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CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FORÇA PARA CRIANÇA E ADOLESCENTE W B A 04 14 _v 1. 0 2 Marina Lívia Venturini Ferreira Vinícius Barreto da Silva Londrina Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2020 CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FORÇA PARA CRIANÇA E ADOLESCENTE 1ª edição 3 2020 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Giani Vendramel de Oliveira Henrique Salustiano Silva Juliana Caramigo Gennarini Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Camila Braga de Oliveira Higa Revisor Túlio Bernardo Macedo Alfano Moura Editorial Alessandra Cristina Fahl Beatriz Meloni Montefusco Gilvânia Honório dos Santos Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) _________________________________________________________________________________________ Ferreira, Marina Lívia Venturini. F383c Condicionamento e treinamento de força para criança e adolescente/ Marina Lívia Venturini Ferreira, Vinícius Barreto da Silva – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2020. 43 p. ISBN 978-65-5903-042-2 1. Avaliar 2. Planejar 3. Acompanhar. I. Silva, Vinícius B arreto da. II. Título. CDD 796.08 ____________________________________________________________________________________________ Raquel Torres – CRB 6/2786 © 2020 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. 4 SUMÁRIO Conceitos fundamentais na infância e adolescência _________________ 05 Conceitos fundamentais e princípios científicos sobre prescrição de exercício físico para criança e adolescente __________________________ 21 Desmistificando a musculação para crianças e adolescentes ________ 38 Periodização e modelos de treinamento para crianças e adolescentes ______________________________________________________ 54 CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FOR- ÇA PARA CRIANÇA E ADOLESCENTE 5 Conceitos fundamentais na infância e adolescência Autoria: Vinícius Barreto da Silva Leitura crítica: Túlio Bernardo Macedo Alfano Moura Objetivos • Descrever os conceitos básicos do crescimento Infantil. • Explicar as etapas do desenvolvimento e da maturação infantil. • Explanar sobre conceitos relacionados à aprendizagem e ao desenvolvimento motor. 6 1. Conceitos fundamentais na infância e na adolescência O intervalo entre o nascimento e a idade adulta é comumente dividido em idade e períodos. A infância é geralmente subdividida em duas fases, inicial e intermediária, em que o primeiro se aproxima dos anos pré- escolares, cerca de 1 a 5 anos de idade, enquanto o último se aproxima do ensino fundamental, dos 5-6 aos 10-11 anos. O limite superior da fase intermediária da infância é arbitrário, porque é seguido pela adolescência, cujo início é variável. Por exemplo, algumas meninas da quarta série, que têm cerca de 9 e 10 anos de idade, já entraram nos primeiros estágios da adolescência, o que torna a delimitação de idade de transição entre os estágios muito subjetiva. Além disso, o término da adolescência também é bastante variável, de modo que se torna muito difícil especificar quando começa a idade adulta. Em questões biológicas, algumas meninas são sexualmente maduras por volta dos 12 anos de idade e alguns meninos são por volta dos 14 anos, ou seja, eles são biologicamente adultos. No entanto, eles são adolescentes aos olhos da sociedade, uma vez que a idade adulta é um conceito definido socialmente, geralmente no contexto de conclusão do ensino médio e, em alguns casos, de conclusão da faculdade. O grande fato é que crianças e adolescentes experimentam três processos importantes de interação: crescem, amadurecem e se desenvolvem. Esses termos são frequentemente tratados como tendo o mesmo significado; porém, são três tarefas distintas durante aproximadamente as duas primeiras décadas de vida. Dessa forma, ao longo deste material, abordaremos os conceitos fundamentais que abrangem o universo da infância e da adolescência, no intuito de esclarecermos pontos importantes para a atuação profissional. 7 1.1 Conceitos básicos sobre o crescimento humano De forma geral, o crescimento refere-se ao aumento do tamanho do corpo como um todo e de suas partes. Assim, à medida que as crianças crescem, ficam mais altas e pesadas, aumentam em tecidos magros e gordurosos, seus órgãos aumentam de tamanho e assim por diante. Volume do coração e massa, por exemplo, seguem o padrão de crescimento do peso corporal, enquanto os pulmões e as funções pulmonares crescem proporcionalmente à altura. Já diferentes partes do corpo crescem em ritmos e tempos diferentes, o que resulta em mudanças em proporções do corpo, ou seja, a relação de uma parte do corpo para outra. As pernas, por exemplo, crescem mais rápido que o tronco durante a infância; portanto, a criança torna-se relativamente mais comprida para a sua altura (MALINA, 2010). O crescimento infantil é considerado o melhor indicador global de bem-estar físico em crianças, uma vez que as práticas alimentares inadequadas, tanto em quantidade quanto em qualidade, e o nível de atividade física, ou mais frequentemente uma combinação dos dois, são os principais fatores que afetam o crescimento físico e o desenvolvimento mental em crianças. O crescimento é consequência de uma série de fatores relacionados ao padrão geral de vida e aspectos biológicos. A avaliação do crescimento infantil, portanto, não serve apenas como um meio para avaliar a saúde e o estado nutricional, mas também fornece uma excelente medição das desigualdades em saúde enfrentadas pelas populações (ROMANI; LIRA, 2004). Os marcos de crescimento são os mais previsíveis, embora devam ser vistos dentro de cada contexto específico de influências genéticas e étnicas da criança. Dessa forma, é essencial traçar o crescimento da criança em gráficos apropriados para gênero e idade. Eles atualmente são disponibilizados para alguns grupos étnicos específicos, bem como 8 para algumas síndromes genéticas (por exemplo, síndromes de Down e Turner). O ganho de peso fetal é maior durante o terceiro trimestre de gestação e após o nascimento; já durante os primeiros poucos meses de vida, esse crescimento é rápido e contínuo. Todavia, ao longo do tempo, essa taxa tende a desacelerar, como mostra a Tabela 1. O peso ao nascer é recuperado por volta das 2 semanas de idade e dobra em 5 meses, enquanto a altura não dobra até entre 3 e 4 anos de idade. O crescimento da cabeça durante os primeiros 5 ou 6 meses é devido à continuação da divisão celular neuronal; porém, mais tarde, ele acontece por meio do crescimento de células neuronais e da proliferação de tecidos de suporte (JOHNSON; BLASCO, 1997). Tabela 1 – Parâmetros de crescimento físico médio IDADE CIRCUNFERÊNCIA OCCIPITOFRONTAL ALTURA PESO Nascimen- to 35 cm 50,8 cm 3 a 3,5 kg + 2 cm (0 a 3 meses) + 25,4 cm Reganho do peso de nascimento em 2 semanas + 1 cm (3 a 6 meses) Dobro do peso de nascimento em 5 meses + 5 cm (6 a 12 meses) 1 anoe adolescentes é a dor lombar, com taxas de prevalência que se aproximam das encontradas em adultos, salientando-se a importância da aptidão física geral e da saúde da região lombar (FAIGENBAUM et al., 2009). 2. Lesão da placa de crescimento: uma preocupação comum associada ao treinamento de força em crianças e adolescentes é o potencial de lesão das estruturas responsáveis pelo crescimento longitudinal do osso, que incluem a fise (placa de crescimento) e as epífises. Tais estruturas apresentam uma composição de três a cinco vezes mais fraca quando comparadas ao tecido conjuntivo circundante, sendo mais vulneráveis a estímulos de tensão e cisalhamento. Lesões nessa parte do osso podem resultar em afastamento da prática esportiva, desconforto significativo e problemas de crescimento. No entanto, ainda que relatos de casos retrospectivos tenham notado traumas nas estruturas de crescimento de jovens praticantes de treinamento de força, 50 grande parte dessas lesões foram decorrentes de escolhas inadequadas de exercícios, técnicas incorretas de execução e ausência de supervisão por profissionais qualificados. Em estudos prospectivos não há relatos de traumas na fise nem na epífise, da mesma forma que não há nenhuma evidência de que o treinamento de força possa ser prejudicial para o crescimento e a maturação de crianças e adolescentes (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 3. Hipertensão arterial: crianças e adolescentes com alguma patologia pré-estabelecida devem ser tratados com cautela, pois a prática de treinamento de força pode resultar em aumentos adicionais da pressão arterial durante a sessão, de modo que uma autorização médica prévia para a realização do treinamento garante mais segurança a todos (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 4. Tratamentos quimioterápicos: crianças e adolescentes submetidos a tratamentos com antraciclinas também apresentam um risco aumentado de intercorrências cardiovasculares durante o treinamento de força devido aos efeitos tóxicos desses medicamentos, devendo ser acompanhados por profissionais médicos e do exercício (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 5. Distúrbios convulsivos: crianças e adolescentes que apresentem quadros de distúrbios convulsivos devem ser suspensos de programas de treinamento de força até que sejam autorizados por seus médicos (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 6. Hipertensão pulmonar de moderada a grave: crianças e adolescentes que apresentem tal patologia devem se ausentar de programas de treinamento de força, pois apresentam risco de descompensação aguda devido a alterações hemodinâmicas repentinas (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 7. Cardiomiopatias: o treinamento de força não é recomendado para crianças e adolescentes que apresentem cardiomiopatias (particularmente cardiomiopatia hipertrófica), uma vez que podem desenvolver um agravamento da hipertrofia ventricular e 51 da cardiomiopatia restritiva ou descompensação hemodinâmica secundária decorrente de um aumento agudo da pressão arterial pulmonar. Indivíduos com quadros de hipertensão pulmonar de moderada a grave também devem se ausentar de programas de treinamento de força, pois apresentam risco de descompensação aguda devido a alterações hemodinâmicas repentinas. Aqueles que apresentem a síndrome de Marfan, caracterizada por uma raiz aórtica dilatada, também não devem participar de programas de treinamento de força (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). Figura 1 – Adolescente com sobrepeso praticando treinamento de força Fonte: iStock – coffeekai/iStock.com. 3. Conclusão O amplo embasamento teórico adquirido nos últimos anos evidencia a aplicabilidade, a eficácia e a segurança do treinamento de força 52 para crianças e adolescentes, fazendo com que este seja aceito e recomendado por importantes organizações médicas e da ciência do exercício. Seus benefícios são inúmeros, e os riscos podem ser minimizados com uma prescrição e supervisão de treinamento adequadas, seleção cuidadosa dos equipamentos e progressão de carga sensata, sempre realizada por profissionais da área. Assim como nas demais modalidade esportivas, a origem do problema se encontra na maneira como o treinamento de força é prescrito ou realizado, e não propriamente nas suas características enquanto exercício físico. Estudos recentes apontam novos desafios. Questões relacionadas à motivação, à manutenção, à diversificação e à aderência aos programas de treinamento de força devem ser o foco das próximas investigações. Isso porque, mais do que aumentar o número de crianças e adolescentes praticantes de treinamento de força em academias, escolas e centros esportivos, é preciso mantê-los ativos, de modo que os hábitos adquiridos na infância e na adolescência se transponham para a vida adulta. Referências Bibliográficas DENCKER, M. et al. Daily physical activity related to body fat in children aged 8–11 years. J Pediatr., [s.l.], v. 149, p. 38-42, 2006. FAIGENBAUM, A. D. et al. Youth resistance training: updated position statement paper from the National Strength and Conditioning Association. The Journal of Strength & Conditioning Research, [s.l.], v. 23, n. 5, p. 60-79, 2009. FAIGENBAUM, A. D.; MYER, G. D. Pediatric Resistance Training: Benefits, Concerns, and Program Design Considerations. Current Sports Medicine Reports, [s.l.], v. 9, n. 3, p. 161-168, maio/jun. 2010. FAIGENBAUM, A. D. et al. Resistance training for kids: right from the start. ACSM’s Health & Fitness Journal, [s.l.], v. 20, n. 5, set./out., 2016. HAGBERG, J. et al. Effect of weight training on blood pressure and hemodynamics in hypertensive adolescents. J Pediatrics, [s.l.], v. 104, p. 147-151, 1984. 53 KRAEMER, et al. Resistance training and youth. Pediatric Exercise Science, [s.l.], v. 1, p. 336-350, 1989. MCCAMBRIDGE, T. M.; STRICKER, P. R. Strength training by children and adolescents. American Academy of Pediatrics Council on Sports Medicine and Fitness, [s.l.], v. 121, n. 4, p. 835-840, abr. 2008. WHO. World Health Organization. Global Recommendations on Physical Activity for Health. Geneva: WHO Press, 2010. p. 58. 54 Periodização e modelos de treinamento para crianças e adolescentes Autoria: Marina Ferreira Leitura crítica: Túlio Bernardo Macedo Alfano Moura Objetivos • Fornecer uma atualização sobre o papel do treinamento de força para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. • Compreender a importância da periodização e dos diferentes modelos de treinamento dentro de um programa de treinamento de força voltado para crianças e adolescentes. • Avaliar, planejar, prescrever e acompanhar com eficácia um programa de treinamento voltado para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. 55 1. Introdução O treinamento de força é considerado parte integrante de programas abrangentes para o condicionamento físico e a promoção da saúde de crianças e adolescentes. Embora não haja uma idade mínima para o início da prática de treinamento de força, participantes devem estar fisicamente e mentalmente aptos a seguir as instruções de seus treinadores e superar desafios inerentes a um programa de treinamento. Para os profissionais de educação física, o entendimento dos modelos de periodização do treinamento e a apreciação da singularidade de crianças e adolescentes são essenciais para o desenvolvimento seguro, eficiente e agradável de um programa de treinamento. O planejamento, a prescrição e a supervisão adequados não garantem apenas segurança e prazer ao participante, mas aumentam a aderência e otimizam as adaptações. Assim, a proposta deste Tema será atualizar e esclarecer a respeito dos tipos de periodização para crianças e adolescentes, bem como os modelos para o desenvolvimento das principais capacidades físicas (cardiorrespiratória, força, flexibilidade, velocidade e agilidade), com base nas principais diretrizes médicas e na ciência do exercício. 2. Modelo de periodização do treinamento para crianças e adolescentes A periodizaçãodesportiva pode ser definida como sendo a divisão do tempo de treinamento em diferentes períodos, objetivando o alcance de um pico máximo de rendimento em uma fase específica (BOMPA, 2002). De acordo com Dantas (2003), a periodização é o planejamento 56 geral e detalhado do tempo disponível para treinamento, obedecendo a metas intermediárias previamente estabelecidas, de modo a respeitar os princípios científicos do treinamento desportivo. Dentro da periodização esportiva voltada para crianças e adolescentes, o objetivo principal é a promoção do desenvolvimento global, proporcionando diversos estímulos que levem ao desenvolvimento de habilidades motoras básicas, além de oportunizar bases universais para a prática de uma variedade de atividades desportivas. Para isso, é necessário um planejamento progressivo e a longo prazo, estabelecendo pequenas metas para um determinado período (BOMPA, 2002). 2.1 Periodização linear ou clássica Pensando no desenvolvimento global e na formação desportiva, o modelo de periodização tradicional ou clássica é o mais recomendado para crianças e adolescentes. Ele foi criado nos anos 1960 por Leev Pavlovich Matveev e fundamentou-se na teoria da Síndrome Geral de Adaptação, caracterizada pela variação das cargas de treinamento ao longo do tempo (OLIVEIRA; SEQUEIROS; DANTAS, 2005). De acordo com Matveev (1990), a periodização tem por objetivo proporcionar ao atleta sua melhor forma desportiva durante as competições, ou seja, prepará-lo para um estado em que ele esteja apto para a obtenção de resultados. Dessa forma, o autor elaborou um modelo de distribuição de cargas por períodos com duração máxima de 12 meses, sendo o primeiro período composto por 6 meses; o segundo com variação de 4 a 5 meses; e o terceiro composto de 1 a 2 meses. Tais períodos estão descritos a seguir: 1. Período preparatório Necessário para a criação e o desenvolvimento das bases para 57 que se atinja a forma desportiva, de modo a assegurar a sua consolidação. Subdivide-se em outras duas subfases: a preparação geral e a preparação específica. A preparação geral tem por objetivo criar uma base sólida para o alcance da forma desportiva. Assim, é necessária a evolução das capacidades funcionais do organismo, por meio do aumento gradual do volume e da intensidade do treinamento, com incremento preferencial no volume. A forma desportiva é dependente do nível inicial de preparação física, não tendo um indivíduo iniciante os mesmos resultados que um indivíduo previamente treinado. Como essa etapa objetiva o aumento das capacidades funcionais, deve-se utilizar uma ampla gama de exercícios, visando ao desenvolvimento da resistência geral e ao aperfeiçoamento da força. Nessa fase, as competições devem representar uma porcentagem baixa. A preparação específica tem por objetivo a maior ênfase na estrutura e no conteúdo do treino, de modo a criar condições para atingir a forma desportiva. Assim, há uma tendência para a redução do volume total e o acréscimo da intensidade. A preparação técnica é essencial nessa fase e paralelamente se desenvolve a preparação tática, criando condições para a especificidade do treinamento. 2. Período competitivo Após atingir a forma desportiva, é necessária a manutenção desses ganhos para que possam ser utilizados na conquista dos resultados desportivos. Nesse período, não devem ser realizadas reestruturações, já que estas poderiam limitar a forma 58 desportiva, impedindo o alcance de resultados. Caso o período de competição seja curto, pode-se manter o volume geral das cargas de treinamento contínuo, realizando apenas uma ligeira redução para em seguida estabilizar. As intensidades das cargas específicas devem aumentar até seu máximo para em seguida também estabilizar. Nesse momento, ocorrem as oscilações ondulatórias entre volume e intensidade. Caso o período de competição seja longo, é necessário um novo aumento do volume geral das cargas após a estabilização e uma leve redução da intensidade, ocorrendo uma redução do volume e um aumento da intensidade novamente. 3. Período de transição Após as competições, é necessário um período de descanso entre os macrociclos. Isso não significa que o atleta irá suspender completamente o processo de treinamento, mas que será necessária uma redução dos estímulos de modo a evitar o efeito acumulativo e o overtraining. É interessante que haja uma manutenção mínima das adaptações do treinamento, ainda que seja difícil a manutenção do mesmo nível de treinamento, de modo a iniciar um novo macrociclo com níveis de partida maiores que os anteriores. Esse período deve ser utilizado para a redução da carga de treinamento, porém com manutenção da atividade física, podendo ser um bom momento para a prática de diferentes esportes. 59 Figura 1 – Modelo proposto por Matveev para a distribuição de cargas dentro de um macrociclo Fonte: adaptada de Matveev (1990). 2.2 Periodização não linear ou ondulatória Ao contrário da periodização linear, a periodização não linear não segue um comportamento progressivo. Nela, a distribuição de cargas do treinamento acontece de forma ondulatória, alternando volume e intensidade, mas sem reduzir os níveis de 80% de carga máxima, ou seja, ela trabalha com uma intensidade elevada de maneira contínua. Além disso, utiliza predominantemente atividades específicas do período de competição, fazendo uso de intervalos profiláticos motivados pelo treinamento de alta qualidade, com pequena diferença entre volume e intensidade (GOMES, 2009). As mudanças na intensidade e no volume acontecem mais frequentemente, variando ao longo dos dias ou das semanas. Esse tipo de periodização tem por objetivo o desenvolvimento simultâneo de diversas capacidades, promovendo estímulos frequentemente e dificultando a homeostase do organismo (FLECK, 2011). Acredita-se que a periodização não linear seja causadora de maior estresse ao sistema neuromuscular em consequência da rápida e constante variação de estímulos (RHEA et al., 2002). Por esse motivo, é 60 mais recomendada para alunos intermediários/avançados, não sendo recomendada para crianças e adolescentes, que em sua maioria estão iniciando programas de treinamento. Aplicado a um programa de treinamento de força, o modelo de periodização não linear permite a mudança na intensidade e no volume em um microciclo, possibilitando o treinamento de diferentes componentes neuromusculares, como força, potência e resistência muscular localizada (RATAMESS et al., 2009). Dentro de um padrão de periodização não linear diária, pode-se utilizar, por exemplo, três diferentes zonas de treinamento, como 4-6, 8-10 e 12-15 zonas máximas de repetição, sendo cada uma delas realizada em um dia da semana, pensando-se em um total de três sessões de treinamento a cada semana (FLECK, 2011). 2.3 Modelo de treinamento não periodizado O modelo de treinamento não periodizado é caracterizado pela ausência de variação da intensidade e do volume. Ele pode se constituir de maneira uniforme, havendo pouca ou nenhuma mudança no volume ou na intensidade; de maneira linear, com manutenção ou aumento do volume, enquanto a intensidade aumenta; ou aleatório, não apresentando mudanças sistemáticas de volume nem de intensidade. Contudo, estudos já demonstram que o treinamento periodizado é superior ao não periodizado em atletas (FLECK, 2011; KRAEMER et al., 2003) e indivíduos treinados (FRY; MORTON; KEAST, 1992). 61 3. Modelos de treinamento para as principais capacidades físicas Crianças e adolescentes devem praticar no mínimo de 60 minutos de atividade física diária, com intensidade moderada a vigorosa, com o objetivo de manter a saúde (WHO, 2010). O objetivo principal dessas atividades deve ser o desenvolvimento de habilidades motoras básicas; porém, atividades para ganho de força, capacidade cardiorrespiratória, flexibilidade, velocidade e agilidade também devem ser incluídasna rotina. As atividades em questão podem variar desde práticas esportivas até uma série de outras atividades mais simples, como caminhadas, práticas de aulas de educação física, danças e brincadeiras. Elas devem ser adequadas às fases de desenvolvimento e, o mais importante, variadas, além de proporcionarem diversão aos participantes. 3.1 Desenvolvimento de capacidade aeróbia Como falado anteriormente, crianças e adolescentes devem praticar no mínimo 60 minutos de atividade física diária. Dentro dessa recomendação, são incluídos exercícios aeróbios de intensidade moderada a vigorosa, os quais devem ser realizados pelo menos três vezes por semana, com o objetivo de aumentar a capacidade cardiorrespiratória (WHO, 2010). Para crianças e adolescentes, atividades moderadas são entendidas como aquelas em que o participante observa um aumento da frequência cardíaca e respiratória, sendo classificada em 5 ou 6, dentro de uma escala de 0 a 10. Já a atividade vigorosa é entendida como aquela que eleva consideravelmente a frequência cardíaca e respiratória, sendo classificada entre 7 ou 8, dentro de uma escala de 0 a 10 (GANLEY et al., 2011). 62 Normalmente, o exercício aeróbio é prescrito por meio do uso de três parâmetros: intensidade, frequência e duração. Porém, quando se trata de crianças e adolescentes, devemos considerar que grande parte desses exercícios é realizada em curtos períodos, com alta intensidade, em vez de períodos prolongados de atividade. Nesse sentido, um estudo realizado com um acelerômetro demonstrou que episódios isolados de alta intensidade, menores ou iguais a 5 minutos, tiveram efeitos semelhantes sobre fatores de risco cardiometabólicos quando comparados a sessões prolongadas, com duração maior que 10 minutos (HOLMAN; CARSON; JANSSEN, 2011). Assim, atividades como corrida, amarelinha, escalada, jogos, brincar, dançar, pular corda e muitos outros exercícios simples e atividades realizadas em playground podem ser incluídos como forma de levar ao aumento da aptidão cardiorrespiratória. 3.2 Desenvolvimento de força Diretrizes internacionais incluem o treinamento de força como item fundamental dentro de um programa de condicionamento físico para crianças e adolescentes (FAIGENBAUM et al., 2009). Ele pode fazer parte dos 60 minutos de atividade física diária recomendado ou constituir-se como atividade adicional à recomendação. Seu principal objetivo dentro de um programa de treinamento para crianças e adolescentes é realizar um trabalho muscular específico, com um nível mais alto comparado às atividades diárias normais. É importante notar que o treinamento de força para essa faixa etária não se concentra apenas no aumento da massa muscular, mas em melhorar o recrutamento neural, a adaptação muscular, a consciência corporal, a coordenação, o equilíbrio e a resistência (SALE, 1989). A prescrição e a supervisão adequadas são fundamentais para a prevenção de lesões. Para a realização dos exercícios de força, podem 63 ser utilizados o peso corporal, pesos e elásticos, exercícios pliométricos, além de jogos e brincadeiras como subir em árvores, cabo de guerra, corrida e pular corda. Tabela 1 – Recomendações para a progressão do treinamento de força para crianças e adolescentes Iniciante Intermediário Avançado Ação Muscular Excêntrica e Concêntrica Excêntrica e Concêntrica Excêntrica e Concêntrica Tipo de Exercício Multiarticular e Uniarticular Multiarticular e Uniarticular Multiarticular e Uniarticular Intensidade 50-70% 1RM 60-80% 1RM 70-85% 1RM Volume 1-2 séries x 10-15 repetições 2-3 séries x 8-12 repetições ≥3 séries x 6-10 repetições Intervalo (min.) 1 1-2 2-3 Velocidade Moderada Moderada Moderada Frequência (dias/semana) 2-3 2-3 3-4 Fonte: adaptada de Faigenbaum et al. (2009). 3.3 Desenvolvimento de flexibilidade A flexibilidade pode ser entendida como sendo a propriedade intrínseca dos tecidos do corpo, que determina a amplitude de movimento alcançada, sem que haja lesões em uma ou mais articulações (HOLT; HOLT; PELHAM, 1996). Já o alongamento consiste em um fator extrínseco do exercício, capaz de influenciar a ocorrência ou não de lesões e o desempenho por meio de uma adequada amplitude de movimento e complacência muscular (MCHUGH; COSGRAVE, 2010). 64 Pelo fato de haver poucos estudos com crianças e adolescentes, não são encontradas recomendações de alongamentos específicos para essa faixa etária, estando estas limitadas à população adulta. Assim, as mesmas recomendações de adultos são usadas como forma de orientação para exercícios de alongamentos em jovens saudáveis. Com o objetivo de melhorar a flexibilidade e a amplitude de movimento a longo prazo, são recomendados exercícios de flexibilidade de 2 a 3 vezes por semana de forma intensa, mas sem que haja um desconforto de mais de 30 segundos por alongamento, havendo uma repetição com duração de 60 segundos por grupo muscular (GARBER et al., 2011). Já em relação aos tipos de alongamento, são encontrados resultados positivos para alongamentos facilitadores estáticos, dinâmicos, balísticos ou proprioceptivos (GARBER et al., 2011). O aquecimento dos músculos, de forma dinâmica ou estática, é recomendado uma vez que a conformidade e a flexibilidade são beneficiadas pelo aquecimento dos tecidos (NOONAN et al., 1993). Crianças e adolescentes envolvidos em atividades desportivas específicas devem realizar alongamentos mais específicos visando melhorar o desempenho. Assim, são recomendados alongamentos com duração de 4 a 6 minutos por grupo muscular em séries de 60-90 segundos cada (MCHUGH; NESSE, 2008). 3.4 Desenvolvimento de velocidade e agilidade A agilidade pode ser definida como a capacidade de realizar um movimento com o corpo inteiro com velocidade, envolvendo a mudança de direção e a resposta rápida a um estímulo (LLOYD et al., 2013). Sheppard e Young (2006) destacam ainda os processos de percepção e tomada de decisão como importantes subcomponentes da agilidade. Ela melhora o desempenho em atividades desportivas e pode prevenir o surgimento de lesões (JEFFREYS, 2006; JUNGE et al., 2011). Pode 65 ser parte de uma sessão de treinamento regular ou integrar sessões especializadas. Lloyd et al. (2013) apresentam uma visão geral do tempo a ser dedicado ao treinamento de diferentes componentes de agilidade dentro de uma sessão de treinamento ao longo do desenvolvimento de crianças e adolescentes. Assim, na pré-puberdade, 60% do treinamento de agilidade deve ser dedicado ao desenvolvimento de habilidades motoras fundamentais; 25% ao desenvolvimento de habilidades para mudanças rápidas de direção; e 15% para a agilidade reativa. Na puberdade, 30% do tempo deve ser dedicado ao desenvolvimento de habilidades motoras fundamentais; 40% ao desenvolvimento de habilidades para a mudança rápida de direção; e 30% para a agilidade reativa. Após a puberdade, 20% do tempo deve ser dedicado ao desenvolvimento de habilidades motoras fundamentais; 20% a habilidades de mudança rápida de direção; e 60% ao treinamento de agilidade reativa. Figura 2 – Criança realizando treinamento de agilidade em quadra Fonte: adaptada de LLYOD et al. (2013). 66 4. Conclusão O aumento do número de crianças e adolescentes praticantes de treinamento de força em academias, escolas e centros esportivos criou uma necessidade imediata de implementar programas de treinamento seguros, eficazes e agradáveis. Diretrizes de avaliação, planejamento, prescrição e acompanhamento de um programa de treinamento de força para essa faixa etária foram propostos pelas principais organizações médicas e da ciência do exercício. Profissionais de educação física que compreendem a singularidade dessa população e os modelos de treinamento estão mais preparados para planejar, prescrever e supervisionar programas de treinamento de força sustentáveis, que despertem o interesse contínuo no treinamento para a melhora da saúde e daaptidão física. Pesquisas futuras devem ter como objetivo estabelecer a combinação de modelos e variáveis de treinamento que possam otimizar as adaptações neuromusculares ao mesmo tempo que despertam a motivação e o interesse de crianças e adolescentes, de modo a promover maior aderência aos programas de treinamento. Referências Bibliográficas BOMPA, T. O. Treinamento total para jovens campeões. São Paulo: Manole, 2002. DANTAS, E. H. M. A prática da preparação física. 5. ed. Rio de Janeiro: Shape, 2003. FAIGENBAUM, A. D. et al. Resistance training for kids: right from the start. ACSM’s Health & Fitness Journal, [s.l.], v. 20, n. 5, set./out. 2016. FAIGENBAUM, A. D. et al. 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Introdução 2. Modelo de periodização do treinamento para crianças e adolescentes 3. Modelos de treinamento para as principais capacidades físicas 4. Conclusão Referências Bibliográficas47 cm 76,2 cm 10 kg + 2 cm + 12,7 cm Triplo do peso de nascimento 2 anos 49 cm 88,9 cm 12 a 12,5 kg Quádruplo do peso de nascimento Fonte: adaptada de Johnson e Blasco (1997). Ao longo do processo de crescimento, ocorrem algumas acelerações bruscas que podem ser denominadas de saltos de crescimento. Ao 9 longo da infância e da adolescência, o indivíduo passa por vários saltos de crescimento, todos com sua importância específica; todavia, podemos destacar um como sendo o mais relevante, que é o que acontece durante a puberdade. O salto da puberdade tende a atingir seu pico máximo aos 12 anos de idade nas meninas e aos 14 anos de idade nos meninos. Ele é extremamente importante, pois traz um aumento expressivo, tanto do peso como da altura, o que ocasionará diferenças significativas, não observadas anteriormente, entre os meninos e as meninas em relação ao peso e à estatura (UNESCO, 2013). Embora a maioria dos indivíduos abaixo ou acima do tamanho médio não apresente disfunções, há um aumento da prevalência de deficiências de desenvolvimento nessas duas subpopulações. Muitas síndromes genéticas estão associadas à baixa estatura, enquanto síndromes de grande estatura são menos comuns. Novamente, ao considerar o desvio da normalidade em uma criança específica, com base no padrão construído pelo National Center of Health Statistics (NCHS) (1977/1978), adotado como referência internacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS), as características genéticas advindas dos familiares devem ser consideradas. O conceito de altura parental média é útil em determinar se uma determinada criança apresenta tamanho condizente ao seu processo de crescimento e desenvolvimento (HOWARD, 1990). 10 Figura 1 – Fatores que podem influenciar no crescimento Fonte: elaborada pelo autor. 1.2 Desenvolvimento e Maturação Infantil A maturação refere-se ao progresso em direção à maturidade ou ao estado de maturidade biológica. É um conceito operacional, porque o estado maduro varia com o sistema corporal, uma vez que todos os tecidos, órgãos e sistemas do corpo amadurecem. É um processo que deve ser visto em dois contextos, timing e tempo. O timing refere-se aos eventos maturacionais específicos; por exemplo, a idade em que ocorre o início do desenvolvimento dos seios em meninas, a idade de aparecimento de pelos púbicos em meninos e meninas, ou a idade de crescimento máximo durante o pico de crescimento do adolescente. Já o tempo refere-se à taxa de progressão da maturação; por exemplo, a rapidez ou lentidão com que o jovem passa pelo pico de crescimento adolescente. Tanto o timing quanto o tempo variam consideravelmente entre os indivíduos (MALINA, 2010). 11 De acordo com Haywood e Getchell (2016), o desenvolvimento motor se refere ao processo de mudanças no movimento contínuo relacionado à idade, além das interações entre fatores do indivíduo, ambiente e tarefa. Quando as crianças experimentam a vida em casa, escola, igreja, esportes, recreação e outras atividades comunitárias, desenvolvem-se nas áreas cognitiva, social, emocional, moral e assim por diante. Elas estão aprendendo a comportar-se de maneira culturalmente apropriada (ROMANI, 2004). Os três processos, crescimento, maturação e desenvolvimento, ocorrem ao mesmo tempo e interagem entre si, influenciando o autoconceito da criança, a autoestima, a imagem corporal e a competência percebida. Dessa forma, os professores e treinadores devem estar cientes dessas interações, uma vez que uma incompatibilidade entre as demandas de um esporte e as etapas de crescimento e maturação normais pode ser uma fonte de estresse entre jovens atletas. Como um jovem está lidando com sua maturação sexual ou com seu surto de crescimento, por exemplo, pode influenciar seus comportamentos, incluindo aqueles relacionados ao esporte (MALINA, 2010). Entre as formas de se avaliar o status de maturidade e o progresso de crianças e adolescentes, podemos citar a avaliação das maturações esquelética e sexual. A maturação do esqueleto concentra-se nos ossos da mão e do punho, que geralmente refletem o restante do esqueleto; dessa forma, um raio-X da mão e do pulso é necessário para avaliar a maturação esquelética. Esse é um método valioso e útil durante a infância e adolescência para o acompanhamento do progresso e da maturidade; além de poder ser usado, em uma certa idade, para prever a altura adulta. Todavia, o método tem utilidade limitada fora de um ambiente clínico (MACHADO, 2007). 12 Figura 2 – Comparação da radiografia de mão e punho de um adulto e uma criança Fonte: https://media.gazetadopovo.com.br/2009/09/f33b4bf34730afc8a8709f762353407d- gpLarge.jpg . Acesso em: 7 set. 2020. A maturação sexual é baseada no desenvolvimento dos seios e pelos púbicos nas meninas e nos testículos e pelos púbicos nos meninos, avaliação normalmente feita por um médico no exame clínico. Todavia, como proposto por Matsudo e Matsudo (1991), a autoavaliação pode ser utilizada como um método mais simples e menos invasivo para o avaliado. Além disso, a idade em menarca, o primeiro período menstrual, é o indicador mais comumente usado de maturidade sexual em meninas (MACHADO, 2007). https://media.gazetadopovo.com.br/2009/09/f33b4bf34730afc8a8709f762353407d-gpLarge.jpg https://media.gazetadopovo.com.br/2009/09/f33b4bf34730afc8a8709f762353407d-gpLarge.jpg 13 Figura 3 – Diretrizes para mudanças esperadas de altura, peso e composição corporal Pré-adolescência ou pré-puberdade (dos 6 aos 10 anos de idade) Espera-se que as crianças cresçam, ou seja, aumentem de peso e altura. Embora haja muita variação entre os individuos, elas ganham, em média, cerca de 5-8 cm (2 a 3 polegadas) e cerca de 2-3 kg (5 a 7 libras) por ano entre os 6 e os 10 anos de idade. Na adolescência, com o início da puberdade, as taxas de crescimento aumentam, primeiro em altura e depois em peso. Adolescência e puberdade A adolescência é caracterizada pelo pico de crescimento e maturação sexual. A seguir encontram-se as tendências centrais que caracterizam o pico de crescimento: MENINAS: • Começa entre 9 e 10 anos. • Atinge o máximo por volta dos 12 anos. • Fica mais lento após os 12 anos. • A taxa desacelera após os 12 anos; porém, o crescimento continua até os 16 ou 18 anos. MENINOS: • Começa entre 11 e 12 anos. • Atinge o máximo por volta dos 14 anos. • Fica mais lento após os 14 anos. • A taxa desacelera após os 14 anos; porém, o crescimento continua até os 18 ou 20 anos. O crescimento em altura continuará até os 20 anos em alguns meninos e em algumas meninas. Há grande variação entre os individuos em relação ao TIMMING (quando ocorre o pico) e ao TEMPO (taxa de progressso por meio do pico). O peso corporal, a massa livre de gordura e a massa muscular também mostram picos nos adolescen- tes; ocorrem, em média, vários meses após a taxa máxima de crescimento em altura. Durante o intervalo de crescimento máximo em altura (cerca de 11-13 anos em meninas e 13-15 anos em meninos), as meninas ganham cerca de 7 kg de massa livre de gordura, enquanto os meninos ga- nham o dobro desse valor, 14 kg. No entanto, as meninas ganham um pouco mais de massa gorda do que os meninos durante o intervalo do estirão de crescimento, 3 kg versus 1,5 kg. Fonte: adaptada de Malina (2014). As duas características mais óbvias da maturação biológica durante a adolescência são a puberdade ou maturação sexual e o pico de 14 crescimento. O primeiro sinal fisicamente aparente de maturação sexual em meninas é geralmente o desenvolvimento inicial das mamas, seguido pelo aparecimento de pelos pubianos. Já nos meninos, em média, é o aumento dos testículos, seguido pelo aparecimento de pêlos pubianos. Cada uma dessas características sexuais secundárias passam por uma série de mudanças conforme o indivíduo passa da puberdade à maturidade, sendo geralmente avaliadas por um médico em um exame clínico, uma vez que sua avaliaçãorequer a invasão da privacidade do jovem em um momento da vida em que está aprendendo a lidar com as alterações fisiológicas que ocorrem durante a puberdade. Desta forma, seu monitoramento requer o máximo cuidado e sensibilidade para o jovem envolvido (UNESCO, 2013). O início do aparecimento dos sinais de maturação sexual em meninas ocorre, em média, por volta dos 10 anos de idade, mas pode ocorrer antes dos 9 anos em cerca de 10% das meninas e não antes dos 12 anos em outros 10%. O desenvolvimento das mamas maduras ocorre, em média, entre os 14 e 15 anos de idade. No entanto, a maturidade pode ocorrer por volta dos 12 anos em algumas meninas e não antes dos 16 ou 17 anos em outras. O progresso do desenvolvimento inicial ao amadurecimento da mama é altamente variável. Algumas meninas podem passar pelo processo em dois anos, enquanto outras podem levar cinco ou mais anos. A menarca, o primeiro período menstrual, é um evento de maturação bastante tardio da puberdade, ocorrendo normalmente após o crescimento máximo em altura, em uma idade média de 12,8 anos (MALINA, 2014). O aumento inicial dos órgãos genitais (testículos e pênis) marca o primeiro sinal fisicamente aparente de maturação sexual em meninos. Ocorre, em média, por volta dos 11 anos de idade, mas pode ocorrer aos 9 anos em cerca de 10% dos meninos e não antes de 13 anos em outros 10%. O desenvolvimento genital maduro ocorre, em média, por volta 15 dos 15 anos de idade. Contudo, a maturidade pode ocorrer aos 13 anos e após os 18 anos. O progresso do desenvolvimento genital inicial ao maduro é altamente variável; assim, alguns meninos podem passar pelo processo em dois anos, enquanto outros podem levar cerca de cinco ou mais anos (MALINA, 2014). É importante que professores e treinadores estejam cientes de tal variação entre os indivíduos, bem como da importância da maturação sexual para o crescimento e o desenvolvimento comportamental. A maturação sexual em meninos é acompanhada de ganhos marcantes na massa muscular e força e alargamento dos ombros em relação aos quadris. Já nas meninas, é acompanhada por ganhos menores de massa muscular e força, por um alargamento dos quadris em relação aos ombros e por ganhos na gordura. O resultado líquido são diferenças de sexo em força, constituição corporal e composição corporal no final da adolescência e na idade adulta jovem. A maturação sexual também influencia o desenvolvimento comportamental, como aumento da autoconsciência, preocupação com o ganho de peso em meninas, relacionamentos com o sexo oposto, e assim em diante (UNESCO, 2013). 1.3 Desenvolvimento motor Para realizar uma classificação significativa sobre a competência motora de uma criança, o pediatra deve organizar dados coletados, como exame físico e exame de neurodesenvolvimento, de acordo com o seguinte esquema proposto por Malina (2014): 1. Marcos de desenvolvimento motor. 2. Exame neurológico clássico. 3. Marcadores cerebrais de maturação neuromotora (primitivos reflexos e reações posturais). Marcos do desenvolvimento motor são extraídos da história bem como de observações durante o exame de neurodesenvolvimento. Para esse 16 tipo de análise, são necessárias tabelas de referências de sequências de marcos de desenvolvimentos motores brutos e finos. Os resultados da avaliação em qualquer um dos domínios são resumidos com uma indicação da idade de desenvolvimento da criança, ou seja, essa abordagem torna possível classificar a criança em termos do seu nível de funcionamento em comparação com a idade cronológica. O Quociente de Desenvolvimento (QD) é a idade de desenvolvimento dividida pela idade cronológica vezes 100 (veja o exemplo a seguir). Isso fornece uma expressão simples de desvio da normalidade. Um quociente acima de 85 em qualquer domínio é considerado dentro dos limites normais, enquanto um quociente abaixo de 70 é considerado anormal. Já um quociente entre 70 e 85 representa um resultado que justifica um acompanhamento rigoroso, como demonstrado na Tabela 3 (MALINA, 2014). Exemplo: Um menino de 12 meses é levado para supervisão de saúde. Ele não caminha sozinho, mas se levanta para ficar de pé (9 meses), passa por móveis (10 meses) e caminha bem quando sua mãe segura as duas mãos (10 meses). Essa criança tem uma idade motora grossa de 10 meses e uma idade cronológica de 12 meses. Essa discrepância de 2 meses deve ser uma preocupação? Para decidir, deve-se calcular o QD usando os marcos motores: QD = Quociente de Desenvolvimento; IM = Idade Motora; IC = Idade Cronológica 𝑄𝑄𝑄𝑄 = IM 𝐼𝐼𝐼𝐼 × 100 = 10 𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚 12 𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚𝑚 x 100 = 83 17 Tabela 2 – Diretrizes para a classificação do QD QD CLASSIFICAÇÃO > 85 Normal 70–85 Zona Suspeita (necessita de acompanhamento próximo) o desenvolvimento cognitivo via manipulação de objetos (UNESCO, 2013). Como foi possível observar, o processo de crescimento, maturação e desenvolvimento motor infantil passa por diferentes estágios, que influenciam diretamente na formação e na evolução das habilidades motoras dos indivíduos. Desse modo, a compreensão dos diferentes 20 estágios e das habilidades que devem ser desenvolvidas em cada um deles é de extrema importância para a atuação assertiva do profissional de Educação Física nos diferentes campos, uma vez que o universo que abrange o movimento humano em geral se encontra como um dos principais objetos desta área e, consequentemente, como um dos pilares de sua atuação profissional. Referências Bibliográficas CATTUZZO, M. T. et al. Motor competence and health related physical fitness in youth: a systematic review. J Sci Med Sport, [s.l.], v. 19, n. 2, p. 123-129, 2016. HAYWOOD, K. M.; GETCHELL, N. Desenvolvimento motor ao longo da vida. 6. ed. Artmed: Porto Alegre, 2016. HOWARD, B. J. Growing together: a guide to how babies and parents develop. Contemp. Pediatr., [s.l.], v. 7, p. 12-40, 1990. JOHNSON, C. P.; BLASCO, P. A. Infant Growth and Development. Pediatrics in Review, [s.l.], v. 18, n. 7, p. 224-242, 1997. MACHADO, F. A. 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A Academia Americana de Pediatria (AAP, 1989) concluiu que meninos pré-púberes (que se encontram na fase 1 ou 2 dos pelos pubianos) não melhoraram significativamente sua força ou aumentaram sua massa muscular em um programa de treinamento resistido, devido a uma circulação insuficiente de andrógenos no sangue. Todavia, a maioria das pesquisas recentes fornecem evidências convincentes de que as crianças e os adolescentes engajados em programas de treinamento resistido, planejados de maneira adequada, podem aumentar significativamente sua força e potência muscular, a níveis acima dos normais de crescimentos e maturação. Dessa forma, ao longo deste material, estudaremos os conceitos fundamentais e os princípios científicos sobre a prescrição de exercícios físicos para criança e adolescente, principalmente sobre o que tange o universo do treinamento resistido ou, como popularmente é conhecido, a musculação. 1.1 Conceitos básicos sobre atividade física, exercício físico e treinamento resistido Por muito tempo os conceitos de Atividade Física (AF) e Exercício Físico (EF) foram tratados como sinônimos; todavia, atualmente os conceitos 23 de ambos estão bem definidos com base na literatura. Desse modo, podemos definir a AF como qualquer atividade do nosso sistema locomotor que gere um gasto energético que sobressaia aos níveis de repouso. Já o EF é uma atividade conceituada com uma abrangência menor, ou seja, envolve movimentos realizados com planejamento, organização e repetição no intuito do desenvolvimento ou da manutenção de uma ou mais capacidades físicas (CASPERSEN; POWELL; CHRISTENSON, 1985). Assim, podemos entender que todo EF é também uma AF; porém, apenas algumas AF são classificadas como EF. Entre as modalidades de EF podemos citar o Treinamento Resistido (TR), também conhecido como treinamento de força ou musculação, como uma das atividades mais praticadas. Ele consiste em uma modalidade de EF que exige o movimento muscular realizado contra uma resistência, que pode ser gerada por meio da utilização de pesos, como anilhas e halteres, ou por meio de alguns equipamentos específicos (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016). Os objetivos do TR devem se concentrar nos objetivos específicos do participante do programa, que podem ser melhorar a força, a partir do aumento da potência ou do volume muscular melhorar a resistência muscular; ou ainda uma combinação de ambos. Além disso, alguns estudos observaram associações positivas entre a aptidão muscular, a saúde óssea e a autoestima (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016; MILLER; CHEATHAM; PATEL, 2010; BEHRINGER et al., 2010). Já quando falamos do âmbito esportivo, os programas de TR devem ser especificamente planejados, levando em consideração as várias demandas do esporte em questão. Por exemplo, um atleta que corre na pista e um atleta que joga beisebol podem ter o mesmo objetivo de melhoria da força muscular, mas devem ter programas adaptados às demandas do respectivo esporte. 24 Assim, o planejamento de tais programas, para condicionamento e treinamento específico do esporte, devem ser feitos por profissionais devidamente treinados, levando o atleta aos objetivos em questão. Isso permitirá que o exercício seja realizado no intuito de realizar a promoção ou auxiliar na aquisição de habilidades motoras, para melhorar o desempenho e os marcadores de bem-estar e reduzir o risco de lesões esportivas. Além disso, Granacher, Lesinski e Büsch (2016) analisaram os principais benefícios de implementar exercícios de aumento da aptidão muscular e sugeriu que o TR aumenta a tolerância às demandas de treinamento de longo prazo, enquanto induz a saúde a longo prazo, promovendo efeitos que seguem até a idade adulta. O TR é considerado seguro para crianças e adolescentes se for planejado de forma adequada, considerando o emocional e o estágio de desenvolvimento maturacional do participante. Isso ajudará a minimizar quaisquer lesões associadas às placas de crescimento, cartilagem e estrutura esquelética geral. O termo TR pode ser usado de forma intercambiável com o levantamento de peso, mas esse uso muitas vezes é inapropriado, uma vez que o levantamento de peso como modalidade competitiva não é recomendado para crianças ou adolescentes (MILLER; CHEATHAM; PATEL, 2010). 1.2 Princípios científicos do TR para crianças e adolescentes Acredita-se que o TR na juventude tira proveito da sinergia entre as adaptações fisiológicas exigidas pelo treinamento em conjunto com a proliferação natural de adaptações devido à maturação. Durante a pré- pubescência, a experiência da juventude é intensificada pela proliferação neural e maturação do sistema nervoso central (SNC). Desse modo, o aumento da cargae o estresse no corpo fornecem um estímulo 25 adicional para a proliferação, resultando em um aumento sinérgico na proliferação neural em comparação com jovens que não participam do TR (NEGRA et al., 2016). Estudos também demonstram que jovens e adolescentes iniciantes no TR desenvolvem maiores ganhos de força em comparação com adultos iniciantes. Essa disparidade também apoia a sugestão de que o aumento das adaptações neurais durante a maturação fisiológica é sinérgico com as demandas físicas desse treinamento (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016). No passado, pensava-se que o TR era prejudicial para jovens e foi contraindicado por muito tempo, especificamente por preocupação relacionada a possíveis danos que seriam causados pelas altas forças exercidas sobre o esqueleto do adolescente, que poderiam resultar em um aumento de lesões epifisárias, atrofiando o potencial de crescimento. Entretanto, vários estudos vêm contrapondo essa teoria, demonstrando que quando planejado de forma adequada, os jovens que incorporam esse treinamento em suas práticas podem apresentar uma diminuição nas taxas de fratura e lesões musculotendíneas associadas à prática esportiva específica. Isso ocorre devido ao aumento no índice de resistência óssea e no conteúdo mineral, ao fortalecimento dos tendões e à melhoria da força de músculos acessórios, promovidos pela atividade (LEGERLOTZ et al., 2016). O TR é benéfico para o esqueleto imaturo em vários aspectos. O aumento da carga no esqueleto causa mudanças no conteúdo mineral ósseo, que por sua vez está positivamente correlacionado ao aumento na força óssea. Além disso, esse aumento no conteúdo mineral ósseo também está relacionado ao aumento do tempo de prática de TR semanal, ou seja, o aumento do número de horas de treinamento com pesos na semana acarreta um aumento proporcional no conteúdo mineral ósseo, desde seja realizado com a qualidade adequada, respeitando o controle adequado das variáveis de controle 26 da intensidade do treinamento e a execução correta dos exercícios. Desse modo, podemos sugerir que um jovem submetido a 4 horas de TR por semana, por exemplo, terá ganhos significativamente maiores em conteúdo mineral ósseo em comparação a jovens submetidos a apenas 2 horas por semana, considerando que o treinamento possua os ajustes adequados, garantindo sua qualidade (NEGRA et al., 2016). No que diz respeito aos tendões, o TR pode ocasionar mudanças na composição e na espessura, o que permite uma maior quantidade de estresse que pode ser tolerado sem ferimentos. A composição do tendão muda em uma taxa mais rápida devido ao TR em comparação com os aumentos na área da seção transversa da estrutura. Os tendões dos adolescentes são capazes de aumentar a área seccional por longos períodos, conforme evidenciado por ginastas, ciclistas e atletas de esportes com bola, quem têm maiores áreas transversais dos tendões de Aquiles em comparação com não esportistas de idade semelhante. Todavia, o mecanismo exato de como o TR leva a mudanças na área da seção transversal e na composição do tendão a ainda não está claro (LEGERLOTZ et al., 2016). A musculatura em crianças é reforçada pelo TR de várias maneiras, como por meio do aumento a longo prazo da área de seção transversa fisiológica do músculo, do aumento do comprimento do fascículo e dos ângulos de penação, os quais estão associados ao aumento da força, independentemente do processo de maturação. Além disso, alguns trabalhos indicam uma correlação dos ganhos de força e a duração dos programas de treinamento, o que enfatiza que os mais longos são ligeiramente mais benéficos do que aqueles semelhantes de menor duração. Assim, assume-se que as crianças são capazes de ganhar força além dos ganhos promovidos pelas mudanças neurológicas que ocorrem predominantemente nas primeiras semanas de treinamento de força. Dessa forma, é possível que esses ganhos adicionais de força sejam 27 advindos das mudanças estruturais, como a controversa e debatida hipertrofia, mesmo em estágios maturacionais iniciais (BEHRINGER et al., 2010). 1.3 Diretrizes para a prescrição de TR para crianças e adolescentes Devido às diferenças interindividuais na tolerância ao estresse, o TR precisa ser cuidadosamente prescrito e desenvolvido, uma vez que sua prescrição excessiva pode resultar em overtraining, enquanto sua prescrição insuficiente resultará em adaptações subótimas. Por esse motivo, a magnitude do esforço individual junto com a estruturação sistemática do programa de treinamento resistido precisa ser monitorada cuidadosamente. Além disso, cuidados (como supervisão qualificada, ambiente seguro, triagem de saúde) devem ser tomados quando crianças e adolescentes desejam participar desse tipo de programa. É consenso que o modelo, a intensidade e o volume do TR necessários para promover um resultado específico dependerão do resultado que se deseja alcançar. Por exemplo, um programa de TR necessário para melhorar a composição corporal em adolescentes obesos pode ser diferente de um desenvolvido para reduzir a probabilidade de lesões relacionadas ao esporte em jovens atletas. Portanto, uma vez que uma criança é considerada saudável o suficiente para participar de um programa de TR, questões relacionadas aos objetivos, as quais podem afetar o desenho do programa de treinamento, devem ser identificadas e tratadas. Embora a maioria dos programas de TR para jovens visem melhorar coletivamente vários desses objetivos, um fator-chave é o planejamento apropriado, que inclui a instrução e a supervisão adequadas dos exercícios, a prescrição correta das variáveis do programa e a inclusão de métodos específicos 28 de progressão que manterão o estímulo de treinamento eficaz (BEHRINGER et al., 2010). Além disso, uma vez que os estudos presentes na literatura demonstram que o prazer medeia os efeitos dos programas de atividade física para jovens, a importância de criar uma experiência de exercício agradável não deve ser esquecida. Entre as variáveis do programa que devem ser controladas, podemos citar o aquecimento, a escolha, a ordem dos exercícios, a intensidade do treinamento, o volume de treinamento, os intervalos de descanso entre as séries e os exercícios, a velocidade de repetição (cadência), a frequência de treinamento e a variação do programa. O Quadro 1 resume as diretrizes do TR para crianças e adolescentes (BEDOYA; MILTENBERGER; LOPEZ, 2015). Quadro 1 – Diretrizes para a prescrição do TR para crianças e adolescentes - Forneça instrução e supervisão qualificadas. - Certifique-se de que o ambiente de exercícios seja se- guro e livre de perigos. - Comece cada sessão com um período de aquecimento dinâmico de 5 a 10 minutos. - Comece com 1 série de 10 a 15 repetições com uma carga moderada em uma variedade de exercícios. - Avance para 2 ou 3 séries de 6 a 15 repetições, depen- dendo das necessidades e dos objetivos. - Aumente a resistência gradualmente (5% a 10%), con- forme a força melhora. - Concentre-se na técnica correta do exercício, e não na quantidade de peso levantado. - Realize o TR de 2 a 3 vezes por semana em dias não consecutivos. 29 - Use registros de treino individualizados para monitorar o progresso. - Mantenha o programa atualizado e desafiador, varian- do-o sistematicamente. Fonte: adaptado de Faigenbaum (2007). 1.3.1 Aquecimento Embora protocolos de aquecimento que incluem exercícios aeróbicos de baixa intensidade e alongamento estático tenham se tornado uma prática padrão, nos últimos anos, crenças antigas sobre a prática rotineira de alongamento estático pré-treino foram questionadas. Recentemente, tem havido um interesse crescente em procedimentos de aquecimento que envolvam a execução de movimentos dinâmicos (por exemplo, saltos e exercícios baseados em movimentos para a parte superior e inferior do corpo)projetados para elevar a temperatura corporal central, aumentar a excitabilidade da unidade motora, melhorar a consciência cinestésica e maximizar as amplitudes ativas de movimento (FAIGENBAUM, 2007). O aquecimento dinâmico pode criar um ambiente ideal para o TR, melhorando a função neuromuscular. Recentemente, foi relatado que protocolos de treinamento que incluem exercícios preparatórios de intensidade moderada a alta, envolvendo movimentos dinâmicos, podem aumentar o desempenho de força em jovens e reduzir a probabilidade de lesões. Todavia, isso não quer dizer que o alongamento estático deva ser eliminado do programa de TR de um jovem, mas sim que o potencial impacto da realização de exercícios dinâmicos antes do TR sobre seu desempenho deve ser considerado. Uma sugestão razoável é realizar atividade dinâmica de 5 a 10 minutos durante o 30 aquecimento, e alongamento estático durante a volta à calma (BEDOYA; MILTENBERGER; LOPEZ, 2015). 1.3.2 Escolha e ordem dos exercícios Embora um número ilimitado de exercícios possa ser usado para melhorar a aptidão muscular, é importante selecionar exercícios que são apropriados para uma criança em relação ao tamanho do corpo, o nível de aptidão e experiência em relação à técnica de execução do exercício. Além disso, a escolha de exercícios deve promover o equilíbrio muscular entre as articulações e os grupos musculares antagônicos (por exemplo, quadríceps e isquiotibiais). Máquinas de peso (as específicas para crianças e as de tamanho adulto), pesos livres, elásticos e medicine balls têm sido usados por crianças e adolescentes em programas de exercícios clínicos e escolares. Na maioria dos casos, pode ser razoável iniciar o TR em máquinas de peso e progredir gradualmente aos exercícios de peso livre e medicine ball, que geralmente requerem mais coordenação e habilidade para serem executados corretamente. Independentemente do modo de exercício, as fases concêntricas e excêntricas de cada movimento devem ser realizadas de forma controlada e de maneira condizente com a técnica adequada do exercício (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016). Existem muitas maneiras de organizar a sequência de exercícios em uma sessão de TR. A maioria dos jovens deve realizar exercícios de corpo inteiro várias vezes por semana, que envolvem vários exercícios que estimulam todos os principais grupos musculares em cada sessão. Nesse tipo de treino, exercícios de grandes grupos musculares devem ser realizados antes de exercícios de grupos musculares menores; e exercícios multiarticulares (que envolvem mais de uma articulação, como o agachamento e o leg press) devem ser realizados antes de exercícios monoarticulares (que envolvem apenas uma articulação, como a rosca 31 direta e a cadeira extensora). Seguindo essa ordem, será possível utilizar cargas mais pesadas nos exercícios multiarticulares, devido a uma menor fadiga. Também é útil realizar exercícios desafiadores no início do treino, quando o sistema neuromuscular está menos fatigado. Assim, se uma criança está aprendendo como realizar um exercício de agachamento com barra, por exemplo, este deve ser realizado no início da sessão de treinamento para que ela possa praticar o exercício sem interferência da fadiga (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016). 1.3.3 Intensidade do treino A variável mais importante na concepção de um programa de TR é a intensidade do treinamento. Todavia, para maximizar os ganhos na aptidão muscular, os jovens devem primeiro aprender a realizar cada exercício corretamente e então aprender como executar cada série até a fadiga volitiva (definida como a incapacidade de completar uma repetição por causa da fadiga temporária), usando uma resistência apropriada. O esforço individual, combinado com um programa de treinamento bem elaborado, acabará por determinar as adaptações que ocorrem (FAIGENBAUM, 2007). O uso de repetição máxima (RM) é um método relativamente simples para prescrever a intensidade do TR. Alguns estudos envolvendo adultos sugerem que cargas de 6 ou menos RM têm maior efeito no desenvolvimento de força muscular, enquanto cargas de 20 ou mais RM têm maior impacto no desenvolvimento de resistência muscular localizada. No entanto, a maioria dos estudos envolvendo jovens sugere que cargas mais leves e repetições mais altas (por exemplo, 10 a 15 RM) são mais benéficas para melhorar a força muscular durante o período inicial de adaptação (cerca de 8 semanas). 32 Uma vez que diferentes combinações de séries e/ou repetições podem ser necessárias para promover ganhos a longo prazo na aptidão muscular, a melhor abordagem para uma criança ou adolescente consiste em começar o TR com uma série de 10 a 15 repetições com uma carga moderada e progredir gradualmente o programa de treinamento, dependendo dos objetivos e do tempo disponível para treinamento (GRANACHER; LESINSKI; BÜSCH, 2016). Ao prescrever uma intensidade adequada de treinamento para jovens, parece ser razoável em um primeiro momento estabelecer uma faixa de repetição (por exemplo, 10 a 15) e, em seguida, ajustar a carga para manter a intensidade desejada. Em uma tentativa de auxiliar na prescrição de exercícios de força, podemos utilizar uma escala subjetiva de percepção de esforço específica para crianças. A escala de esforço percebido para crianças, que é uma adaptação da Escala de Borg (1982), contém expressões verbais ao longo de uma faixa numérica de respostas de 0 a 10 e descritores pictóricos que representam uma criança variando os níveis de esforço enquanto realiza treinamento de força (Figura 1). As informações subjetivas advindas dessa escala, combinadas com as informações relacionadas à experiência e aos objetivos de treinamento, podem ser usadas para auxiliar na prescrição de programas de TR para jovens de forma segura e eficaz. Alguns autores, como Naclerio et al. (2011), Day et al. (2004) e Robertson (2004), sugerem que uma classificação de esforço de 6 ou 7 sobre o esforço percebido para crianças na escala é consistente com uma intensidade de treinamento de aproximadamente 75% de uma repetição máxima, que é a intensidade de treinamento desejável para a maioria dos jovens (FAIGENBAUM, 2007). 33 Figura 1 – Escala de Esforço Percebido para Crianças Fonte: adaptada de Faigenbaum (2007). 1.3.4 Volume do treino O número de exercícios realizados por sessão, as repetições realizadas por série e o número de séries realizadas por exercício influenciam o volume de treinamento. Embora haja algum debate sobre o volume de treinamento, é importante lembrar que as sessões de treinamento não precisam ser caracterizadas pelo mesmo número de séries, repetições e exercícios. A National Strength and Conditioning Association (NSCA, 2009) recomenda que crianças e adolescentes 34 realizem de 1 a 3 séries em cada exercício para atingir as metas de aptidão muscular. Em geral, é razoável começar o TR com uma série de vários exercícios e, em seguida, progredir gradualmente para protocolos de 2 ou 3 séries, seguindo as primeiras semanas de treinamento. Embora estudos de treinamento de longo prazo (> 6 meses) sejam necessários para explorar os efeitos de diferentes modelos de TR para jovens, treinamentos compostos por protocolos de várias séries provaram ser mais eficazes do que protocolos de conjunto único em adultos, e é provável que descobertas semelhantes ocorram em crianças e adolescentes a longo prazo (BEDOYA; MILTENBERGER; LOPEZ, 2015). 1.3.5 Velocidade das repetições A velocidade ou a cadência com que um exercício de força é realizado pode afetar as adaptações a um programa de treinamento. Dessa forma, considerando que os iniciantes precisam aprender como executar cada exercício corretamente, é recomendado que jovens não treinados realizem exercícios resistidos em uma velocidade moderada. Posteriormente, quando ganhar experiência com TR, diferentes velocidades podem ser usadas, dependendo da escolha do exercício(por exemplo, exercício de máquina de peso livre) e dos objetivos do programa (BEDOYA; MILTENBERGER; LOPEZ, 2015). 1.3.6 Frequência de treino Uma frequência de TR de 2 a 3 vezes por semana em dias não consecutivos é recomendada para crianças e adolescentes. Evidências indicam que apenas um dia por semana de TR pode ser subótimo para aumentar a força muscular de jovens. Além disso, em trabalho realizado por Faigenbaum et al. (2002), foi demonstrado que após oito semanas de treinamento de força progressivo (uma série de 35 10-15 repetições em 12 exercícios), crianças que treinaram uma vez por semana atingiram 67% de 1 RM em comparação às crianças que treinaram duas vezes por semana. A frequência de treinamento de duas ou três vezes por semana em dias não consecutivos permite uma recuperação adequada entre as sessões (48 a 72 horas entre sessões) e será eficaz para melhorar força e desempenho musculoesquelético. Fatores como volume, intensidade, seleção de exercícios, ingestão nutricional e hábitos de sono também devem ser considerados ao prescrever uma frequência de treinamento, pois podem influenciar na capacidade de recuperação e de adaptação ao programa de treinamento (LEGERLOTZ et al., 2016). 1.3.7 Variação do programa Alterando periodicamente as variáveis do programa, os ganhos de desempenho de longo prazo irão ser otimizados e o risco de lesões por uso excessivo pode ser reduzido. O conceito em que um programa de treinamento é sistematicamente variado ao longo do tempo é conhecido como periodização. Também é razoável sugerir que crianças e adolescentes que participam de um programa de TR, progressivo e bem planejado, e continuam a melhorar sua saúde e aptidão terão uma melhor aderência ao programa de exercício. Além disso, mudar os exercícios sistematicamente, o número de séries e/ou as repetições e o intervalo de descanso entre as séries e os exercícios pode ajudar a evitar os platôs de treinamento, que não são incomuns após as primeiras 8 a 12 semanas de TR. A longo prazo, programas de TR periodizados (com recuperação adequada entre as sessões de treinos) permitem que os participantes obtenham ganhos adicionais, pois o corpo é desafiado a se adaptar a demandas ainda maiores (FAIGENBAUM, 2007). 36 Como foi possível observar, o universo que permeia a prescrição do TR é complexo e depende de diversos fatores, ainda mais quando tratamos da prescrição para crianças e adolescentes. Todavia, com base nas informações apresentadas neste material, podemos chegar à conclusão de que, com um planejamento cuidadoso de séries, repetições e exercícios, o estímulo de treinamento permanecerá eficaz, e, portanto, a relação esforço-benefício será maximizada. Referências Bibliográficas AAP. American Academy of Pediatrics, Committee on Sports Medicine. Anabolic steroids and the adolescent athlete. Pediatrics, [s.l.], v. 83, p. 127-128, 1989. BEDOYA, A. A.; MILTENBERGER, M. R.; LOPEZ, R. M. Plyometric Training Effects on Athletic Performance in Youth Soccer Athletes: A Systematic Review. J Strength Cond. Res., [s.l.], v. 29, p. 2351-2360, 2015. BEHRINGER, M. et al. Effects of Resistance Training in Children and Adolescents: a meta-analysis. Pediatrics, [s.l.], v. 126, e1199, 2010. CASPERSEN, C. J.; POWELL, K. E.; CHRISTENSON, G. M. Physical activity, exercise, and physical fitness: definitions and distinctions for health-related research. Public Health Rep., [s.l.], v. 100, p. 126-131, 1985. DAY, M. L. et al. Monitoring exercise intensity during resistance training using the session RPE scale. J Strength Cond Res, [s.l.], v. 18, p. 353-358, 2004. FAIGENBAUM, A. et al. Comparison of 1 and 2 days per week of strength training in children. Res. Q Exerc. Sport, [s.l.], v. 73, p. 416-424, 2002. FAIGENBAUM, A. Resistance training for children and adolescents: are there health outcomes? Am J Lifestyle Med., [s.l.], v. 1, p. 190-200, 2007. GRANACHER, U.; LESINSKI, M.; BÜSCH, D. Effects of Resistance Training in Youth Athletes on Muscular Fitness and Athletic Performance: A Conceptual Model for LongTerm Athlete Development. Front Physiol, [s.l.], v. 7, n. 164. 2016. LEGERLOTZ, K. et al. Physiological Adaptations following Resistance Training in Youth Athletes-A Narrative Review. Pediatr Exerc Sci., [s.l.], v. 28, p. 501-520, 2016. MILLER, M. G.; CHEATHAM, C. C.; PATEL, N. D. Resistance training for adolescents. Pediatr Clin North Am., [s.l.], v. 57, p. 671-682, 2010. NACLERIO, F. et al. Control of Resistance Training Intensity by the Omni Perceived Exertion Scale. J Strength Cond Res, [s.l.], v. 25, n. 7, p. 1879-1888, 2011. 37 NEGRA, Y. et al. Effects of High-Velocity Resistance Training on Athletic Performance in Prepuberal Male Soccer Athletes. J Strength Cond. Res., [s.l.], v. 30, p. 3290-3297, 2016. NSCA. National Strength and Conditioning Association. Strength and Conditioning Professional Standards and Guidelines. Strength and Conditioning Journal, [s.l.], v. 31, n. 5, p. 14-38, out. 2009. ROBERTSON, R. J. Perceived Exertion for Practitioners. Champaign, IL: Human Kinetics, 2004. 38 Desmistificando a musculação para crianças e adolescentes Autoria: Marina Ferreira Leitura crítica: Túlio Bernardo Macedo Alfano Moura Objetivos • Fornecer uma atualização sobre o papel do treinamento de força para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. • Compreender a importância do treinamento de força como parte de uma abordagem para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. • Avaliar, planejar, prescrever e acompanhar com eficácia um programa de treinamento de força voltado para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. 39 1. Introdução Nos últimos anos, houve um aumento no número de crianças e adolescentes praticantes de treinamento de força em academias, escolas e centros esportivos. Simultaneamente, um maior corpo de evidências foi criado acerca dos benefícios desse tipo de treinamento para essa faixa etária. Pesquisas iniciais focaram em relatar seus efeitos sobre a aptidão física e sua relação com o crescimento e o desenvolvimento dos jovens. No entanto, recentemente, a ênfase mudou para os efeitos do treinamento de força na redução dos fatores de risco para doenças não transmissíveis. Isso pode ser explicado pelas mudanças no comportamento dos jovens, que passaram a adquirir hábitos mais sedentários, levando muitos estudos a se preocuparem com os impactos do treinamento de força sobre os parâmetros de saúde. Um amplo embasamento teórico foi adquirido nos últimos tempos e o treinamento de força foi considerado parte integrante de programas abrangentes para o condicionamento físico e a promoção da saúde de crianças e adolescentes. Contudo, este ainda é um tema polêmico, que pode gerar controvérsias. Por esse motivo, a proposta deste Tema será atualizar e esclarecer os assuntos e as recomendações relacionados ao treinamento de força para crianças e adolescentes. Entre os tópicos abordados, iremos falar sobre o contexto histórico, os mecanismos fisiológicos, os benefícios e os riscos de um programa de treinamento de força voltado para essa faixa etária. 40 2. Treinamento de força para crianças e adolescentes Recomendações de saúde global sugerem que crianças e adolescentes devam realizar pelo menos 60 minutos diários de atividade física com intensidade moderada a vigorosa. Além de atividades aeróbicas, a participação regular em atividades de fortalecimento muscular também é incentivada em uma rotina semanal de exercícios (WHO, 2010). O aumento da aptidão muscular deve ser considerado fator fundamental para o desenvolvimento físico de crianças e adolescentes, uma vez que algum nível de produção de força é necessário para o desenvolvimento das habilidades motoras no início da vida (FAIGENBAUM et al., 2016). Pesquisas indicam que o treinamento de força pode levar a uma melhora de habilidades motoras básicas, como saltar, correr, arremessar e jogar. Além disso, a ausência de forçamuscular pode prejudicar o desenvolvimento de competências e habilidades motoras necessárias para a realização de uma variedade de atividades e esportes (FAIGENBAUM et al., 2009). Nesse texto, o termo treinamento de força irá se referir a todos os exercícios que envolvem a capacidade de superar uma ampla gama de cargas resistivas, sejam elas aparelhos de musculação, pesos livres (barras e halteres), elásticos, medicine ball e peso corporal (FAIGENBAUM et al., 2010). Aqui, treinamento de força se difere de esportes como levantamento de peso e powerlifting, nos quais atletas treinam periodicamente com o intuito de levantar quantidades máximas de peso para participar de competições (FAIGENBAUM et al., 2010). 2.1 Contexto histórico do treinamento de força para crianças e adolescentes 41 Até as décadas de 1970 e 1980, havia uma grande discussão entorno da utilização do treinamento de força para crianças e adolescentes. Isso estava relacionado ao alto risco presumido de lesões associadas a esse tipo de treinamento. Além disso, havia a crença de que esse tipo de treinamento poderia, por levar ao aumento da força muscular, impedir o crescimento, causar lesões na coluna vertebral, causar deficiências no coração e até mesmo levar à impotência sexual. Em 1986, um dos primeiros estudos conduzidos em crianças pré- púberes relatou aumento da força muscular após nove semanas de treinamento de força. No entanto, em 1989, Kraemer e seus colaboradores publicaram uma importante revisão sobre os fatores que influenciavam o ganho de força em crianças e adolescentes, apresentando um modelo de integração entre fatores de crescimento e desenvolvimento com potenciais ganhos de força por meio do treinamento. Embora a segurança e a eficácia do treinamento de força ainda fossem questionadas, Kraemer e seus colaboradores foram os pioneiros em desenvolver um programa de treinamento de força baseado em evidências e aplicações práticas e voltado para programas de condicionamento físico em crianças e adolescentes. Assim, foi demonstrado pela primeira vez que o treinamento de força era um método seguro, eficaz e válido para o condicionamento dessa faixa etária (KRAEMER et al., 1989; FAIGENBAUM et al., 2010). Após algum tempo, estudos passaram a investigar os efeitos de diferentes protocolos de treinamento de força em crianças pré-púberes, sendo relatados importantes ganhos da força muscular. Desde então, diversas pesquisas têm expandido os conhecimentos a respeito do tema. Nos anos 2000, relatórios baseados em evidências sobre a segurança e a eficácia do treinamento de força fizeram com que este fosse aceito e recomendado por organizações médicas e da ciência do exercício (FAIGENBAUM et al., 2009; MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 42 Atualmente, as recomendações de saúde globais objetivam aumentar o número de jovens praticantes de atividades de fortalecimento muscular, e um número crescente deles já está envolvido em algum tipo de treinamento de resistência em escolas, academias de ginásticas e centros esportivos. Dessa forma, fica implícita a importância de conhecer as diretrizes pelas quais os exercícios de força podem melhorar a saúde, a aptidão física e o desempenho esportivo de populações mais jovens. 2.2 Fisiologia do treinamento de força para crianças e adolescentes Os processos de crescimento, maturação e desenvolvimento estão em constante evolução em crianças e adolescentes, sendo observadas diversas alterações quantitativas e qualitativas. Assim, é possível notar ao longo dos anos ganhos em altura, peso, consumo máximo de oxigênio, capacidade anaeróbica e força muscular. Também podem ser notórios ganhos significativos de força, acima e além do crescimento e da maturação, durante o desenvolvimento de crianças e adolescentes, desde que estes se envolvam em programas de treinamento de força, com intensidade, volume e duração adequados (FAIGENBAUM et al., 2009; FAIGENBAUM et al., 2010). Quando realizadas anteriormente ao pico de velocidade de crescimento, as adaptações decorrentes do treinamento de força não parecem muito evidentes. Isso se deve à ausência de níveis adequados de hormônios circulantes, como a testosterona, levando as crianças a terem maiores dificuldades de aumentar a massa muscular em comparação com adultos. Em pré-adolescentes, um programa de treinamento de força pode resultar em aumentos da força muscular, ainda que não sejam observados ganhos hipertróficos na mesma magnitude. Isso pode ser explicado pelo fato de que as adaptações do treinamento de força 43 nessa faixa etária, assim como em adultos, estão mais associadas a mecanismos neurais (aumento da ativação, integração, sincronização e recrutamento de unidades motoras) e adaptações musculares intrínsecas (aumento do torque de contração) (FAIGENBAUM et al., 2009; FAIGENBAUM et al., 2010). Na puberdade, esse quadro começa a mudar. Devido ao estímulo promovido pela secreção testicular de testosterona nos homens, podemos observar um considerável aumento da massa muscular e um crescimento linear. O treinamento de força, quando introduzido a partir dessa fase, pode resultar em ganhos de força induzidos também por adaptações hipertróficas, uma vez que hormônios androgênicos, como a testosterona, estão atuantes nesse momento. Já nas mulheres, a magnitude da hipertrofia muscular se mantém limitada, uma vez que estas apresentam menores quantidades de testosterona (resultante da conversão enzimática de androgênicos precursores na glândula adrenal), ainda que outros hormônios e fatores de crescimento (por exemplo, o hormônio do crescimento e fatores de crescimento semelhantes à insulina) possam ser parcialmente responsáveis pelo desenvolvimento da massa muscular. Embora ainda seja um campo incerto, alterações na arquitetura da fibra muscular (por exemplo, no ângulo de penação) e mudanças nas influências inibitórias centrais também devem ser consideradas como fatores relacionados ao ganho de força em jovens (FAIGENBAUM et al., 2009; FAIGENBAUM et al., 2010). As adaptações decorrentes da puberdade também refletem padrões diferentes de força e coordenação (neuromuscular) entre homens e mulheres. Potência, força e coordenação corporal aumentam com a idade cronológica nos homens, estando relacionadas ao estágio maturacional; ao passo que, em mulheres púberes não treinadas, observa-se pouca melhora na força, no equilíbrio e na potência muscular (FAIGENBAUM et al., 2010). Tal fato pode ser evidenciado, por 44 exemplo, com a aplicação de um teste de salto vertical (uma medida de potência para membros inferiores), no qual os valores atingidos pelos homens aumentam constantemente durante a puberdade, o que não é observado nas mulheres. Tais divergências no desenvolvimento neuromuscular entre homens e mulheres na puberdade também podem explicar em parte o risco maior de lesões no sexo feminino. Contudo, devido aos menores níveis de desempenho neuromuscular basal, ganhos relativos decorrentes da prática de treinamento de força podem ser mais bem observados em mulheres em comparação aos homens (FAIGENBAUM et al., 2010). 2.3 Benefícios do treinamento de força para crianças e adolescentes Nos últimos anos, um corpo de pesquisa convincente vem demonstrando que a utilização do treinamento de força é fundamental para a melhora da saúde e da aptidão física de crianças e adolescentes (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008; FAIGENBAUM et al., 2009). Embora a prática de exercícios físicos voltados para o desenvolvimento da capacidade aeróbia ainda seja o foco da maior parte das pesquisas pediátricas, muitos estudos já demonstram que o treinamento de força pode oferecer benefícios únicos para crianças e adolescentes quando devidamente prescritos e supervisionados por profissionais da área. A melhora da composição corporal, do perfil lipídico, da quantidade de açúcar no sangue, da força muscular, de habilidades motoras e da saúde óssea são apenas alguns bons exemplosdas alterações induzidas pelo treinamento de força (FAIGENBAUM et al., 2009). Benefícios psicológicos e de bem-estar também estão relacionados com a prática de atividades físicas. Além disso, é importante ressaltar que hábitos adquiridos durante a infância e a adolescência tendem a se transpor para a vida adulta, levando a um maior número de 45 adultos mais ativos. Assim, uma boa razão para incentivar crianças e adolescentes a praticarem exercícios físicos regularmente é o fato de que a inserção de atividades físicas no início da vida pode reduzir o risco do desenvolvimento de doenças no futuro. A seguir, podemos conferir os principais benefícios do treinamento de força para crianças e adolescentes: 1. Risco cardiovascular A melhora da composição corporal (relação entre massa gorda e massa magra) em crianças e adolescentes por meio do treinamento de força tem se mostrado um importante tópico em vista da alta prevalência de obesidade nessa faixa etária. Atualmente, a obesidade é considerada um problema de saúde pública e está associada ao desenvolvimento de diabetes tipo 2, que pode ser levada para a vida adulta. O comportamento sedentário constitui-se uma das principais causas da obesidade, embora fatores genéticos, psicossociais, econômicos e ambientais também desempenhem seu papel. É importante ressaltar ainda que, embora a prática de exercícios aeróbicos seja tradicionalmente recomendada para indivíduos obesos, o excesso de peso corporal pode levar a maiores dificuldades na realização das atividades, além de aumentar o risco de lesões musculoesqueléticas durante a prática (DENCKER et al., 2006). Por esse motivo, o treinamento de força pode ser mais bem aceito por jovens obesos, que tendem a preferir curtos períodos de atividade física intercalados com breves períodos de descanso entre as séries e os exercícios. Já em relação aos fatores hemodinâmicos, ainda não é clara a influência do treinamento de força sobre a pressão arterial de crianças e adolescentes, embora estudos sugiram que este possa 46 ser considerado um tratamento não farmacológico importante para indivíduos hipertensos (HAGBERG et al., 1984). Da mesma forma, os efeitos do treinamento de força sobre o perfil lipídico dessa faixa etária ainda não são bem documentados, embora dados iniciais sugiram resultados positivos (FAIGENBAUM et al., 2009). 2. Saúde óssea Os processos de desenvolvimento e remodelamento ósseo que ocorrem durante a infância e a adolescência podem ser oportunizados por estímulos de força, tração e compressão decorrentes do treinamento de força. Isso porque a contração muscular leva a um aumento da atividade de osteoblastos, células anabólicas responsáveis pela produção da parte orgânica da matriz óssea e, consequentemente, ao aumento da mineralização. Os mecanismos de ganho de massa óssea podem ainda ser otimizados quando realizados próximo ao pico máximo de crescimento, caracterizado pela fase da puberdade. Não obstante, os efeitos osteogênicos estão relacionados com a magnitude da carga e da frequência de aplicação do estímulo, que, quando repetidos, otimizam a hipertrofia óssea (FAIGENBAUM et al., 2010). Assim, quando seguidas as diretrizes nutricionais, com a adequada ingestão de cálcio, somadas a um programa de treinamento de força condizente com a idade, podemos observar importantes ganhos em densidade mineral óssea nessa faixa etária. É importante ressaltar também que o treinamento de força durante a infância e a adolescência pode exercer influência positiva na prevenção de distúrbios ósseos no futuro, evitando o desenvolvimento de doenças como a osteoporose (FAIGENBAUM et al., 2009). 47 3. Saúde psicossocial e bem-estar Estudos demonstram que os benefícios do treinamento resistindo superam medidas físicas e podem ser comprovados também no âmbito da saúde psicossocial e do bem-estar. Outros notaram melhorias significativas no humor e nos fatores de autoavaliação em crianças que participaram de um programa de atividade física que incluiu treinamento de força. Além disso, há evidências de que crianças envolvidas em programas de treinamento de força tiveram uma melhora na socialização e na disciplina mental, de forma semelhante ao que ocorre com participantes de esportes em equipe (FAIGENBAUM et al., 2009). 4. Desempenho motor e esportivo Melhorias de habilidades motoras básicas, tais como saltar, correr e lançar, foram observadas em crianças e adolescentes que realizaram o treinamento de força. Ganhos importantes também foram observados naqueles envolvidos em treinamentos pliométricos. Assim, como observado em adultos, a combinação do treinamento de força com o treinamento pliométrico parece ser mais vantajosa para o desenvolvimento motor de crianças e adolescentes. Contudo, os ganhos obtidos são bastante dependentes do programa de treinamento realizado, de forma que o princípio da especificidade deve ser levado em consideração quando avaliados tais dados (FAIGENBAUM et al., 2009). 5. Lesões relacionadas ao esporte Um programa de treinamento de força devidamente prescrito e supervisionado pode levar a uma redução da probabilidade de 48 lesões relacionadas ao esporte em crianças e adolescentes, além de ser utilizado em programas de reabilitação de lesões pré- estabelecidas, o que é um fatores importante, uma vez que o risco de osteoartrite na vida adulta pode ser aumentado por certas lesões na juventude (FAIGENBAUM et al., 2009; MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). 2.4 Riscos do treinamento de força para crianças e adolescentes Uma das maiores preocupações associadas ao treinamento de força em crianças e adolescentes diz respeito aos presumidos riscos associados a ele. De fato, assim como em qualquer outro exercício ou atividade desenvolvida para essa população, o risco de intercorrências é algo inerente. Contudo, uma parte desse medo que se criou entorno dessa prática está relacionada aos dados publicados durante as décadas de 1970 e 1980 pelo Sistema Nacional de Vigilância de Lesão (NEISS) da Comissão de Segurança de Produtos de Consumo dos Estados Unidos, que utilizavam números de departamentos de emergência para fazer projeções das lesões relacionadas aos exercícios e aos equipamentos. Porém, esses dados eram baseados em relatos de pacientes, ficando difícil concluir se realmente estavam relacionados aos exercícios e aos equipamentos ou a técnicas de execução inadequadas (FAIGENBAUM et al., 2009). Estudos prospectivos atuais demonstram que as taxas de lesões decorrentes do treinamento de força em crianças e adolescentes, quando em ambientes supervisionados e com execução correta dos movimentos, são inferiores às que ocorrem durante a prática de modalidades esportivas e até mesmo nas escolas durante os intervalos da aula (MCCAMBRIDGE; STRICKER, 2008). Na grande maioria dos estudos publicados, nenhuma lesão evidente foi reportada, mesmo quando utilizada uma ampla variedade de regimes de treinamento. Na 49 verdade, as lesões relacionadas ao treinamento de força parecem estar mais ligadas a progressões de carga excessivas e técnicas incorretas de execução. De fato, a prescrição e a supervisão de treinamento adequadas, com seleção cuidadosa dos equipamentos e progressão de carga sensata, são fatores essenciais para a redução de acidentes. Além disso, é importante ressaltar que o risco de lesão em crianças e adolescentes pode ser significativamente reduzido por meio de períodos adequados de descanso entre as sessões de treinamento (FAIGENBAUM et al., 2010). A seguir, podemos conferir os principais riscos do treinamento de força para crianças e adolescentes: 1. Lesão de tecidos moles: ocorre principalmente devido ao uso repetitivo de certas estruturas durante a prática de treinamento de força, sendo uma lesão difícil de ser determinada, pois muitas vezes não causa idas a setores médicos e de emergência. Nesse sentido, uma lesão comum em crianças