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A CLÍNICA COM CRIANÇAS 
AULA 6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Marianne Bonilha
2 
 
 
CONVERSA INICIAL 
O processo psicanalítico da criança 
Nesta etapa vamos aprofundar nos conhecimentos dos aspectos do 
processo psicanalítico com a criança. Abordaremos a primeira entrevista com o 
paciente; as sessões de avaliação; discutiremos sobre a função diagnóstica e 
terapêutica da transferência da criança com o analista; conheceremos a devolutiva 
a ser dada para a criança após a avaliação; e refletiremos sobre o andamento do 
tratamento do paciente até a alta. 
Com esta etapa, objetivamos que você consiga: 
• compreender as fases do processo de tratamento com a criança; 
• entender a estrutura e a importância da primeira entrevista com a criança; 
• compreender a avaliação da criança (o que pode ser avaliado e como pode 
ser avaliado); 
• conhecer a importância da transferência para o diagnóstico e o 
tratamento da criança; 
• entender o processo analítico até a alta do paciente. 
TEMA 1 – A PRIMEIRA ENTREVISTA 
A clínica com crianças traz uma primeira peculiaridade: normalmente, a 
primeira entrevista não ocorre com o paciente. Entrevista-se os pais, antes de 
entrevistar a criança. O objetivo é conhecer os pais, ter as informações 
relacionadas à problemática da criança, conhecer a percepção destes, de modo 
abrangente. Investiga-se a queixa e se trabalha a demanda. Após a entrevista ou 
as entrevistas com os pais, realiza-se o primeiro contato com a criança. Nas 
entrevistas que foram realizadas com os pais, deve-se combinar que eles 
conversem com a criança a respeito do motivo pelo qual ela é levada ao psicanalista 
– o que é retomado pelo próprio analista, na primeira sessão com a criança 
(Werlang, 2000). 
Esse pode ser o início do diálogo com a criança, dentro da sala de jogo, 
sendo importante, então, perguntar se sabe o que está fazendo ali, 
porque veio ou o que os pais falaram da sua vinda ao psicólogo. 
Esclarecendo esse aspecto, compreender-se-ão as fantasias da criança 
a respeito do processo de avaliação, e, se a resposta for negativa, deve-
se fazer um breve relato do que foi falado com os pais, sem detalhes 
muitos profundos, mas sempre explicitando a verdade. As instruções 
3 
 
 
específicas para uma entrevista lúdica consistem em oferecer à criança 
a oportunidade de brincar, como deseje. (Werlang, 2000). 
Na primeira entrevista com a criança, realiza-se um plano de acolhimento 
dela e suas manifestações espontâneas no espaço analítico (Berardino, 2011). O 
psicanalista deve mergulhar nas representações reveladas por ela, montadas 
pelas cenas lúdicas e/ou verbalizadas, sob o pano de fundo dos referenciais 
familiares trazidos pelos pais. Trata-se de apresentar para a criança a 
especificidade do setting psicanalítico, lugar de livre expressão verbal e lúdico. As 
entrevistas com crianças são o momento de se deixar enredar pela rede 
significante em que ela está imersa, para, em um segundo momento, interpretar 
de tal modo que os significantes da interpretação possam ser recebidos e 
articulados por ela (Berardino, 2011). 
Nesse primeiro contato, abre-se um convite para a criança falar, produzir 
seus significantes, falar de seu sintoma, de sua história, possibilitando-lhe articular 
suas relações primordiais. Convoca-se a criança, na transferência, a fazer-se 
sujeito, sujeito responsável pelo sintoma. Se, por um lado, o sintoma da criança 
responde a uma demanda inconsciente dos pais, por outro, há sua própria escolha 
enquanto sujeito. Sua resposta sintomática tem a marca das suas construções 
enquanto sujeito, com as suas respectivas responsabilidades e implicações. É na 
entrevista inicial que se desencadeia (ou se pretende que desencadeie) a 
implicação da criança quanto ao próprio sintoma. 
No primeiro encontro com a criança, além de questionar sobre o prévio 
conhecimento dela a respeito da ida ao consultório e qual percepção tem acerca 
disso, o psicanalista, em linguagem simples e adequada à idade da criança, pode 
conduzir a conversa com o paciente sobre: 
• a função daquele espaço, qual é o trabalho feito e para que serve; 
• o fato do sigilo das sessões (esclarecendo que, nos contatos ou na 
devolutiva, são comunicados aos pais um parecer acerca das condições 
psíquicas e não o conteúdo das sessões); 
• o motivo da consulta, dando ao paciente a oportunidade de se posicionar 
sobre a queixa trazida pelos pais; 
• a duração e a frequência das sessões; 
• os combinados quanto à utilização de brinquedos e o direito de escolher 
livremente as atividades lúdicas ou gráficas; 
• a regra fundamental de dizer livremente o que lhe vier na cabeça (Dolto, 
4 
 
 
1991). 
As perguntas feitas para o paciente devem circunscrever as falas e as 
brincadeiras que a criança produz. Dessa forma, permite-se à criança uma maior 
aproximação e expressão dos sentimentos e vivências do dia a dia que a 
incomoda. 
Deve-se ter à disposição, para uso do paciente, caixa ou armário de 
brinquedos, com materiais diversificados para idades e interesses diversos. Como 
meio facilitador para as expressões infantis, pode-se selecionar: família de 
bonecos, casinha de bonecas mobiliada, fantoches, carrinhos (incluindo de 
bombeiro, de polícia, ambulância, corrida), aviões, navios, revólveres e espadas 
(para facilitar o jogo agressivo da criança), panelinhas, pratos, xícaras, diferentes 
tipos de lego, soldados, mamadeira, argila, areia, massa de modelar, tintas, cola, 
pincéis, cordão, fita adesiva, tesoura sem ponta (materiais não estruturados são 
importantes, pois possibilitam a expressão sem que a experiência se torne 
invasora), telefone, papéis para desenhar, lápis preto e de cor, lápis de cera, 
borracha, apontador, animais selvagens e domésticos, bola, jogos de competição, 
jogos de montar. 
O uso das entrevistas preliminares com a criança e seus pais permite ao analista 
não cair no erro de conduzir a análise da criança no sentido de responder à 
demanda inicial dos pais. O cuidado com a singularidade da criança requer 
endereçar-se a ela, trata-se de proporcionar que esta diga o que pensa, que 
brinque, que possa comunicar o que habita, pois, somente assim, é possível 
para a criança a apreensão da própria posição subjetiva. 
TEMA 2 – ENTREVISTAS PRELIMINARES COM A CRIANÇA 
As sessões de avaliação, desde a primeira entrevista, embora possam 
produzir um efeito terapêutico, pela possibilidade de nomeação do sofrimento no 
brincar e no desenhar, mantêm-se como um período voltado para o 
conhecimento/reconhecimento do paciente, muito mais do que para intervenção. 
Esse conhecimento sobre o paciente refere-se ao psicodiagnóstico, que é 
necessário para o estabelecimento da direção do tratamento da criança. O 
psicodiagnóstico pode fornecer uma perspectiva acerca da personalidade e do 
desenvolvimento do paciente. O período avaliativo permite conhecer as 
características estruturais, os aspectos psicodinâmicos, ao mesmo tempo que 
possibilita o estabelecimento do vínculo, da transferência do paciente com o 
5 
 
 
analista. 
A sequência dessas primeiras sessões revela atitudes, ideias, 
verbalizações, brincadeiras, desenhos e conteúdos que se repetem. Todas as 
manifestações da criança, no setting terapêutico, sinalizam as condições de 
personalidade e demonstram os traumas, conflitos, ansiedades e medos que 
precisam ser elaborados. As manifestações espontâneas, pelo método da livre 
expressão, apresentam pontos de conflito, de angústia, na medida da 
suportabilidade da estrutura de personalidade naquele momento. O que se avalia? 
Avalia-se o encaminhamento estrutural da personalidade da criança, as condições 
de funcionamento dessa estrutura, as condições do eu em suas funções 
emocionais, adaptativas, cognitivas, sociais e psicomotoras. Na avaliação 
observa-se: 
• o modo de interagir; 
• o tipo do vínculo estabelecido; 
• a linguagem; 
• a motricidade;• a dinâmica intrafamiliar; 
• os afetos manifestados; 
• a capacidade de adaptação; 
• o curso de ideias; 
o conflito central.A avaliação é o período no qual se faz necessário 
compreender dados globais do paciente, os quais incluem elementos do 
funcionamento e organização da família em termos de hábitos, rotinas, 
valores, assim como elementos do funcionamento psíquico da criança, 
no que diz respeito à fase de desenvolvimento em que se encontra, 
mecanismos de defesas predominantes, recursos egoicos, fantasias e 
integração ou não das instâncias psíquicas. Essa etapa não pode ser 
apenas considerada uma coleta de dados da história e do contexto da 
criança, o que empobreceria o vínculo, mas se constitui em um 
verdadeiro encontro com ela, sua família e seus sofrimentos. (Kern; 
Campezatto; Saraiva, 2009) 
Ainda que as crianças estejam em um momento de estrutura não decidido 
em função do desfecho edípico (as maneiras de lidar com a castração), que será 
reeditado e confirmado na adolescência, pode-se analisar sua posição quanto ao 
estabelecimento dos laços e reações às perdas, pois denotam um 
encaminhamento neurótico, psicótico ou perverso. A infância é o tempo das 
inscrições e da confirmação dessas inscrições, por isso, afirma-se que a estrutura 
na infância é não decidida (Berardino, 2017). “Na constituição do sujeito psíquico 
são determinantes os processos fantasmáticos, sem que, por isso, deixem de ter 
6 
 
 
importância os aspectos instrumentais do sujeito (incluídos nas funções do eu) 
que, no entanto, encontram-se determinados desde esta posição” (Jerusalinky, 
1983). 
Para além da verificação do desenvolvimento, da socialização, da 
aprendizagem, da psicomotricidade, da constituição de hábitos, da comunicação, 
é importante verificar o processo de constituição da criança como sujeito psíquico, 
se sua entrada no campo erógeno e da linguagem está em curso, ou seja, se a 
criança está se estruturando psiquicamente, para que se organize e se encaminhe 
o desenvolvimento global. Ressalta-se que o que se desenvolve são as funções 
e não o sujeito. Isto é, as funções instrumentais (as diferentes áreas do 
desenvolvimento), necessárias para a adaptação ao meio, evoluem de acordo com 
a maturação e o crescimento, dando origem aos diferentes esquemas de ação. Mas 
o que dá sentido a essas funções, o que move o processo de desenvolvimento é o 
sujeito que começa a surgir, sustentado pelo campo da linguagem ao qual está 
submetido e referenciado. Jerusalinsky (1988) coloca que “o maturativo se 
mantém simplesmente como limite, mas não como causa”. 
A existência do adulto enquanto resultado de separação definitiva de uma 
posição ocupada na infância não existe. A queixa que mobiliza a procura por 
análise traz encoberta fantasias infantis, sendo estas produtoras de angústia e 
sofrimento. A psicanálise nos mostra que o mais importante não é a idade do 
paciente, mas a escuta do sujeito inconsciente por meio da associação livre. 
Contudo, há a especificidade do emprego da regra fundamental da psicanálise 
com crianças. Estas exigem uma delicadeza específica no manejo, pois não 
dispõem da mesma capacidade racional do relato verbal que os adultos, sendo 
por meio da ludicidade e do brincar que se comunicam dentro do setting analítico 
(Vasconcelos et al., 2017). 
TEMA 3 – A DEVOLUTIVA COM A CRIANÇA 
Concluído o diagnóstico, realiza-se uma devolutiva acerca do parecer, uma 
com o paciente e outra com a família. Antes mesmo da entrevista devolutiva com 
os pais, deve-se fornecer o parecer ao próprio paciente. A devolutiva com a 
criança trata-se da comunicação verbal sobre o parecer elaborado, após o término 
do período avaliativo contratado com ela e com sua família. Segundo Cunha 
(1986), “para o paciente representa uma resposta às próprias dificuldades, um 
momento de entendimento dos problemas e uma perspectiva de solução dos 
7 
 
 
mesmos, por meio das indicações terapêuticas”. Tais apontamentos terão para o 
paciente efeito de interpretação, podendo proporcionar para ele revisão, reflexão 
e transformação, ou seja, pode possibilitar retificação subjetiva. Esta, por sua vez, 
é o movimento de reconhecimento e implicação no próprio sintoma, necessário ao 
tratamento psicanalítico. As crianças, em entrevista preliminares, vão retomando, 
relembrando, repetindo, e, nesse processo, situando-se em relação às amarras 
particulares e familiares que a aprisionam em determinado sintoma. Ainda que 
essa sequência ocorra no gerúndio, o instante da devolutiva promove um instante 
de corte, de parada e reflexão para a criança. 
A formulação psicodinâmica deverá englobar uma descrição das principais 
defesas, a apresentação dos conflitos centrais do paciente e, como resultado, uma 
apreciação do modelo de funcionamento mental predominante e a forma de 
estabelecimento das relações de objeto. Deverá, também, enfocar aspectos 
preditivos das respostas do paciente em relação à situação terapêutica 
(prognóstico), bem como seus recursos de ego e sua motivação para o 
tratamento (Kern; Campezatto; Saraiva, 2009). A comunicação deve ser clara, 
simples, adequada à idade, facilitando a comunicação analista/paciente, 
proporcionando uma posição ativa e participativa da criança, para que esta possa 
trazer as próprias percepções e entendimentos, se assim desejar. 
TEMA 4 – OBSERVAÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA DA CRIANÇA 
Assim como na análise de adultos, o que sustenta a análise da criança é a 
transferência. A transferência é a relação que se estabelece, de maneira 
espontânea e atual, entre o analisando e o analista. Ela presentifica, no setting 
terapêutico, os significantes que fazem parte da constituição psíquica, é 
testemunha da atemporalidade do inconsciente e sua caracterização enquanto 
infantil, ainda que o paciente seja adulto. É a partir da transferência que o analista 
escuta o inconsciente do analisando, sem se deixar cair no equívoco dos 
elementos imaginários que permeiam as relações interpessoais comuns 
(Vasconcelos et al., 2017). 
Na clínica com crianças, trabalha-se com a transferência em duplo aspecto: 
a transferência dos pais, que estão envolvidos desde o princípio, já que são eles 
que demandam o trabalho e a transferência da criança. O psicanalista possibilita 
o despertar, na criança, do desejo de participar do setting analítico, permitindo que 
se dê a transferência da criança à medida que o vínculo de confiança cresce. A 
8 
 
 
condição da infância, de dependência com relação ao adulto, para suprir a 
ineficiência de atos que ainda não pode/consegue realizar, faz com que a criança 
se sustente em um outro real (Jerusalinsky, 2005). O psicanalista, em sua relação 
com o paciente, coloca-se como agente real, pela própria necessidade de que a 
criança tem de personificar o Outro como Outro encarnado (Jerusalinky, 1999). 
A transferência é, também, transferência de saber. Este aspecto refere-se ao fato 
do analisando atribuir ao analista um saber que este tem acerca dele. Trata-se de 
condição fundamental para que se inicie uma análise. As crianças costumam 
supor um saber por parte dos adultos, especialmente dos que delas cuidam. 
Portanto, para que se constitua a transferência entre a criança e o analista, é 
necessário que primeiro se constitua a transferência de quem lhe trouxe para a 
análise (Leitão, 2020). A criança detém a própria capacidade de supor um saber 
no analista, podendo endossar ou recusar a transferência realizada pelos pais, 
o que revela que a transferência não é apenas uma continuidade da 
transferência dos pais, ainda que possa ser influenciada por ela (Leitão, 2020). 
No vínculo entre paciente e psicanalista não existe a reciprocidade que 
encontramos em outras formas de relacionamento. Ela é assimétrica, com papéis 
e funções diferenciadas para o paciente e para o analista (Stürmer; Kern, 2009). 
Este estará disponível para ouvir e interagir com a criança,resguardando a própria 
vida e opiniões pessoais, mantendo a privacidade do profissional. Essa abstinência 
pessoal do psicanalista dá espaço para a subjetividade da criança. 
No entanto, sabe-se que, sempre evidenciaremos aspectos de nossa 
personalidade que estarão sendo mostrados nas maneiras de trabalhar 
com o paciente, ou seja, é impossível manter a ficção, uma 
“neutralidade” total. Crianças e adolescentes tendem a captar os 
aspectos da personalidade do analista e, a partir disso, também poderão 
agir. Importante é estarmos atentos ao jogo de identificações projetivas 
e introjetivas que moldam os fenômenos 
transferenciais/contratransferenciais. (Stürmer; Kern, 2009). 
O laço transferencial pode apresentar nuances de variação de acordo com 
o momento do tratamento, a partir de aspectos conscientes e inconscientes. O 
vínculo de confiança se intensifica, se fortalece com o tempo. No entanto, ela pode 
não estar presente no início do tratamento, transformando-se ao longo das 
sessões, em um vínculo positivo para o trabalho (Stürmer; Kern, 2009). No 
processo analítico, o brincar está sempre presente na relação entre paciente e 
analista. A fantasia, frequente recurso do universo infantil, é transposta na 
transferência, revelando conflitos, laços e lugares ocupados. 
9 
 
 
TEMA 5 – O PROCESSO DE TRATAMENTO 
Dolto (1991) dizia que nenhuma sessão é igual a outra, que nenhum 
tratamento é igual ao outro. De fato, variam as idades, as personalidades, as 
famílias, as problemáticas, diferenças que constelam um universo e um tratamento 
particular em cada caso. O que então se replica nesta ciência do particular? Neste 
sentido, “o processo é sempre o mesmo, qualquer que seja o analista. Este fala 
pouco, às vezes, não fala nada ou o que for preciso para relançar o discurso e 
permitir à criança continuar” (Dolto, 1991). Pode-se dizer que se repete os 
conhecimentos para avaliar/diagnosticar, para projetar a direção do tratamento, 
para sustentar a ética profissional, para conduzir a cura do paciente. 
Para tanto, o brincar é um meio facilitador do processo de tratamento, seja 
para o período diagnóstico, seja para o atendimento da criança, por ser a forma 
primordial de expressão desta. O brincar permite compreender a realidade psíquica 
e auxiliar na resolução de conflitos daquele que se submete ao processo 
terapêutico. Nessa perspectiva, o brincar é visto como forma de relação e possibilita 
a expressão das angústias. O brincar da criança, em seu processo de 
crescimento, acompanha as nuances de estruturação psíquica, desenvolvimento 
cognitivo/motor e crescimento pôndero-estatural. Em cada uma dessas fases o 
recurso lúdico está constantemente relacionado à etapa mental vigente e o 
desenvolvimento psicomotor. 
O psicanalista, ao longo dos atendimentos, utiliza objetos lúdicos; participa 
de brincadeiras, quando for convidado a participar; e desenha junto ou 
acompanha desenhos feitos pelo paciente. Toda essa interação está permeada 
pelas nuances transferenciais, a cena lúdica ou gráfica, possibilita a manifestação 
das representações que a criança habita. É o que Vorcaro (1999) aponta sobre o 
trabalho com a criança “se tratar de tomar o tecido significante articulado pelos 
sentidos, ressaltar as incidências e fisgar as insistências, para buscar a montagem 
que o estrutura”. O inconsciente se revela pelo lúdico articulado com o verbo, 
demonstrando o universo de significações, que são intrínsecas ao paciente. 
O brincar está para a criança assim como a poesia está para o poeta. 
Em outras palavras, a criança é capaz de criar metáforas com o intuito 
de ordenar seu mundo de um modo prazeroso, como o artista 
habitualmente faz. A arte, ainda que capte um fragmento de uma 
realidade tenebrosa, consegue abstrair a beleza e a emoção do 
momento. E ela o faz pela via da estética artística. Do mesmo modo, o 
brincar é a invenção da criança para transformar sua realidade, tratando 
prazerosamente do que foi perdido e do real que não se inscreve. 
10 
 
 
(Souza, 2021). 
A observação freudiana acerca do jogo do carretel é paradigmática sobre 
o brincar, pois demonstra o movimento da criança de se apropriar dos significantes 
que a marcaram. A dinâmica implicada neste exemplo elucida a possibilidade de 
que o ato lúdico traz à criança de operar no nível simbólico, nível em que o sujeito 
se faz representar por representações, ou seja, fazer uso dos significantes. Tal 
movimento promove à criança uma organização particular, organização de si 
próprio. Por meio do brincar, a criança pode tomar uma posição ativa. Pela obra 
lúdica ou gráfica produzida, reposiciona-se diante do discurso que foi capturada, 
alienada, restituindo-se em nova posição subjetiva. 
Um trabalho interpretativo de aspectos do inconsciente da criança será 
possível quando este for traduzível, ou seja, quando algo do aparelho 
psíquico já se constituiu a partir do trabalho do recalque. Se a criança 
manifesta verbalmente ou através do brinquedo sua capacidade 
simbólica, poderemos auxiliá-la na tradução deste material, sempre 
fazendo uso de palavras adequadas para cada faixa etária. (Falcão, 
2016). 
Porém, em determinadas situações, em que a criança não tem capacidade 
simbólica, é necessário o movimento ativo em direção a ela no auxílio de 
construções, de laço, de amarração das palavras, justamente por não haver 
material inconsciente a ser interpretado. Ou seja, trata-se de um trabalho, junto ao 
paciente, de construção de recalque. 
5.1 Período intermediário 
A fase intermediária do tratamento caracteriza-se por sessões que 
costumam apresentar encadeamento e continuidade. O vínculo entre paciente e 
psicanalista se intensifica, os sintomas da criança revelam sua origem psíquica e 
o responsável pelo atendimento interpreta o material trazido pela criança durante 
as sessões com o propósito de tornar consciente a maneira pela qual a criança 
vivencia as dificuldades. A tomada de consciência ajuda em sua posterior 
elaboração, a qual requer determinado período para que se torne fato (Coppolillo, 
1990). 
Essa etapa do processo analítico é o período que se estende desde o 
momento em que se consolida a aliança terapêutica até o momento em que se 
propõe o término do tratamento do paciente. É, em geral, a etapa mais longa do 
tratamento e visa examinar, analisar, explorar e resolver os sintomas e as 
11 
 
 
dificuldades emocionais do paciente. O objetivo dessa etapa é a essência do 
tratamento: recordar, repetir e elaborar (Freud, 1969). Ao longo desta fase, o 
paciente, de forma não linear, lembra-se de situações, memoriza acontecimentos 
e descreve vivências. Repete nas brincadeiras ou desenhos, várias e várias 
vezes, recontando cada vez de forma mais amplificada e complexificada, 
aspectos que o marcaram e marcam, em um movimento de ir e vir em torno de 
pontos que se assemelham e convergem para a apropriação de uma temática 
central. 
Neste momento, existe uma continuidade nos temas trazidos pelo paciente 
entre as sessões. A criança resgata assuntos ou brincadeiras ocorridas em 
momentos anteriores ao tratamento. Os indícios do momento propício para 
interpretações/intervenções são quando o paciente brinca com o mesmo 
brinquedo, repete o mesmo material, mesmo que sob diferentes formas, ou 
mesmo pela repetição de olhares, posturas, que apresenta na interação com o 
terapeuta. 
5.2 Período final 
Na fase final ocorre o término do tratamento, na forma de término 
terapêutico, considerado como alta, cuja indicação pode vir do psicanalista, por 
intermédio da avaliação constante que se mantém ao longo do tratamento. O 
estado psíquico da criança, observado pelo analista, somado às observações da 
família ou do ambiente que a cerca, oferecem informações sobre as mudanças 
produzidas na criança. Tais mudanças estão relacionadas às diretrizes do 
tratamento proposto. À luz da direção de cura pretendida,verifica-se o alcance da 
resolução de conflitos e ressignificações identificatórias, podendo estar 
associadas a mudanças estruturais da personalidade. Alcançada a resolução de 
conflitos diante de um reposicionamento subjetivo, sinalizando o desaparecimento 
do sintoma, vislumbra-se a possibilidade da alta. 
Alguns critérios indicam a possibilidade do término do tratamento: 
• mudanças no vínculo transferencial entre paciente/analista; 
• aumento do interesse no campo de exploração do mundo; 
• diminuição de sintomas de ansiedade; 
• diminuição de temores e pavores da criança; 
• aumento da autoconfiança e espontaneidade; 
• melhoria na capacidade de socialização; 
12 
 
 
• autopercepção quanto às dificuldades e melhora na desenvoltura de 
atividades condizentes à idade (Coppolillo, 1990). 
Cada psicanalista tem critérios de alta embasados em suas experiências 
e características singulares com cada paciente, porém ao se aproximar 
do término do processo terapêutico a criança pode começar a 
demonstrar algumas características como: desaparecimento de 
sintomas, plasticidade aos modos de responder ou adaptar-se ao meio, 
adequação de comportamentos a sua idade, produzir associações, 
observações e conclusões sozinha, maior utilização da expressão 
verbal como meio de comunicação, diminuição de atitudes agressivas, 
diminuição de angústias e culpabilidade, utilização de defesas mais 
flexíveis, a relação consigo mesma e com seu meio. Nessa etapa 
demonstra um sentimento ambivalente referente ao término do 
tratamento, estando triste pelo rompimento do vínculo, porém, feliz pelas 
conquistas alcançadas durante o período de análise (Silva, 2017). 
 
É necessário ter clareza que nenhum processo psicanalítico torna o 
paciente imunizado para o enfrentamento de impasses subjetivos. Se isso é um 
fato mesmo para os adultos, quem dirá para a criança, que se encontra ainda em 
um período de indefinições estruturais; estão à mercê da influência que se 
acomete pelo meio e o futuro enfrentamento da crise adolescente. 
NA PRÁTICA 
Exemplifico com uma cena, um trecho de situação clínica que, por meio do 
brincar, observa-se uma repetição no ato lúdico acerca dos cuidados maternos 
vivenciado pela criança e um aspecto na perspectiva transferencial. Trata-se de 
uma menina de 9 anos, durante uma sessão, em meio a uma dramatização 
escolhida pela própria paciente. A brincadeira era que ela (a paciente e a psicóloga 
brincariam cada uma com uma boneca/bebê no colo, ambas seriam mãe e teriam 
uma filha), realizando cuidados de higiene, alimentação e sono. A paciente ninava 
a boneca/filha no colo com movimentos duros, batia no bumbum com força ao 
mesmo tempo que observava a psicóloga ninar a boneca no colo e comentava: 
“Essa mãezinha aí tá muito boazinha!”, comentando a atitude da profissional com 
a boneca/bebê. Neste trecho conseguimos perceber a percepção de cuidado 
materno que ela tinha tanto pelas ações que fazia com a boneca que representava 
a própria filha na brincadeira (projeção da vivência), como no comentário (que 
revela um aspecto transferencial) que faz à terapeuta esperando uma mãe que não 
fosse tão boazinha, tinha que ser mais agressiva. 
 
13 
 
 
FINALIZANDO 
Recapitulando! Conhecemos o formato da primeira entrevista com a 
criança, o manejo clinico, o estabelecimento do setting e do contrato de trabalho. 
Abordamos a importância das sessões de avaliação com o paciente, quais 
aspectos podem ser avaliados, diferenciando as funções de personalidade e 
estruturação subjetiva. Compreendemos a forma de dar a devolutiva da avaliação 
para a criança. Refletimos sobre a importância da transferência no processo de 
tratamento. Conhecemos o processo, o encaminhamento e o final da análise até 
a alta. 
 
14 
 
 
REFERÊNCIAS 
BERARDINO, L. As entrevistas preliminares na psicanálise com crianças. 
Revista, Associação Psicanalítica de Curitiba, n. 23, 2011. 
BERARDINO, L. Psicanálise: educação especial e formação de professores: 
construções em rasuras. Carla K. Vasques; Simone Zanon Moschen (Org.). 
SEAD/UFRGS. (Coord.). 2. ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2017. 
CAMPOS, R. C. Do processo de avaliação da personalidade em contextos 
clínicos ao diagnóstico psicodinâmico: contributos para uma avaliação 
psicológica psicodinâmica CIEP - Publicações - Artigos em Revistas 
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