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Apostila para apoio aos alunos Bioquímica da Nutrição Profª Patricia Cintra Editado em fevereiro 2018 Revisado em março 2023 Página 1 Profª Patricia Cintra março 2023 I - INTRODUÇÃO A BIOQUÍMICA A bioquímica é a ciência que estuda a química da vida, investigando o componente material de um organismo vivo, identificando a substância ou macromolécula que nele intervém e a forma como interage. Trata-se de uma disciplina que dá suporte ao ensino dos conhecimentos básicos que diversos cursos tais como os da área de saúde e exatas necessitam para uma formação mais abrangente. Essa disciplina aborda temas comuns que são contemplados na Educação Física, Enfermagem, Fisioterapia, Odontologia, Nutrição, Biologia e Química, fazendo-se necessário, pois, demonstrar a inter-relação dessa disciplina com os referidos cursos por meio de aplicação prática do seu conteúdo para compreensão de assuntos específicos é fundamental. Para que e porque precisamos da bioquímica? • Para conhecermos a estrutura química da composição dos alimentos; • Para entendermos o metabolismo dos nutrientes ingeridos. A bioquímica e a fisioterapia A Fisioterapia é a ciência da saúde que estuda, diagnostica, previne e trata os distúrbios da cinesia (ciência do movimento) humana decorrentes de alterações de órgãos e sistemas humanos, de modo que a complexidade da profissão reside na necessidade do entendimento global da bioquímica e de outras ciências básicas. A Bioquímica ensinada nos cursos de Fisioterapia tem um caráter interdisciplinar, uma vez que seus objetivos devem estar especificamente voltados à formação do fisioterapeuta. A bioquímica deve fornecer conhecimentos básicos para facilitar a integração com as ciências da saúde, levando o profissional a integrar a bioquímica com as aplicações práticas, incluindo suas relações com outras ciências. Compreender os fundamentos de bioquímica é de grande importância para que os profissionais de fisioterapia venham a desempenhar sua função em relação ao atendimento que podem proporcionar a seus pacientes. Página 2 Profª Patricia Cintra março 2023 I - A BIOQUÍMICA E A ORGANIZAÇÃO CELULAR Células Definição A célula é uma estrutura funcional altamente específica, com papel fundamental e determinante para o organismo humano, ela é composta de várias estruturas (organelas), sendo que as mesmas são responsáveis por funções diferenciadas, por exemplo na mitocôndria que ocorre a produção de energia para o corpo humano, no núcleo está localizado o genoma humano (DNA e RNA). A célula é formada a partir de moléculas simples como a água, o metano, o dóxido de carbono, a amônia, o nitrogênio e o hidrogênio. Essas moléculas por sua vez foram formadas a partir de átomos. química = estrutura do alimento (composição), tipos de ligações biologia = local de atuação alimento Página 3 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 4 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 01. Níveis de organização estrututal do corpo humano. Átomo Ex: oxigênio, hidrogênio Moléculas Ex: água Macromolécula Ex: proteína Organelas Ex: mitochondria, núcleo, golgi Célula tecido órgão Página 5 Profª Patricia Cintra março 2023 Biomoléculas Para entendermos biomoléculas é preciso saber que bio significa vida e moléculas são estruturas formadas por vários átomos, ou seja, são moléculas de extrema importância para as reações químicas que acontecem no organismo humano. Importante: as reações das moléculas são as reações dos grupos funcionais. Tabela 01. Grupos funcionais de importância bioquímica Página 6 Profª Patricia Cintra março 2023 Origens da vida As condições iniciais na Terra eram inóspitas para a maioria das formas de vida atuais. Havia pouco ou nenhum oxigênio livre (O2). As erupções vulcânicas expeliam gases e violentas tempestades produziam uma chuva torrencial que cobria a Terra, a formação de biomoléculas foi dada a partir de precursores simples (benzeno, ácido sulfúrico, metano, ácido graxo). Figura. Origem das biomoléculas As biomoléculas são frequentemente compostas por apenas seis elementos: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, enxofre e fósforo. O principal elemento dessas biomoléculas é o carbono, que possui propriedade única de ligar-se a outros átomos de carbono, formando longas cadeias. Nos organismos vivos, essa capacidade de autoligação é importante, pois permite a Página 7 Profª Patricia Cintra março 2023 formação de muitos compostos diferentes por meio de rearranjo do esqueleto existente. Dois exemplos ilustram a diferença que uma mudança estrutural simples pode determinar. Tanto a glicose como a frutose possuem fórmula C6H12O6, mas a glicose é um aldeído não muito doce e a frutose é uma cetona muito doce. Figura. Exemplo de glicose e frutose. Procariotos e eucariotos: diferença nos níveis de organização Tanto a célula procariótica como as células eucarióticas contem DNA. O DNA total de uma célula é chamado genoma. As unidades hereditárias individuais, que controlam características ou traços individuais codificando uma proteína ou RNA funcional, são conhecidas como genes. Os procariotos são organismos simples, a palavra de origem grega (Karyon, “núcleo, noz”), significa literalmente “antes do núcleo”. Os procariotos incluem as bactérias e as cianobactérias. (As cianobactérias eram anteriormente chamadas de algas azuis; como a nova terminologia indica, elas têm um parentesco próximo com as bactérias). Os procariotos são organismos unicelulares, embora possam ocorrer associados em grupos, formando colônias com alguma diferenciação de funções celulares. glicose frutose Página 8 Profª Patricia Cintra março 2023 A palavra “eucarioto” significa “núcleo verdadeiro”. Os eucariotos são organismos mais complexos, uni ou pluricelulares. Um núcleo bem definido, separado do restante da célula por uma membrana, é uma das principais características diferenciais entre o eucarioto e um procarioto. Alguns exemplos de eucariotos unicelulares incluem as leveduras e o Paramecium, todos os organismos multicelulares (como os animais e os vegetais) são eucariotos. A principal diferença entre as células procarióticas e eucarióticas é a existência de organelas, especialmente do núcleo, em eucariotos. Uma organela é uma parte da célula que exerce uma função distinta; ela é envolvida por sua própria membrana no interior da célula. Em contraste, a estrutura de uma célula procariótica é bastante simples, não possuindo organelas delimitadas por membranas. Contudo, uma célula procariótica, assim como uma eucariótica, possui uma membrana celular ou plasmática que a separa do mundo exterior; essa é a única membrana encontrada na célula procariótica. A membrana celular consiste, tanto em procariotos como em eucariotos, de uma camada dupla (bicamada) de moléculas lipídicas, na qual estão inseridas váriasproteínas. As mitocôndrias são organelas respiratórias, as reações de oxidação que produzem energia ocorrem nas mitocôndrias eucarióticas. Em procariotos, reações similares ocorrem na membrana plasmática. Os ribossomos (partículas que consistem de RNA e proteína), os quais são sítios de síntese proteica em todos os organismos vivos, estão frequentemente ligados ao retículo endoplasmático em eucariotos. Em procariotos, os ribossomos são encontrados livres no citosol. O citoplasma refere-se à porção da célula fora do núcleo e o citosol é a porção solúvel da célula que fica do lado externo das organelas envoltas por membranas. Os cloroplastos, que são organelas fotossintéticas, são encontrados em células vegetais e em algas verdes, nas quais acontece fotossíntese. Em procariotos capazes de realizar fotossíntese, as reações não ocorrem em cloroplastos, mas em arranjos laminares chamados cromatóforos, que são extensões da membrana plasmática. Página 9 Profª Patricia Cintra março 2023 Tabela função das organelas Organela Função Procarioto/Eucarioto Mitocôndria Ribossomos Retículo endoplasmático Complexo de golgi Lisossomo Membrana celular/ plasmática Cloroplasto Parede celular Vacúolo Núcleo Realizam reações de oxidação que produzem energia Realizam síntese protética Produção de colesterol e lecitina (componentes da membrana celular) e produção de hormônio esteróis. É parte de um sistema de membranas contínuas simples que abrange toda a célula. O retículo endoplasmático rugoso contem ribossomos ligados a membrana e o retículo endoplasmático liso não possuem ribossomos ligados a ele. Está envolvido na secreção de proteína fora da célula, mas também ocorre em células cuja função principal não é secretora. Ele é o sítio de ligação no qual os açúcares são ligados a outros componentes celulares como as proteínas São vesículas delimitadas por membranas que contem enzimas. As enzimas degradam moléculas alvos, geralmente oriundas de fontes externas, como uma etapa do processamento de nutriente da célula Separa o conteúdo da célula do exterior Realizar fotossíntese Camada exterior rígida de células vegetais, proteção para a célula Vesícula delimitada por membrana que isolam substâncias residuais tóxicas Constituição do genoma Eucarioto (célula animal e vegetal) Eucarioto (célula animal e vegetal) e procarioto Eucarioto (célula animal e vegetal) Eucarioto (célula animal e vegetal) Eucarioto (célula animal) Eucarioto (célula animal e vegetal) Eucarioto (célula vegetal) Procarioto Eucarioto (célula vegetal) Eucarioto (célula animal e vegetal) e procarioto Fonte: adaptado Campbell, M.K. Bioquímica. Página 10 Profª Patricia Cintra março 2023 Tabela Comparação entre procariotos e eucariotos Organela Procarioto Eucarioto Núcleo Sem núcleo definido Presente Membrana celular (membrana plasmática) Presente Presente Mitocôndria Não há; as enzimas para reações de oxidação estão localizadas na membrana plasmática Presentes Retículo endoplasmático Não há Presente Ribossomos Presentes Presentes Cloroplastos Não há; a fotossíntese é localizada em cromatóforos Presentes em plantas verdes Fonte: Campbell, M.K. Bioquímica. Página 11 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio • CAMPBELL, M. K; FERREIRA, H. B. Bioquímica. 3 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2006. • NELSON, D. L.; COX, M. M. Lehninger Princípios de Bioquímica. 4 ed.; São Paulo: Sarvier, 2006. Página 12 Profª Patricia Cintra março 2023 II – ÁGUA, pH E TAMPÕES Conceito A água é a substância mais abundante dos organismos vivos, correspondendo a 70% ou mais da sua composição. A molécula de água é constituída por 2 ligações covalentes entre os átomos de oxigênio e hidrogênio. Ela é uma molécula polar, devido a eletronegatividade do átomo de oxigênio e a própria estrutura da molécula. A molécula forma pontes de hidrogênio entre o átomo de oxigênio de uma molécula e um átomo de hidrogênio da outra molécula. Importância da água • Manter a temperatura corpórea. • Solvente universal (digestão e absorção de nutrientes e transporte de nutrientes pelo sangue). • Fornece base para o sangue, saliva, lágrima, suco gástrico. Interações entre as biomoléculas e a água As forças atrativas entre as moléculas, e a sua ligeira tendência para sofrer ionização são essenciais para a estrutura e função das biomoléculas. A molécula de água e seus produtos de ionização, H+ e OH-, influenciam profundamente a estrutura, auto-organização, e propriedades de todos os componentes celulares, incluindo proteínas, ácidos nucléicos e lipídeos. As forças não covalentes responsáveis pela intensidade e especificidade das interações entre biomoléculas são condicionadas pela capacidade de formação de ligações de hidrogênio entre a água e os seus solutos. Página 13 Profª Patricia Cintra março 2023 Influência do pH sobre a estrutura de biomoléculas A escala de pH foi inventada por Sorensen em 1906, devido a necessidade de controlar rigorosamente a concentração hidrogeniônica nos ensaios bioquímicos. pH = - log [H+] O pH é definido como o logaritmo negativo da concentração de íons hidrogênio (o símbolo “p” designa “logaritmo negativo de”). Em uma solução aquosa neutra a 25˚C, a concentração do íon hidrogênio (como também a [OH-]) é 1,0 x 10-7 M ou pH =7. Soluções com pH < 7 são ácidas, enquanto aquelas com pH >7 são básicas. Tabela 01. Escala de pH [H+] (M) pH [OH-] (M) 100 (1) 0 10 -14 10-1 1 10 -13 10-2 2 10-12 10-3 3 10-11 10-4 4 10-10 10-5 5 10-9 10-6 6 10-8 10-7 7 10-7 10-8 8 10-6 10-9 9 10-5 10-10 10 10-4 10-11 11 10-3 10-12 12 10-2 10 -13 13 10-1 10 -14 14 100 (1) É importante frisar que o pH varia na razão inversa da concentração de H+. Desse modo, o aumento de [H+] reduz o pH, enquanto a diminuição o eleva. pH neutro pH básico pH ácido Página 14 Profª Patricia Cintra março 2023 Deve-se notar, também, que o pH é uma função logarítmica, portanto quando o pH de uma solução aumenta de 3 para 4, a concentração de H+ diminui 10 vezes, de 10-3 M para 10-4 M. Quase todos os processos biológicos são dependentes da concentração de H+, observando-se grandes variações de velocidade de reações para pequeníssimas alterações do pH do meio. Mesmo quando o H+ não está diretamente envolvido na reação, a variação da sua concentração pode ter um efeito profundo na estrutura e função das biomoléculas. As enzimas que catalisam as reações biológicas contêm grupos ionizáveis cuja carga varia de acordo com o pH. Os grupos fosfatos dos nucleotídeos funcionam como ácidos fracos, sendo a sua ionização sensível ao pH do meio. Quase todos os processos biológicos são dependentes do pH; uma pequena variação na acidez produz uma grande variação na velocidade da maioria destes processos. Importante A constância do pH é assegurada pela existência de tampões biológicos, que são misturas deácidos fracos e das suas bases conjugadas. Tampões biológicos O conceito original de ação tamponante surgiu de estudos bioquímicos e da necessidade do controle do pH em diversos aspectos da pesquisa biológica, como por exemplo em estudos com enzimas que têm sua atividade catalítica muito sensível a variações de pH. Neste contexto, em 1900, Fernbach e Hubert, em seus estudos com a enzima amilase, descobriram que uma solução de ácido fosfórico parcialmente neutralizado agia como uma “proteção contra mudanças abruptas na acidez e alcalinidade”. Esta resistência à mudança na concentração hidrogeniônica livre de uma solução foi então descrita por estes pesquisadores como “ação tamponante” (do inglês buffering). Página 15 Profª Patricia Cintra março 2023 A regulação do pH nos líquidos biológicos é atividade essencial dos organismos vivos. Mesmo pequenas quantidades de ácido (H+) ou base (OH-) podem afetar muito as estruturas e as funções das biomoléculas. A concentração do H+ (pH) é mantida relativamente constante por meio de sistemas tampões que resistem a alterações bruscas de pH quando são adicionadas quantidades relativamente pequenas de ácido (H+) ou base (OH-) à solução. Um sistema tampão consiste em um ácido fraco (o doador de prótons) e sua base conjugada (o aceptor de prótons). Quando um ácido forte como o HCL é adicionado a água pura, todo o ácido adicionado contribui diretamente para a redução de pH. No entanto, quando o HCL é adicionado a uma solução contendo um ácido fraco em equilíbrio com sua base conjugada (A-), o pH não se altera tão dramaticamente, pois parte dos prótons adicionados combina com a base conjugada para amenizar o aumento da [H+] HCL H+ + CL- grande aumento da [H+] HCL + A- HA + CL- pequeno aumento da [H+] Quando uma base forte (como o NaOH) é adicionada à água pura, ocorre grande redução da [H+]. Se a base for adicionada a um ácido fraco em equilíbrio com sua base conjugada (A-), parte dos íons hidróxidos aceita prótons do ácido para formar H2O e, portanto, não contribui para a redução do [H+]: NaOH Na+ + OH- grande redução da [H+] NaOH + HA Na+ + A- + H2O pequena redução da [H+] A resistência a mudanças no pH de um tampão depende de dois fatores: (a) a concentração molar do ácido fraco e sua base conjugada e (b) a relação entre suas concentrações. Tampões de ocorrência natural e industrial: contextualização Quase todos os processos biológicos são dependentes do pH; uma pequena variação na acidez produz uma grande variação na velocidade da maioria destes processos. Página 16 Profª Patricia Cintra março 2023 O pH do sangue de mamíferos é um reflexo do estado do balanço ácido-base do corpo. Em condições normais, o pH é mantido entre 7,35 e 7,45 devido a uma série de mecanismos complexos que compreendem produção, tamponamento e eliminação de ácidos pelo corpo (Perrin e Dempsey, 1974). Um papel importante neste equilíbrio é desempenhado por sistemas inorgânicos, tais como H2PO4 –/HPO4 -2 (tampão fosfato), CO2/H2CO3/HCO3 – (tampão bicarbonato/ácido carbônico), e grupos orgânicos ácidos e básicos, principalmente de proteínas. Uma diminuição (acidose) ou aumento (alcalose) do pH do sangue pode causar sérios problemas e até mesmo ser fatal. A acidose metabólica é a forma mais frequentemente observada entre os distúrbios do equilíbrio ácido-base. Pode ser causada por diabetes grave, insuficiência renal, perda de bicarbonato por diarréia e hipoxia ou isquemia, durante, por exemplo, exercício físico intenso. Uma compensação natural da acidose metabólica pelo corpo é o aumento da taxa de respiração, fazendo com que mais CO2 seja expirado. Dentre os fluidos biológicos, a saliva também constitui uma solução tampão, com a função de neutralizar os ácidos presentes na boca, evitando o desenvolvimento de bactérias que formam a placa bacteriana. O pH normal da saliva varia entre 6,4 e 6,9 no intervalo entre as refeições e de 7,0 a 7,3 enquanto comemos. Na indústria de alimentos, alguns ácidos e bases (ácido cítrico, ácido adípico, bicarbonato de sódio, ácido lático, tartarato ácido de potássio, ácido fosfórico) são usados como agentes de processamento para o controle da acidez e alcalinidade de muitos produtos alimentícios. Dependendo da quantidade desses aditivos e da acidez ou alcalinidade do alimento antes da adição destes compostos, pode ocorrer a formação de sistemas tampões ou estes simplesmente funcionam como agentes neutralizantes. Estes tipos de aditivos são usados em gelatinas, fermento, processamento de queijo e em bebidas refrigerantes (Snyder, 1995). Em alguns casos, a própria solução tampão (ácido lático/lactato de sódio) é adicionada ao alimento, com a função de agente conservante, evitando a deterioração por bactérias e outros microrganismos (Zeitoun e Debevere, 1992). Neste caso, as substâncias do tampão são utilizadas como agentes Página 17 Profª Patricia Cintra março 2023 antimicrobiais mantendo o alimento com o pH baixo e consequentemente evitando o desenvolvimento de microrganismos, como fungos e bactérias. Alcalose e acidose metabólica O pH sanguíneo deve obedecer a faixa de 7,35 a 7,45, quando há algum distúrbio do equilíbrio ácido-base, atribuímos o nome de acidose ou alcalose metabólica. Alcalose = pH sanguíneo alto. Acidose = pH sanguíneo baixo. A alcalose é uma condição na qual o sangue apresenta um excesso de base (ou uma falta de ácido), acarretando ocasionalmente um aumento do pH sanguíneo. A acidose e a alcalose não são doenças e sim consequências de vários distúrbios. A presença de uma acidose ou uma alcalose provê um indício importante ao médico de que existe um problema metabólico grave. A acidose e a alcalose podem ser classificadas como metabólicas ou respiratórias, de acordo com a sua causa primária. A acidose metabólica e a alcalose metabólica são causadas por um desequilíbrio na produção e na excreção de ácidos ou bases pelos rins. A acidose respiratória e a alcalose respiratória são causadas principalmente por distúrbios pulmonares ou respiratórios. A acidose metabólica é a acidez excessiva do sangue caracterizada por uma concentração anormalmente baixa de bicarbonato no sangue. Quando um aumento do ácido supera o sistema tampão do pH do corpo, o sangue pode tornar- se realmente ácido. Quando o pH sanguíneo diminui, a respiração torna-se mais profunda e rápida à medida que o organismo tenta livrar o sangue do excesso de ácido reduzindo a quantidade de dióxido de carbono. Finalmente, os rins também tentam compensar excretando mais ácido na urina. No entanto, ambos os mecanismos podem ser superados quando o corpo continua a produzir ácido em demasia, o que acarreta uma acidose grave e, em última instância, o coma. Página 18 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio • FIORUCCI, R.A; SOARES, M. H.F.E; CAVALHEIRO, E.T.G. O conceito de solução tampão. Química nova na escola, número 13, maio 2001. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc13/v13a04.pdf. • MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. • SNYDER, C.H. The extraordinary chemistry of ordinary things. 2ª ed. Nova Iorque: John Wiley & Sons, 1995. p. 512-524. • PERRIN, D.D. e DEMPSEY, B. Buffer for pH and metal ion control. Londres: Chapman and Hall, 1974. • ZEITOUN, A.A.M. e DEBEVERE, J.M. Decontamination with lactic-acidsodium lactate buffer in combination with modified atmosphere packaging effects on the shelf-live of fresh poultry. International Journal of Food Microbiology,v. 16, n. 2, 1992, p. 89. http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc13/v13a04.pdf Página 19 Profª Patricia Cintra março 2023 III – AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS. As proteínas são as biomoléculas mais abundantes nos seres vivos e exercem funções fundamentais em todos os processos biológicos. São polímeros formados por α-aminoácidos, unidos entre si por ligações peptídicas. As proteínas são constituídas de 20 aminoácidos primários diferentes, reunidos em combinações praticamente infinitas, possibilitando a formação de milhões de estruturas diferentes. Aminoácidos Os α-aminoácidos tem um grupo carboxílico (-COOH), um grupo amino primário (-NH2), uma cadeia lateral diferenciada (grupo R) e um átomo de hidrogênio, todos covalentes ligados a um átomo de carbono central (α). Os aminoácidos são classificados como α, β ou de acordo com a localização do grupo amino em relação ao grupo carboxila. Nos α-aminoácidos, o tipo mais comum, o grupo amino está ligado ao átomo de carbono adjacente ao grupo carboxílico (carbono α) Figura 01. Exemplo de um α-aminoácido Peptídeos Os peptídeos são cadeias de aminoácidos. Alguns peptídeos atuam como moléculas de sinalização usadas para coordenar o imenso número de processos bioquímicos em organismos celulares. Os exemplos incluem o apetite, a pressão sanguínea e a percepção da dor. Evidencias recentes sugerem que a leptina, polipeptídeo produzido pelos adipócitos, exerce seus efeitos sobre o peso corporal. http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://3.bp.blogspot.com/_VRv1F_Ue7cw/SDsfjFrVQ1I/AAAAAAAAACI/T4vKdECF97Y/s320/aminoacidos.gif&imgrefurl=http://vetorbiologia.blogspot.com/2008/05/protenas.html&usg=__l7ShzIATFUcHZoRmKkMtb_ROX-w=&h=108&w=140&sz=2&hl=pt-BR&start=4&zoom=1&tbnid=Lap0cGeE06rs9M:&tbnh=72&tbnw=93&ei=8NJHT6qOKYiviQLhmIjbDQ&prev=/search?q=estrutura+de+um+amino%C3%A1cido&hl=pt-BR&biw=1366&bih=556&gbv=2&tbm=isch&itbs=1 Página 20 Profª Patricia Cintra março 2023 A pressão sanguínea é influenciada pelo volume sanguíneo e pela viscosidade. Dois peptídeos afetam o volume sanguíneo: a vasopressina e o fator natriurético atrial (ANF). A vasopressina, também chamada de hormônio antidiurético (ADH), é sintetizada no hipotálamo e contem nove resíduos de aminoácidos. O ADH estimula os rins a reter a água. A estrutura do ADH é similar a outro peptídeo produzido pelo hipotálamo, chamado oxitocina, uma molécula de sinalização que estimula a liberação do leite pelas glândulas mamárias e influencia o comportamento sexual, maternal e social. A oxitocina (produzida no útero) estimula a contração uterina durante o parto. O ANF – peptídeo produzido por células atriais cardíacas em resposta à distensão – estimula a formação de urina diluída, efeito oposto a vasopressina. O ANF exerce seus efeitos, em parte, pelo aumento da excreção de Na+ pela urina, processo que causa aumento da excreção de água e a inibição da secreção de renina pelo rim. Um importante dipeptídeo comercial sintético é o adoçante artificial aspartame (éster metílico de L-aspartil-L-fenilalanina). Proteínas As proteínas são componentes essenciais à matéria viva. Atuam como catalisadores (enzimas), transportadores (de oxigênio, vitaminas, fármacos, lipídeos, ferro, cobre), armazenamento (caseína do leite), proteção imune (anticorpos), reguladores (insulina, glucagon), movimento (actina, miosina), estruturais (colágeno), transmissão de impulsos nervosos (neurotransmissores), controle do crescimento e diferenciação celular (fatores de crescimento). Outras funções das proteínas: manutenção da distribuição de água entre o compartimento intersticial e o sistema vascular do organismo, participação da homeostase e coagulação sanguínea, nutrição de tecidos, formação de tampões para manutenção do pH etc. Com base em sua composição, as proteínas são divididas em simples, que constituem somente em cadeias polipeptídicas, e conjugadas, que além das cadeias polipeptídicas, também possuem componentes orgânicos e inorgânicos. A porção não peptídica das proteínas conjugadas é o grupo Página 21 Profª Patricia Cintra março 2023 prostético. As mais importantes proteínas conjugadas são: nucleoproteínas, lipoproteínas, fosfoproteínas, metaloproteínas, glicoproteínas, hemoproteínas e flavoproteínas. Considera-se uma proteína quando existem pelo menos 40 resíduos de aminoácidos na estrutura. Isso representa o ponto de demarcação no tamanho entre um polipeptídeo e uma proteína; entretanto, deve-se enfatizar que essa é uma definição de conveniência, pois não existem diferenças marcantes nas propriedades dos peptídeos grandes e das proteínas grandes. Estrutura, classificação e nomenclatura dos aminoácidos Estrutura A estrutura das proteínas é extraordinariamente complexa, e seu estudo exige o conhecimento dos vários níveis de organização. A distinção dos níveis de organização é realizada em termos de natureza das interações necessárias para sua manutenção. Destingem-se quatro níveis de organização existentes nas proteínas. As quatro estruturas são: • Primária: número espécie e sequência dos aminoácidos em uma cadeia polipeptídica. É especificada por informação genética. • Secundária: arranjos regulares e recorrentes da cadeia peptídica (conformações com hélice, folha pregueada ou ao acaso). • Terciária: pregueamento não periódico da cadeia polipeptídica, formando uma estrutura tridimensional estável. • Quaternária: arranjo espacial de duas ou mais cadeias polipeptídicas (ou subunidades proteicas) com a formação de complexos tridimensionais. Página 22 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 02. Exemplo das estruturas da proteína Página 23 Profª Patricia Cintra março 2023 Estrutura primária A estrutura primária descreve o número de aminoácidos, a espécie, a sequência (ordem) e a localização das pontes dissulfetos de uma cadeia polipeptídica. A estrutura é estabilizada pelas ligações peptídicas e pontes dissulfetos. Exemplo 01. Estrutura primária Estrutura secundária As proteínas apresentam arranjos tridimensionais com dobramentos regulares estabilizados por pontes de hidrogênio entre os átomos dos grupamentos NH e CO que participam das ligações peptídicas (-NH.... O=C-). Formam conformações α-hélice, folha β pregueada e ao acaso. Outras regiões da cadeia peptídica formam outros tipos de estrutura, como alças e espirais. As cadeias laterais não são consideradas na estrutura secundária. Página 24 Profª Patricia Cintra março 2023 Exemplo 02. Pontes de hidrogênio Exemplo 03. Estrutura secundária Página 25 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 03. A forma de β-folha pregueada ocorre entre duas cadeias peptídicas dentro da molécula Estrutura terciária A estrutura terciária consiste no enovelamento não periódico da cadeia peptídica e é determinada pela sequência de aminoácidos na proteína. O dobramento proteicoé um processo no qual uma molécula não organizada nascente adquire uma estrutura tridimensional altamente organizada como consequência de interações entre as cadeias laterais presentes em sua estrutura primária. A estrutura terciária tridimensional das proteínas é estabilizada por interações entre as cadeias laterais: • Interações hidrofóbicas: são as forças não covalentes mais importantes para a estabilidade da estrutura peptídica enovelada. As interações são resultantes da tendência de as cadeias laterais não polares – presentes na alanina, na isoleucina, na leucina, na fenilalanina e na valina - serem atraídas umas pelas outras para se agruparem em áreas específicas e definidas de modo a minimizar seus contatos com a água. Quando Página 26 Profª Patricia Cintra março 2023 circundados por moléculas de água, os grupos hidrofóbicos são induzidos a se juntarem para ocupar o menor volume possível. As interações hidrofóbicas levam os peptídeos ao processo de dobramento, configurando sua estrutura nativa. • Interações eletrostáticas (ligações iônicas): grupos carregados positivamente, como os grupos protonados de lisil, arginil e histidil, interagem com grupos carregados negativamente, como o grupo carboxila dos ácidos glutâmico e aspártico (pares iônicos ou pontes salinas). • Pontes dissulfeto: a única ligação covalente para a manutenção da estrutura terciária é a ponte dissulfeto (Cys-S-S-Cys). São formadas à medida que a proteína se dobra para adquirir sua conformação nativa. No meio extracelular, essas ligações protegem parcialmente a estrutura das proteínas de modificações adversas de pH e das concentrações de sais. As proteínas intracelulares raramente contem pontes dissulfeto devido a altas concentrações citoplasmáticas de agentes redutores. • Pontes de hidrogênio: são formadas no interior e na superfície das proteínas e contribuem moderadamente para direcionar o enovelamento. • Forças de Van der Waals: são uma força de atração inespecíficas que ocorre entre dois átomos próximos. Podem existir entre a fenilalanina e tirosina próximas umas das outras ou entre resíduos vizinhos de serina. As forças de Van der Waals são também proeminentes entre as cadeias laterais envolvidas nas interações hidrofóbicas. São as mais fracas das forças não covalentes, mas sua contribuição total (efeito acumulativo) é de substancial importância para a estabilidade enovelada. Página 27 Profª Patricia Cintra março 2023 Exemplo 04. Ligações existentes na estrutura terciária Estrutura quaternária Muitas proteínas são multiméricas; são compostas por duas ou mais cadeias peptídicas. As cadeias individuais de peptídeos – chamadas protômeros ou subunidades – estão associadas entre si por interações não covalentes: efeitos hidrofóbicos, pontes de hidrogênio e interações eletrostáticas. O arranjo espacial das subunidades é conhecido como estrutura quaternária das proteínas. Um exemplo de estrutura quaternária é a hemoglobina formada por quatro subunidades, ligadas entre si em uma configuração específica (oligômero). Página 28 Profª Patricia Cintra março 2023 Exemplo 05. Hemoglobina. Classificação Quanto a composição • Proteínas Simples - Por hidrólise liberam apenas aminoácidos. • Proteínas Conjugadas - Por hidrólise liberam aminoácidos mais um radical não peptídico, denominado grupo prostético. Ex: metaloproteínas, hemeproteínas, lipoproteínas, glicoproteínas, etc. Página 29 Profª Patricia Cintra março 2023 Quanto ao número de ligações peptídicas Proteínas Monoméricas - Formadas por apenas uma cadeia polipeptídica. Proteínas Oligoméricas - Formadas por mais de uma cadeia polipeptídica. São as proteínas de estrutura e função mais complexas. Quanto a Forma • Proteínas fibrosas Na sua maioria, as proteínas fibrosas são insolúveis nos solventes aquosos e possuem pesos moleculares muito elevados. Exemplos: colágeno, queratina, elastina. São formadas geralmente por longas moléculas mais ou menos retilíneas e paralelas ao eixo da fibra. A esta categoria pertencem as proteínas de estrutura, como colágeno do tecido conjuntivo, as queratinas dos cabelos, as esclerotinas do tegumento dos artrópodes, a conchiolina das conchas dos moluscos, ou ainda a fribrina do soro sanguíneo ou a miosina dos músculos. Algumas proteínas fibrosas, porém, possuem uma estrutura diferente, como as tubulinas, que são formadas por múltiplas subunidades globulares dispostas helicoidalmente. • Proteínas globulares De estrutura espacial mais complexa, são mais ou menos esféricas. São geralmente solúveis nos solventes aquosos e os seus pesos moleculares situam-se entre 10.000 e vários milhões. Nesta categoria situam-se as proteínas ativas como as enzimas, transportadores como a hemoglobina, etc. Exemplo: enzimas, albuminas, hemoglobina. Página 30 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 05. Diferença entre proteína fibrosa e globular A classificação também depende do radical R dos aminoácidos. Aminoácidos apolares (não polares): Apresentam radicais de hidrocarbonetos apolares, exceto a glicina. São radicais hidrófobos. Exemplo 06. Aminoácidos apolares Página 31 Profª Patricia Cintra março 2023 Aminoácidos aromáticos: Exemplo 07. Aminoácidos aromáticos Aminoácidos polares neutros: Apresentam radicais que tendem a formar pontes de hidrogênio. Exemplo 08. Aminoácidos polares neutros Página 32 Profª Patricia Cintra março 2023 Aminoácidos ácidos: Apresentam radicais c/ grupo carboxílico quase sempre têm cargas negativas no pH fisiológico São hidrófilos. Ácido aspártico: aspartato. Ácido glutâmico: glutamato. Exemplo 09. Aminoácidos ácidos Página 33 Profª Patricia Cintra março 2023 Aminoácidos básicos: Apresentam radicais com grupo amino têm cadeias laterais muito polares São hidrófilos. Exemplo 10. Aminoácidos básicos. Nomenclatura Peptídeos menores são designados de acordo com os aminoácidos que os constituem. Quando o número de aminoácidos é grande, o nome da proteína muitas vezes é dado de acordo com a função que ela desempenha. Peptídeos: Podem ser oligo- ou polipeptídeos. N= 2 a 10 (oligopeptídeo); N=11- 40 (polipeptídeo); N > 40 PROTEÍNA. Proteínas são polipeptídeos de elevado peso molecular. Página 34 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio • MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. Página 35 Profª Patricia Cintra março 2023 III – AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS. Classificação nutricional e metabólica dos aminoácidos A classificação nutricionaldos aminoácidos categorizava-os em dois grupos: indispensáveis (essenciais) e dispensáveis (não essenciais). Os aminoácidos indispensáveis são aqueles cujo esqueleto de carbono não pode ser sintetizado pelo organismo, necessitando ser obtidos na alimentação, são eles: histidina; isoleucina; leucina; lisina; metionina; fenilalanina; treonina; triptofano; valina. A definição de aminoácidos dispensáveis, tem se tornado controversa, uma vez que muitas informações têm sido relatadas sobre o metabolismo intermediário e as características nutricionais desses compostos. Laidlaw e Kopple separaram os aminoácidos dispensáveis em duas classes: 1. Verdadeiramente dispensáveis e 2. Condicionalmente indispensáveis. Página 36 Profª Patricia Cintra março 2023 Cinco aminoácidos são denominados dispensáveis, uma vez que podem ser sintetizados no organismo a partir de outros aminoácidos ou outros metabólitos de complexos nitrogenados. Além disso, seis aminoácidos são considerados condicionalmente indispensáveis, uma vez que são sintetizados a partir de outros aminoácidos e/ou sua síntese é limitada sob condições fisiopatológicas especiais. Portanto, a designação aminoácidos condicionalmente indispensável caracteriza que, em condições normais, o organismo pode sintetizar esses aminoácidos para alcançar a necessidade metabólica. Contudo, em determinadas condições fisiológicas ou fisiopatológicas, ocorre necessidade da ingestão desses aminoácidos. A necessidade quantitativa de aminoácidos condicionalmente indispensáveis não tem sido determinada e presume-se que varia em grandes extensões, de acordo com a condição específica. Página 37 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio MOTTA, V.T. Bioquímica. 2. ed. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. COZZOLINO, S.M.F.; COMINETTI, C. Bases bioquímcias e fisiológicas da nutrição nas diferentes fases da vida, na saúde e na doença. Barueri, SP: Manoel. 2013. Página 38 Profª Patricia Cintra março 2023 III – AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS. Degradação de aminoácidos (catabolismo) Conceitos importantes Metabolismo é o processo geral pelo qual os sistemas vivos adquirem e usam energia livre para realizarem suas funções. O metabolismo é dividido em duas partes: Catabolismo ou degradação é o processo no qual os nutrientes e os constituintes celulares são degradados para aproveitamento de seus componentes e/ou para geração de energia. Anabolismo ou biossíntese: processo no qual as biomoléculas são sintetizadas a partir de componentes mais simples (utiliza a energia liberada durante o catabolismo). Figura 01. Visão geral do anabolismo e catabolismo Proteínas Aminoácidos α - cetoácidos oxaloacetato Acetil - CoA NH3 Uréia excreção citrato Ciclo ácido cítrico α - cetoglutarato Co2 + H2O excreção Página 39 Profª Patricia Cintra março 2023 Digestão e absorção Antes de serem absorvidos, os alimentos ingeridos pelo organismo são quebrados em moléculas mais simples. Por exemplo, as proteínas são hidrolisadas a seus aminoácidos constituintes. A principal função da digestão dos alimentos ingeridos é transformá-los em unidades menores para serem absorvidos e utilizados. O sistema gastrointestinal inclui: estômago, fígado, vesícula, pâncreas, intestino delgado e cólon. Órgãos que contribuem para digestão • Boca: contém saliva produzida pelas glândulas parótidas, submandibulares e sublinguais, várias enzimas (p. ex., α- amilase, que hidrolisa ligações α-1,4 dos carboidratos) e, mucina, que atua como lubrificante. O alimento é mastigado, homogeneizado, digerido e lubrificado para ser engolido. O processo mais importante que ocorre na boca consiste na quebra mecânica de alimentos e sua hidratação com a saliva. • Estômago: secreta ácido clorídrico (HCL) e enzimas digestivas no lúmen gástrico (p. ex., pepsinogênio). É o órgão responsável pelo processo inicial de mistura e digestão. A digestão gástrica libera pequena quantidade de peptídeos, aminoácidos e ácidos graxos que estimulam a liberação do suco pancreático e da bile no lúmen do intestino delgado. • Pâncreas: secreta no lúmen do duodeno bicarbonato e enzimas para a digestão intraluminal. O bicarbonato neutraliza o conteúdo estomacal ácido. • Intestino delgado: é o principal sítio de digestão e absorção de todas as classes de alimentos. É o local onde são excretadas as enzimas pancreáticas e a bile elaborada no fígado. No intestino delgado estão presentes microvilosidades que se assemelham a uma escova e são Página 40 Profª Patricia Cintra março 2023 denominadas bordas em escova. As bordas fornecem uma ampla área recoberta por muitas enzimas, como di e oligossacarídeos, esterases, amino e dipeptidades, que permitem a digestão intraluminal final dos alimentos para geração de moléculas mais simples absorvidas pelos enterócitos. O íleo participa da circulação êntero-hepática, que contribui para a reciclagem dos sais biliares e a absorção de nutrientes essenciais como a vitamina B12. Além disso, o intestino delgado é o maior órgão endócrino do organismo e produz uma variedade de hormônios que regulam a digestão e o balanço energético. É o principal local de absorção de água e íons sódio e cloro. • Intestino grosso: está envolvido na reabsorção de água, íons sódio e cloretos e na secreção de potássio e bicarbonato. É também local de absorção de alguns metabólitos produzidos por bactérias, particularmente lactatos, ácidos graxos de cadeia curta, como propionato e butirato, além de amônia, gerada por hidrólise da uréia pela uréase bacteriana. Enzimas A maioria das enzimas digestivas sintetizadas pelas glândulas salivares, mucosa gástrica e pâncreas é produzida e armazenada como pró-enzima (ou zimogênios), formas precursoras inativas. As pró-enzimas são armazenadas em vesículas conhecidas como grânulos de zimogênio intracelulares e liberadas e ativadas mediante um estímulo apropriado. A enzima amilase não é secretada como pró-enzima por não ameaçar os tecidos do trato gastrointestinal. As enzimas digestivas hidrolisam macromoléculas complexas em unidades menores para facilitar a absorção. Digestão e absorção de proteínas A quebra da maioria dos 20 aminoácidos naturais é iniciada pela remoção do grupo α – amino do aminoácido via transaminação. Os esqueletos de carbono resultantes são então catabolizados para gerar energia ou usados para sintetizar outras moléculas (p.ex., glicose, cetonas). Os átomos de hidrogênio dos aminoácidos podem ser utilizados para a síntese de outros compostos Página 41 Profª Patricia Cintra março 2023 nitrogenados, como heme, purinas e pirimidinas. O excesso de nitrogênio é excretado na urina em forma de uréia. Nas proteínas nativas, as cadeias polipeptídicas são dobradas em arranjo espacial estabilizado por ligações não covalentes. Nessa forma compactada, muitas ligações peptídicas foram ocultas no interior da molécula, dificultando o ataque dessas ligações pelas enzimas hidrolíticas. Uma importante etapa inicial na digestão das proteínasé sua desnaturação realizada pelo ácido clorídrico no estômago em pH < 2. A desnaturação rompe parte das ligações que estabilizam as dobras das cadeias polipeptídicas, tornando-as mais suscetíveis à proteólise. Segundo ADIBI (2003), o intestino delgado pode ser considerado o principal órgão na digestão dos alimentos. Por muito tempo, foi convencionalizado que as proteínas são completamente hidrolisadas no lúmen intestinal e absorvidas como aminoácidos livres. No entanto, há cerca de 30 anos atrás, estudos de digestão protéica no intestino delgado de humanos, tem revelado que o principal produto da digestão de proteínas no lúmen intestinal não são aminoácidos livres e sim dipeptídeos e tripeptídeos. Sendo assim, esses di e tri peptídeos são transportados para o interior do enterócito através do transportador de oligopeptídeos (PEPT-1), fundamental na absorção de proteínas. A entrada de di e tri peptídeos nos enterócitos permitem ao organismo menor gasto de ATP, quando comparados com a entrada de aminoácidos livres, uma vez que o organismo gasta 1 ATP para entrada de cada aminoácido livre na célula. Como o turnover no intestino delgado é intenso, com as células formadas nas criptas migrando para a extremidade das vilosidades, células epiteliais e outras são continuamente esfoliadas para o lúmen intestinal. Assim, além do nitrogênio presente nas fezes poder ser proveniente da dieta, a secreção de proteínas e a esfoliação de células no lúmen intestinal são formas de excreção de nitrogênio de origem não alimentar. Neste sentido, cerca de 60 a 70 g de proteína são adicionados ao lúmen, 20 g podem ser oriundos das proteínas Página 42 Profª Patricia Cintra março 2023 secretadas e 50 g podem originar-se das células descamadas (SHILS et al., 2003). Figura 02. Digestão e absorção das proteínas As proteases do trato digestivo hidrolisam tanto proteínas da dieta (ou exógenas) como proteínas endógenas. As proteínas endógenas incluem as próprias proteases secretadas no intestino ou resultantes da renovação das células epiteliais do intestino. De fato, os aminoácidos absorvidos por uma pessoa de porte médio são derivados de maneira quase equitativa de proteína endógena (70g/dia) e da proteína da dieta (60 a 90g/dia). Somente uma pequena fração é perdida pelas fezes. 1. Enzimas proteolíticas (proteases) A digestão ocorre em dois estágios: (1) endopeptidases catalisam a hidrólise de ligações peptídicas no interior da molécula de proteína para formar peptídeos que (2) são hidrolisados para formar aminoácidos pelas exopeptidases e dipeptidases. Página 43 Profª Patricia Cintra março 2023 A pepsina, secretada pelas células epiteliais do estômago (como a pró-enzima pepsinogênio) por estímulo do hormônio secretina liberado no sangue em resposta ao alimento, é uma protease relativamente não específica que reconhece os grupos R aromáticos (tirosina, fenilalanina, triptofano) ou contendo cadeias laterais volumosas (leucina, metionina). A pepsina digere de 10 a 20% da proteína da refeição, formando grandes peptídeos, pequenos peptídeos e aminoácidos livres. A pepsina hidrolisa ligações peptídicas no interior de moléculas de proteínas e, por isso, é denominada endopeptidases, por não atacar as extremidades das cadeias. O quimo, conteúdo do estômago parcialmente digerido, atinge o duodeno e desencadeia a digestão do intestino delgado. O ácido induz o duodeno a liberar hormônios (secretina e colecistocinina) no sangue, o que estimula o pâncreas a liberar o suco pancreático alcalino. O suco contém proteases que mostram diferentes especificidades em suas ações; cada uma hidrolisa somente as ligações peptídicas adjacentes a certos aminoácidos. A tripsina cliva ligações peptídicas da extremidade C-terminal de aminoácidos básicos arginina e lisina, enquanto a quimotripsina rompe ligações peptídicas no C-terminal da leucina, metionina, asparagina e de aminoácidos aromáticos fenilalanina, tirosina e triptofano. A elastase rompe o C-terminal de aminoácidos hidrofóbicos pequenos: alanina, glicina e serina. A pepsina á ativada pelo HCL por remoção de 44 aminoácidos da extremidade N-terminal da pró-enzima pepsinogênio. Esse segmento adicional cobre e bloqueia o centro ativo da enzima. Uma vez ativada, a pepsina hidrolisa outras moléculas de pepsinogênio para gerar moléculas adicionais de pepsina (autocatálise). O tripsinogênio pancreático no lúmen do intestino delgado é transformado em tripsina pela ação hidrolítica da enteropeptidase, uma protease sintetizada pelas células da borda em escova intestinal. Uma vez ativada, a tripsina é capaz de ativar moléculas adicionais de tripsinogênio e de outros zimogênios pancreáticos. Página 44 Profª Patricia Cintra março 2023 1. Tripsinogênio tripsina + peptídeo 2. Quimotripsinogênio quimotripsina + peptídeo 3. Pró-elastase elastase + peptídeo 4. Pró-carboxipeptidase A e B carboxipeptidase A e B + A ativação das pró-enzimas envolve a hidrólise de uma ou mais ligações peptídicas, a qual resulta na liberação de um segmento da cadeia polipeptídica e permite que a enzima assuma a conformação tridimensional com a correta configuração do sítio ativo. O pâncreas também secreta um peptídeo de baixo peso molecular, chamado inibidor de tripsina pancreática, que se liga fortemente ao sítio ativo da tripsina. O inibidor evita que algumas moléculas de tripsina desencadeiem a ativação prematura das enzimas proteolíticas e danifiquem o pâncreas. 2. Carboxipeptidades O suco pancreático também contém carboxipeptidases A e B, exopeptidases zinco-dependentes (metaloproteases), que clivam ligações peptídicas e liberam aminoácidos um a um da extremidade C- terminal de peptídeos. As duas enzimas são secretadas como pró- enzimas e ativadas pela tripsina. A carboxipeptidade A é específica para aminoácidos com cadeias laterais hidrofóbicas (alanina, valina, leucina, isoleucina), enquanto a carboxipeptidase B é específica para aminoácidos básicos (lisina, arginina). enteropeptidase tripsina tripsina tripsina peptídeo Página 45 Profª Patricia Cintra março 2023 3. Aminopeptidases Células da mucosa intestinal produzem várias aminopeptidases intra e extracelulares que liberam aminoácidos sequencialmente da extremidade N-terminal de pequenos peptídeos. Os aminoácidos absorvidos são os mais abundantes produtos da digestão proteica. No entanto, alguns dipeptídeos e tripeptídeos são produzidos e absorvidos sem digestão. Absorção de aminoácidos e pequenos peptídeos Aminoácidos e alguns pequenos peptídeos são absorvidos nos enterócitos do jejuno, particularmente dipeptídeos e tripeptídeos. Existem vários sistemas transportadores específicos para aminoácidos e peptídeos na superfície apical dos enterócitos. Alguns desses sistemas de transporte para o interior do enterócito são acoplados ao transporte de íons de Na+ a favor do gradiente de concentração. Há no mínimo seis sistemas carreadores com diferentes especificidades. Uma vez no interior do enterócito, os peptídeos são hidrolisados em aminoácidos livres por aminopeptidases intracelulares. Aminoácidos livres são então transportados através da membrana basolateral para o espaço intersticial e a seguir para o sangue. Alguns aminoácidos são oxidadospara fornecer energia para as células intestinais, em particular a glutamina, glutamato e o aspartame. Página 46 Profª Patricia Cintra março 2023 Sinalização hormonal sobre o fígado e o pâncreas Página 47 Profª Patricia Cintra março 2023 Metabolismo de aminoácidos nos enterócitos Alguns aminoácidos são metabolizados nos enterócitos: • (Vários peptídeos são sintetizados, como, por exemplo, glutationa (tripeptídeo constituído de glutamato, glicina e cisteína) e peptídeos que controlam a atividade no interior do intestino). • Arginina é convertida em citrulina, que é liberada no sangue. O processo protege a arginina da captação e degradação no ciclo da uréia no fígado. Citrulina é liberada no sangue e transportada ao rim, onde é reconvertida a arginina. • Parte da glutamina absorvida é metabolizada nos enterócitos. É usada, juntamente com a glicose, com combustível para gerar ATP. A amônia e a alanina produzidas entram no sangue e são captadas pelo fígado. • Glutamato e aspartato são transaminados em seus respectivos cetoácidos (cetoglutarato e oxaloacetato), que são oxidados para gerar ATP. Como não entram na corrente circulatória, suas concentrações no sangue são muito baixas. Isso é importante porque esses aminoácidos atuam como neurotransmissores no cérebro, onde seus teores são rigidamente controlados. As enzimas transaminases (aminotransferases) no intestino podem, portanto, ser consideradas enzimas desintoxicadoras. Um problema de saúde poderá surgir se grande quantidade de glutamato for ingerida em uma refeição. A maioria dos aminoácidos que entram no sistema porta é captada e metabolizada no fígado. Página 48 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio • MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. • ADIBI, S.A. Regulation of expression of the intestinal oligopeptide transporter (PEPT-1) in health and disease. Am. J. Physiol., Bethesda, v.285, p.G779-G788, 2003. • SHILS, M.E.; OLSON, J.A.; SHIKE, M.; ROSS, A.C., eds. Tratado de nutrição moderna na saúde e na doença. 9.ed. Barueri: Manole, 2003. 1026p. Página 49 Profª Patricia Cintra março 2023 III – AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS. Metabolismo dos aminoácidos As proteínas representam o segundo maior estoque de energia química no organismo, mas não são usadas para gerar ATP, exceto em algumas doenças e condições extremas (p. ex., jejum prolongado ou inanição, exercícios intensos e prolongados). O maior depósito de proteína no corpo é o músculo esquelético (cerca de 40% do peso corporal). A síntese de proteínas requer aminoácidos, enquanto sua degradação gera aminoácidos. Desse modo, há todo o gasto de energia do organismo em repouso. São três os principais destinos dos aminoácidos: • Síntese de novas proteínas: a velocidade de síntese proteica é o principal fator determinante da taxa de metabolismo dos aminoácidos: quanto maior a taxa de síntese, menor a quantidade de aminoácidos destinada ao catabolismo. • Síntese de pequenos compostos contendo nitrogênio: os aminoácidos proveem nitrogênio para a síntese de purinas, pirimidinas, fosfolipídeos, contendo nitrogênio (p.ex., fosfotidilcolina) e aminoaçúcares (p.ex., glicosamina). A tirosina é precursora de neurotransmissores, catecolaminas (dopamina, adrenalina e noradrenalina), hormônios da tireoide (tiroxina e tri-iodotirosina) e melanina. O triptofano é precursor de serotonina, melatonina e niacina. Outros importantes produtos derivados de aminoácidos incluem ácido -aminonutírico, histamina, carnitina, taurina, creatina, glutationa, óxido nítrico e poliaminas. • Catabolismo: o processo em geral resulta na formação de amônia e cadeia de carbonos. Os esqueletos carbonados são usados para a síntese de glicose e triacilglecerol ou para oxidação completa a CO2 e H2O com geração de ATP. A amônia é convertida em ureia. Página 50 Profª Patricia Cintra março 2023 Fontes de aminoácidos Há quatro fontes de aminoácidos que entram no pool de aminoácidos livres no organismo: • Alimentos: a ingestão média de proteína é de 90 g/dia. Durante a digestão, a proteína é hidrolisada para liberar aminoácidos que são absorvidos pelos enterócitos do intestino delgado e entram no sangue, de onde são captados pelos tecidos para a síntese de peptídeos e proteínas para seguir as vias do metabolismo. Aminoácidos livres estão presentes nos alimentos, mas em pequenas quantidades. • Intestino delgado e pâncreas: ao redor de 70 g de proteínas entram no lúmen do intestino a cada dia a partir de células secretoras na forma de enzimas digestivas, muco e células epiteliais da descamação. • Proteínas endógenas: o processo de renovação proteica (turnover) envolve 250 a 350 g de proteínas hidrolisadas e ressintetizadas diariamente em tecidos e adultos. • Bactérias e outros micro-organismos no intestino: estão presentes principalmente no cólon. A morte de micro-organismos é seguida por sua digestão e liberação de aminoácidos no lúmen. Os aminoácidos ficam então disponíveis para uso por outros micro-organismos, pelos colonócitos ou fígado, após sua captação a partir do lúmen. A utilização do fígado é quantitativamente importante em algumas condições. Remoção de nitrogênio de aminoácidos Fígado, intestino delgado, músculo e rim participam do catabolismo de aminoácidos. Há três processos gerais pelos quais os aminoácidos são catabolizados: • Por vias catabólicas específicas (p.ex., glicina, lisina, metionina, serina, treonina e triptofano). Página 51 Profª Patricia Cintra março 2023 • Por conversão a outros aminoácidos, que são então catabolizados por vias específicas (p.ex., arginina, asparagina, glutamina, histidina, fenilalanina, prolina e serina). • Pela remoção do nitrogênio pela combinação de transaminação/desaminação oxidativa que resulta na formação de amônia convertida em ureia (p.ex., alanina, aspartato, isoleucina, leucina, serina, tirosina e valina). Duas condições fisiológicas promovem o aumento da remoção do nitrogênio por transaminação/desaminação oxidativa: (1) após a ingestão de refeição rica em proteína e (2) durante o jejum. No estado bem alimentado, ocorre síntese de proteínas pelo músculo, fígado e outros tecidos; o excesso de aminoácidos é degradado para gerar energia. No estado de jejum há aumento de degradação das proteínas musculares. A maioria dos esqueletos de carbono das cadeias laterais dos aminoácidos desaminados é utilizada como combustível. Os grupos amino são exportados pelo músculo como alanina e glutamina e transportados para o fígado e os rins para fornecer substratos para a gliconeogênese. O fígado converte a amônia em ureia. A ureia contém um átomo de carbono e dois átomos de nitrogênio e é excretada na urina. A amônia é também gerada pela desaminação do AMP (adenosina monofosfato), que produz IMP (inosina monofosfato) em mecanismo denominado ciclo purina nucleotídeo. Outras fontes de amônia incluem células da medula óssea, células que empregam a glutamina como combustível (p.ex., células imune, enterócitos, colonócitos) e hidrólise da ureia por micro-organismos no cólon.Em geral, o catabolismo dos aminoácidos envolve: (1) remoção do grupo α-amino na forma de ureia e (2) oxidação dos esqueletos carbonados a CO2 e H2O, gerando ATP no processo ou produzindo glicose no fígado pela gliconeogênese. Página 52 Profª Patricia Cintra março 2023 Remoção de grupo α-amino dos aminoácidos por transaminação A primeira etapa da remoção de amônia de aminoácidos consiste na reação de transaminação que transfere reversivelmente o grupo α- amino de um aminoácido para o α-cetoácido (α-cetoglutarato), originado um novo aminoácido (glutamato) e um novo α-cetoácido pela ação de aminotransferase (transaminases). Para a alanina, a alanina aminotransferase catalisa a reação: Página 53 Profª Patricia Cintra março 2023 As aminotransferase requerem piridoxal-5'- fosfato (PLP) como cofator. Esse composto é a forma fosforilada da piridoxina (vitamina B6): α-cetoglutarato α-cetoácido Alanina (aminoácido) Glutamato (aminoácido) Piruvato (α-cetoácido) Página 54 Profª Patricia Cintra março 2023 A PLP está covalente ligada ao sítio ativo da enzima via base de schiff (R'- CH=N-R, uma aldimina) ligada ao grupo Ɛ-amino do resíduo de lisina. Forças estabilizadoras adicionais incluem interações iônicas entre as cadeias laterais de aminoácidos, o anel piridinium e o grupo fosfato. As reações de transaminação exercem papéis centrais tanto na síntese como na degradação dos aminoácidos. Além disso, essas reações envolvem a interconversão de aminoácidos em piruvato, ou em ácidos dicarboxílicos, e atuam como ponte entre o metabolismo dos aminoácidos e carboidratos. Transformação de α-amino em íons de amônio A glutamato desidrogenase catalisa a remoção oxidativa do grupo amino como amônia livre a partir do glutamato proveniente, sobretudo, das reações de transaminação. No fígado, a enzima está localizada na matriz mitocondrial e emprega NAD+ ou NADP+ como aceptor de elétrons. Página 55 Profª Patricia Cintra março 2023 A reação catalisada pelo glutamato desidrogenase é facilmente reversível e atua também na biossíntese de aminoácidos. A atividade da glutamato desidrogenase hepática é inibida alostericamente por ATP, GTP e NADH e ativada pelo ADP. Aminoácido oxidases Pequena quantidade de amônia é formada pela ação das L-aminoácidos oxidases encontradas nos peroxissomos do fígado e dos rins. O aceptor imediato de elétrons é a FMN (flavina mononucleotídeo). A FMNH2 produzida reage com o O2 para formar H2O2. Urease bacteriana Cerca de 25% da amônia hepática é produzida pela ação de uréases bacterianas intestinais sobre a ureia. A amônia se difunde do sangue para o lúmen do intestino. A amônia liberada volta para o fígado pela circulação. Página 56 Profª Patricia Cintra março 2023 Transporte de amônia para o fígado e os rins Os grupos α-amino são removidos dos aminoácidos no fígado e em outros tecidos (p.ex., músculos). Os íons amônio formados em tecidos extra- hepáticos são transportados para o fígado e os rins como glutamina ou alanina (ciclo glicose-alanina). Os íons amônio no fígado formam a ureia, um composto de excreção e atóxico (fígado é o único órgão que contém todas as enzimas para a biossíntese da ureia). Nos rins, a amônia é protonada a íons de amônio e excretada. A incorporação da amônia ao glutamato para formar glutamina A maioria dos tecidos sintetiza glutamina a partir do glutamato como forma de armazenamento temporário atóxico e transporte de amônia para o fígado ou rins. A formação da glutamina é catalisada pela glutamina sintetase mitocondrial. Pela ação da glutaminase, a glutamina é hidrolisada no fígado e nos rins a glutamato e amônia: Glutamina + H2O glutamato + NH3 Glutaminase Página 57 Profª Patricia Cintra março 2023 No fígado, o principal destino da glutamina, a amônia liberada pela hidrolise é utilizada na síntese da ureia. Nos rins, além da atividade da glutaminase para a produção de glutamato, ocorre desaminação oxidativa catalisada pela glutamato desidrogenase. Portanto, duas moléculas de amônia são excretadas na urina para cada glutamina transformada em α-cetoglutarato: Glutamina glutamato α-cetoglutarato + 2 NH3 Nos túbulos renais, a amônia é protonada a íons amônio, que atuam na neutralização de ácidos metabólicos na urina. A glutamina pode ser oxidada para gerar ATP em diferentes tecidos, como fígado, rins, intestino delgado e grosso, células imunes, células da medula óssea e células tumorais. Além disso, exerce importante papel na biossíntese de hexosaminas, aminoácidos, purinas e pirimidinas. glutaminase Glutamato desidrogenase Página 58 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. Página 59 Profª Patricia Cintra março 2023 III – AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS. Efeitos fisiológicos dos peptídeos: aspartame, oxitocina, vasopressina, glucagon Definições Aspartame = é um aditivo alimentar utilizado para substituir o açúcar comum. Ele tem maior poder de adoçar (cerca de 200 vezes mais doce que a sacarose) e é menos denso. O aspartame é o adoçante mais utilizado em bebidas. É formado quimicamente por (L-fenilalanina e L-aspártico), sendo que a fenilalanina se encontra metilada no grupo carboxílico, formando um éster metílico. Figura 01. Aspartame Oxitocina = é um hormônio produzido pelo hipotálamo e armazenado na hipófise posterior (Neuroipófise), e tem a função de promover as Contrações musculares uterinas durante o parto e a ejeção do leite durante a amamentação. Figura 02. Oxitocina http://pt.wikipedia.org/wiki/Aditivo_alimentar http://pt.wikipedia.org/wiki/A%C3%A7%C3%BAcar http://pt.wikipedia.org/wiki/Sacarose http://pt.wikipedia.org/wiki/Fenilalanina http://pt.wikipedia.org/wiki/Asp%C3%A1rtico http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/f0/Aspartame.svg http://pt.wikipedia.org/wiki/Hipot%C3%A1lamo http://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%B3fise http://pt.wikipedia.org/wiki/Neuroip%C3%B3fise http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Contra%C3%A7%C3%B5es_musculares&action=edit&redlink=1 http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Contra%C3%A7%C3%B5es_musculares&action=edit&redlink=1 http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%9Atero http://pt.wikipedia.org/wiki/Parto http://pt.wikipedia.org/wiki/Leite http://pt.wikipedia.org/wiki/Amamenta%C3%A7%C3%A3o http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/55/Oxytocin_with_labels.png Página 60 Profª Patricia Cintra março 2023 Vasopressina = ou hormônio antidiurético é secretado em casos dedesidratação; fazendo com que os rins conservem a água, concentrando e reduzindo o volume da urina. Este hormônio é chamado de vasopressina, pois aumenta a pressão sanguínea ao induzir uma vasoconstrição moderada sobre as arteríolas do corpo. O ADH atua no néfron, favorecendo a abertura dos canais de aquaporinas no Túbulo Contorcido Distal, impedindo que a água seja eliminada pelo Ducto Coletor. A vasopressina é secretada pela neuroipófise (porção posterior da hipófise), mas é produzida por células nervosas do hipotálamo que estendem seus axônios até a neuroipófise. Figura 03. Atuação da vasopressina Glucagon é um hormônio hiperglicemiante produzido nas células alfa das ilhotas de Langerhans do pâncreas e também nas células espalhadas pelo tracto gastrointestinal. O glucagon estimula os hepatócitos e adipócitos a liberarem glicose e ácidos graxos, respectivamente, para a circulação. No fígado, o glucagon estimula a glicogenólise e a gliconeogênese, enquanto inibe as vias de armazenagem de energia (p. ex., síntese do glicogênio e ácidos graxos). Nos adipócitos, o http://pt.wikipedia.org/wiki/Rim http://pt.wikipedia.org/wiki/Urina http://pt.wikipedia.org/wiki/Press%C3%A3o_sangu%C3%ADnea http://pt.wikipedia.org/wiki/Arter%C3%ADola http://pt.wikipedia.org/wiki/N%C3%A9fron http://pt.wikipedia.org/wiki/Aquaporina http://pt.wikipedia.org/wiki/Neuroip%C3%B3fise http://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%B3fise http://pt.wikipedia.org/wiki/Hipot%C3%A1lamo http://pt.wikipedia.org/wiki/Ax%C3%B4nio http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/a5/ADH2.svg http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A9lulas_alfa http://pt.wikipedia.org/wiki/Ilhotas_de_Langerhans http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%A2ncreas Página 61 Profª Patricia Cintra março 2023 glucagon acelera a lipólise e a liberação de ácidos graxos livres e glicerol para a circulação. Os peptídeos são extremamente diversificados em termos funcionais. Muitos atuam como hormônios ou fatores liberadores destes, enquanto outros são neuropeptídeos, neurotransmissores, toxinas, antibióticos naturais, adoçantes ou substratos de proteases. Na verdade, vários deles fazem parte de nossas conversas sem que nos apercebamos disto: é o caso do aspartame, da insulina, da oxitocina e de diversas drogas comerciais, que consistem em antagonistas de peptídeos naturais ou em inibidores de enzimas envolvidas na sua produção e liberação no organismo. Todo este conhecimento começou a ser acumulado principalmente a partir da década de 50, quando vários peptídeos ativos foram descobertos e tiveram as suas estruturas químicas determinadas. Foi o caso de diversos hormônios que controlam o metabolismo animal (glucagon e insulina, p.ex.) e de outros que desempenham papéis específicos em nosso organismo (ocitocina, vasopressina e o hormônio estimulador de melanócitos, p. ex.). Tabela 01. Peptídeos de importância biológica Peptídeo Número de aminoácidos Glândulas/células produtoras Principais efeitos oxitocina 9 Hipófise posterior Contração da musculatura uterina no parto e de glândulas mamárias na lactação. vasopressi na 9 Hipófise posterior Aumento da pressão sanguínea e da reabsorção de água pelo rim. glucagon 29 Células α do pâncreas Aumento da produção de glicose pelo fígado no jejum. Página 62 Profª Patricia Cintra março 2023 Estrutura, funções e degradação da hemoglobina. A hemoglobina é a principal proteína solúvel que se encontra presente nos eritrócitos do sangue de diversos organismos (representa cerca de 75% da proteína total do sangue), e cuja capacidade de ligação a gases é conhecida. É responsável pelo transporte do oxigénio, dos pulmões até aos tecidos e parte do dióxido de carbono no sentido inverso. A versatilidade da hemoglobina reside na capacidade para se ligar e desligar facilmente ao O2, conforme varie a pressão deste gás nos tecidos. O nome hemoglobina deriva do grego haima (sangue) e do latim globus (bola). As características viscosas, assim como cor vermelha do sangue, têm sido um dos aspectos mais notórios deste fluído desde que o homem existe. A explicação de que a cor vermelha do sangue resultaria da constituição e da conformação tetramérica própria de cada molécula de hemoglobina, foi adquirindo receptividade ao longo dos anos. A hemoglobina é composta basicamente de duas porções: a) A porção proteica denominada globina e; b) A porção que carrega uma estrutura pigmentar ligada ao ferro, chamada grupo heme. O grupo prostético heme confere a estas proteínas uma cor característica, e é constituído por uma parte orgânica e um átomo de ferro, no estado ferroso [Fe(II)]. Página 63 Profª Patricia Cintra março 2023 Grupo heme na mioglobina e na subunidade β da hemoglobina.Adaptado de Nelson e Cox, 2004) As funções da hemoglobina são: • Manter o pH sanguíneo em constante equilíbrio; • Transportar H+ e CO2 dos tecidos para o pulmão. A hemoglobina é degradada em globina e grupos heme, onde a primeira é quebrada e transformada em aminoácidos para reutilização no organismo e, o segundo é fagocitado principalmente no fígado, baço e medula óssea, até a formação de bilirrubina. A degradação da heme ocorre com a abertura do anel de tetrapirrol da porfirina pela ação da enzima heme oxigenase, onde há quebra da ponte metenil entre os pirróis I e II. Nesta reação ocorrem duas oxigenações e o NADPH, com seu poder redutor, libera Fe2+, CO e biliverdina, um pigmento verde. Tem sido estimado que mais de 86% do monóxido de carbono endógeno é derivado da quebra enzimática da heme, e a quantidade de monóxido de carbono respiratório tem sido usada como um mensurador indireto da produção de bilirrubina. Grupo heme mioglobina Subunidade β da Hemoglobina Página 64 Profª Patricia Cintra março 2023 Logo, através da enzima biliverdina redutase ocorre a formação de bilirrubina. Essa enzima adiciona um hidrogênio fornecido pelo NADPH reduzindo a dupla ligação entre os pirróis III e IV. O pigmento amarelo formado será carreado até o fígado pela albumina, onde será posteriormente conjugado e excretado. Reações de catabolismo do grupo heme e formação da bilirrubina. Fonte: http://library.med.utah.edu/NetBiochem/images/hemeorxn.gif. Armazenada na vesícula biliar, a bilirrubina conjugada é então excretada no duodeno (bile), mas sua melhor absorção ocorre no intestino grosso, onde é reduzida a uma série de derivados incolores, chamados estercobilinogênios. A reação é catalisada por desidrogenases bacterianas anaerobicamente no http://library.med.utah.edu/NetBiochem/images/hemeorxn.gif Página 65 Profª Patricia Cintra março 2023 cólon. O ácido glicurônico é removido por ação de enzimas bacterianas específicas (glicuronidases), enquanto o pigmento é reduzido a urobilinogênio. A maioria do urobilinogênio formada no intestino é excretada nas fezes (estercobilina). Uma pequena parte é reabsorvida para a circulação portal e reexcretada na bile. Uma pequena fração (1 a 5%) do urobilinogênio volta para a circulação geral (via ciclo entero-hepático) e é excretado pelo rim (urobilina). Esquema ilustrando a excreção da bilirrubina e do urobilinogênio. Ciclo da ureia O ciclo da ureia é um ciclo contínuo que tem como objetivo a produção de ureia. Este ciclo acontece no fígado e é resultante de5 reações químicas entre a mitocôndria e o citosol. A ureia e a principal forma de eliminação dos grupos amino derivados dos aminoácidos e responde por mais de 90% dos componentes nitrogenados presentes na urina. Diariamente, cerca de 11 a 15 g de nitrogênio são excretados na urina de um individuo adulto saudável que consome de 70 a 100 g de proteína por dia. Além da ureia, existem outras formas de excreção de nitrogênio na urina, como amônia, acido úrico, creatinina e alguns aminoácidos livres. Ureia e amônia Página 66 Profª Patricia Cintra março 2023 surgem a partir da oxidação parcial de aminoácidos, enquanto o acido úrico e a creatinina são indiretamente derivados de aminoacidos. Verifica-se que o nitrogênio que entra no ciclo da ureia é a amônia, na forma do íon amônio (NH4 +). O precursor imediato é o glutamato, porém o nitrogênio da amônia provém de diversas fontes, como resultado de reações de transaminação. Em resumo, um nitrogênio da molécula de ureia e fornecido pela amônia livre, enquanto o outro nitrogênio provém do aspartato. O glutamato é o precursor imediato da amônia por meio da deaminação oxidativa catalisada pela enzima glutamato desidrogenase e do nitrogênio do aspartato por meio da transaminação do oxaloacetato catalisada pela enzima aspartato aminotransferase. O carbono e o oxigênio da ureia são derivados do CO2. A ureia sintetizada pelo fígado e, posteriormente, transportada pela circulação sanguínea ate os rins, onde e filtrada e excretada na urina. Uma parte da ureia sintetizada no fígado difunde-se do sangue ao intestino e é clivada a CO2 e NH3 pela urease bacteriana. Esta amônia e parcialmente perdida nas fezes, enquanto outra parte e reabsorvida pelo sangue. Página 67 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 68 Profª Patricia Cintra março 2023 As reações: As duas primeiras reações ocorrem na mitocôndria, enquanto todas as enzimas restantes do ciclo estão localizadas no citosol. 1. Formação do carbamoil fosfato: ação da carbamoil fosfato sintase I dependente da clivagem de duas moléculas de ATP. A amônia incorporada ao carbamoil fosfato é proveniente da desaminação do glutamato. O átomo de N derivado desta amônia torna-se um dos N da ureia. 2. Formação de citrulina: a ornitina e citrulina são aminoácidos básicos que participam no ciclo da ureia, mas não são incorporados nas proteínas. A ornitina é regenerada em cada volta do ciclo da uréia. A liberação do fosfato do carbamoil fosfato em forma de Pi direciona a reação. A citrulina, o produto, é transportado ao citosol. 3. No citosol, a citrulina condensa-se ao aspartato para formar argininosuccinato. O aspartato fornece o segundo N que é incorporado à uréia. O terceiro ATP é consumido. 4. O argininosuccinato é clivado para originar arginina e fumarato. A arginina formada por esta reação serve como precursor imediato da ureia. 5. A arginase cliva a arginina em ornitina e ureia. A arginase ocorre quase exclusivamente no fígado. Assim, enquanto outros tecidos podem sintetizar a arginina, somente o fígado pode clivar a arginina e sintetizar ureia. A ureia difunde-se a partir do fígado e é transportada no sangue até os rins, onde é filtrada e excretada na urina. A ornitina entra novamente na mitocôndria para continuar o ciclo. Balanço nitrogenado O balanço de nitrogênio é a diferença entre o nitrogênio ingerido e a soma do nitrogênio excretado nas fezes e urina. Em indivíduos adultos e sadios, recebendo uma dieta balanceada (adequada) em relação aos nutrientes nitrogenados deve-se encontrar o verdadeiro balanço de nitrogênio, isto é, o Página 69 Profª Patricia Cintra março 2023 nitrogênio ingerido deverá ser igual a soma do nitrogênio excretado nas fezes e urina. Nos indivíduos em crescimento deve-se encontrar o chamado “balanço positivo” em que o nitrogênio ingerido deverá ser superior à soma do nitrogênio excretado pelas vias fecal e urinária. Essa situação de retenção do nitrogênio é necessária sempre que houver necessidade de formação de novos tecidos pelo organismo. Já um maior débito de nitrogênio, em comparação com a ingestão de nitrogênio (equilíbrio nitrogenado negativo) indica que a proteína está sendo utilizada para obtenção de energia e que está havendo uma possível usurpação de aminoácidos, principalmente a partir do músculo esquelético. A ingestão excessiva de proteína, contudo, pode ser prejudicial, pois pode afetar o metabolismo hepático e renal, já que muitos subprodutos do metabolismo proteico e nitrogenado têm sua síntese e excreção nesses órgãos. Página 70 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. SGARBIERI, V.C. Proteínas em alimentos proteicos: propriedades, degradações, modificações. São Paulo: Varela, 1996. DANIEL, M.F.; NEIVA, C.M. AVALIAÇÃO DA INGESTÃO PROTÉICA E DO BALANÇO NITROGENADO EM UNIVERSITÁRIOS PRATICANTES DE NITROGENADO EM UNIVERSITÁRIOS PRATICANTES DE MUSCULAÇÃO. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. 2009, 8 (1):21-39 Página 71 Profª Patricia Cintra março 2023 IV- ENZIMAS Estrutura e funções A vida depende de uma série de reações químicas bem orquestradas. Muitas delas, entretanto, ocorrem muito lentamente para manter os processos vitais. Para resolver esse problema, a natureza planejou um modo de acelerar a velocidade das reações químicas por meio da catálise. As ações catalíticas nos seres vivos são executadas por enzimas. As enzimas são proteínas com a função específica de acelerar reações químicas que ocorrem sob condições termodinâmicas não favoráveis. Elas aceleram consideravelmente a velocidade das reações em sistemas biológicos, quando comparadas com as reações correspondentes não catalisadas. Para ser classificada como enzima, uma proteína deve: • Apresentar eficiência catalítica; • Demonstrar especificidade em relação a seus substratos (reagentes) ou substratos estruturalmente muito similares; • Ser capaz de catalisar um tipo específico de reação química; • Acelerar a velocidade das reações em pelo menos 106 vezes, quando comparadas às reações correspondentes não catalisadas; • Não ser consumida ou alterada ao participar da reação; • Não alterar o equilíbrio químico das reações; • Ter atividade regulada geneticamente ou pelas condições metabólicas. As proteínas são as únicas substâncias com propriedades catalíticas nos sistemas biológicos. Algumas moléculas de RNA, denominadas ribozimas, também executam essa função. O composto sobre a qual a enzima atua é o substrato (S) que se transforma em produto (P) da reação: Substrato (S) Produto (P) Para a compreensão da atividade catalítica, duas questões devem ser respondidas: (1) quais são os mecanismos que explicam a enorme atividade enzima Página 72 Profª Patricia Cintra março 2023 catalítica das enzimas? (2) quais são as propriedades das enzimas que permitem que sua atividade seja controlada?Respostas a essas questões proporcionam o entendimento dos princípios básicos da enzimologia aplicada à célula. Na maioria das reações biológicas, na ausência de enzima, pouco (ou nenhum) produto é formado, mas em presença da enzima a reação é reversível, os produtos da reação em uma direção tornam-se substratos para a reação inversa. As enzimas são os catalisadores mais específicos que se conhece, tanto para o substrato como para o tipo de reação efetuada sobre o substrato. A especificidade inerente à enzima reside em uma cavidade ou fenda de ligação do substrato, que está situada na superfície da proteína enzimática. A cavidade, denominada sítio ativo, é um arranjo de grupos presentes em cadeias laterais de certos aminoácidos que ligam o substrato por ligações não covalentes. Muitas vezes, os resíduos de aminoácidos que formam o sítio ativo ficam em regiões distantes, na sequência primária, mas próximos no sítio ativo, pelo enovelamento da cadeia polipeptídica (estrutura terciária). Algumas enzimas possuem sítios adicionais, denominados sítios alostéricos (local de uma enzima que ao ligar-se a um modulador, leva a enzima a sofrer mudança conformacional que pode alterar as propriedades catalíticas ou de ligação da enzima). Nos sítios alostéricos, moléculas específicas se ligam e causam alterações na conformação proteica que afetam o sítio ativo, aumentando ou reduzindo a atividade enzimática. Muitas enzimas alostéricas são constituídas de múltiplas subunidades e múltiplos sítios ativos. Muitas enzimas necessitam de pequenas moléculas não proteicas essenciais a sua atividade e denominadas coenzimas e cofatores. Inibição enzimática Inibidores são compostos que reduzem a atividade das enzimas. São geralmente pequenas moléculas, mas alguns são peptídeos ou proteínas. Muitos fármacos, antibióticos, venenos e conservantes de alimentos atuam Página 73 Profª Patricia Cintra março 2023 como inibidores enzimáticos. Os inibidores são importantes por vários motivos: (1) regulam as vias metabólicas; (2) são empregados como medicamentos (p. ex., o tratamento da AIDS inclui inibidores das proteases, moléculas que inibem a enzima necessária para produzir novos vírus); (3) são usados para demostrar a composição e as propriedades das enzimas. Distinguem-se dois tipos de inibição: reversível e irreversível, segundo a estabilidade da ligação entre o inibidor e a molécula de enzima. Inibidores Reversíveis Na inibição reversível, ocorrem interações não covalentes entre o inibidor e a enzima e a enzima retoma sua atividade após dissociação do inibidor. A inibição reversível envolve modificações químicas da molécula enzimática, promovendo a inativação definitiva. A inibição é classificada em: • COMPETITIVOS: inibidores competitivos são substâncias que competem diretamente com o substrato por ligação com o sítio ativo das enzimas. São moléculas estruturalmente semelhantes ao substrato. O inibidor (I) competitivo reage reversivelmente com a enzima para formar um complexo enzima-inibidor (EI) análogo ao complexo enzima-substrato, mas cataliticamente inativo: E +I EI + S Competem com o substrato pelo sítio ativo da enzima. Figura 04. Exemplo de inibição competitiva Página 74 Profª Patricia Cintra março 2023 Exemplos: - Estatinas (inibem a síntese de colesterol) - Outros (quimioterápicos de tumores e leucemias) Muitos fármacos são inibidores competitivos de enzimas específicas. Por exemplo, o dicumarol, um análogo da vitamina K, inibe a catálise que envolve a vitamina K (reações de -carboxilação). Como muitas enzimas da cascata de coagulação sanguínea são ativadas por reação de -carboxilação, o dicumarol atua como anticoagulante que reduz o risco de formação de trombos. Em alguns casos, duas diferentes moléculas podem ser substratos para a mesma enzima, com cada uma atuando como inibidor competitivo do metabolismo da outra, como, por exemplo, a álcool desidrogenase, que catalisa a oxidação do etanol e do metanol: Etanol + NAD+ acetaldeído + NADH + H+ Metanol + NAD+ formaldeído + NADH + H+ O metanol por si é tóxico, mas não seus metabólicos (formaldeído e ácido fórmico). O metanol é responsável pela cegueira e morte. Um dos tratamentos em caso de envenenamento agudo pelo metanol consiste na administração intravenosa de etanol (mais glicose). O etanol reage como inibidor competitivo da conversão do metanol em formaldeído, além de prevenir o acúmulo de metabólitos tóxicos até que todo o metanol seja depurado pelos rins. A glicose é administrada para corrigir a hipoglicemia causada pelo etanol. • NÃO COMPETITIVOS: o inibidor não competitivo se liga tano à enzima como ao complexo ES em um sítio diferente do sítio de ligação do substrato. A ligação do inibidor não afeta a ligação do substrato, mas provoca uma modificação da conformação da enzima a formação de produto. E + I EI + S EIS não há reação Página 75 Profª Patricia Cintra março 2023 E + S ES + I EIS não há reação Ligam-se em um local diferente do sítio ativo da enzima provocando uma mudança na estrutura enzimática em torno do sítio ativo. O substrato pode se ligar, porém a enzima não será tão eficiente. Exemplos: 1) metais pesados, 2) a ação do ácido acetilsalicílico (AAS) como um inibidor não competitivo é a principal razão para sua escolha como terapia a longo prazo para redução do risco de crises cardiovasculares. Figura 05. Exemplo de inibição não competitiva Inibidores irreversíveis Ocorre quando uma enzima inibida não recupera a sua atividade devido à modificação química no seu sítio ativo. Exemplos: - Compostos presentes em inseticidas e raticidas que inibem a ação da acetilcolinesterase. Página 76 Profª Patricia Cintra março 2023 Os inibidores enzimáticos irreversíveis são geralmente substâncias tóxicas. Podem ser substâncias naturais ou sintéticas. Esses inibidores são bastante tóxicos para o organismo, não só em virtude da irreversibilidade de sua ligação às enzimas, mas também em razão de sua inespecificidade. Fatores que influenciam a atividade enzimática Vários fatores podem modificar a atividade catalítica de uma enzima. Os aqui descritos são: temperatura, concentração de íon hidrogênio (pH), concentração da enzima e inibidores. Efeitos da temperatura sobre as enzimas As reações químicas são afetadas pela temperatura. O aumento da temperatura eleva a velocidade das reações enzimáticas, aumentando a energia cinética e a frequência das colisões entre as moléculas da reação para atingir o estado de transição. Ao atingir a “temperatura ótima” (37°C), a enzima opera com a eficiência máxima. Acima da “temperatura ótima” (p. ex., 60 a 70˚C), a atividade catalítica declina abruptamente por quebra de ligações envolvidas na manutenção da estrutura tridimensional da proteína, o que ocasiona a desnaturação da enzima. Como consequência desses efeitos opostos de aumento da temperatura, o gráfico da atividade enzimática exibe um máximo. Como a desnaturação térmica é um processo dependente do tempo de exposição, a forma do gráfico e a posição da “temperatura ótima” dependerão do tempo em que a enzima permanece em alta temperatura. Todas as enzimas são moderadamenteestáveis in vivo nas temperaturas em que normalmente o organismo vive; no entanto, a desnaturação varia de enzima para enzima. Algumas bactérias vivem em ambientes quentes, onde a temperatura normal é maior que 90˚C: são conhecidas como bactérias termofílicas. Na hipotermia, a atividade enzimática é deprimida. Página 77 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 06. Efeito da temperatura sobre a atividade enzimática Efeitos do pH sobre as enzimas A concentração de íons de hidrogênio afeta as enzimas de vários modos: 1. A atividade catalítica das enzimas está relacionada com a ionização de aminoácidos no sítio ativo. Por exemplo, certas enzimas necessitam a forma protonada do grupo amino. Se o pH é suficiente alcalino, o grupo perde seus prótons e reduz a atividade da enzima. Além disso, os substratos também são afetados. Se um substrato contém um grupo ionizável, as mudanças no pH afetam a capacidade de ligação ao sítio ativo. 2. Alterações nos grupos dissociáveis podem modificar a estrutura terciária das enzimas (p.ex., grupos carboxilatos carregados negativamente e grupos aminas protonadas carregados positivamente). Mudanças drásticas no pH promovem a desnaturação enzimática. Apesar de algumas enzimas tolerarem alterações na concentração de íon hidrogênio, a maioria delas é ativa somente em intervalos muito estreitos de pH. A maioria das enzimas intracelulares exibe atividade ótima em valores de pH entre 5 e 9. Por essa razão, os organismos vivos empregam tampões que Página 78 Profª Patricia Cintra março 2023 regulam o pH. O valor de pH no qual a atividade da enzima é máxima é chamado pH ótimo. Valores de pH acima ou abaixo do intervalo de 6 e 9 desnaturam a maioria das enzimas intracelulares. Figura 08. Efeito do pH sobre atividade da enzima. Página 79 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio MACHADO, A.; LIRA, C.W.; PROTI, P.B.; REMUZGO, C.; MIRANDA, M,T,M. Sintese e química enzimática de peptídeos: princípios básicos e aplicações. Quim. Nova, vol 27, n˚5, 2004. MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Efeito da concentração da enzima na atividade enzimática. Disponível em: http://www2.bioqmed.ufrj.br/enzimas/concn_enz.htm. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Efeito da temperatura na atividade da enzima. Disponível em: http://www2.bioqmed.ufrj.br/enzimas/temperat.htm. http://www2.bioqmed.ufrj.br/enzimas/concn_enz.htm http://www2.bioqmed.ufrj.br/enzimas/temperat.htm Página 80 Profª Patricia Cintra março 2023 V - ESTRUTURA E METABOLISMO DE CARBOIDRATOS Carboidratos 1. Os carboidratos, moléculas mais abundantes na natureza, são classificados como monossacarídeos, dissacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos de acordo com o número de unidades de açúcar que contêm. 2. Os monossacarídeos com grupos funcionais aldeídos são aldoses; aqueles com grupos cetona são cetoses. Açucares simples pertencem às famílias D e L, de acordo com a configuração do carbono assimétrico mais distante dos grupos funcionais aldeído e cetona semelhantes ao D e L isômeros do gliceraldeído. A família D contém os açúcares biologicamente mais importantes. 3. Açúcares que contêm cinco ou seis carbonos existem nas formas cíclicas que resultam da reação entre grupos hidroxila e aldeído (produto hemiacetal) ou grupos cetonas (produto hemicetal). Tanto nos anéis com cinco membros (furanoses) como nos anéis com seis membros (piranoses), o grupo hidroxila ligado ao carbono anomérico está abaixo (α) ou acima (β) do plano do anel. A interconversão espontânea entre as formas α e β e chamada mutarrotação. 4. Os açúcares simples sofrem vários tipos de reações químicas. Derivados dessas, os ácidos urônicos, aminoaçúcares, desoxiaçúcares e açúcares fosforilados exercem importantes papéis no metabolismo celular. 5. Hemiacetais e hemicetais reagem com ácidos para formar acetais e cetais, respectivamente. Quando a forma cíclica hemiacetal ou hemicetal de um monossacarídeo reage com um álcool, a nova ligação é denominada ligação glicosídica e o composto é chamado glicosídeo. 6. As ligações glicosídicas são formadas entre o carbono anomérico de um monossacarídeo e um dos grupos hidroxila livre de outro monossacarídeo. Dissacarídeos são carboidratos compostos de dois monossacarídeos. Os oligossacarídeos, carboidratos que contem até Página 81 Profª Patricia Cintra março 2023 dez unidades de monossacarídeos, estão muitas vezes ligados a proteínas e lipídeos. As moléculas de polissacarídeos são compostas de grande número de unidades de monossacarídeos, tem estrutura linear como a celulose e a amilose, ou estrutura ramificada, como o glicogênio e a amilopectina.os polissacarídeos podem ser formados por um único tipo de açúcar (homopolissacarídeos) ou por tipos múltiplos (heteropolissacarídeos). 7. Os três homopolissacarídeos mais comuns encontrados na Natureza (amido, glicogênio e celulose) fornecem D-glicose quando são hidrolisados. A celulose é um material estrutural das plantas; amido e glicogênio são formas de armazenamento de glicose nos vegetais e células animais, respectivamente. A quitina, principal composto estrutural dos exoesqueletos dos insetos, é composta de resíduos de N-acetil-glicosamina ligados a carbono não ramificados. Os glicosaminoglicanos, os principais componentes dos proteoglicanos, e a muréia, um constituinte fundamental das paredes das células bacterianas, são exemplos de heteropolissacarídeos, polímeros de carboidratos que contem mais de um tipo de monossacarídeos. 8. A enorme heterogeneidade dos proteoglicanos, que são encontrados predominantemente na matriz extracelular dos tecidos, exerce diversos papéis nos organismos vivos, embora ainda não totalmente entendidos. As glicoproteínas ocorrem nas células, tanto na forma solúvel como na forma ligada à membrana, e em líquidos extracelulares. Em virtude de sua estrutura diversificada, os glicoconjugados, que incluem proteoglicanos, glicoproteínas e glicolipídeos, exercem importantes funções na transferência de informações nos seres vivos. Página 82 Profª Patricia Cintra março 2023 Classificação Classe (GP*) Subgrupos Componentes Açúcares simples (1-2) Monossacarídeos Dissacarídeos Polióis Glicose, galactose e frutose Sacarose, lactose, maltose Sorbitol, manitol Oligossacarídeos (3-9) Maltoligossacarídeos Outros oligossacarídeos Maltodextrinas Rafinose, estaquiose, frutoligossacarídeos. Polissacarídeos (>9) Amido Polissacarídeos que não contem amido Amilose, amilopectina, amidos modificados Celulose, hemicelulose, pectina. GP* significa grau de polimerização da cadeia, ou seja, o número de ligação entre os açúcares. Digestão e absorção dos carboidratos: intolerância a lactose Os principais carboidratos da dieta são: amido, sacarose e lactose. O glicogênio, a maltose, a glicose e a frutose livre constituem frações relativamente menores de carboidratos ingeridos. Digestão A digestão tem início na boca e é completada no lúmen do duodeno. Aamilase está presente na saliva e nas secreções pancreáticas e catalisa a hidrólise do amido. No duodeno, os oligossacarídeos e dissacarídeos completam a digestão: • α-amilase salivar: a digestão do amido inicia durante a mastigação na boca pela ação da α-amilase salivar, que hidrolisa as ligações glicosídicas α (1 4), com a liberação de maltose e oligossacarídeos. A α-amilase salivar não contribui significativamente para a hidrólise dos polissacarídeos. Ao atingir o estômago, a enzima é inativada pelo baixo pH do conteúdo gástrico. • α-amilase pancreática: o amido e o glicogênio são hidrolisados no duodeno em presença da α-amilase pancreática, que produz Página 83 Profª Patricia Cintra março 2023 maltose como produto principal e oligossacarídeos, chamados dextrinas limites-contendo, em média, oito unidades de glicose com uma ou mais ligações glicosídicas α (1 6). Certa quantidade de isomaltose (dissacarídeos) também é formada. amido (ou glicogênio) maltose + dextrina • Enzimas da superfície intestinal: a hidrólise final da maltose e da dextrina é realizada pela maltase e pela dextrinase, presentes na superfície das células epiteliais do intestino delgado. Outras enzimas também atuam na superfície das células intestinais: a isomaltase, que hidrolisa as ligações α (1 6) da isomaltase; a sacarase, que hidrolisa as ligações α, β (1 2) da sacarose em glicose e frutose; a lactase, que fornece glicose e galactose pela hidrólise das ligações β (1 4) da lactose. Maltose + H2O 2 glicose Dextrina + H2O n glicose Isomaltose + H2O 2 glicose Sacarose + H2O frutose + glicose Lactose + H2O galactose + glicose α-amilase Maltase Dextrinase Isomaltase Sacarase Lactase Página 84 Profª Patricia Cintra março 2023 Deficiência de lactose A deficiência da enzima lactase (dissacaridase) provoca intolerância a lactose (desenvolvimento de diarreia e distensão do intestino e flatulência após a ingestão de lactose ou açúcar do leite). A deficiência de lactase congênita é uma condição rara, caracterizada pela falta total da atividade da lactase. Mais comumente, a incapacidade de adultos tolerarem lactose decorre do declínio com a idade na produção da enzima suficiente para digerir o açúcar do leite. Neste caso, a pessoa ao nascer produz quantidade suficiente de lactase, mas durante a primeira década de vida gradualmente perde a capacidade de produzir a enzima. A perda da atividade da lactase também pode ser secundária a desordens que lesionam a estrutura e função normal da mucosa do intestino (p.ex., enterite), parasitos gastrointestinais (p.ex., giardíase), enteropatias (p.ex., doença celíaca), doença inflamatória crônica do intestino (p.ex., doença de Crohn). Página 85 Profª Patricia Cintra março 2023 Transporte de monossacarídeos para os enterócitos Os monossacarídeos resultantes da digestão dos carboidratos da dieta (glicose, frutose, galactose) são transportados do lúmen para o enterócito e deste para os capilares sanguíneos por dois sistemas: • Cotransportador Na+ /monossacarídeos (SGLTI): a glicose e a galactose são captadas no lúmen pela SGLTI. É um transporte ativo indireto pelo qual a ATPase para Na+/K+ remove íons Na+ da célula em troca por íons K+, com a hidrólise concomitante de ATP. O mecanismo tem alta especificidade por glicose e galactose. Uma molécula de glicose (ou galactose) é transportada contra gradiente de concentração e a energia necessária é obtida pelo transporte de íons Na+ a favor do gradiente de concentração. Defeitos em SGLTI ocorrem por expressão de um gene autossômico recessivo, causando diarreia, desidratação e glicosúria. Página 86 Profª Patricia Cintra março 2023 • Transporte facilitador de monossacarídeos, Na+- independente (GLUT): o GLUT 5 é o transportador específico de frutose para o interior do enterócito, enquanto o GLUT 2 transporta a glicose, frutose e galactose através da membrana do lado oposto do lúmen (contraluminal) para o espaço intersticial e o capilar. A aborção de glicose e galactose do lúmen intestinal via GLUT 2 ocorre somente durante períodos de absorção máxima. Os transportadores GLUT não necessitam de ions de Na+. Outro modo de transporte através do intestino é a rota paracelular que ocorre entre enterócitos adjacentes. A água entra no espaço intestinal por meio dessa rota e arrasta moléculas de glicose, aminoácidos e pequenos peptídeos. Esse processo é denominado “arrasto por solvente”. Não é conhecida a importância quantitativa dessa rota. Metabolismo de monossacarídeos nos enterócitos Nem todas as glicoses e frutoses absorvidas pelos enterócitos passam diretamente para o sangue. Enzimas glicolíticas estão presentes nessas células e parte da glicose e frutose é convertida em ácido láctico. Não é conhecida a quantidade de glicose metabolizada nessa via (estima-se em 50% da glicose absorvida), já que o ácido láctico é captado pelo fígado e convertido novamente em glicose. O ATP gerado pela glicólise fornece a energia para manter o gradiente de íons Na+ para o transporte de glicose e aminoácidos e para a formação de quilomícrons* no enterócito. * quilomícrom é a maior lipoproteína encontrada no corpo humano. Página 87 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 01. Ação dos transportadores na absorção dos monossacarídeos. Página 88 Profª Patricia Cintra março 2023 Figura 02. Absorção de monossacarídeos pelo intestino. Metabolismo dos carboidratos 1. Via glicolítica 1.1. Glicólise A glicólise é uma via de fornecimento de energia a partir da glicose. Esta via acontece de forma aeróbia e anaeróbia. 1.1.1. Glicólise aeróbia A via aeróbia, ou seja, glicólise aeróbia é realizada com a presença de oxigênio, acontece no citoplasma das células e sua degradação acorre em 10 reações químicas diferentes tendo como produto final 2 moléculas de piruvato. Página 89 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 90 Profª Patricia Cintra março 2023 Duas moléculas de ATP são geradas para cada molécula de glicose. Duas moléculas de NADH são também produzidas para cada molécula de glicose. A glicólise aeróbia requer a oxidação da maior parte desse NADH pela cadeia de transporte de elétrons, produzindo aproximadamente três ATPs para cada molécula de NADH que chega à cadeia respiratória. 1.1.2. Glicólise anaeróbia A via anaeróbia, ou seja, glicólise anaeróbia é realizada sem a presença de oxigênio, acontece no citoplasma das células e sua degradação acorre em 8 reações químicas diferentes tendo como produto final 2 moléculas de lactato. O lactato formado pela ação da lactato- desidrogenase é o produto final da glicólise anaeróbia nas células eucarióticas. A formação do lactato é o principal destino do piruvato no cristalino e na córnea do olho,na medula renal, nos testículos, nos leucócitos e nos eritrócitos, pois todos eles apresentam-se pobremente vascularizados e/ou privados de mitocôndrias. Consumo de lactato nos músculos No musculo esquelético em exercício, a produção de NADH excede a capacidade oxidativa da cadeia respiratória. Isso resulta em aumento na razão NADH/NAD+, favorecendo a redução de piruvato a lactato. Portanto, durante exercício físico intenso, o lactato se acumula no músculo, causando diminuição do pH intracelular, podendo levar a caibra. Muito desse lactato acabará difundido para a corrente sanguínea, podendo ser utilizado pelo fígado para produzir glicose. Página 91 Profª Patricia Cintra março 2023 Os destinos alternativos do piruvato são: 1. Descarboxilação oxidativa do piruvato. A descarboxilação oxidativa do piruvato pelo complexo da piruvato- desidrogenase é uma importante via nos tecidos com alta capacidade oxidativa, como o músculo cardíaco. A piruvato desidrogenase converte irreversivelmente o piruvato, produto final da glicólise, em acetil- CoA, principal combustível para o ciclo do ácido cítrico. 2. Carboxilação do piruvato a oxalacetato. A carboxilação do piruvato a oxalacetato pela piruvato-carboxilase é uma reação dependente de biotina. Essa reação é importante, pois repõe os intermediários do ciclo do ácido cítrico e fornece substrato para a gliconeogênese. 3. Redução de piruvato a etanol (microrganismos) Página 92 Profª Patricia Cintra março 2023 A conversão do piruvato em etanol ocorre por meio de duas reações. A descarboxilação do piruvato pela piruvato-descarboxilase ocorre em leveduras e em certos micro-organismos, mas não em humanos. Regulação da glicólise Estado alimentado (pós-prandial) Estado de jejum (pré-prandial) Aumento da ingestão de glicose Não há ingestão de glicose Aumento da glicose sanguínea Diminuição da glicose sanguínea Aumento na liberação de insulina Aumento na liberação de glucagon Metabolismo do lactato O ciclo de Cori é uma cooperação metabólica entre músculos e fígado. Com um trabalho muscular intenso, o músculo usa o glicogênio de reserva como fonte de energia, via glicólise. Para obtenção de energia sob a forma de adenosina trifosfato (ATP), a glicose é convertida a piruvato através da glicólise. Durante o metabolismo aeróbio normal, o piruvato é então oxidado pelo oxigênio, onde o produto gerado é CO2 e H2O. Durante um curto período de intenso esforço físico, a distribuição de oxigênio aos tecidos musculares pode não ser suficiente para oxidar totalmente o piruvato. Nestes casos, a glicose é convertida a piruvato e depois a lactato, através da via da fermentação láctica, onde os músculos obtêm ATP sem recorrer ao oxigênio. Página 93 Profª Patricia Cintra março 2023 2. Ciclo do ácido cítrico e Cadeia respiratória. 2.1. Ciclo do ácido cítrico Associação da glicólise e do ciclo do ácido cítrico Página 94 Profª Patricia Cintra março 2023 O ciclo do ácido cítrico é o estágio final comum para a oxidação de moléculas energéticas. Os átomos de carbono entram no ciclo na forma de grupos acetila derivados da glicose, ácidos graxos, aminoácidos, corpos cetônicos (produtos derivados na quebra dos ácidos graxos) e acetato (composto químico). A acetil CoA é oxidada em 8 reações mitocondriais para formar moléculas de CO2. Os elétrons de alta energia obtidos nessa oxidação são utilizados para gerar equivalentes redutores na forma de NADH e FADH2. O NADH (nicotinamida adenina dinucleotídeo, forma reduzida) e o FADH2 (flavina adenina dinucleotídeo, forma reduzida) são oxidados, e os elétrons são conduzidos pela CADEIA MITOCONDRIAL TRANSPORTADORA DE ELÉTRONS com a liberação de energia conservada na forma de ATP, sintetizado a partir de ADP e de fósforo inorgânico por meio de um processo denominado FOSFORILAÇÃO OXIDATIVA. O ciclo também gera diretamente compostos de alta energia (GTP ou ATP). Além da geração de energia, o ciclo também é fonte de precursores para a biossíntese (moléculas precursoras mais simples são ligadas para formar moléculas maiores e complexas) de carboidratos, lipídeos e aminoácidos. Como fonte geradora de energia, o ciclo é estimulado no músculo esquelético e nas células cardíacas durante o exercício aeróbio. Durante o JEJUM, o ciclo no fígado permanece inativo, intermediários do ciclo são convertidos em malato e transportados para fora da mitocôndria para servir de substrato para a gliconeogênese (síntese de glicose a partir de compostos anglicanos, ou seja, não carboidratos). Sob essas condições, a acetil CoA gerada pela beta-oxidação dos ácidos graxos no fígado é utilizada para produzir corpos cetônicos exportados para o sangue. As cetonas são metabolizadas a CO2 e água em outros tecidos, principalmente no músculo. Página 95 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 96 Profª Patricia Cintra março 2023 Etapas do ciclo: 1. Sintese do Citrato; 2. Conversao do Citrato a Isocitrato; 3. Oxidacao descarboxilativa do Isocitrato a α -Cetoglutarato 4. Oxidacao descarboxilativa do α -Cetoglutarato a Succinil- CoA; 5. Hidrolise do Succinil-CoA a Succinato; 6. Oxidacao do Succinato a Fumarato; 7. Hidratacao do Fumarato a Malato; 8. Oxidacao do Malato a Oxaloacetato, que inicia um novo ciclo. Enzimas do ciclo: 1. Citrato sintase 2. Aconitase 3. Isocitrato descarboxilase 4. Cetoglutarato desidrogenase 5. Succinil CoA sintetase 6. Succinato desidrogenase 7. Fumarase 8. Malato desidrogenase Energia do ciclo O ciclo é a via oxidativa terminal para a maioria dos combustíveis metabólicos (CHO, aminoácidos e ácidos graxos). Os dois carbonos do grupo acetila que participam do ciclo são oxidados completamente em CO2 e H2O. A energia liberada por essas oxidações é conservada na forma de três NADH, de um FADH2 e de uma molécula de GTP (ou ATP). Para cada NADH que transfere seus elétrons para a cadeia mitocondrial transportadora de elétrons, aproximadamente 2,5 ATP são produzidos a partir de ADP + Pi. Página 97 Profª Patricia Cintra março 2023 Para cada FADH2 é produzido cerca de 1,5 ATP. Assim, a completa oxidação do grupo acetila do acetil-CoA no ciclo produz 10 ATP. Regulação do ciclo do ácido cítrico Estado alimentado (pós prandial) Estado de jejum (pré prandial) Aumento na quantidade de ATP Diminuição na quantidade de ATP Diminuição na quantidade de ADP ou Pi Aumento na quantidade de ADP ou Pi Diminuição da fosforilação oxidativa Aumento da fosforilação oxidativa Diminuição da atividade do ciclo Aumento da atividade do ciclo 2.2. Cadeia Transportadora de elétrons e fosforilação oxidativa A cadeia transportadora de elétrons é a etapa de maior síntese de ATP celular. Nesse processo ocorre reoxidação de NADH+ H+ e FADH em NAD+ e FAD+ e outros pares redoxes compostos de coenzima Q, citocromos b, c, c1, a, a3 os quais são apresentados nas suas formas oxidadas e reduzidas no processo de transporte de elétrons. O transporte de elétrons ocorre no espaço intermembrana e a fosforilação oxidativa ocorrena matriz mitocondrial em conjunto com a ATP sintetase. Todos os elétrons capturados pelo NAD+ ou pelo FAD+ no processo de oxidação de macromoléculas como carboidratos, lipídeos e proteínas são levados por essas mesmas moléculas nas formas reduzidas, NADH+ H+ e FADH2, para serem transportados com ajuda de outros pares redox na cadeia de transporte de elétrons. Página 98 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 99 Profª Patricia Cintra março 2023 O RENDIMENTO ENERGÉTICO A PARTIR DA OXIDAÇÃO COMPLETA DE UMA MOLÉCULA DE GLICOSE é de 32 ATPs. 2.3. Gliconeogênese É um processo que só ocorre no fígado, pelo qual o organismo sintetiza glicose a partir de moléculas não glicolíticas, para utilização principalmente pelos órgãos glicodependentes como o cérebro e miocárdio. Esse processo ocorre quando há necessidade de manutenção de energia pela falta de glicose intracelular. Ocorre quando o organismo está em estado de fome prolongada ou fome celular como na patologia diabetes. As reações irreversíveis da via gliconeogênese e na via glicolítica são localizadas nas mesmas posições. Isso serve como artifício para que a gliconeogênese só ocorra quando necessária e não seja anulada pela via glicolítica. A via glicolítica é controlada negativamente nesses pontos no momento em que a gliconeogênese esteja ocorrendo. Se a gliconeogênese ocorresse ao mesmo tempo da via glicolítica ambas as vias seriam anuladas. Gliconeogênese a partir do Piruvato Nesse processo, o piruvato não pode dar origem ao piruvato e por isso entra na mitocôndria onde é carboxilado a oxaloacetato e sai na forma de malato que retorna ao oxaloacetato no citosol. O oxaloacetato citosólico é transformado em P-enolpiruvato pela Penolpiruvato carboxinase Página 100 Profª Patricia Cintra março 2023 Gliconeogênese a partir do lactato muscular O lactato formado no músculo é transportado para o fígado onde é convertido em piruvato e entra no processo da gliconeogênese pela mesma via da gliconeogênese a partir do piruvato. Na formação do lactato há produção de energia, e na utilização do piruvato para dar a glicose há gasto de energia. O mesmo caminho é utilizado pela alanina muscular quando a dieta anterior tenha sido hiperproteica. Página 101 Profª Patricia Cintra março 2023 O lactato acumula-se no tecido muscular e difunde-se posteriormente para a corrente sanguínea. Quando o esforço físico termina, o lactato é convertido à glicose através da gliconeogênese, no fígado. O indivíduo continua a ter uma respiração acelerada por algum tempo: o O2 extra consumido neste período promove a fosforilação oxidativa no fígado e, consequentemente uma produção elevada de ATP que é necessário para a gliconeogênese, formando-se então a glicose a partir do lactato, e esta glicose é transportada de volta aos músculos para armazenamento, sob a forma de glicogênio. Enzimas que fazem parte das etapas irreversíveis envolvidas na diferença da via glicolítica. ● Enzimas que fazem parte das etapas em geral envolvidas também na via glicolítica. O lactato é proveniente do piruvato muscular. Esse piruvato pode dar origem à alanina por transaminação, a partir de dieta hiperproteica. O lactato e a alanina armazenados no músculo são transportados para a mitocôndria hepática e daí Página 102 Profª Patricia Cintra março 2023 são transformados novamente em piruvato o qual toma um caminho paralelo no sentido inverso da glicólise para originar a glicose (gliconeogênese). A glicose formada, não fosforilada, navega até os órgãos carentes de energia, principalmente os glicodependentes como o cérebro, miocárdio e os glóbulos vermelhos. Gliconeogênese a partir de proteínas e aminoácidos As proteínas endógenas são hidrolisadas através de proteases específicas originando os aminoácidos. Esses aminoácidos são hidrolisados em grupo amino e radical carbônico. O grupo amino é reaproveitado e o excesso é eliminado na forma de ureia ou amônia. O radical carbônico entra no processo de gliconeogênese. Página 103 Profª Patricia Cintra março 2023 O radical carbônico dos aminoácidos de origem protéica, entra na gliconeogênese através do piruvato ou intermediários do ciclo de Krebs, na mitocôndria. Esses tomam destino ao oxaloacetato que saem da mitocôndria por meio do malato ou de fosfoenolpiruvato. O malato citosólico se transforma em oxalacetato citosólico. O oxalacetato toma a via da gliconeogênese. Nesse processo, as enzimas transaminases estão sempre presentes, transformando os aminoácidos em cetoácidos que, em sua maioria, são componentes do ciclo do ácido cítrico. Assim, os aminoácidos podem ser biossintetizados a partir dos cetoácidos, também por transaminação. Página 104 Profª Patricia Cintra março 2023 Regulação da gliconeogênese no jejum Aumento da liberação de ácidos graxos do tecido adiposo Diminuição da glicose sanguínea Aumento da liberação de glucagon 2.4. Metabolismo do glicogênio O glicogênio é a reserva disponível de glicose para suprir os tecidos com uma fonte de energia oxidável e é encontrado principalmente no fígado, este é considerado fonte de glicose que pode ser utilizada por todo o organismo. Uma segunda maior fonte de glicose é o glicogênio do músculo esquelético. Contudo, o glicogênio muscular não é disponível para outros tecidos, é conhecido como reserva particular, uma vez que o músculo não possui a enzima glicose-6-fosfatase responsável pela liberação da glicose livre com capacidade de circulação por todo organismo. O principal local de consumo de glicose diário é o cérebro, através da via aeróbica. A maior parte da energia restante é utilizada por eritrócitos, músculos esquelético e cardíaco. O corpo obtém glicose através da dieta ou da via da gliconeogênese. A glicose obtida a partir destas duas fontes primárias permanece solúvel nos fluidos do corpo ou é estocado na forma polimérica denominada glicogênio. O glicogênio é considerado a principal forma de depósito de glicose e é encontrado, principalmente, no fígado e músculo e, secundariamente, nos rins e intestinos. O músculo tem menor quantidade de glicogênio por unidade de massa de tecido, mas, considerando-se que a massa do músculo é muito maior do que a do fígado, o glicogênio total do músculo é cerca de duas vezes maior que a do fígado. O estoque de glicogênio no fígado é considerado o principal tampão de níveis de glicose no sangue. A molécula de glicogênio apresenta ligações glicosídica α 1-4 na cadeia linear e α 1-6 nos pontos de ramificações. Página 105 Profª Patricia Cintra março 2023 Regulação da síntese e degradação do glicogênio no fígado Estado alimentado (pós prandial) Estado de jejum (pré prandial) Aumento da síntese de glicogênio é acelerada. A degradação do glicogênio é acelerada. Regulação da síntese e degradação do glicogênio no músculo esquelético Durante exercício físico Durante o descanso do músculo Ocorre a degradação de glicogênio. Ocorre a síntese de glicogênio.Página 106 Profª Patricia Cintra março 2023 2.5. Glicogenólise É um processo de degradação do glicogênio o qual se inicia pela necessidade de glicose intracelular ou pelo organismo. Esse processo ocorre nas 36 primeiras horas de fome para sustentar o período em que a glicose está sendo formada pelo processo da gliconeogênese. A degradação dos estoques de glicogênio ocorre através da ação da enzima glicogênio fosforilase. A ação desta enzima é remover resíduos de glicose-1 P a partir da quebra de ligações α-(1,4) da molécula de glicogênio. Essa reação apresenta duas vantagens para o organismo: • A glicose é removida do glicogênio em um estado ativado (fosforilada) e isto ocorre sem hidrólise de ATP. • A concentração Pi nas células é alta o suficiente para dirigir o equilíbrio da reação no sentido favorável. A glicose-1-fosfato produzida pela ação da fosforilase é convertida em glicose- 6-fosfato por uma fosglicomutase. A enzima desramficadora entra quando há poucas unidades de glicose para chegar na ligação α1-6, tranferindo unidade de glicose de uma extremidade não redutora para outra não redutora dando oportunidade para a continuação do glicogênio fosforilase. Daí a conversão de glicose-6-fosfato para glicose, que ocorre no fígado, rim e intestinos, pela ação da glicose-6-fosfatase. No fígado, a ação desta enzima conduz a glicogenólise para geração de glicose livre e à manutenção da concentração desta no sangue. A enzima fosforilase não remove resíduos de glicose a partir das ligações α(1,6) ou extremidade redutora do glicogênio. A atividade da fosforilase cessa a quatro resíduos de glicose do ponto de ramificação. Para a remoção de glicose destes pontos é necessária a ação da enzima desramificadora conhecida também por transferase que contém duas atividades. A transferase ou desramificadora remove um bloco de três glicoses de uma ramificação para outra. Em seguida, a glicose em uma ligação α (1,6) da ramificação é removida pela ação da 1,6-glicosidase. No fígado, parte da glicose-6-P entra na via glicolítica e parte é desfosforilada pela glicose-fosfatase. Página 107 Profª Patricia Cintra março 2023 Essa glicose defosforilada juntamente com a originada da ação da enzima 1,6- glicosidase, caem na corrente sanguínea para serem distribuídas para órgãos glicodependentes. A glicose de origem do glicogênio hepático pode ser utilizada no fígado ou por tecidos extra hepáticos. A defosforilação da glicose-6 fosfato não ocorre no músculo esquelético devido à falta da enzima glicose- fosfatase. Teoricamente, a glicogenólise ocorre no músculo esquelético e pode gerar alguma glicose livre para entrar na corrente sanguínea. No entanto, a atividade da hexoquinase no músculo é alta e a glicose livre é imediatamente fosforilada e entra na via glicolítica. Já no músculo, a glicose livre liberada pela 1,6 glicosidase é fosforilada pela hexoquinase, em glicose-6P. E, portanto, todas as moléculas de glicose-6-P provenientes da glicogenólise, pela hexoquinase e pela fosfatase são destinadas para a via glicolítica muscular Página 108 Profª Patricia Cintra março 2023 Página 109 Profª Patricia Cintra março 2023 O fígado possui uma hexoquinase com pouca afinidade para a glicose e que não é inibida por glicose-6-P. Portanto, a glicose só é fosforilada no fígado quando existe no sangue em concentrações muito elevadas (i.e. depois das refeições). Assim, quando a concentração de glicose no sangue é baixa, o fígado não compete com os outros tecidos, e quando os níveis de glicose são elevados o excesso de glicose é convertido pelo fígado em glicogênio. Regulação hormonal da síntese e da degradação do glicogênio Estado alimentado (pós-prandial) Estado de jejum (pré-prandial) Diminuição dos níveis de glucagon Aumento dos níveis de glucagon Diminuição da gliconeogênese Aumento da gliconeogênese Diminuição da glicogenólise Aumento da glicogenólise Página 110 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio HARVEY, Richard A.; FERRIER, Denise R. Bioquímica ilustrada. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. SANTOS, C.F. dos. Bioquímica Metabólica. Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa. 2011. Página 111 Profª Patricia Cintra março 2023 VI- LIPÍDEOS Compostos encontrados nos organismos vivos, geralmente insolúveis em água e solúveis em solventes orgânicos. Nesta classe estão incluídos os óleos, gorduras, ceras, hormônios esteroidais, colesterol, vitaminas lipossolúveis, e os fosfolipídeos (membranas celulares), etc. Alguns exemplos: Cêra de abelha (p.f. 60-82 oC) Ceras C O O C30/32H61/65C24 H5127 55- - Fosfatidil colina ( presente nas membranas de organismos superiores ) H2C O C O (CH2)14CH3 C O C O (CH2)7 C O H CH CH (CH2)7CH3 P O O - O CH2CH2N(CH3)3 + H2 Fosfolipídeo R C O OR' H2C O C O C17H35 C O C O C17H35 C O C O C17H35 H H2 triestearina (sebo) (óleos e gorduras)TAG (R e R' = cadeias longas) H H H CH3 OH HO estradiol CH3 Vitamina E (a-Tocoferol) CH3 CH3 H3C HO O Página 112 Profª Patricia Cintra março 2023 C O CH O C O H H H H R1 O C R2 O C R3 O C Algumas funções dos lipídeos: • São reservas alimentares; • Fornecem energia (2 a 3 vezes mais calorias do que os carboidratos e proteínas; • São isolantes térmicos (ex. nos leões marinhos, focas, baleias, etc.); • Impermeabilizantes térmicos (gorduras das penas de aves, ceras das folhas das plantas, etc.) • Os fosfolipídeos são os principais componentes das membranas celulares. CLASSIFICAÇÃO DOS LIPÍDEOS: I – Lipídeos Simples II – Lipídeos Compostos III – Lipídeos Derivados I- LIPÍDEOS SIMPLES: São aqueles que sofrem quebra pela molécula de água (hidrólise) produzindo como produtos ácidos graxos e álcoois. São os óleos, gorduras e ceras. II- Óleos e Gorduras: também chamados de triacilglicerois (TAG), pois são ésteres derivados de ácidos graxos (de longa cadeia alquílica) e glicerol, também chamado de glicerina, cujo nome oficial da IUPAC é 1,2,3- propanotriol. Fórmula Geral: onde, Página 113 Profª Patricia Cintra março 2023 R1, R2, R3 são cadeia alquílicas de grande número de carbonos, ex.: -C15H31, C24H51, etc. Óleos: TAG que são líquidos a temperatura ambiente. Gorduras: TAG que são sólidos a temperatura ambiente. Os TAG variam no comprimento (a partir de 3 a 25 Carbonos) e também na saturação da cadeia carbônica. As gorduras possuem a cadeia carbônica saturada, já os óleos possuem de 1 a 4 insaturações (duplas ligações) na cadeia carbônica. As gorduras e óleos são ésteres, portanto são produtos da reação entre o glicerol e um ácido carboxílico graxo, isto é, ácidos de cadeias longas, embora na composição de gorduras do leite e derivados alguns são de pequena cadeia como por ex. o ácido butanóico(4 Carbonos), também chamado de ácido butírico. Classificação de Triacilgliceróis (TAG): I) Grupo das Gorduras do Leite e Derivados: - 30 a 40% de ácido oleico, 20 a 30% de ácido palmítico, 10 a 15% de ácido esteárico, e ca. 15% de ácido butírico (o único grupo que contém este ácido). II) Grupo dos Ácidos Insaturados: (Óleos e gorduras vegetais): - Contém TAG de ácidos insaturados, predominando ácidos oleico, linoleico e linolênico. Ex.: óleo de milho, girassol, oliva, de gérmem de trigo, etc. III) Grupo do Ácido Láurico: + H O C O R1 H O C O R1 H O C O R1 C O CH O C O H H H H H H H H + C O CH O C O H H H H R1 O C R2 O C R3 O C + 3 H O H Glicerol Ácido carboxílico Triacilglicerol (óleo ou gordura) água + + Página 114 Profª Patricia Cintra março 2023 - Contém ca. 50% de ácido láurico e quantidades menores de ácidos saturados com 8, 10, 16 e 18 C na cadeia. Possuem ácidos insaturados em pequena quantidade. Ex.: óleos de dendê e babaçu. IV) Grupo das Gorduras Animais: - São constituídos de ca. 40% de ácidos com 16 - 18C, 60% de ácidos insaturados (oleico e linoleico). Possuem p.f. maior do que os TAG de outros grupos. Ex.: triestearina (toicinho, sebo). Ácidos Carboxílicos Graxos: Os ácidos graxos ocorrem na natureza como substâncias livres ou esterificadas. A maior parte encontra-se esterificada com o glicerol, formando os triacilgliceróis e ou triglicerídeos. Os óleos e gorduras são misturas relativamente complexas de triacilgliceróis. As unidades acila correspondentes aos ácidos graxos representam cerca de 95% do peso molecular dos triacilgliceróis. As propriedades físicas, químicas e nutricionais de óleos e gorduras dependem, fundamentalmente, da natureza, do número de átomos de carbono e posição dos grupos acila presentes nas moléculas dos triacilgliceróis. Os triacilgliceróis representam aproximadamente 95% dos lipídeos na dieta humana. Durante a digestão, os TGA são hidrolisados nas posições 1 e 3 pelas lipases pancreáticas. Os ácidos graxos e monoacilgliceróis resultantes são consumidos pelo sistema de absorção de fluidos do metabolismo no corpo humano. Página 115 Profª Patricia Cintra março 2023 Os ácidos graxos livres ou constituintes dos TGA, mais comuns são: Nome usual Fórmula Nome IUPAC Ác. butírico CH3(CH2)2COOH ác. butanóico Ác. valérico CH3(CH2)3COOH ác. pentanóico Ác. capróico CH3(CH2)4COOH ác. hexanóico Ác. caprílico CH3(CH2)6COOH ác. octanóico Ác. cáprico CH3(CH2)8COOH ác. decanóico Ác. láurico CH3(CH2)10COOH ác. dodecanóico Ác. mirístico CH3(CH2)12COOH ác. tetradecanóico Ác. palmítico CH3(CH2)14COOH ác. hexadecanóico Ác. esteárico CH3(CH2)16COOH ác. octadecanóico Ác. araquídico CH3(CH2)18COOH ác. eicosanóico Ác. linocérico CH3(CH2)22COOH ác. tetracosanóico Ác. palmitoleico (C16:1) CH3(CH2)5CH=CH(CH2)7COOH Ác. oleico (C18:1) CH3(CH2)7CH=CH(CH2)7COOH Ác. linoleico (C18:2) CH3(CH2)4CH=CHCH2CH=CH(CH2)7COOH Ác. linolênico: (C18:3) CH3CH2CH=CHCH2CH=CHCH2CH=CH(CH2)7COOH Ác.araquidônico: (C20:4)) CH3(CH2)4CH=CHCH2CH=CHCH2CH=CHCH2CH=CH(CH2)3COOH Os ácidos graxos livres ou esterificados nos lipídeos dos alimentos, salvo poucas exceções, são monocarboxílicos e possuem número par de átomos de carbono dispostos numa cadeia linear, em decorrência da bioprodução a partir de uma unidade de acetato (acetil-Coenzima A). As ligações duplas dos ácidos insaturados estão localizadas na cadeia de forma não conjugada (sistema 1,4-diênico), freqüentemente separadas por grupo metilênico (a-CH2). A configuração dos ácidos insaturados são cis ou Z. No processo de rancidez autoxidativa ou nos processos de hidrogenação Página 116 Profª Patricia Cintra março 2023 catalítica catalisada por níquel ou aquecimento prolongado a temperaturas elevadas, a configuração cis pode ser convertida no isômero trans = E. No sistema de nomenclatura oficial, o número de átomos de carbono é indicado por um prefixo grego, exs. os ácido láurico (12 C), mirístico (14 C), araquídico (20 C) e behênico (22 C), são designados pelos prefixos dodeca-, tetradeca-, eicosa- e docosa-. Os ácidos graxos saturados têm sufixo anóico, e os insaturados tem sufixo enóico. O ácido linoléico, é denominado oficialmente por ácido 9(Z), 12(Z)-octadecadienóico. A estrutura de um ácido graxo pode também ser indicada mediante uma notação simplificada, na qual se escreve o número de átomos de carbono seguido de dois pontos e depois um número que indica quantas ligações duplas estão presentes na molécula. O linoléico, nesse caso, seria representado por 18:2 ou C18:2. Encontra-se também na literatura o símbolo para indicar a presença de dupla ligação, sendo a posição desta função definida pelo número correspondente indicado como potência. A forma simplificada de nomenclatura tem como inconvenientes principais a indefinição da posição e da isomeria geométrica (cis=Z ou trans = E) das ligações duplas. Ultimamente, principalmente nas áreas de nutrição e bioquímica, verifica-se uma tendência em agrupar os ácidos graxos insaturados em famílias conhecidas como (ômega). Sua representação costuma ser baseada no número de carbonos, número de duplas ligações e a posição que a primeira dupla ligação ocupa na sua estrutura a partir do grupo terminal metila (CH3). Exemplo: 18:3n6, ou seja, 18 → contém 18 carbonos 3 → contém três duplas ligações n6 → a primeira ligação está localizada no carbono 6, a partir do grupo metila (ômega-6 ou -6). Nesta nomenclatura, o ácido oleico (C18:1n9) seria pertencente à classe dos - 9. A família dos -3 estariam representados pelo ácido a-linolênico, ácido 5(Z),8(Z),11(Z),14(Z),17(Z)-eicosapentanóico- EPA - (ou seja, C20:5n3) e pelo ácido 4(Z),7(Z),10(Z),13(Z),16(Z),19(Z)-docosaexaenóico – DHA –(ou seja, C22:6n3). Página 117 Profª Patricia Cintra março 2023 Os ácidos graxos mais abundantes na natureza têm 16 ou 18 átomos de carbono. Estão incluídos entre eles os ácidos palmítico, esteárico, linoléico e oléico. Estes ácidos aparecem como os principais constituintes dos triacilgliceróis dos óleos de soja, dendê, girassol, colza, caroço de algodão, oliva, amendoim, que representam 84% da produção mundial de óleos vegetais. Os ácidos graxos possuem a propriedade de polimorfismo, i.e., se cristalizam em mais de uma forma, tem a mesma composição química, porém diferem em propriedades físicas e algumas ppdds. químicas. A consistência da manteiga, por ex., depende também da forma cristalina dos ácidos graxos. O entendimento das características físicas dos hidrocarbonetos ajuda a entender o comportamento de lipídeos cujas propriedades dependerão em grande parte da cadeia alquílica. Quanto maior a cadeia maior o ponto de fusão, portanto poderá ser sólido à temperatura ambiente (Gorduras), quanto menor a cadeia e quanto mais insaturada, menor ponto de fusão, portanto líquido à temperatura ambiente (óleos). Na natureza a maioria dos insaturados tem configuração “cis”, o que provoca ainda mais, a diminuição do ponto de fusão (menor empacotamento).Ex.: Ácido Símbolo Ponto de fusão (oC) Butírico (butanóico) 4:0 - 4,2 Capróico (hexanóico) 6:0 - 3,4 Caprílico (octanóico) 8:0 16,7 Cáprico (decanóico) 10:0 31,6 Láurico (dodecanóico) 12:0 44,2 Mirístico (tetradecanóico) 14:0 54,4 Palmítico (hexadecanóico) 16:0 62,9 Esterárico (octadecanóico) 18:0 69,6 Araquídico(eicosanóico) 20:0 75,4 Behênico (docosanóico) 22:0 80,0 Lignocérico (tetracoisanóico) 24:0 84,2 Oléico (9(Z)-octadecenóico), (-9) 18:1n9 16-17 Linoléico (9(Z),12(Z)-octadecadienóico, (-6) 18:2n6 5,0 Linolênico (9(Z),12(Z),15(Z)-octadecatrienóico, (-3) 18:3n3 11,0 Exemplo de gordura: Página 118 Profª Patricia Cintra março 2023 CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 C O O CH2 CH CH2 O O C C O O CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 Triplamitina (gordura vegetal) Exemplo de um óleo: Óleo vegetal Comportamento de óleos e gorduras em água: Os ácidos graxos de pequena cadeia são solúveis em água (ptes. de H). Os de cadeia grandes são solúveis em solventes apolares. Sais de ácidos graxos insaturados são sempre mais solúveis em água do que os saturados de igual peso molecular, principalmente os de metais pesados. Esta propriedade é empregada na separação quantitativa de ácidos graxos saturados e insaturados, por meio de sais de chumbo. Óleos são pouco solúveis em água, formando uma película monomolecular em água. CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 C O O CH2 CH CH2 O O C C O O CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 C CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 CH3 C HH CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 Página 119 Profª Patricia Cintra março 2023 H2O grupo carboxílico cadeia alquílica I.2. Ceras: As ceras são ésteres derivados de ácidos carboxílicos e álcoois de cadeia longa. Diferentemente de gorduras e óleos há somente uma ligação éster em cada molécula. As ceras em geral são mais duras e quebradiças, menos gordurosas do que as gorduras, mais resistentes à hidrólise e à decomposição, portanto servem de fator de proteção, ex.: as folhas e caules de regiões áridas, possuem uma camada de cêra que as protegem contra agentes externos e evitam a evaporação excessiva de água (ex., cêra da carnaúba). As cêras são utilizadas para polimentos, cosméticos, velas, etc. Fórmula Geral: II – LIPÍDEOS COMPOSTOS: São aqueles que contêm outros grupos além de ácidos graxos. São também insolúveis em água. Nesta classe estão incluídas, os fosfolipídeos, R1 C O O R2 onde, R1 e R2 são cadeias alquílicas longas Ex.: C15H31 C O O C30H61 palmitato de miricila, principal componente da cêra da abelha. ponto de fusão = 72 oC C15H31 C O O (CH2)15CH3 palmitato de cetila (do espermaceti da baleia) CH2(CH2)n C O O CH2(CH2)mCH3 HO n = 16-28 m = 30 e 32 cêra da carnaúba Página 120 Profª Patricia Cintra março 2023 glicolipídeos, carotenóides, tocoferóis (Vit. E), Vitaminas A, D, K, esteróides etc. A seguir descreveremos um pouco de fosfolipídeos e esteróides. II.1. Fosfolipídeos: Os: Fosfolipídeos e Glicolipídeos, são componentes estruturais das membranas das células vivas, e também parecem constituir um fator essencial na formação do coágulo sanguíneo. Os fosfolipídeos tem a seguinte fórmula estrutural: Os compostos hidroxilados ligados ao fósforo (-O-R3) mais comuns dos fosfolipídeos são: R1 C O O CH2 CHO O CR2 R3O O - O POH2C onde, R1 e R2 são cadeias alquílicas longas HO CH2 C COO - NH3 + H HO CH2CH2 NH3 + HO CH2CH2 N + CH3 CH3 CH3 HO CH2 CH OH CH2 OH OH H OHOH HO OH H H OH H H H O R3 álcool ligado ao fósforo Serina Etanolamina Colina Glicerol Inositol ác. graxo G l i c e r o l ác. graxo fosfato álcool Página 121 Profª Patricia Cintra março 2023 Exemplo 1: Este composto é também chamado de lecitina e é encontrada em gema de ovos, fígado, óleos vegetais não refinados. Exemplo 2: Os fosfolipídeos têm também suas propriedades físicas, altamente dependentes da cadeia alquílica. A presença de uma cauda apolar (alquil) e de uma cabeça polar capacita a membrana fazer a conexão entre uma fase polar e outro apolar. Este é um fator determinante para controlar seletivamente a permeabilidade nas membranas das células. CH3(CH2)16 H2C O P O O - O CH2CH2N + (CH3)3 C O O CH CH2O O C (CH2)7CHCHCH3(CH2)7 Fosfatidil colina (ou, 1-palmitil-2-oleil-fosfatidil colina) R1 C O O CH2 CHO O CR2 CH2CH2NH3 + O O - O POH2C fosfatidil etanolamina isolado do cérebro, fígado, soja Página 122 Profª Patricia Cintra março 2023 O P O O - O C O O CH2 CH CH2 O OCCH3CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 CH3CH2CH2CH2CH2CH2CH=CHCH2CH2CH2CH2CH2CH2CH2 + NR3 CH2 CH2 Bicamada da membrana celular proteínas cadeia alquílica = R cabeça polar Exemplo 3: difosfatidil glicerol (cardiolipina) Este fosfolipídeo está presente em grande quantidade nas membranas das mitocôndrias bacterianas. Exemplo 4: Fosfatidil inositol R1 C O O CH2 CHO O CR2 CH2CHCH2O O - O POH2C OH O P O O - O H2C O C O R1 C O C O R2 CH2 H OH OH H OH OH H H O H O P O O - O CH2 C O C O R2H C O C O R1 H H H Página 123 Profª Patricia Cintra março 2023 II.2. Esfingolipídeos: Também são componentes das membranas. São derivados da esfingosina. Cerebrosídeo (glicolipídeo) Os esfingolipídeos, juntamente com as proteínas e os polissacarídeos, compõe a mielina, a cobertura protetora que recobre as fibras nervosas ou axônios. Os axônios das células nervosas transportam os impulsos elétricos dos nervos; a mielina foi descrita como tendo função em relação ao axônio semelhante à do isolante em um fio elétrico. III- LIPÍDEOS DERIVADOS • Esteróis (colesterole sais biliares); • Sequiterpreno, clorofila, carotenoides e vitaminas lipossolúveis. CH3(CH2)12 C H C H C OH H C NH2H CH2OHesfingosina CH3(CH2)12 C H C H C OH H C NHH C O (CH2)22CH3 P O O - O CH2CH2N + (CH3)3OH2C EsfingomielinaCH3(CH2)12 C H C H C OH H C NHH CH2 C O (CH2)22CH3 O O CH2OH H OH OH H H O H H H unidade da galactose Página 124 Profª Patricia Cintra março 2023 III.2. Esteróides: Compostos esteroidais são aqueles que são derivados do peridrociclopentafenantreno, que tem a seguinte cadeia carbônica: OU SEJA, Existem muitos compostos com o esqueleto esteroidal, como por exemplo o colesterol, a Vitamina D3 e os hormônios esteroidais. Colesterol e Sais Biliares: O colesterol é o mais abundante esteróide nos animais (as plantas não possuem), cerca de 240 g. Cerca de metade desta quantidade está nas membranas celulares entre as células fosfolipídicas, ajudando a manter a fluidez da membrana. Muito do colesterol no corpo é transformado em sais biliares. O colesterol é também um importante precursor dos hormônios esteroidais (sexuais). C C C C C C C C C C C C C C C C C CH3 CH3 H R CH3 CH3 H R A B C D1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 CH3 CH3 CH H CH3 CH2 CH3 CH3CHCH2 CH2 A B C D1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 CH3 CH3 CH H CH3 CH2 C CH2 O W A B C D1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 NHCH2COO - Na + OHW= W= (ácido cólico = ácido bile) (glicolato de sódio = sal de bile) Colesterol Página 125 Profª Patricia Cintra março 2023 Excesso de colesterol não utilizado pelo corpo humano é levado ao fígado e transportado pelo sangue para a vesícula. Normalmente permanece em solução e é secretada para o intestino (na bile) para ser eliminada, porém pode precipitar formando sólidos e causando “pedras na vesícula”. Muitos alimentos são ricos em colesterol, por exemplo, ovos, manteiga, queijos, creme de leite, etc. O excesso de colesterol também está relacionado à aterosclerose, que pode levar à um ataque de coração. A aterosclerose causa a perda da elasticidade nas artérias e o espessamento de suas paredes. O espessamento é resultado do depósito do LDL colesterol (liproproteína de baixa densidade) na parede celular das artérias. Quando depositado nas paredes arteriais o colesterol pode ser oxidado por radicais livres. Os glóbulos brancos migram para as células arteriais numa tentativa de “limpar” as células consumindo os produtos de oxidação. A deposição destes glóbulos brancos modificados produz um estreitamento na parede da artéria provocando um aumento da pressão sanguínea. O ataque do coração ocorre quando uma das artérias coronárias (artérias que suprem o músculo do coração de sangue) está bloqueada. Os sinais de perigo são: - dor e sensação de pressão no meio do peito; - a dor pode se intensificar e espalhar por toda a região do peito e do braço esquerdo; - a dor pode se espalhar para os dois braços, ombros, pescoço e mandíbula. A sensação de pressão, indisposição e cólica que ocorrem na região do abdomen pode levar a uma idéia errônea de indigestão; - os sintomas podem ocorrer isoladamente ou de uma forma combinada ao mesmo tempo. A dor frequentemente é acompanhada por suor, nausea, vômito e respiração acelerada. Página 126 Profª Patricia Cintra março 2023 Digestão, absorção, transporte e utilização dos lipídios da dieta. A digestão e absorção de gorduras são consideradas mais complexas que as dos carboidratos ou proteínas porque as gorduras são insolúveis em água e quase todas as enzimas catalisam reações em meio aquoso. Em presença de detergentes (sais biliares e fosfolipídeos) ocorrem emulsificação que permite a associação da gordura com a fase aquosa, possibilitando a digestão. Assim, os lipídeos são emulsificados pelos sais biliares, digeridos por enzimas hidrolíticas e absorvidas pelas células da mucosa intestnal. Degradação dos triacilgliceróis A hidrólise dos triacilgliceróis é catalisada por lipases, duas das quais estão presentes no estômago. São lipase lingual, sintetizada no palato mole, e a lipase gástrica, secretada pelas glândulas gástricas do estômago. Triacilglicerol ácido graxo + diacilglicerol Diacilglicerol monoacilglicerol + ácido graxo Monoacilglicerol ácido graxo + glicerol Absorção de lipídeos No ambiente aquoso do intestino, os produtos da lipólise (ácidos raxos, monoacilgliceróis, fosfolipídeos, etc.) em emulsão são incorporados a Lipase lingual ou gástrica Lipase pancreática esterase pancreática Página 127 Profª Patricia Cintra março 2023 estruturas micelares com sais biliares. As micelas mistas são os principais veículos no movimento dos ácidos graxos, monoacilgliceróis e gliceróis do lúmen para a superfície das células da mucosa intestinal, onde ocorre o transporte para o interior do enterócito. Os sais biliares permanecem no lúmen intestinal para continuar a atividade de absorção de gorduras e, eventualmente, são absorvidos no íleo. O colesterol da dieta pouco solúvel é fracamente absorvido (cerca de 40% do ingerido). Na ausência de sais biliares, a absorção de lipídeos é drasticamente reduzida com a presença excessiva de gorduras nas fezes (esteatorréia). Formação de quilomícrons Na célula da mucosa intestinal, o destino dos ácidos graxos absorvidos é determinado pelo tamanho de suas cadeias de átomos de carbono. Ácidos graxos de cadeia menor que 12 a 14 carbonos não são esterificados (falta a enzima acil-CoA sintase de cadeia média) e são transportados ao sangue portal como ácidos graxos livres e levados diretamente ao fígado unidos a albumina. Diferentemente, os ácidos graxos de cadeia longa (> 14 átomos de carbono) são convertidos novamente em triacilgliceróis e agrupados ao colesterol esterificado, aos fosfolipídeos e a proteínas específicas (apolipoproteína B48), que os tornam parcialmente hidrossolúveis. Esses agregados lipoproteicos, denominados quilomícrons, são sintetizados no retículo endoplasmático rugoso dos enterócitos e liberados para os vasos linfáticos intestinais por exocitose e, a seguir, para o sangue do ducto torácico. Lipoproteínas e o transporte de lipídeos Lipoproteínas são complexos solúveis de proteínas (apolipoproteínas) e lipídios que transportam lipídeos na circulação de todos os vertebrados e até de insetos. Elas são sintetizadas no fígado e no intestino, em decorrência de alterações metabólicas dos precursores das lipoproteínas, ou são formadas nas membranas dos enterócitos. Página 128 Profª Patricia Cintra março 2023 Estruturalmente as lipoproteínas são partículas globulares formadas por uma capa hidrofílica constituída por fosfolipídeos, colesterol livre e proteínas, envolvendo um núcleo hidrofóbico que contêm triacilgliceróis e ésteres de colesterol e que possuem a função de transportar os lipídeos por meio da circulação sanguínea. Transporte de lipídeos aos tecidos pelas lipoproteínas plasmáticas. VLDL: lipoproteína de muito baixa densidade; IDL: lipoproteína de densidade intermediária; LDL: lipoproteína de baixa densidade; HDL: lipoproteína de alta densidade. Página 129 Profª Patricia Cintra março 2023 Metabolismo de lipídeos Mobilização e biossíntese dos lipídeos Os ácidos graxos são uma forma importante de armazenamento de energia para o nosso corpo. Possui maior rendimento energético do que os glicídios, pois se apresenta na forma reduzida e anidra. Além do valor energético, os lipídeos são componentes de fosfolipídios e glicolipídios, modificadores lipófilos1 de proteínas e hormônios. São armazenados na forma de triacilglicerídeos. Quando há necessidade de sua mobilização (para uma posterior geração de energia), as triglicérides são hidrolisadas por lipases pancreáticas à ácidos graxos livres e monoacilglicerois. Os lipídeos ingeridos são emulsionados pelos sais biliares para que sejam transportados e mais facilmente degradados. Ao chegar à parede da mucosa, os ácidos graxos e monoacilglicerol são reconvertidos a triglicerídeos para serem transportados daí em diante na forma de quilomícrons. Ao serem absorvidos pelas células intestinais são envolvidos por lipoproteínas que irão formar a estrutura estável do quilomícrons para ser encaminhado ao sistema linfático e deste, para o sangue. Página 130 Profª Patricia Cintramarço 2023 Os ácidos graxos são sintetizados no citosol e a unidade de formação dessas moléculas é a acetil-CoA quando em excesso e não utilizadas no ciclo do ácido cítrico. Como a molécula de acetil-CoA é formada somente na mitocôndria essa deve ser transportada para o citosol. A acetil-CoA é impermeável à membrana mitocondrial, essa é condensada com o oxaloacetato se transformado em citrato o qual sai da mitocôndria e é quebrado novamente em oxaloacetato e acetil-CoA citosólico a qual é utilizada para síntese dos ácidos graxos. Página 131 Profª Patricia Cintra março 2023 Os lipídeos para serem degradados, com o objetivo de gerar energia, devem antes ser mobilizados por influência de sinais hormonais. Isso ocorre quando hormônios como a epinefrina, glucagon e ACTH ativam as lipases que os quebram em ácidos graxos livres e gliceróis. Estes são incorporados em albumina para serem transportados do sangue até as células do tecido que está necessitando. A célula adiposa é capaz de retirar lipídios circulantes do sangue e armazená- los na forma de depósito de gordura neutra, os triacilgliceróis. A célula adiposa também é capaz de remover glicose da corrente sanguínea, degradá-la até Acetil-coA e no interior de suas mitocôndrias utilizá-las para a síntese de ácidos graxos, e posteriormente triglicérides e fosfolipídios pelo processo denominado lipogênese. Quando necessário, a gordura armazenada é hidrolisada em glicerol e ácidos graxos que são lançados na corrente sanguínea, podendo ser utilizados pelo fígado e músculos. Células musculares degradam e queimam ácidos graxos até CO2 e H2O, utilizando a energia liberada para a produção de ATP que é utilizada no processo de contração muscular. O fígado utiliza ácidos graxos para a produção de triglicéride. O colesterol que é utilizado para a produção de sais biliares, corpos cetônicos que serão Página 132 Profª Patricia Cintra março 2023 lançados para a corrente sanguínea e consumidos pelos músculos, em caso de excesso, excretado pelos pulmões e rins. A maior parte da reserva energética do organismo encontra-se armazenada sob a forma de triacilglicerídeos. Estes, assim como os ligados em outras moléculas, podem ser hidrolisados por lipases à glicerol e ácidos graxos. A molécula de glicerol liberada pode seguir para a glicólise depois de oxidado à dihidroxiacetona fosfatada na face externa da membrana interna da mitocôndria. Os dois elétrons libertados nesta oxidação, carreados por NADH+H+ são transferidos para a mitocôndria e recebidos pela ubiquinona ou coenzima Q, e esses fazem parte do conjunto de elétrons transferidos pela cadeia de transportes de elétrons acoplada a formação de ATP. A reação abaixo mostra a formação da glicose a partir do glicerol proveniente do triacilgliceróis: Os ácidos graxos terão um destino diferente: a β-oxidação, que ocorre na mitocôndria. Antes de entrarem na mitocôndria, os ácidos graxos são ativados na forma de Acil-CoA (radical do ácido graxo ligado a CoA). A reação de ativação ocorre no citoplasma, e consiste na sua transformação em Acil-CoA. Nessa etapa, um ATP é hidrolisado à AMP, o equivalente à hidrólise de 2 ATP em 2 ADP. Página 133 Profª Patricia Cintra março 2023 A membrana da mitocôndria interna é impermeável aos acil-CoA. Para que essa molécula passe para a matriz é necessário reagir com uma molécula de carnitina, em substituição com a coenzima A. A molécula Acil-Carnitina é transportada para dentro da mitocôndria por uma translocase. Dentro da mitocôndria, a carnitina transfere o grupo acil para uma outra molécula de CoA. A carnitina livre volta então para o citoplasma através da translocase. Neste processo não existe transporte de CoA nem para dentro e nem para fora da mitocôndria, pois as reservas citoplasmática e mitocondrial de CoA são independentes. -oxidação dos ácidos graxos Os ácidos graxos presentes no citoplasma da célula devem ser ativados pela adição da coenzima A (CoA) formando uma Acil-CoA. Esta unidade ativada irá entrar para a matriz mitocôndrial para iniciar o processo de oxidação. Essa transferência ocorre, contudo, com o auxílio de uma proteína chamada carnitina e de uma translocase. Página 134 Profª Patricia Cintra março 2023 Na mitocôndria, a Acil CoA irá passar por diversas reações (oxidação, hidratação, oxidação novamente e tiólise) para formar Acetil CoA, Acil CoA, NADH e FADH2. A molécula acetil CoA irá participar do ciclo do ácido cítrico e o NADH e FADH2 irão entrar no processo de geração de energia pela fosforilação oxidativa. Os ácidos são degradados a grupos acetil (C2) que na forma de Acetil-CoA suprem o ciclo do ácido cítrico por sua adição a um intermediário C4 (oxaloacetato) produzindo uma molécula C6 (citrato). Durante o ciclo, o C2 adicionado é perdido como CO2 e C4 é produzido. Não ocorre aumento no número de moléculas intermediárias do ciclo. Assim, se ácidos graxos são a única fonte de carbono, nenhum intermediário do ciclo do ácido cítrico pode ser removido sem que o ciclo se interrompa. A β-oxidação dos ácidos graxos consiste num ciclo de 3 reações sucessivas, idênticas à parte final do ciclo do ácido cítrico: desidrogenação, hidratação da ligação dupla formada e oxidação do álcool a uma cetona. A liberação de moléculas de Acetil-CoA ocorre por ação da enzima denominada tiolase, restando um acil-CoA com menos dois carbonos que o acil-CoA original. Em uma quebra do (Acil-CoA) não há liberação de um acetil- CoA pela β-oxidação restando (Acil- dando (Acil-CoA))n-2, onde n corresponde ao número de carbonos. O ciclo de oxidação é repetido e há repetição da formação de um FADH2 e um NADH+H+ por cada liberação de uma molécula de Acetil-CoA. Portanto, a repetição do ciclo permite a degradação total de uma molécula de ácido graxo de cadeia par liberando somente moléculas de Acetil-CoA. Essas moléculas de Acetil-CoA podem entrar no ciclo do ácido cítrico, onde é perdida Página 135 Profª Patricia Cintra março 2023 completamente no processo de descarboxilação na forma de CO2. Nesse caso é impossível utilizar esse Acetil-CoA para dar a volta no ciclo do ácido cítrico até malato o qual sai da mitocôndria (gliconeogênese) para ser transformado em oxaloacetato citosólico e dar origem à glicose. No processo da neoglicogênese só é aproveitada a unidade C3, restante da quebra dos ácidos graxos ímpares. Em um ácido graxo de cadeia ímpar na penúltima quebra é liberado uma Acetil-CoA e uma unidade com 5 carbonos. Na última quebra a unidade com 5 carbonos (C5) dá origem a uma molécula de Acetil-CoA(C2) e uma de propionil-CoA (C3). Para que o propionil-Coa possa ser utilizado pelo ciclo de Krebs, esse sofre uma carboxilação, dando o metilmalonil-CoA. O metilmalonil-CoA assim formado é então rearranjado a succinil-CoA, numa reação com a ajuda da vitamina B12. O succinil-CoA, além de ser um intermediário no ciclo do ácido cítrico, é um precursor do grupo heme. Uma deficiência em vitamina B12 resulta por isso na dificuldade de sintetizar heme, o que pode provocar o desenvolvimento da anemia perniciosa: é uma doença resultante da dificuldade de sequestrar cobalamina em nível do estômago, característica de indivíduos predispostos em idade avançada. O succinil-CoA é oxidado pelo ciclo do ácido cítrico à malato, que depoisde passar para o citoplasma é transformado em oxaloacetato e fosfoenolpiruvato pela gliconeogênese (ver gliconeogênese a partir do piruvato). Página 136 Profª Patricia Cintra março 2023 O oxaloacetato citosólico pode também ser descarboxilado à piruvato pela enzima málica, com produção simultânea de NADPH, molécula utilizada nas reações de biossíntese: Dessa forma, o piruvato pode entrar na mitocôndria e ser completamente oxidado a CO2 pelo ciclo do ácido cítrico. O ciclo do ácido cítrico funciona para produzir energia e compostos de carbono. Contudo, se os intermediários forem removidos para uso em outras vias metabólicas, estes devem ser repostos. O processo de reposição é diferente quando da utilização de açúcares ou ácidos graxos. A β-oxidação dos ácidos graxos insaturados seguem um percurso semelhante, porém novas enzimas são necessárias para a oxidação na proximidade da ligação insaturada. No caso desta ligação ser formada num carbono ímpar, é necessário a ação da Δ3, Δ2-enoil-CoA isomerase. Esta enzima transfere a ligação dupla do carbono 3 para o carbono 2, permitindo a continuação da β- oxidação. Neste ciclo de β-oxidação não se forma uma das moléculas de FADH2. Página 137 Profª Patricia Cintra março 2023 No caso da ligação dupla se localizar num carbono par, é necessária a ação da 2,4-dienoil-CoA redutase: a presença das ligações duplas conjugadas faz com que a reação de hidratação tenha mais tendência a ocorrer no carbono 4 do que no carbono carreto (2). A 2,4-dienoil-CoA redutase transforma as ligações conjugadas Δ4, Δ2 numa única ligação dupla Δ3. Os elétrons necessários para esta conversão provêm do NADPH. O processo continua seguidamente de forma análoga à oxidação de ácidos graxos insaturados em carbono ímpar. Regulação da -oxidação dos ácidos graxos Controlar a entrada dos acil-CoA na mitocôndria é um fator crucial na regulação. O malonil-CoA, que se encontra presente no citoplasma em grande quantidade, em situações de abundância de combustíveis metabólicos, inibe a carnitina aciltransferase impedindo que os acil-CoA entrem na mitocôndria para serem degradados. Além disso, a 3-hidroxiacil-CoA desidrogenase é inibida por NADH e a tiolase é inibida por acetil-CoA, o que diminui a degradação de ácidos graxos quando a célula tem energia em abundância. Corpos cetônicos Quando há alta taxa de oxidação de ácidos graxos no fígado, ocorre a produção de consideráveis quantidades de corpos cetônicos. Os corpos cetônicos são metabólitos normais exportados pelo fígado que atuam como combustíveis em outros tecidos, especialmente durante os períodos de jejum moderado (12 a 24 horas) a intenso (> 5 dias) em adultos ou jejum em períodos curtos em crianças. Os corpos cetônicos são hidrossolúveis em água e, portanto, não necessitam de transportadores no plasma. Síntese de corpos cetônicos Sob condições normais, a acetil-CoA formada durante a β-oxidação é oxidada fundamentalmente no ciclo do ácido cítrico e utilizada na síntese de esteroides ou para formar corpos cetônicos. Página 138 Profª Patricia Cintra março 2023 O metabolismo dos ácidos graxos é regulado de tal modo que somente pequenas quantidades de acetil-CoA são produzidas em excesso. Em certas condições metabólicas, como em jejum prolongado, inanição e diabetes não tratado, ocorre aumento da velocidade da β-oxidação, tornando necessário reciclar o excesso de acetil-CoA e liberar a CoA livre para novas β- oxidações. Nesses casos, o grupo acetil da acetil-CoA é transformado em corpos cetônicos no fígado, em processo chamado de cetogênese. Os corpos cetônicos consistem em acetoacetato, β-hidrobutirato e acetona e são utilizados como combustível hidrossolúvel nos tecidos extra-hepáticos. Metabolismo do colesterol • Os esteroides livres são solubilizados no interior das micelas mistas, na porção superior do intestino delgado e absorvidos em sua borda em escova. • O colesterol que se encontra no interior do enterócito origina-se tanto da alimentação quanto da bile. Β-hidroxibutirato Acetona Página 139 Profª Patricia Cintra março 2023 • O colesterol alimentar é esterificado em até 65%, enquanto o colesterol biliar existe na forma livre, o que provavelmente explica as diferenças de eficiência de absorção do colesterol da alimentação (34%) e do biliar (46%). • Para serem absorvidos, os ésteres de colesterol são primeiramente hidrolisados a esteróis livres por ação da enzima pancreática denominada colesterol esterase ou hidrolase de éster de colesterol, dependente de sais biliares. O colesterol pode ser obtido a partir d duas maneiras: por síntese exógena e por síntese endógena. A síntese do colesterol ocorre em todas as células nucleadas, principalmente no fígado, e a sua produção vai ser diretamente influenciada pela quantidade presente no organismo. A síntese exógena se dá através da dieta alimentar. O alimento é capturado no trato intestinal, emulsificado (mistura de substância oleosa com outra não oleosa), digerido por enzimas hidrolíticas e absorvido por células da mucosa intestinal. Posteriormente, passa para a linfa e segue para o tecido muscular para obtenção de energia, tecido adiposo para armazenamento e o remanescente é levado para o fígado através dos quilomícrons, sendo estas as maiores lipoproteínas encontradas no corpo humano. Página 140 Profª Patricia Cintra março 2023 A síntese endógena ocorre quando o colesterol é sintetizado pelo próprio organismo. A síntese ocorre principalmente no fígado, mas ocorre também no córtex adrenal e nos tecidos reprodutores, 75% do colesterol é proveniente dessa síntese. Todos os tecidos podem produzir colesterol, porém a maior parte é sintetizada no fígado em 3 fases: Página 141 Profª Patricia Cintra março 2023 1. Produção de mevalonato a partir de duas moléculas de acetil-CoA. 2. Transformação do mevalonato em uma molécula de esqualeno. 3. Ciclização da molécula de esqualeno para formação do colesterol. Transporte do colesterol O transporte do colesterol é feito por lipoproteínas plasmáticas. A lipoproteína que irá transportar os lipídeos que foram absorvidos no intestino para os outros tecidos é o quilomícrom. Quando há excesso de ácido graxo absorvido pela dieta estes estarão na forma de triacilgliceróis no fígado e serão transportados para os tecidos periféricos pela lipoproteína VLDL. Além de triacilgliceróis as VLDLs também irão transportar colesterol, éster de colesterol e fosfolipídeos. A medida que a VLDL libera triacilgliceróis será chamada de IDL e após liberar mais triacilgliceróis formará a LDL. A LDL é uma lipoproteína rica em colesterol e irá fazer o transporte desse para os outros tecidos. Página 142 Profª Patricia Cintra março 2023 Nas células há receptores para o LDL que será endocitado e o colesterol liberado nas células. Quando há muito colesterol dentro da célula os receptores de LDL diminuem. Já a HDL irá fazer o transporte reverso do colesterol, ou seja, dos outros tecidos para o fígado. Quando sintetizado no fígado e no intestino delgado essa lipoproteínaé pobre em colesterol e rica em proteínas sendo chamada de HDL nascente, após captar o colesterol e se tornar uma molécula rica em colesterol, que pode ser levada para o fígado é chamada de HDL madura. INTEGRAÇÃO DO METABOLISMO DE MACRO E MICRONUTRIENTES NO PERÍODO ABSORTIVO E DE JEJUM E EM ESTADOS CATABÓLICOS. Logo após uma refeição, a maior parte dos carboidratos, aminoácidos e uma pequena parte dos triglicerídeos advindos da dieta são diretamente levados ao fígado pela veia porta. A maior parte dos triglicerídeos advindos da dieta, no entanto, percorre um caminho diferente, eles migram pelo sistema linfático, caem na circulação sistêmica podendo ser metabolizados pelo fígado ou captados pelo tecido adiposo. De um modo geral, a concentração dos nutrientes no sangue é extremamente controlada pelo fígado, que os capta e distribui. O fígado será o órgão central da manutenção da homeostasia de carboidratos, lipídeos e proteínas. No período de jejum a degradação de glicogênio, a proteólise muscular e lipólise são responsáveis por manter o aporte energético no organismo. É preciso considerar que em cada célula ou tecido exercendo papéis fisiológicos específicos as vias metabólicas tenham características próprias. Este artigo analisa o metabolismo de diferentes células (hemáceas) e tecidos (cérebro, músculos, fígado e tecido adiposo) enfocando as inter-relações teciduais que ocorrem no período pós-prandial e no jejum, e também as características metabólicas próprias de cada tecido. Página 143 Profª Patricia Cintra março 2023 Hemáceas As hemáceas, cuja principal função é o transporte de oxigênio, teriam sua função extremamente prejudicada caso, ao transportar o oxigênio por longos trajetos, como o fazem, se consumissem o mesmo. Portanto, o metabolismo da hemácea é predominantemente anaeróbico. Sem o aparato mitocondrial para a oxidação dos demais nutrientes, as hemáceas tornam-se dependentes da via glicolítica anaeróbica. O consumo de glicose nestas células ocorre de modo constante e independente do perfil nutricional. A captação da glicose pelos transportadores GLUT1 da membrana da hemácea independe da presença de insulina. Nestas células, a via glicolítica culmina na produção constante de lactato, o qual será captado pelo fígado. O lactato produzido pelas hemáceas é convertido em glicose pela gliconeogênese hepática e é uma das fontes de manutenção da glicemia em jejum. Cérebro O cérebro não tem qualquer reserva energética e por isso, independente do estado nutricional é necessário que haja um suprimento de glicose constante para este tecido. Os transportadores de glicose no SNC são do tipo GLUT1 e GLUT3, trabalham independente da presença de insulina, e juntos, garantem uma alta eficiência na captação da glicose neste tecido. Além da glicose, os corpos cetônicos podem ser utilizados como substratos energéticos no SNC em situações especiais como veremos a seguir. No entanto, a independência de glicose neste tecido nunca é absoluta. Situações de hipoglicemia causam perturbações no funcionamento do SNC, que vão desde cefaléia, incoordenação de fala e motora, até alterações no eletroencefalograma e coma. Os ácidos graxos não podem atravessar a barreira hemato-encefálica e, portanto, não podem suprir a demanda energética do SNC. Em situação fisiológica o consumo de glicose pelo SNC chega a 120 g/dia, só sendo menor que o consumo de glicose pelo músculo esquelético em atividade física. A maior parte da energia utilizada pelo cérebro é usada na bomba Na+- K+ ATPase, responsável pela repolarização do potencial de membrana nas Página 144 Profª Patricia Cintra março 2023 células nervosas. O SNC, mesmo durante o sono, mantém um consumo constante de glicose, cerca de 60% do total da glicose consumida pelo restante do organismo, e é o grande consumidor deste nutriente. Fígado O metabolismo de carboidratos no fígado No fígado, o transporte de glicose ocorre por transportadores GLUT2, os quais de modo eficiente, mantêm a concentração de glicose no hepatócito na mesma proporção com que este nutriente existe na circulação sanguínea. No entanto, a glicose só poderá ser utilizada pelo tecido hepático após ser fosforilada. A enzima responsável por essa reação, a glicoquinase, possui baixa afinidade pela glicose, assim, o fígado só irá fosforilar e garantir a permanência da glicose dentro das células hepáticas, uma vez que haja concentração suficientemente alta de glicose na circulação. Isso ocorre, porque o fígado pode usar outros substratos energéticos como ácidos graxos ou aminoácidos como fonte energética. Apesar da insulina não influenciar a captação de glicose nas células hepáticas, influencia profundamente a utilização da glicose por estas células. A glicose só será utilizada pelo fígado como nutriente preferencial quando a razão insulina/glucagon for suficientemente alta para ativar a via glicolítica. Os altos aportes de glicose juntamente com a presença de insulina também estimularão a síntese de glicogênio, e, neste momento, o fígado passa a ser um armazenador de glicose. Caso contrário, o fígado fará exatamente o oposto, será um exportador de glicose. No momento de jejum, quando houver predomínio do glucagon sobre a insulina, a glicogenólise será ativada e o fígado passa a exportar a glicose que havia armazenado sob a forma de glicogênio. Como o glicogênio é uma reserva limitada e somente pode suprir a demanda de glicose no organismo por algumas horas, o fígado lança mão de outro recurso, a gliconeogênese. A gliconeogênese ocorre predominantemente no tecido hepático pelo estímulo do glucagon e é simultânea a glicogenólise hepática [1,3,6]. Enquanto houver glicogênio, a velocidade da gliconeogênese é pequena, no entanto, esta via ocorrerá em velocidade máxima após a exaustão do glicogênio hepático. Página 145 Profª Patricia Cintra março 2023 Portanto, no jejum prolongado, a glicemia é mantida somente pela gliconeogênese, o que significa um custo metabólico importante, pois esta via está relacionada à perda significativa de massa muscular e de tecido adiposo que acompanham o jejum. É preciso lembrar que a síntese de glicose que ocorre no fígado durante períodos de jejum prolongados tem como principais precursores aminoácidos, advindos do músculo esquelético, glicerol, advindo da mobilização de triglicerídeos do tecido adiposo e lactato, advindo das hemáceas, e tendo como fonte de energia a intensa betaoxidação dos ácidos graxos liberados pela mobilização dos triglicerídeos. Mesmo com a chegada de alimentos a produção de glicogênio a partir de aminoácidos provenientes da dieta pode continuar ocorrendo no fígado por algum tempo. Isto é chamado de gliconeogêse pós-prandial e ocorre para garantir um adequado armazenamento de glicogênio no fígado. O metabolismo lipídico no fígado No período pós-prandial, estimulado pela insulina, os ácidos graxos podem ser sintetizados em alta velocidade pelo fígado a partir de moléculas de acetil-coA. Os ácidos graxos sintetizados pelo fígado serão exportados através das lipoproteínas transportadoras VLDL até o tecido adiposo, local onde serão armazenados. Toda vez que o consumo de alimentos exceder a demanda energética teremos o acúmulo de reservas (glicogênio e triglicerídeos). No entanto, a capacidade de armazenamento de glicogênio é bastante limitada quando comparada a de triglicerídeos. Veja que a capacidade total do fígado armazenar glicogênio é em torno de 70 g e do músculo esquelético 120 g, mas o tecido adiposopode conter dezenas de quilogramas de triglicerídeos. A capacidade de transformar excessos alimentares em lipídeos é praticamente ilimitada e toda vez que houver desequilíbrio neste processo teremos a obesidade. Em situação de jejum, no entanto, o fígado capta ácidos graxos liberados pela mobilização de triglicerídeos do tecido adiposo, os quais serão utilizados para a síntese de corpos cetônicos. A cetose é favorecida, pois, o outro caminho possível para a utilização dos ácidos graxos, a beta-oxidação, está inibida no Página 146 Profª Patricia Cintra março 2023 fígado neste momento, já que há um desvio do oxaloacetato para a gliconeogênese, diminuindo a velocidade do ciclo do ácido cítrico. A produção de corpos cetônicos pelo fígado tem como principal objetivo fornecer um nutriente alternativo à glicose, para os tecidos extra-hepáticos. O SNC, por exemplo, adapta-se paulatinamente a chegada do novo nutriente e após algumas semanas inverte sua preferência nutricional passando de consumidor exclusivo de glicose (120g/dia) a consumidor preferencial de corpos cetônicos (100g/dia), embora seja sempre dependente de glicose, mesmo que em pequena proporção (40mg/dia). A profunda adaptação do SNC em relação à fonte energética se deve ao fato de que no jejum, a manutenção continuada da gliconeogênese significa importante depleção de proteínas do músculo esquelético, assim, caso a gliconeogênese fosse a única forma de suprimento energético, haveria uma debilidade protéica importante no organismo. Por outro lado, a manutenção da cetose implica importante perda de lipídeos do tecido adiposo, uma reserva imensamente maior do que a de proteínas, e, portanto, quantitativamente mais disponível. É mantendo uma gliconeogênese moderada e intensificando a cetose que o organismo pode suportar um jejum prolongado por períodos bastante longos de tempo, de 30 a 60 dias. O papel do fígado como fornecedor energético do jejum, seja ele curto ou longo, exportando glicose ou corpos cetônicos para o restante do organismo, é fundamental para manter o funcionamento adequado do SNC e de outras células e consequentemente, para a manutenção da vida. O metabolismo proteico no fígado No período pós-prandial, quando a concentração de aminoácidos na corrente circulatória é alta, a oxidação completa de aminoácidos fornece uma quantidade de energia significativa para o tecido hepático. Os aminoácidos podem ser totalmente oxidados pelo fígado, ou ainda, ser convertidos em glicose ou corpos cetônicos. A produção de glicogênio a partir de aminoácidos provenientes da dieta (gliconeogênese pós-prandial) é particularmente estimulada por dietas ricas em proteínas e pode persistir por algum tempo mesmo após o término de uma refeição. Nos momentos de jejum, o fígado passa a receber aminoácidos do tecido muscular priorizando a Página 147 Profª Patricia Cintra março 2023 gliconeogênese. O fígado participa ativamente do catabolismo proteico, já que o ciclo da uréia é exclusivo do tecido hepático, e é a forma preferencial de excreção de nitrogênio advindo da proteólise. Por outro lado, o fígado é responsável pela síntese de todas as proteínas plasmáticas, com exceção das imunoglobulinas as quais são sintetizadas pelos linfócitos. A manutenção da concentração de proteínas circulantes nos valores adequados 6-8 g/dL exige um intenso trabalho de síntese proteica hepática. Tecido Muscular No músculo, a utilização de corpos cetônicos e ácidos graxos livres pode substituir a de glicose. No entanto, em situações de intensa atividade física, o metabolismo anaeróbico é favorecido, o que significa, que nesses momentos, o músculo será mantido principalmente pela utilização anaeróbica da glicose. Isto justifica, a necessidade do músculo esquelético e cardíaco, manterem uma reserva de glicose, o glicogênio. O glicogênio muscular, diferentemente do hepático, somente alimenta o próprio músculo, pois há ausência da enzima glicose-6-fosfatase nas células musculares, de tal modo que a glicose liberada pelo glicogênio muscular se mantenha fosforilada e seja incapaz de ser transportada para fora da célula. A contribuição do glicogênio armazenado no músculo é fundamental para garantir a eficiência do trabalho muscular, principalmente quando é exigida do organismo uma atividade física intensa num período muito curto de tempo, como por exemplo, em exercícios de explosão, corridas de 400 metros ou provas de natação de 100 metros, ou ainda, em exercícios de força (musculação). A captação de glicose no músculo ocorre pelos transportadores GLUT4, os mesmos que aparecem no tecido adiposo, e é extremamente dependente da ação da insulina. A insulina aumenta o número de receptores GLUT4 expostos nas membranas celulares musculares e do tecido adiposo, porque estimula a mobilização destes receptores dos locais de armazenamento e sua migração para a membrana plasmática. Outra ação da insulina no tecido muscular é a inibição da degradação proteica com favorecimento da síntese de proteínas, de tal modo que dietas adequadas em aminoácidos e carboidratos se tornam Página 148 Profª Patricia Cintra março 2023 importantes coadjuvantes para a obtenção de hipertrofia muscular induzida pelo exercício físico. No músculo esquelético em alta atividade a velocidade da glicólise é maior do que a do ciclo do ácido cítrico, então, uma grande parte do piruvato será convertido a lactato, o qual é captado pelo fígado, tornando-se substrato para a gliconeogênese. Nesta situação fígado e músculo estabelecem uma relação de interdependência, o músculo consome glicose de maneira importante, produzindo lactato, o lactato é levado ao fígado pela corrente circulatória e lá é novamente convertido em glicose, este ciclo de reações, é conhecido como ciclo de Cori, conforme ilustrado na Figura abaixo. Parte do piruvato produzido no músculo é convertido em alanina por reação de transaminação, e esta alanina, também irá alimentar a via de gliconeogênese hepática. Em períodos de trabalho muscular intenso, ou ainda, durante o jejum prolongado, ocorre uma proteólise importante, e liberação do aminoácido alanina que funciona como importante substrato da gliconeogênese nestas situações. Nos primeiros dias de jejum, a proteólise muscular é intensa, cerca de 75 g/dia, e após 3 ou 4 dias de jejum, passa a ocorrer em menor escala, cerca de 20 g/dia. As proteínas musculares devem ser poupadas após alguns dias de jejum, pois a reserva protéica é limitada, corresponde a 6 Kg de massa muscular, para um indivíduo adulto de 70 Kg, e seria insuficiente para manter a glicemia por períodos maiores que duas semanas. Assim, após um período de 3 ou 4 dias de jejum, o SNC vai substituindo o uso de glicose pelo de corpos Página 149 Profª Patricia Cintra março 2023 cetônicos o que permite uma menor velocidade da proteólise muscular e consequentemente da gliconeogênese. Em todo o caso, o músculo é a principal fonte de aminoácidos durante a inanição e será o grande alimentador da gliconeogênese nos períodos prolongados de jejum. Nos períodos de exercício físico moderado e de longa duração, o principal combustível para o tecido muscular passa a ser os lipídeos, e nesse sentido, os depósitos de triglicerídeos do próprio músculo assumem especial importância. Em todo o caso, o músculo cardíaco parece dar prioridade aos corpos cetônicos, preferindo-os inclusive à glicose. Como foi discutido acima, o tecido muscularpode utilizar vários substratos energéticos para garantir a eficiência do trabalho muscular. O tipo de substrato energético utilizado pelo músculo é determinado primariamente pela intensidade e duração do exercício, mas pode ser influenciado pelo nível de treinamento, dieta e fatores externos que poderiam modificar a resposta metabólica ao exercício. Isto não significa que qualquer que seja o combustível preferencialmente utilizado haja exclusão dos demais, e sim, que há uma combinação de diferentes fontes de energia para um mesmo tecido. Tecido adiposo O tecido adiposo distribui-se sob o tecido subcutâneo, porém com tendência de acumular-se na cavidade abdominal e no músculo esquelético, e atinge cerca de 15 % do peso de um indivíduo normal, isto é, cerca de 15 kg para um indivíduo adulto de 70 kg. Este grande volume lipídico é sem sombra de dúvida a maior reserva energética do organismo, e é caracterizado pelo acúmulo de grandes quantidades de triglicerídeos (TG) nas células adiposas. A grande parte dos ácidos graxos que constituirão a moléculas de TG, chegam ao tecido adiposo transportados pelas lipoproteínas plasmáticas. A síntese de TG, a partir de moléculas de glicerol-3-fosfato e ácidos graxos ou a hidrólise, da molécula de TG são processos regulados pela disponibilidade de glicose nas células do tecido adiposo. A entrada de glicose no tecido adiposo é feita pelos receptores GLUT4 dependentes da ação da insulina, e, assim, quando a razão Página 150 Profª Patricia Cintra março 2023 insulina/glucagon for alta, o glicerol-3-fosfato é produzido no tecido adiposo pela redução da di-hidroxiacetona fosfato, intermediária da via glicolítica e novas moléculas de TG podem ser armazenadas. No entanto, quando a razão insulina/glucagon diminui, a disponibilidade de glicose diminui. Com a diminuição da produção de glicerol-3-fosfato, a síntese de TG no tecido adiposo será dificultada. Por outro lado, quando a presença de insulina está diminuída e a de glucagon aumentada, as enzimas lipases que promovem a quebra de TG em ácido graxo e glicerol, serão ativadas, e assim, tanto ácidos graxos como glicerol, serão liberados para a corrente circulatória e serão captados pelo fígado. Os hormônios T3 e T4, o hormônio do crescimento (GH) e o cortisol também acionam a via lipolítica por aumento do AMPc, de modo semelhante ao glucagon e às catecolaminas. De um modo geral podemos afirmar que a oferta de nutrientes garante uma série de condições que culminam na ativação das vias anabólicas, é o momento propício para o armazenamento. No entanto, no período de jejum que se segue a uma refeição as células passam ter um metabolismo predominantemente catabólico. Os principais, reservatórios energéticos, como glicogênio, triglicerídeos e proteínas serão mobilizados para suprir a carência energética do organismo. Vimos também que, em casos de jejum prolongado, uma série de adaptações metabólicas ocorre para garantir o funcionamento do organismo, sendo que a produção e utilização de corpos cetônicos passa ter uma importância ímpar na manutenção da vida. Página 151 Profª Patricia Cintra março 2023 Bibliografia de apoio: CAMPBELL, M. K.; FERREIRA, H. B. Bioquímica. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2007. MALHEIROS, S.V.P. Integração metabólica nos períodos pós-prandial e de jejum – um resumo. Revista Brasileira de Ensino de Bioquímica e de Biologia Molecular. 2006. MARZZOCO, A.T., TORRES, B.B. - Bioquímica Básica, 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999. MOTTA, V.T. Bioquímica. 2ª edição. Rio de Janeiro: MedBook, 2011. NELSON, D. L.; COX, M. M. Lehninger Princípios de Bioquímica. 4. ed. São Paulo: Sarvier, 2006. SANTOS, C.F. dos. 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