aptidão e desempenho. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010, p. 497. ISBN 9788527724838. Outro tipo de contração dinâmica é a contração isocinética. Nela, ao contrário dos outros dois tipos, a velocidade de contração é mantida constante. Já a contração muscular que não resulta em movimento é chamadade isométrica ou estática, tendo como importância a fixação ou a estabilização. Apesar desta classificação dos tipos de contração muscular, é importante deixar claro que na maioria das atividades ocorre mais de um tipo de contração para se ter um movimento harmonioso e coordenado. Isto é, quando um indivíduo corre e faz um salto, chuta uma bola ou lança um objeto, vários músculos executam diferentes tipos de contração durante o movimento para viabilizá-lo. Fadiga Quando ocorre uma incapacidade de se manter o nível de potência ou força durante repetidas contrações em uma atividade, dizemos que ocorreu fadiga. Isso ocorre, por exemplo, quando uma pessoa não consegue manter a velocidade de sua corrida ou precisa até parar. Ou quando um atleta de vôlei não consegue sacar com a mesma potência no final de uma partida. São várias as causas da fadiga e para algumas delas ainda não há consenso estabelecido. Alguns autores consideram que a fadiga se inicia no SNC, chamada de fadiga central, quando haveria uma diminuição na quantidade de unidades motoras envolvidas na atividade ou uma redução da frequência de disparos das unidades motoras. Entretanto, a maioria das evidências aponta para a predominância de causas periféricas de fadiga (fadiga periférica), quando fatores neurais, mecânicos ou energéticos no músculo podem prejudicar, ou até mesmo impedir, a produção de força. “ Não há mais dúvida de que existe algum envolvimento do sistema nervoso central (SNC) na maioria dos tipos de fadiga. Quando os músculos de um indivíduo parecem estar quase exauridos, o encorajamento verbal, gritos, a execução de uma música ou mesmo a eletroestimulação direta do músculo podem aumentar a força da contração muscular. Não foram ainda completamente esclarecidos os mecanismos subjacentes ao papel do SNC na causa, na percepção e mesmo na superação da fadiga. A menos que estejam altamente motivados, quase todos os atletas terminam o exercício antes que seus músculos estejam fisiologicamente exauridos. KENNEY; WILMORE; COSTILL, 2020, p. 148 ” Vale ressaltar que nenhum fator (central ou periférico) explica sozinho todos os aspectos e tipos de fadiga, já que diferentes fatores podem atuar de forma sinérgica para causá-la. Para saber mais sobre os fatores envolvidos na fadiga, acesse a Minha Biblioteca e leia KENNEY, W. L.; WILMORE, J. H.; COSTILL, D. L. Fisiologia do esporte e do exercício. 7. ed. Barueri: Manole, 2020, p. 141-140. ISBN 9786555760910. Dor muscular Outro fator que pode comprometer o desempenho é a dor muscular. Tanto a dor aguda como a dor muscular de início tardio (DMIT) podem atrapalhar a manutenção de um programa de exercícios, prejudicando tanto a performance de atletas como a adesão e a continuidade em uma atividade por parte dos iniciantes. A dor aguda é aquela que ocorre durante ou imediatamente após uma sessão de exercício. Já a DMIT tem seu pico um dia ou dois após a sessão de exercício e pode persistir por três a quatro dias. Acúmulo de metabólitos, como H+ e edema tecidual causado por desvio de líquido do plasma para os tecidos são as principais causas de dor muscular aguda, que é percebida como enrijecimento, dolorido e sensibilidade do músculo. A DMIT pode ter como causa um ou mais fatores associados, como: • Lacerações do tecido ou dano dos componentes contráteis. • Mudança de pressão osmótica com retenção de líquido. • Espasmos. • Estiramento excessivo com laceração de tecido conjuntivo. • Inflamação aguda. • Mudança dos mecanismos celulares para regulação de cálcio. As causas exatas da dor muscular ainda não são totalmente esclarecidas, porém sabemos que o grau de desconforto e de perda da força dependem em grande parte da intensidade, da duração e do tipo de movimento realizado na atividade. Estudos também demostram que a contração excêntrica induz DMIT mais intensa do que as contrações concêntricas ou isométricas. A DMIT é provocada por uma série de eventos celulares adaptativos, basicamente uma resposta inflamatória a uma atividade para a qual não se estava acostumado ou suficientemente preparado. Para ver mais detalhes sobre dor muscular, acesse a Minha Biblioteca e leia MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016, p. 547-551. ISBN 9788527730167. Tema 2 Controle neural da contração muscular Como ocorre o controle neural da contração muscular? Quando você vê seu ônibus partindo e resolve correr para alcançá-lo, como os músculos das suas pernas coordenam os movimentos, enquanto sustentam o peso do corpo e o impulsionam para a frente durante a corrida? Para que tarefas como essa, ações do dia a dia e movimentos esportivos sejam executados é necessária uma integração sensitivo-motora, ou seja, um funcionamento em conjunto das divisões sensitiva e motora do sistema nervoso. Uma das características do músculo é a irritabilidade, que diz respeito à sua capacidade de receber estímulos e responder a eles e isso ocorre via sistema nervoso. Toda contração de um músculo esquelético acontece em resposta a um sinal que vem do sistema nervoso. Agora veremos como isso acontece. A célula nervosa que inerva as fibras musculares é chamada de motoneurônio alfa. O conjunto de um motoneurônio alfa e todas as fibras musculares inervadas por ele é chamado de unidade motora. “ As diferenças individuais nas razões fibras musculares/unidades motoras contribui, provavelmente, de maneira significativa para a variação no desempenho esportivo em termos de habilidade. (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2016, p. 397) ” O espaço entre um motoneurônio alfa e uma fibra muscular é chamado de junção neuromuscular (JNM) (ou placa motora terminal) e é neste local que ocorre a comunicação entre sistema nervoso e sistema muscular via neurotransmissores, principalmente acetilcolina (ACh). Quando um impulso chega na JNM a ACh é liberada, transformando assim um impulso nervoso basicamente elétrico em um estímulo químico. A enzima colinesterase degrada ACh na fenda sináptica torna possível a repolarização da membrana pós-sináptica, de forma que o processo possa se repetir com a chegada de um novo impulso. Essa liberação de ACh modifica a permeabilidade da membrana, de forma que os íons de sódio penetrem no neurônio. Se essa modificação na entrada de sódio alcançar o limiar de excitação, um potencial de ação será gerado e uma onda de despolarização irá percorrer toda a fibra muscular. A mudança de carga elétrica leva à liberação de grande quantidade de íons cálcio (Ca2+). A tropomiosina é, então, retirada dos sítios ativos pela troponina e pelo cálcio e assim a miosina poderá se acoplar a esses sítios de ligação nas moléculas de actina. Ocorrerá em seguida mudança na conformação das pontes cruzadas, havendo desse modo o deslizamento que levará à contração muscular. Quando um motoneurônio é estimulado, todas as fibras musculares dessa unidade motora se contraem em toda a sua plenitude ou não se contraem de forma alguma. Essa característica é conhecida como princípio de tudo-ou-nada. O que faz um músculo produzir mais ou menos força é a quantidade de unidades motoras ativadas e a frequência de estímulos que chegam a elas. Quando há necessidade de pouca força, por exemplo, apenas poucas unidades motoras são recrutadas. Uma unidade motora contém apenas um tipo específico de fibra muscular. Assim, de acordo com as características de contração, de tensão e de resistência à fadiga as unidades motoras podem ser classificadas em: Tipo I Tipo IIa Tipo IIx Contração lenta, força baixa e resistência à fadiga. Contração rápida, força moderada e resistência à fadiga. Contração rápida, alta força e fadiga rápida. De acordo com as características do movimento a serrealizado, serão ativados diferentes tipos de unidades motoras. A ordem de recrutamento das unidades motoras (princípio do recrutamento ordenado) está ligada ao tamanho de seu motoneurônio, sendo as unidades motoras com motoneurônios menores recrutadas primeiro. Assim, as unidades motoras do tipo I, que possuem motoneurônios menores, são as primeiras unidades recrutadas em um movimento gradativo. Em seguida, as unidades motoras do tipo II são recrutadas à medida que aumenta a necessidade de força para a realização do movimento. A integração sensório-motora também pode envolver vias reflexas para uma resposta mais rápida. O reflexo é uma resposta programada com antecipação, ou seja, só existe uma ação possível. Nesse tipo de resposta o impulso não é transmitido pela medula espinal até o cérebro antes de a ação ocorrer, tornando-a a mais rápida de todas. Horas e mais horas (até milhares de horas!) de repetição de uma determinada tarefa motora delineia os movimentos neuromusculares, que se tornam automáticos. Por isso, é de extrema importância orientação e supervisão profissional no aprendizado e no aprimoramento de gestos esportivos e na execução de exercícios físicos. Não importa se um movimento é simples ou complexo, pois, se ele for praticado de forma incorreta, esse padrão inadequado será aprendido e incorporado. Ação muscular reflexa também pode ser desencadeada por receptores sensoriais bem especializados chamados proprioceptores, que são altamente sensíveis a estiramento, tensão e pressão. Os fusos musculares (presentes no músculo) respondem ao estiramento do músculo promovendo uma contração muscular mais vigorosa a partir de uma resposta reflexa com o intuito de contrabalançar o estiramento. Já os órgãos tendinosos de Golgi (OTG ou GTO), que ficam próximos à junção do músculo com o tendão, transmitem sinais para a medula espinal a fim de desencadear inibição reflexa (relaxamento quando há alta tensão muscular). Na prática, o OTG protege músculo e tecido conjuntivo de lesões causadas por sobrecarga ou movimento repentino ao qual não se está acostumado. Tema 3 Mecanismos de desenvolvimento da força Quais os mecanismos de desenvolvimento da força? A maioria das pessoas acredita que existe uma relação direta de causa e efeito entre o volume (tamanho) e a força muscular, ou seja, quanto mais volume de músculo, mais força se tem. Realmente existe importante relação entre o volume e a força e isso pode ser observado em situações como a dos praticantes de treino de força que possuem maior massa muscular (hipertrofia) ou quando alguém tem um braço engessado e depois tem menos força nesse membro e ele também está mais fino (atrofia). Porém, é importante entender que a força muscular envolve muitos outros fatores, além do volume. O ganho de volume (massa) muscular é de extrema importância quando o assunto é força, mas os mecanismos associados ao ganho de força são bem mais complexos. Podemos separar os mecanismos de desenvolvimento da força em neurais e musculares. Componentes neurais Os componentes neurais são de extrema importância, principalmente para os iniciantes, e são responsáveis por ganho de força na ausência de hipertrofia. Ao contrário do que se pode pensar, a força não é uma aptidão exclusivamente muscular e sim uma aptidão do sistema motor como um todo. Assim, o ganho de força pode ser alcançado sem que ocorra mudança estrutural do músculo, mas jamais ocorrerá sem que ocorram adaptações nervosas. Os fatores neurais estão relacionados a aprendizado, a coordenação e à capacidade de recrutamento de fibras. Fica clara assim a sua importância no início de um programa de treinamento ou quando um novo gesto motor começa a ser aprendido. Já reparou que um iniciante na academia vai aumentando a sua carga na musculação rapidamente de um treino para o outro? Isso se deve às adaptações neurais, ou seja, esse aumento de força se dá por conta do aprendizado do movimento novo, da coordenação para executá-lo bem e do recrutamento mais eficiente das fibras musculares necessárias para aquele movimento. As adaptações neurais que atuam no desenvolvimento da força incluem maior habilidade de recrutamento de unidades motoras e melhor sincronia do disparo dessas unidades. Alguns estudos ainda sugerem que o treinamento de força poderia reduzir impulsos inibitórios, como o executado pelo órgão tendinoso de Golgi, permitindo que o músculo atinja níveis maiores de produção de força. Outro fator neural sugerido que poderia contribuir para o desenvolvimento de força é a diminuição da coativação de músculos antagonistas. Para se aprofundar no tema leia o artigo: A contribuição dos fatores neurais em fases iniciais do treinamento de força muscular: uma revisão bibliográfica (MAIOR; ALVES, 2003). Componentes musculares Já os mecanismos de desenvolvimento da força relacionados ao músculo estão ligados ao seu crescimento, ou seja, hipertrofia. Essa hipertrofia pode ser aguda (temporária) ou crônica. Hipertrofia aguda Hipertrofia crônica Ocorre durante ou imediatamente após o exercício devido ao acúmulo de líquido (edema). É aquele “inchaço” pós-musculação que muitos gostam de fotografar. No entanto, esse volume é temporário, pois ocorrerá retorno do sangue algumas horas pós o exercício. Se dá por mudanças estruturais que são resultado de um treinamento de força em longo prazo. O aumento do volume das fibras musculares pode ocorrer por aumento de miofibrilas, de filamentos de actina e miosina, de sarcoplasma e/ou de tecido conjuntivo. Alguns estudos sugerem que parte do aumento muscular deve-se à hiperplasia, que é o aumento do número de fibras musculares e não apenas ao aumento do diâmetro das fibras já existentes (hipertrofia). Entretanto, apenas treinamentos de força com intensidade muito alta poderiam resultar em hiperplasia da fibra muscular e mesmo assim sua participação no aumento do volume muscular não passaria de 10%. No início de um treinamento (até por volta da 20ª semana) teremos uma influência predominante dos fatores neurais no desenvolvimento de força. Conforme o treinamento avança, o aumento do tamanho das fibras musculares passará a predominar no processo de ganho de força. Contribuição das Adaptações Neurais e Musculares para os Ganhos de Força. Fatores neurais e fatores musculares são determinantes da força e podem ser modificados pelo treinamento. No entanto, devemos ter ciência de que existem outras variáveis que irão interferir na manifestação da força como: fatores mecânicos do exercício (tipo de alavanca usada no movimento, de pegada, de equipamento etc.), idade, sexo, nutrição, estado psicoemocional, nível de aquecimento e conhecimento do esforço a ser feito. Tema 4 Adaptações esqueléticas e musculares ao treinamento Quais as principais adaptações do músculo ao treinamento? O treinamento de resistência (também chamado de treino resistido ou de força) é o principal mecanismo para se alcançar adaptações que incrementam a força. O treino de resistência compreende um programa de exercícios com uso de carga, em que a aplicação de força contra essa carga irá gerar adaptações neuromusculares que promovem não apenas o desenvolvimento de força muscular, mas também de potência, hipertrofia e endurance (resistência) muscular. De forma simplificada podemos dizer que, em relação ao músculo, a força é a capacidade de gerar tensão; a potência é a capacidade de gerar tensão com velocidade, em um único ou em múltiplos eventos explosivos; o endurance é a capacidade de se manter gerando tensão por um longo período e a hipertrofia é o aumento do tamanho do músculo. Durante muito tempo o treinamento de força foi considerado adequado apenas para atletas de determinadas modalidades, como algumas lutas e certas provas de atletismo. Ah, e apenaspara homens. Por volta da década de 1960-1970 as pesquisas começaram a mostrar que o treinamento de força trazia benefícios para a maioria dos esportes, tanto para homens como para mulheres. Já mais recentemente, no início da década de 1990, finalmente passou a ser reconhecida a importância do treinamento de força não só para a performance esportiva, mas também para saúde e reabilitação. Cabe destacar que o sistema neuromuscular responde muito bem a repetidos estímulos, como acontece com o treinamento. Em três meses já é possível perceber melhorias em função das adaptações alcançadas. Fatores genéticos, atividade física, ativação neural, nutrição, ação hormonal e fatores ambientais interagem entre si no desenvolvimento e na manutenção da massa muscular. As fibras irão se adaptar às cargas impostas, tendo como principais mudanças o aumento da força e do tamanho do músculo. Um músculo se fortalece quando é treinado próximo de sua atual capacidade máxima de gerar força. Diferentes equipamentos podem ser usados para oferecer uma sobrecarga muscular efetiva e certas abordagens são mais adequadas para o emprego mais preciso da sobrecarga. Entretanto, o nível de tensão aplicada no músculo é o mais importante no desenvolvimento da força. O quanto um músculo se torna mais resistente, mais forte, mais potente e maior, depende do programa de treinamento adotado. E a velocidade com que as adaptações ocorrerão será influenciada por diversos fatores, como pelo repouso e nutrição adequados e varia não só de indivíduo para indivíduo, como também de um grupo muscular para outro no mesmo indivíduo. Nas primeiras semanas de treino de resistência já é possível ter ganhos de força, porém com pouca ou nenhuma mudança da massa muscular, o que indica que fatores neurais são os principais responsáveis pelo desenvolvimento da força nos estágios iniciais do treinamento, como vimos anteriormente. O ganho inicial de força de uma pessoa tem muito a ver com o aprendizado de como gerar força de modo mais efetivo, ou seja, está relacionado a fatores neurais. Outro aspecto interessante relacionado ao papel dos fatores neurais na geração de força é o quanto uma pessoa consegue usar da força que ela realmente tem. Em geral, as pessoas não conseguem expressar sua capacidade máxima da força e isso muito tem a ver com questões relacionadas a fatores neurais e psicológicos. Com a manutenção do treinamento resistido, além de adaptações neurais, irão começar a ocorrer adaptações referentes a fatores musculares. Ocorrerá aumento: • Da quantidade de proteína contrátil. • Do tamanho e número de miofibrilas em cada fibra. • Da área de sessão transversa da fibra. • Na quantidade de tecido conjuntivo adjacente às fibras musculares. • De fortalecimento ósseo. O espessamento e fortalecimento do tecido conjuntivo do músculo colabora para a integridade estrutural e funcional de tendões e ligamentos. A carga imposta aos ossos pelo treinamento gera estímulos osteogênicos levando à calcificação e fortalecimento deles, com consequente aumento de sua densidade. Portanto, o treino resistido é essencial para o desenvolvimento e manutenção de um esqueleto saudável e para reabilitação óssea. O aumento do tamanho do músculo se deve à maior síntese proteica estimulada pelo treinamento de força, aliado a um bom perfil hormonal e nutrição adequada. Essa maior síntese de proteína ocorre em resposta a repetidas lesões de fibras musculares causadas por treino com sobrecarga, com posterior supercompensação durante o repouso para produzir efeito anabólico. A quantidade de carga, ou seja, de estresse que o músculo recebe, é o maior responsável pelo tipo de adaptação gerada. Quando o músculo é submetido a uma carga quase máxima isso favorecerá o aumento da força. Já o uso de cargas mais leves, porém com mais repetições, desenvolverá mais a endurance desse músculo. Além dessas alterações estruturais também serão geradas adaptações metabólicas, que irão aumentar a capacidade muscular de gerar energia a partir do metabolismo anaeróbico. O treinamento de resistência faz aumentar as reservas de fosfocreatina e de glicogênio, substratos usados no metabolismo anaeróbico, e também a quantidade de enzimas que favorecem a geração de ATP pelos sistemas ATP-CP e glicolítico. Já o treinamento aeróbico gera pouca ou nenhuma adaptação em relação à força, potência muscular e hipertrofia, mas promove alterações estruturais e metabólicas das fibras musculares, que facilitam a produção de grandes quantidades de ATP via metabolismo aeróbico. O incremento da quantidade e função das mitocôndrias e aumento do número e da densidade de capilares são adaptações musculares resultantes de treinamento aeróbico. Além disso, o treino de endurance aumenta o tamanho das fibras musculares de contração lenta e existem evidências científicas de que também é possível transformar fibras glicolíticas rápidas em fibras oxidativas glicolíticas rápidas com esse tipo de treinamento. Você sabe o que é treinamento concorrente ou concomitante? Esses termos são usados para caracterizar o treinamento das variáveis força e endurance em uma mesma sessão de treinamento ou em sessões realizadas no mesmo dia em turnos diferentes. Para se aprofundar no assunto leia os artigos científicos a seguir. Encerramento Quais os princípios da contração muscular? O encurtamento das fibras musculares (contração) gera tensão (força) de diferentes formas de acordo com as características contráteis e metabólicas de cada tipo de fibra. Existem diferentes tipos de contração muscular e elas podem ser prejudicadas por diferentes fatores que levam a fadiga e dor. Como ocorre o controle neural da contração muscular? Estímulos internos e externos geram influxos sensoriais até o sistema nervoso, que responde com impulsos que chegarão até o músculo resultando em contração de acordo com a demanda. Quais os mecanismos de desenvolvimento da força? Mecanismos neurais e musculares atuam em conjunto, promovendo ganho de força a partir de treinamento. Quais as principais adaptações do músculo ao treinamento? Enquanto o treino resistido irá gerar ganho de força, hipertrofia e incremento do metabolismo muscular anaeróbico, os treinos de endurance levarão a adaptações estruturais e metabólicas das fibras, que facilitam a produção de grandes quantidades de ATP via metabolismo aeróbico. Resumo da Unidade Todas as fibras musculares têm capacidade de produzir energia, tanto por processo anaeróbico como aeróbico. Porém, haverá predomínio de um deles influenciando a velocidade de contração da fibra, tornando cada uma delas mais adequada para certos tipos de atividade. A contração do músculo esquelético, ocasionada por seu encurtamento, será responsável pela geração de força. Estímulos internos e externos geram influxos sensoriais até o sistema nervoso, que responde com impulsos que chegarão até o músculo resultando em contração de acordo com a demanda. Diferentes contrações poderão ser geradas com (dinâmica) ou sem (estática) movimento e terão sua aplicação específica, mas na maioria das atividades mais de um tipo de contração acontece para que haja movimento harmonioso e coordenado. Fadiga e dor muscular são condições limitantes do exercício e devem ser evitadas. O desenvolvimento da força depende de fatores neurais e musculares. Os fatores neurais estão relacionados a aprendizado, a coordenação e à capacidade de recrutamento de fibras. Já as adaptações referentes a fatores musculares correspondem ao aumento da quantidade de proteína contrátil, aumento do tamanho e número de miofibrilas em cada fibra, aumento da área de sessão transversa da fibra, aumento na quantidade de tecido conjuntivo adjacente às fibras musculares e fortalecimento ósseo. Treinamento de resistência promove ganho de força e hipertrofia a partir de repetidas exposiçõesdo músculo à sobrecarga, que causam lesões no tecido muscular, estimulando respostas adaptativas. O ganho inicial de força está ligado ao aprendizado de como gerar força de modo mais efetivo, ou seja, está relacionado a fatores neurais. Já o aumento da força e volume muscular, fortalecimento de tendões, ligamentos e ossos e as adaptações do metabolismo anaeróbico serão alcançadas com o avançar de treinamento de resistência. Já o treinamento aeróbico promoverá alterações estruturais e metabólicas de fibras musculares, que facilitam a produção de grandes quantidades de energia via metabolismo aeróbico. Referências ANDRADE, M. S.; LIRA, C. A. B. Fisiologia do exercício. Barueri: Manole, 2016. ISBN 9788520461815. HALL, J. E.; HALL, M. E. Guyton & Hall - Tratado de Fisiologia Médica. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. ISBN 9788595158696. KENNEY, W. L.; WILMORE, J. H.; COSTILL, D. L. Fisiologia do esporte e do exercício. 7. ed. Barueri: Manole, 2020. ISBN 9786555760910. MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. 1043p. ISBN 9788527730167. PLOWMAN, S. A.; SMITH, D. L. Fisiologia do Exercício - Para Saúde, Aptidão e Desempenho. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. ISBN 9788527724838. POWERS, S. K. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condicionamento e ao desempenho. 9. ed. Barueri: Manole, 2017. ISBN 9788520455104. Para aprofundar e aprimorar os seus conhecimentos sobre os assuntos abordados nessa unidade, não deixe de consultar as referências bibliográficas básicas e complementares disponíveis no plano de ensino publicado na página inicial da disciplina.