Buscar

Ecologia dos Ecossistemas Urbanos

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 33 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 33 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 33 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

9 
CAPÍTULO 1 
 
Ecologia dos Ecossistemas Urbanos 
 
 
 
“Cidades são tão artificiais quanto colméias.” 
(John Gray, 2006) 
 
 
“De fato, pelo viés direcionado a estudos de ambientes prístinos, muitos ecólogos sentem-se 
desconfortáveis com a noção de que seres humanos fazem parte da natureza. Assim, mesmo com uma 
generalizada crise ambiental, a ecologia acadêmica tem pouco a dizer sobre a ecologia do Homo sapiens 
ou sobre as cidades como fenômeno ecológico.” 
(Willian E. Rees, 1997) 
 
 
Ecologia designa uma ciência que investiga as relações entre organismos e seu 
ambiente. Em contraste com a ecologia geral, a ecologia humana se refere ao estudo das 
relações dinâmicas entre populações humanas e as características físicas, biológicas, 
culturais, sociais e econômicas do ambiente (Lawrence, 2003). 
 
Rees (1997) classifica a ecologia urbana como um ramo da ecologia humana. Ecologia 
urbana é pesquisa ecológica feita em cidades. Há muitas definições para o termo 
“cidade”, a mais generalista é aquela que define uma cidade como uma área densamente 
povoada e caracterizada por áreas habitacionais, de comércio, e industriais (Niemela, 
1999). São quatro os campos principais de pesquisa no âmbito da ecologia urbana (tabela 
1). 
 
Tabela 1: Campos de estudo da ecologia urbana 
1) Estudo do meio físico: pesquisas sobre geomorfologia, substrato geológico, clima, como 
fatores determinantes da atividade biológica nas cidades. Influem em diversas características dos 
ecossistemas urbanos, como por exemplo na composição vegetal mais adequada à arborização 
de um bairro. 
 
2) Estudo das populações biológicas: populações humanas podem ser estudadas sob pontos 
de vista diversos: demografia, etologia, saúde pública. O estudo de outras populações pode ser 
interessante para fins de controle de animais vetores de enfermidades. Comunidades vegetais 
podem ser estudadas para fornecer subsídios ao planejamento da arborização. 
 
3) Estudo da estrutura e da evolução do ecossistema no espaço: os ecólogos entendem os 
ecossistemas como o resultado de processos históricos onde pode intervir o acaso, e de 
tendências espontâneas de auto-organização. Ecossistemas (urbanos ou não) são heterogêneos, 
 10 
como um mosaico, e as partes do mosaico urbano diferem de muitas maneiras: morfologicamente, 
socialmente, metabolicamente. A evolução da estrutura do ecossistema pode ser estudada sob 
diferentes escalas. Por exemplo, o grau de impermeabilização de um bairro pode repercutir em 
escalas superiores (causando inundações). 
 
4) Estudos relativos ao metabolismo material e energético dos ecossistemas: quanta 
energia, quantos e que tipos de materiais entram, de que forma esses insumos são empregados 
dentro do ecossistema urbano e quanta energia e resíduos são exportados. 
 
Fonte: Terradas, 2001 
 
Odum (1988) define ecossistema ou sistema ecológico como qualquer unidade de área 
que abranja todos os organismos interagindo com o ambiente físico de tal forma que um 
fluxo de energia produza: 1) estruturas bióticas claramente discerníveis (os organismos); 
e 2) uma ciclagem de materiais entre as partes vivas e não vivas do sistema. De acordo 
com as fontes e o nível do fluxo de energia que perpassa os sistemas ecológicos, 
podemos dividi-los em quatro categorias (tabela 2). 
 
Tabela 2: Categorias de ecossistemas segundo a fonte e o nível de energia 
Tipo de ecossistema Fluxo energético anual médio (kcal/m2) 
1. Ecossistemas naturais, que dependem de 
energia solar, sem outros subsídios (oceanos 
abertos, florestas de altitude). Prestam serviços 
ambientais fundamentais para a manutenção 
da vida (ciclos biogeoquímicos da água e do 
carbono, por exemplo). 
1.000 – 10.000 
2. Ecossistemas com subsídios naturais. 
Dependem de energia solar, mas contam com 
inputs energéticos, o que os torna bastante 
produtivos. Grande capacidade de sustentação 
da vida, grande produção de matéria orgânica, 
as vezes exportada para outros sistemas 
(estuários de marés, florestas úmidas). 
10.000 – 40.000 
3. Ecossistemas com subsídios antropogênicos. 
Dependem de energia solar, mas recebem 
inputs energéticos maciços (geralmente de 
origem fóssil) sendo também muito produtivos 
(agricultura, aquacultura). 
10.000 – 40.000 
4. Ecossistemas urbano-industriais. Movidos 
sobretudo a combustíveis fósseis. 
Extremamente dependentes dos três outros 
tipos de ecossistema para a manutenção da 
vida e obtenção de matérias primas e 
combustíveis (cidades, bairros residenciais, 
zonas industriais). Sistemas geradores de 
riquezas e poluição de variados tipos. 
100.000 – 3.000.000 
Fonte: Odum, 1988; Collins, 2000 
 
Cidades são geralmente definidas como centros de comércio, como centros de sistemas 
de transporte e comunicação, como fontes de cultura e artes e sede de governos. 
Algumas vezes, pode se fazer menção à poluição, congestionamentos e outras mazelas 
 11 
urbanas. Entretanto, muito raramente se reconhece as cidades como ecossistemas, ou, 
em outras palavras, poucos reconhecem a urbanização e a as cidades como 
manifestações da ecologia humana (Rees, 1997). 
 
O ecólogo barcelonês Jaume Terradas (2001), caracteriza as cidades como ecossistemas 
heterotróficos, dissipativos, que se organizam aumentando a entropia no restante do 
planeta. Ao contrário dos ecossistemas autotróficos (essencialmente estruturados por 
cadeias alimentares compostas por organismos fotossintéticos que convertem energia 
solar em energia química, à qual alimenta grupos de organismos heterótrofos), os 
ecossistemas heterotróficos (também denominados de ecossistemas incompletos) 
dependem de grandes áreas externas a eles para a obtenção de energia, alimentos, 
fibras e outros materiais (Odum, 1988). Pickett (et al, 2004) define a cidade como um 
sistema ecológico, onde humanos e processos sócio-ambientais estão combinados em 
uma rede de interações recíprocas. 
 
Cidades não são o único exemplo de ecossistemas heterotróficos. Riachos, e recifes de 
ostras também o são. Contudo, as cidades diferem de seus congêneres “naturais” por três 
diferenças principais: 1) um metabolismo muito mais intenso por unidade de área, 
exigindo assim um influxo muito maior de energia, que em parte é suprida por 
combustíveis fósseis; 2) uma considerável necessidade de entrada de materiais, como 
metais, para a produção de bens de consumo não necessariamente conexos à 
sobrevivência humana; e 3) uma saída muito maior e mais poluidora de dejetos e 
resíduos (Odum, 1988). 
 
Em suma, cidades são ecossistemas que possuem ambientes de entrada (áreas de onde 
se retiram matérias primas diversas) e de saída (pontos da biosfera que recebem os 
resíduos do metabolismo urbano) muito maiores do que outros ecossistemas 
heterotróficos (Odum, 1988, Wackernagel e Rees, 1996). 
 
A Humanidade não afeta apenas ambientes locais. Muito além disso, ela cooptou a 
biosfera para seus propósitos. Compreender as implicações deste conjunto de eventos 
para a sustentabilidade requer um foco nos seres humanos como os maiores organismos 
consumidores em todos os ecossistemas do planeta (Rees, 1997). 
 
A área ocupada pelos ecossistemas urbanos situa-se entre somente 1 e 5% da parte 
terrestre do globo. Ocorre que, por possuírem extensos ambientes de entrada e saída, 
 12 
estes sistemas alteram sobremaneira a natureza de rios, florestas, campos, oceanos e a 
própria atmosfera (Odum, 1988, Odum, 2001). 
 
Vários dados atestam a enorme amplitude dos ambientes de entrada e de saída dos 
ecossistemas urbanos. Mais nitrato artificial é aplicado nas plantações de grãos do 
mundo, do que a quantidade fixada por atividade bacteriana e outros processos naturais 
(Rees, 1997).Talvez ainda mais significativa, de uma perspectiva ecossistêmica, é a 
evidência de que seres humanos, uma espécie entre milhões, consuma, diretamente ou 
indiretamente, 40% da produção fotossintética primária líquida terrestre, e 35% da 
produção fotossintética líquida de zonas costeiras e ressurgências (Vitousek, 1994). 
 
Isto significa que embora as cidades sejam descritas como entidades geográficas 
isoladas, elas dependem dos recursos naturais de vastas regiões muito além de suas 
fronteiras. Para quantificar o volume de recursos consumidos pelas cidades, Rees e 
Wackernagel (1996) criaram um conceito, a pegada ecológica (ou ecological footprints) 
para medir a dependência entre as cidades e seus hinterlands. 
 
A pegada ecológica é definida como o total da área de terra produtiva e água requeridos 
permanentemente para produzir todos os recursos consumidos e absorver todos os 
dejetos produzidos por uma determinada população. Desde o começo deste século, a 
pegada ecológica cresceu 5 vezes nos países industrializados (Alberti, 1997). 
 
A pegada ecológica de cidades como Los Angeles ou Londres provavelmente possui área 
entre 100 e 300 vezes maior do que a área ocupada pelos próprios assentamentos. A 
pegada ecológica de Londres, com 12% da população britânica, estende-se por cerca de 
20 milhões de hectares, o que equivale ao total de terras produtivas da Grã-Bretanha 
(Girardet, 1999). 
 
O arquiteto italiano Giulio Carlo Argan (1993), conseguiu, de maneira poética, explicitar 
como as cidades, com a globalização econômica, espalham suas ramificações por sobre 
toda a biosfera ao afirmar que 
 
 
a natureza não esta mais além dos muros da cidade; as cidades não têm mais muros, mas 
estendem-se em desesperadores labirintos de cimento, desfiam-se nas sórdidas periferias de 
barracos e, para lá da cidade, ainda é cidade, a cidade das auto-estradas e dos campos cultivados 
industrialmente. 
 
 13 
 
1.1 - Crescimento populacional e consumo 
Nossos padrões de consumo em muito excedem a energia alimentar necessária a 
manutenção da vida humana, que é de aproximadamente 1 milhão de kcal/ano/indivíduo. 
Nos Estados Unidos da América, cada cidadão consome em média 87 milhões de 
kcal/ano (Odum, 1988). 
 
Evidentemente, este enorme consumo de energia extra-somática gera uma cadeia 
enorme de impactos que surgem da necessidade de se importar energia e matérias 
primas. Importação que degrada outros ecossistemas, e sistemas de transporte que 
fragmentam o território. Também são fontes de impactos a produção, consumo e descarte 
de resíduos relacionados ao consumo. 
 
Como observa o ecólogo Eugene Odum (2001) 
 
A Terra pode suportar mais “corpos quentes” sustentados como muitos animais domésticos num 
comedouro poluído, do que pode sustentar seres humanos desfrutando do direito a um ambiente 
livre de poluição, com uma razoável oportunidade de liberdade pessoal e uma variedade de 
opções para a busca da felicidade. Não é a energia que em si mesma é limitante, mas sim as 
conseqüências da poluição resultante da exploração da energia. A poluição é agora o fator 
limitante mais importante para o homem (...) À escala mundial, o crescimento da população 
apresenta uma correlação positiva com a densidade, num pronunciado contraste com as 
populações da maioria dos organismos, nas quais a taxa de crescimento decresce com o aumento 
da densidade (...) Uma vez que para o homem sempre haverá um longo atraso temporal nos 
efeitos da „auto-aglomeração‟ e também nos efeitos do uso em excesso de um recurso, a 
densidade da população tenderá a „transbordar‟ a menos que haja fatores que reduzam 
rapidamente a taxa de crescimento. 
 
 
Embora as taxas de natalidade venham caindo no planeta, ainda há uma grande 
disparidade entre mulheres ricas e pobres. No Brasil, por exemplo, mulheres com renda 
superior a 5 salários têm em média 1,1 filhos, contra 4,6 filhos daquelas com renda de ¼ 
de salário mínimo (IBGE, 2007). 
 
O declínio da natalidade é uma boa nova, mas que deve ser comemorada com cautela. 
Há três projeções para o estacionamento do crescimento populacional humano em 2150: 
a menor, com 8,5 bilhões de pessoas, e a maior, com 13,5 bilhões. Uma população com 
mais de 10 bilhões de pessoas fatalmente reduziria a qualidade da existência humana, 
dados os recursos e a capacidade de suporte atuais do globo (Odum, 1988). 
 
 14 
Com a população se aproximando de 7 bilhões de humanos, dificilmente atingiremos a 
projeção mais baixa para 2150, a menos que lancemos mão de estratégias amplas de 
planejamento familiar, incluindo aí o direito universal ao aborto. Odum (2001) sugere 
também restrições ao uso do solo e água, e forte incentivo à reciclagem. 
 
De acordo com Alan Weisman (2007) no final do século XIX éramos 1,6 bilhão de 
pessoas. O autor especula que, se por um consenso mundial conseguíssemos implantar 
a política do filho único existente na China, em todos os países, ao final do século XXI 
teríamos retornado á população do século XIX. Uma redução de mais de 5 bilhões de 
pessoas, sem guerras, nem atitudes brutais. 
 
Menos pessoas, menor apropriação da produção fotossintética, populações concentradas 
em menos cidades, planejadas para serem mais autotróficas, e grandes áreas do globo 
deixadas intactas para a recolonização por outras formas de vida. Uma população menor, 
com mais oportunidades para a satisfação dos prazeres que o consumo nos traz, como 
viagens planetárias, sem exceder a capacidade de suporte do planeta. 
 
Uma utopia, sem dúvida. Mas, como afirmou Mahatma Ghandi, o planeta pode sustentar 
as necessidades de todos, mas não as ambições de todos. Através de mecanismos 
culturais, ou por restrições ambientais, haveremos de reduzir a população humana. 
 
1.2 - O ambiente urbano 
No desenvolvimento do movimento ambientalista dos anos 60 e 70, tornou-se um 
modismo considerar tudo o que estivesse relacionado às cidades como ruim, e tudo que 
fosse ligado à vida silvestre, como algo virtuoso. Ironicamente, embora desdenhar as 
cidades tenha se tornado modismo, a maioria das pessoas vivem em ambientes urbanos 
e sofrem com seu declínio (Botkin; Beveridge, 1997). 
 
Geralmente evidenciamos os aspectos negativos do ambiente urbano. Como sociedade, 
temos perdido de vista a importância das cidades para tornar nossas vidas mais criativas. 
Certamente, a cidade é uma das maiores invenções da humanidade, senão a maior. O 
adensamento da população nos permite o desenvolvimento de uma economia que 
suporta instituições diversas, como universidades, hospitais e museus, por exemplo. 
 
 15 
Do ponto de vista ecológico, é melhor que as pessoas concentrem-se em cidades, pois 
suas necessidades são atendidas mais facilmente. O uso de energia é mais eficaz nas 
cidades do que em assentamentos dispersos (Alberti, 1997; Spirn, 1995). 
 
Também é mais fácil corrigir eventuais impactos ambientais, bem como melhorar a 
qualidade de vida dos urbanitas (Lugo, 1991). Do ponto de vista da sociedade, as cidades 
produzem uma grande quantidade de informações, conhecimento, cultura e tecnologia, 
exportando-os para outros sistemas (Celecia, 1994; Celecia, 1997). 
 
As cidades produzem soluções para diversos dilemas da existência humana, mas 
também produzem muitos problemas. Nas cidades brasileiras predomina uma horrenda 
estética de concreto, com a vegetação ocupando espaços cada vez menores. Com 
padrões de controle pouco rigorosos ou inexistentes, a poluição é outro dilema 
onipresente. 
 
Segundo os pesquisadores Paulo Saldiva, e Jorge Hallack, do Laboratório de Poluição da 
Universidade de São Paulo, as regiões mais poluídas da cidade de São Paulo registramum menor nascimento de bebês do sexo masculino. A hipótese dos pesquisadores é de 
que alguns poluentes atuem como desreguladores endócrinos, alterando o mecanismo de 
regulação hipotálamo-hipófise-gônadas, e assim inibindo a produção de espermatozóides 
com o cromossomo Y (Collucci, 2008). 
 
Nossa fabulosa capacidade cultural de criar artefatos, não altera nossa fisiologia: 
continuamos a ser animais homeotérmicos. Temos profundas habilidades para modificar 
ambientes, criando, porém, frequentemente, impactos nocivos à nossa biologia (como as 
ilhas de calor). Somos muito hábeis para criar novos ambientes, mas muito menos 
capazes de lidar com as conseqüências adversas desses câmbios. 
 
As ilhas de calor, decorrentes do excesso de pavimentação, estão correlacionadas com o 
aumento do número mortes de idosos em dias mais quentes. Há autores inclusive que 
relacionam o aumento da temperatura nas cidades com o aumento de crimes violentos 
(assaltos e assassinatos). Em experimentos controlados realizados em laboratório, 
temperaturas elevadas aumentam a irritabilidade e a agressão entre humanos (Baker, et 
al, 2002). 
 
 16 
As temperaturas elevadas, comuns nas cidades brasileiras e acentuadas pelas ilhas de 
calor, também se constituem em um fator de estresse para a vegetação urbana. Sob forte 
calor e pouca água disponível no solo, algumas espécies fecham seus estômatos 
(diminutos orifícios existentes nas folhas para captação de CO2 para fotossíntese), e, por 
conseqüência, param de liberar vapor d´água para a atmosfera. 
 
Nessas ocasiões, a vegetação urbana perde sua capacidade de diminuir extremos de 
temperatura, justamente quando esse serviço ambiental se faz mais necessário. Ademais, 
com o fechamento dos estômatos, ocorre acúmulo de O2 nas folhas. O excesso de O2 
provoca um fenômeno conhecido como fotorrespiração, o qual interrompe a fotossíntese, 
privando a planta de obter energia para sua manutenção (Raven, 2001). 
 
A agência de proteção ambiental estadunidense calculou em mais de 1 bilhão de dólares 
anuais os gastos das cidades norte-americanas com energia elétrica para mitigar o 
desconforto térmico das ilhas de calor. Ademais, as ilhas de calor aceleram reações 
químicas que produzem altas concentrações de ozônio, deste modo aumentando a 
poluição atmosférica urbana, com conseqüências deletérias para humanos e vegetação 
(Botkin, Beveridge, 1997). 
 
A urbanização tem efeitos favoráveis e adversos sobre as comunidades bióticas. Por um 
lado, a diversidade da influência humana sobre os ecossistemas urbanos faz surgir uma 
grande variedade de habitats que não ocorrem fora das cidades. Essa miscelânea de 
habitats frequentemente suporta uma alta biodiversidade, inclusive a presença de 
espécies ameaçadas. Por exemplo, rodovias e pilhas de detritos de minas de carvão 
abrigam 35% das espécies raras de besouros da Grã Bretanha. No reverso da medalha, a 
urbanização ameaça a integridade de espécies e habitats naturais. Em Munique, 
Alemanha, durante o século XX, 180 espécies de plantas tornaram-se localmente extintas 
(Niemela, 1999). 
 
A heterogeneidade é uma das mais importantes características a influenciar os ambientes 
surgidos com a urbanização. Esse fator cria e barra oportunidades para os organismos, 
alterando assim a biodiversidade. Como os demais ecossistemas, os sistemas ecológicos 
urbanos são compostos por mosaicos de ambientes heterogêneos. 
 
Recursos naturais, capital, trabalho, conhecimento se deslocam diferentemente através 
das diferentes partes do mosaico urbano. Ricos circulam preferencialmente em certas 
 17 
áreas de uma cidade, toxinas e detritos tendem a se acumular em outros locais (não raro, 
onde residem os mais pobres). Essa hierarquia, comum nas sociedades humanas, cria 
uma heterogeneidade espacial vasta. A variedade de peças dos mosaicos urbanos é 
enorme (Pickett, et al, 1997). 
 
Da mesma forma em que se observa uma heterogeneidade espacial no mosaico urbano, 
(áreas vegetadas, áreas densamente construídas, etc) há também uma heterogeneidade 
social. Essa heterogeneidade pode ser quantificada e espacializada através dados 
socioeconômicos, censos demográficos e surveys sobre decisões individuais ou familiares 
ligadas ao meio ambiente (Pickett, et al, 2004). 
 
Água, poluição atmosférica, diferentes tipos de capital, de vegetação e de outras 
características sócio-ambientais podem se acumular ou se mover por entre as parcelas do 
mosaico. Quais os mecanismos de alocação social e física existem e como eles 
restringem ou permitem esses fluxos são questões importantes de pesquisa (Pickett, et al, 
2004). 
 
O caráter de mosaico dos ecossistemas urbanos torna a dispersão, uma tarefa difícil e 
arriscada, ao menos para espécies com menos habilidades locomotoras. 
Consequentemente, a extensão de áreas verdes e sua conectividade é um importante 
fator a influenciar a ocorrência de espécies animais em paisagens urbanas (Niemela, 
1999). 
 
O isolamento das parcelas de habitats urbanos leva a variações nos eventos de 
colonização e extinção. Este fator, somado ao estágio de sucessão primário mantido por 
perturbações ambientais periódicas (corte da vegetação, por exemplo), contribuem para 
uma alta riqueza de espécies em algumas paisagens urbanas. Este fato está em 
consonância com a “hipótese da perturbação intermédia” (Connel, 1978, in Niemela, 
1999), a qual prediz que a riqueza de espécies é maior em locais medianamente 
perturbados, do que naqueles não perturbados, ou severamente perturbados. Por 
exemplo, a diversidade de pássaros em áreas levemente perturbadas, como vilas era 
maior (22 espécies) do que em florestas (18 espécies) ou no centro de cidades 
finlandesas (12 espécies). 
 
A diversidade alfa é usualmente maior em habitats urbanos porque muitas espécies de 
diferentes origens encontram condições apropriadas nesses locais. Por exemplo, um 
 18 
estudo norte-americano encontrou uma maior abundância de espécies de plantas 
vasculares em lotes urbanos abandonados (412 espécies) do que em florestas semi-
naturais de coníferas (262 espécies). A diversidade beta também costuma ser maior em 
cenários urbanos, devido a enorme variedade de tipos de habitat, que vai desde habitats 
semi-naturais até aqueles altamente antropogênicos. Por exemplo em Helsinki a 
diversidade beta de plantas é maior entre habitats urbanos do que entre florestas semi-
naturais contíguas à cidade (Niemela, 1999). 
 
Invasões bem sucedidas de espécies exóticas são mais comuns em ecossistemas 
humanos do que em outros habitats. Este fenômeno ocorre pelo aumento do número de 
viajantes (que, voluntariamente ou não, atuam como dispersores), e pelo aumento do 
cultivo de espécies exóticas. Por exemplo, na cidade argentina de Bariloche a proporção 
de espécies introduzidas aumenta de 10% em áreas rurais contíguas a cidade para 100% 
no centro da cidade. Se por um lado a introdução de espécies pode aumentar a riqueza 
de espécies urbanas, ela também pode diminuir populações de espécies nativas 
(Niemela, 1999). 
 
A atividade de organismos decompositores de matéria orgânica é diferenciado nos 
sistemas ecológicos urbanos. Em um estudo sobre a decomposição da serapilheira e 
sobre o ciclo de nitrogênio em florestas de carvalho (Quercus spp) variando ao longo de 
um gradiente urbano-rural, chegou-se a conclusão que nas florestas urbanas a 
decomposição e as taxas de nitrificação eram mais velozes, mesmo tendo essas áreas 
populações de fungos e microartrópodos menores do aquelas encontradas nas florestas 
rurais. Essas diferenças foram atribuídas a duas causas antropogênicas: temperaturas 
mais altas causadas pelas ilhasde calor urbanas (o que apressa a decomposição) e uma 
bem sucedida colonização do solo por minhocas (Zipperer, 1997). 
 
Por possuírem uma nuvem de partículas em suspensão, cidades muitas vezes têm 
chuvas com mais freqüência que os arredores, já que as partículas funcionam como 
pontos de condensação de vapor d´água. Em alguns centros urbanos a percentagem de 
precipitações é de até 10% maior do que no entorno (Baker, 2002). Ao mesmo tempo, 
cidades usualmente são excessivamente pavimentadas, e portanto impermeáveis à 
infiltração de água. Em outros ecossistemas, evaporação de água do solo é um 
importante fator de refrigeração. A excessiva pavimentação pode ocasionar enchentes, 
como as que ocorrem anualmente durante o verão na cidade de São Paulo. 
 
 19 
1.3 Influências humanas sobre sistemas ecológicos urbanos 
Os efeitos da influência humana sobre os ecossistemas urbanos podem ser bons 
(produção de conhecimento e difusão de práticas ambientais positivas), ruins (poluição e 
outros impactos) e sutis (por exemplo câmbios na competição entre espécies pela 
introdução de espécies exóticas). 
 
Essas influências são de caráter econômico, social, político, e cultural (dando ao termo 
“cultural” significação latu sensu). São dinâmicas correlatas, interconectadas: dinâmicas 
ambientais e humanas. A religião, por exemplo, pode desempenhar uma dessas 
conexões. 
 
Em Salvador, na Bahia, com população de mais de 80% de negros e pardos, há, 
registrados pela Febacap (Federação Baiana dos Cultos Afro-brasileiros), mais de 3500 
terreiros de Candomblé. Cada terreiro possui uma área verde, com plantas sagradas para 
seus praticantes. Num contexto de uma cidade tropical, com média de temperatura anual 
próxima aos 30° C e extremamente mal arborizada, os terreiros muito provavelmente 
exercem uma influência considerável sobre o conforto térmico dos arredores. 
 
O Candomblé ilustra como as relações entre seres humanos e vegetação não se dão 
apenas sob influência de fatores socioeconômicos. Em Salvador um fato acontecido nos 
anos 80 ilustra com vivas cores uma dinâmica cultural mediando um relacionamento 
ambiental entre pessoas e um bosque. O então prefeito da cidade, Renan Baleeiro, 
propôs que o Parque Metropolitano de Pirajá (com área de 1500 hectares e uma bacia 
hidrográfica) fosse parcialmente desmatado e seu solo convertido em moradias para 
cidadãos pobres da proximidade. 
 
O Parque é uma referência nacional para os praticantes do candomblé, área de culto de 
diversos Orixás, como Oxumaré e Oxossi, desde o século XIX. A proposta do prefeito foi 
combatida por intelectuais como Jorge Amado e líderes espirituais do Candomblé, como 
Mãe Menininha do Gantois. Mas o que mais pesou no recuo do prefeito foi a recusa dos 
moradores em se mudarem para solo sagrado, e, assim, desagradarem os Orixás 
(Angeoletto, 2000). 
 
A presença de vegetação nas cidades deve ser analisada também através de outros 
prismas. Árvores frutíferas atraem morcegos e outros animais dispersores de sementes. 
Poderíamos construir elos entre fragmentos florestais separados por cidades, para esses 
 20 
vetores ambientais? Sabemos que a fragmentação de ecossistemas é um dos mais 
importantes causadores de perda de biodiversidade. Poderíamos planejar a arborização 
de uma cidade não apenas para nossos propósitos, mas também para alicerçar dinâmicas 
ambientais? Essas perguntas ainda estão por serem respondidas. 
 
As relações entre pessoas e ambiente não são apenas espaciais, mas também biológicas 
e culturais (Boyden, 1987 in Lawrence, 2003). Cenários humanos e seus processos 
ecológicos não estão circunscritos a limites administrativos, geográficos ou políticos. 
Cidades estão abertas a influências ecológicas (poluição emitida por outras cidades); 
biológicas e antropológicas (fluxos migratórios, por exemplo) (Lawrence, 2003; Odum, 
1988). 
 
Somos primatas, com necessidades biológicas comuns a outros animais. Em cidades 
brasileiras com temperatura média de 20° C, o consumo médio diário de água é de 470 
litros por família. Se a temperatura média é de 30° C, o consumo aumenta para 570 litros 
(Moraes, 2008). 
 
Mas também é verdade que somos um amálgama de biologia e cultura: com temperatura 
média de 25° C, os brasileiros consomem 114 milhões de latas de cerveja por dia. Se a 
temperatura se eleva para 30° C, o consumo cresce para 120 milhões de latas/dia. A cada 
1% de aumento na temperatura atmosférica, o consumo de cerveja cresce 0,28%. As 
indústrias cervejeiras do Brasil investem pesadamente em serviços de previsão 
meteorológica com o fito de aumentar a produção para suprir a demanda de dias mais 
quentes (Mores, 2008). 
 
Os dados acima exemplificam bem nossas complexas relações com o ambiente: dias 
mais quentes demandam mais água, o que se explica pela biologia dos humanos, mas 
dias de mais calor também demandam mais cerveja, um produto cultural, cujo consumo 
obviamente está atrelado a uma cadeia de impactos ambientais negativos muito maior do 
que aquela ligada ao mero consumo de água potável. 
 
Outro complicador no que tange aos estudos de ecossistemas urbanos é a sociobiologia 
humana, definida como as bases biológicas dos comportamentos sociais (Wilson, 1980). 
Refletindo sobre o embate natureza x cultura, Foster (2000) e Pinker (2004) descrevem o 
que denominam de modelo padrão das ciências sociais. De acordo com essa linha de 
 21 
argumentação, somos como páginas em branco ao nascer, e vamos adquirindo 
comportamentos de acordo com os ambientes que freqüentamos. 
 
Seguindo esse raciocínio, poderíamos, por exemplo, concluir que quanto mais renda e 
educação tivessem acesso um grupo de consumidores, menor uso fariam eles de seus 
carros, dada a maior consciência a respeito da gravidade dos problemas causados pelo 
uso dessas máquinas. 
 
O geógrafo Paul Robbins (2001) testou uma hipótese similar à formulada no parágrafo 
anterior. Investigando o uso de fertilizantes químicos e pesticidas em gramados de 
residências da cidade de Columbus, estado de Ohio, EUA, Robbins descobriu que: 67,2% 
dos proprietários com renda anual acima de US$ 75.000,00 usam fertilizantes químicos, 
ao passo que apenas 28,6% daqueles cuja renda anual é de US$ 20.000,00 o fazem. 
 
Em relação à escolaridade, 53,3% dos que aplicam fertilizantes químicos possuem nível 
superior, enquanto que apenas 24,1% possuem apenas o ensino médio ou sequer. 73,3% 
dos usuários de fertilizantes e pesticidas declararam conhecer que esta prática causa 
impactos ambientais negativos. 
 
Para equacionar a dimensão ambiental do uso generalizado desses produtos nos 
gramados norte-americanos, basta citar que, em 1984, mais fertilizantes químicos foram 
aplicados nos gramados norte-americanos do que a Índia aplicou em todas as suas 
plantações de grãos. 
 
A área ocupada por gramados nos Estados Unidos foi calculada em 16 milhões de 
hectares, ultrapassando largamente cultivos de exportação como cevada (5 milhões de 
hectares), algodão (4,5 milhões) e arroz (1,1 milhão). Obviamente, o aumento da área dos 
gramados, e do uso de produtos químicos relacionado, provoca sérios problemas de 
qualidade da água para consumo humano. Aproximadamente 74% dos lares americanos 
usam fertilizantes e pesticidas em seus gramados. São cerca de 70 milhões de moradias 
injetando esses produtos na biosfera (Robbins, 2001). 
 
Dados como os expostos acima exemplificam bem a complexidade dos ecossistemas 
urbanos, cujo “funcionamento” está permeado por dinâmicas sócio-ambientais múltiplas. 
O gerenciamento dos gramados norte-americanos cuja estética é obtida pelo uso de 
toneladas de produtos nocivosao ambiente (incluem-se aí os milhões de litros de gasolina 
 22 
queimados nos cortadores de grama e as emissões poluentes derivadas) e independe, 
como vimos, de uma suposta “consciência ambiental” de cidadãos mais educados. 
 
Ademais, esse mito politicamente correto da “consciência ambiental” paradoxalmente, 
esconde um preconceito contra os mais pobres e com menos educação formal. Por 
dedução, pobres teriam comportamentos ambientais mais inadequados devido ao menor 
acesso à informação. 
 
Obviamente, não somos autômatos expressando comportamentos ditados por genes, 
mas também não somos meramente produto de nossas vivências nos ambientes nos 
quais transitamos. Explicar comportamentos meramente pela genética ou pelo ambiente 
tem o mesmo sentido de se perguntar de onde vem a música: do instrumentista ou de seu 
instrumento. 
 
Na história evolutiva de nossa espécie, tendências comportamentais foram selecionadas, 
porque eram adaptativas. Sendo conciso, temos genes que transcrevem proteínas, às 
quais ativam determinados circuitos neuronais, deflagrando comportamentos, em 
decorrência de características do ambiente. 
O antropólogo Donald Brown listou mais de 200 comportamentos universais (tabela 3), o 
que aponta claramente para uma base genética comum para as diversas culturas 
humanas. A expressão “base genética” usualmente atrai a ira de setores acadêmicos e da 
sociedade civil. Para esses segmentos, é indefensável que nossos comportamentos 
sejam relacionados ao genoma, pois isso poderia municiar idéias e teorias racistas. 
Intelectuais de esquerda, sobretudo marxistas, têm ojeriza ao fato de que não somos 
apenas produtos de nossas influências culturais, mas, ao revés, um amálgama intricado 
de biologia e cultura. Por possuirmos genomas distintos e vivências ambientais únicas, 
jamais seremos iguais, como almejam os marxistas. Cada ser humano, um amálgama, 
cada um com capacidades distintas. 
Em qualquer sociedade haverá os mais e menos inteligentes, os mais extrovertidos, os 
mais capacitados para a política, os mais reflexivos, pendendo para a produção 
intelectual. Inexoravelmente, essas diferenças levarão à desigualdades na apropriação de 
bens e poder. 
 23 
De fato, desigualdades econômicas são universais nas culturas humanas, como aponta 
Brown. Mas a consciência dessas desigualdades, e a ânsia por equidade também o são. 
Por isso desenvolvemos leis, e se somos desiguais em habilidades, deveríamos em tese 
ser iguais perante a lei. 
 
Tabela 3. Comportamentos humanos universais 
Machos dominando a esfera política Cuidados parentais dirigidos às crianças 
Machos mais engajados em coalizões com 
propósitos violentos 
Classificação, classificação de fauna e flora 
Machos mais agressivos Classificação de parentesco, sexo, espaço, 
ferramentas, condições climáticas 
Machos mais propensos ao uso de violência 
letal 
Coalizões 
Machos mais propensos ao roubo Música, mitos, narrativas, poesia 
Machos viajando em média maiores distâncias 
ao longo da vida 
Proibição do homicídio 
Manipulação de relações sociais Estupro; proibição do estupro 
Crença no sobrenatural/religião Preferência pelos filhos e parentes (nepotismo) 
Capacidade de mensurar Estética 
Medicina Planejamento 
Mapas mentais Fofoca 
Cooperação Conflitos; mediação de conflitos 
Alteração do humor ou consciência por 
ingestão de substâncias psicoativas 
Propriedade 
Sentimentos morais Trocas recíprocas de trabalho, bens, serviços e 
favores sexuais 
Reciprocidade negativa (vingança, retaliação) Resistência ao abuso de poder 
Preocupação com a imagem, perante outros Atração sexual 
Diferenças sexuais em cognição espacial e 
comportamento 
Ciúme sexual 
Treino para melhorar habilidades Regulação sexual (incluindo prevenção do 
incesto) 
Status como forma de distinção de outros 
indivíduos 
Desaprovação da avareza 
Desigualdades econômicas Consciência das desigualdades econômicas; 
ânsia por equidade 
Fonte: Brown, 1991; Brown, 2000 
 
Como se percebe, os comportamentos listados por Brown incluem uma mescla 
interessante de atitudes “nobres” (cooperação, por exemplo), com outros eticamente 
questionáveis, como o nepotismo. 
 
Um desses comportamentos, a busca por status, está mais diretamente correlacionada 
com a crise ambiental de nossos dias. O prestígio, seja materializado na forma de bens, 
de poder, de títulos ou honrarias, é evidentemente um trunfo importante ao seu detentor. 
Lhe permite a atração de parceiros, ou bem para propósitos sexuais, ou para a formação 
de coalizões para a conquista de metas. 
 24 
 
De acordo com evidências corroboradas por estudos psicológicos, o bem estar de uma 
pessoa decorre das diferenças entre o que uma pessoa tem, e o que ela quer 
(aspirações), o que as outras pessoas possuem (comparação social), o que a pessoa 
tinha no passado (história), o que ela esperava ter no passado (desapontamentos), o que 
ela espera obter no futuro (esperança), o que ela merece (equidade), e o que ela precisa. 
Quanto maiores forem as lacunas entre aspirações, comparações sociais, equidade e 
necessidades, menor será a sensação de bem estar (Dodds, 1997). 
 
 A humanidade sempre viveu, nas palavras do ecólogo espanhol Juan Pedro Ruiz Sanz, 
uma fuga em direção ao adiante. Nossa história evolutiva nos impulsionou à cooperação. 
Através da cooperação, desenvolvemos um comportamento gregário (ao contrário de 
outras espécies de primatas, como os orangotangos, que são essencialmente solitários), 
o que nos permitiu seguir adiante, e cooptar a biosfera para nossos propósitos. 
 
Na vida social, foram selecionadas tendências comportamentais importantes, como o 
senso de equidade (que, registre-se, não é exclusivo da espécie humana, tendo sido 
detectado através de experimentos etológicos em outras espécies de primatas e em 
cães). Com a primazia absoluta do capitalismo sobre a humanidade, nosso senso de 
equidade, nossa necessidade de prestígio, e as comparações sociais que cotidianamente 
fazemos entre o que temos e o que os outros possuem, nos impelem a consumir. 
 
Em larga medida, os impactos ambientais gerados nos ecossistemas urbanos têm sua 
origem em nossas opções de consumo. E consumir é a forma mais direta de obtermos 
prestígio. Um automóvel não é apenas uma máquina que nos desloca entre distâncias. Se 
assim fosse, não haveria tanta diversidade de modelos e preços. É também um objeto e 
símbolo que conferem prestígio ao seu possuidor. Surveys realizados na Holanda, um 
país com excelentes sistemas de transporte público e redes de ciclovias, indicam que o 
status é o principal motivo para a aquisição de automóveis (Mcclintock, 2000). 
 
Roupas, adornos, viagens, mobília com um design exclusivo (que a distingue, portanto, 
dos móveis mais baratos) uma biblioteca repleta de títulos importados, se você é um 
intelectual. As opções são ilimitadas. 
 
Assim, podemos retomar a discussão sobre os gramados dos subúrbios norte-
americanos, afirmando que: os moradores buscam uma estética para seus quintais; esse 
 25 
padrão rende aos proprietários algum prestígio (ambos, comportamentos universais), 
obtido através da aplicação de toneladas anuais de substâncias nocivas, sobretudo aos 
corpos hídricos do entorno das cidades. 
 
1.4 - Sustentabilidade urbana 
O conhecimento das características ecológicas das cidades é fundamental para a 
sustentabilidade global. Infelizmente essas características são invisíveis às análises 
urbanas convencionais. A maioria dos estudos sobre as cidades está focada em fluxos de 
investimento, geração de renda, taxas de criação de empregos, estatísticas de crimes e 
outrosindicadores socioeconômicos. 
 
Contudo, essas análises econômicas são de tal modo dissociadas da realidade física, que 
não revelam nada sobre fatores estruturais, espaciais, e temporais que influenciam os 
ecossistemas urbanos. O foco dominante na riqueza gerada por cidades “bem sucedidas” 
é absolutamente omisso no que diz respeito às condições dos ecossistemas dos quais se 
retiram os recursos para a geração de riquezas (Rees, 1997). 
 
Para alguns autores, como Rees (1997-b), a expressão “cidades sustentáveis” é apenas 
um oxímoro. Outros, como Chambers (2001) defendem o planejamento como forma de 
torná-las mais sustentáveis. 
 
Para responder à idéia de sustentabilidade, áreas urbanas precisam manter um balanço 
entre atividades econômicas, crescimento populacional, infra-estrutura e serviços, 
poluição, entre outros fatores, de modo a limitar, tanto quanto seja possível, impactos 
ambientais sobre outros ecossistemas (Barredo, et al, 2003). Como reconhecer, 
mensurar, e interpretar problemas urbanos; e como responder a esses problemas será 
determinante para que se alcance a sustentabilidade urbana (UNCHS, 1997). 
 
Por seu caráter heterotrófico, nenhuma cidade pode ser sustentável em um sentido 
absoluto. As cidades não empregam apenas recursos próprios. Logo, para um maior nível 
de sustentabilidade é necessário incluir nas análises do ecossistema urbano os sistemas 
mais amplos, onde se geram os recursos e onde se depositam os resíduos. Em outras 
palavras, em qualquer estratégia de sustentabilidade urbana há que incluir um diagnóstico 
do metabolismo urbano, de suas dependências e dos impactos provocados (Terradas, 
2001). 
 
 26 
A expressão metabolismo urbano ou tecnometabolismo evidentemente é uma metáfora 
(máquinas não respiram ou fotossintetizam). Todavia, é uma metáfora bastante 
adequada: de modo análogo ao que ocorre com seres vivos, temos nas cidades um 
aparato tecnológico vasto (de liquidificadores a máquinas que produzem aviões, bombas 
atômicas, livros, automóveis...). Essas máquinas, essenciais para a manutenção de nosso 
estilo de vida, “consomem” matérias primas e energia, produzindo assim bens de 
consumo e resíduos. 
 
Nas palavras do ecólogo humano Roderick J. Lawrence (2003): 
 
 
A crescente disparidade entre processos biológicos e ecológicos, e entre produtos está relacionado 
ao rápido crescimento de populações urbanas, à criação de muitos produtos sintéticos que não 
podem ser reciclados por processos naturais e pelo aumento do uso de energia não renovável, ou 
renovável em taxas mais altas do que a capacidade de reposição dessas fontes. As conseqüências 
negativas dessas tendências incluem a depleção da camada de ozônio, acúmulo de resíduos, 
aquecimento global e incidência de catástrofes ambientais como enchentes, deslizamentos de 
terra e fome. 
 
 
Índices de mensuração econômica como o Produto Interno Bruto escondem uma 
simplificação bastante grosseira da realidade ambiental, por não calcularem os impactos 
sócio-ambientais da produção de bens. Converter um manguezal em hotel de luxo pode 
elevar o PIB, mas certamente isso trará reflexos negativos para os pescadores locais. 
 
As cidades mais abastadas deveriam compensar impactos causados em outros territórios 
por seus padrões de consumo. E o PIB como medida do vigor de uma economia deveria 
ser substituído por índices que considerassem também os impactos negativos causados 
pela produção econômica. 
 
1.5 - Planejamento de ecossistemas urbanos 
Para Odum (2001), com o crescimento da população humana, a aplicação de princípios 
ecológicos ao planejamento do uso do solo é sem dúvida o labor mais importante das 
ciências ambientais. O uso do solo aumenta dramaticamente na falta de controle sobre o 
desenvolvimento urbano (tabela 4). Como nos adverte o ecólogo, todos sofrem as 
conseqüências da má utilização e degradação do solo, e todos pagam pela sua 
recuperação. 
 
 27 
Se, por exemplo, é permitida a criação de bairros residenciais em planícies sujeitas a 
inundações (mau uso do solo), fatalmente haverá perdas econômicas (e de vidas 
humanas, como tão frequentemente ocorre nas cidades brasileiras durante a estação 
chuvosa). Se, ao revés, tais planícies forem usadas para agricultura, silvicultura e lazer, 
aos impostos será acrescentado valor, e não subtraído (bom uso do solo). Odum lamenta 
o declínio do interesse público pelo planejamento da cidade, resultante da 
sobrevalorização atribuída aos valores econômicos. 
 
Tabela 4 Projeção de aumento da mancha urbana com e sem planificação do uso do solo 
 População de 20.000 
habitantes 
 
110.000 habitantes, 
urbanização 
planificada 
 
110.000 habitantes, 
urbanização não 
planificada 
 
Área Urbana 5263 hectares 12145 hectares 15384 hectares 
Fonte: Odum, 2001 (baseado em estudos de caso de cidades estadunidenses). 
 
Desafortunadamente, planejamento é apenas uma quimera em muitas áreas do planeta. 
Sobretudo, planejamento urbano com um viés ambiental, em áreas de grande 
biodiversidade do 3° mundo (Angeoletto, et al, 2008). Um clichê muito difundido reza que 
não há planejamento nas cidades brasileiras. Esta é apenas uma meia verdade, e como 
tal, prenhe de desinformação. Planejamento há, comumente associado ao crescimento 
urbano dirigido por grandes empreendimentos, como construções de shopping centers, ou 
pelo parcelamento de solo para o surgimento de bairros de classe média. 
 
O que, efetivamente, não há no Brasil, é o podemos definir como uma categoria de 
planificação alicerçada em critérios ambientais. Há várias expressões para defini-lo, 
sendo a mais usual “planejamento ambiental”. Em se tratando de cidades, o termo 
“planejamento ecossistêmico” poderia também ser usado. 
 
Não se trata de mera questão semântica: ecossistêmico remete ao caráter de sistema 
ecológico que as cidades possuem. Podemos definir o planejamento ecossistêmico como 
aquele que considera a ecologia urbana, em suas variadas facetas, como um norteador 
para a execução de políticas que visem diminuir impactos ambientais e aumentar a 
qualidade de vida dos cidadãos. 
 
Nem a ecologia urbana, nem a ecologia geral foram plenamente incorporadas ao 
planejamento urbano e econômico. Por um lado, há uma permeabilidade bastante 
escassa de alguns coletivos profissionais frente à questão ambiental. Mas há que se 
 28 
acrescentar também que contribui para a falta de conhecimento ecológico na planificação 
a insuficiência teórica da ecologia urbana (Terradas, 2001). 
 
A virtual inexistência de planejamento urbano ecossistêmico é, em parte, explicada pela 
falta de informação e conhecimento. Ecossistemas urbanos são pouco estudados. A 
percentagem de artigos sobre ecologia urbana publicados nos principais periódicos 
científicos internacionais sobre ecologia é de meros 0,4% (Collins, 2000, Robbins, 2001). 
Ecossistemas urbanos têm recebido pouca atenção da comunidade acadêmica, 
sobretudo de pesquisadores das ciências sociais e ciências ambientais (Botkin, 
Beveridge, 1997; Zipperer, 1997). 
 
Por outro lado, em grande medida, os planejadores comungam do ideário o qual 
preconiza que as cidades são forjadas principalmente por forças sociais e econômicas, e 
que a natureza desempenha um papel meramente estético, de embelezamento da urbe, 
através da criação de parques e espaços arborizados. Entre esses profissionais persiste a 
crença de que as cidades são a antítese da natureza. Essa crença dominou a forma pela 
qual a cidade é percebida e continua a afetar a forma como ela é construída (Spirn, 1995). 
 
Nas palavras da bióloga Maria Angela Faggin Pereira Leite (1994): 
 
 
As práticas do urbanismo(...) não fazem uso do conjunto de características naturais e sociais 
de um lugar - da natureza desse lugar - para avaliar, selecionar, emitir juízo ou implantar 
concepções de organização urbana, mas parecem procurar perpetuar, numa atitude temerária, 
a reprodução de modelos parciais, generalizantes e dogmáticos, que apesar de reduzir a 
natureza ao urbano, não têm a capacidade de integrar o natural e o construído (...) 
 
 
Usualmente, as cidades estão localizadas em ambientes-chave: próximas de rios, ao 
longo de costas oceânicas, entremeadas a florestas. Portanto, cidades tendem a se 
desenvolver em cenários cruciais para a conservação biológica, o que evidencia a 
urgência de começarmos a projetar cidades menos hostis à vida silvestre. Segundo Baker 
(et al, 2002) o planejamento adequado de cidades é tão importante para a conservação 
quanto a criação de áreas naturais legalmente protegidas. 
 
No que tange às cidades brasileiras, certamente o planejamento urbano ecossistêmico é 
ainda mais importante do que a criação de reservas naturais. Na região metropolitana de 
São Paulo, o desmatamento de áreas de mata atlântica cresceu 810% entre 2000 e 2005. 
Especulação imobiliária e invasão de pobres para construção de favelas são dois fatores 
que explicam a devastação. 
 29 
 
Contudo, a causa mais importante do desmatamento foi a construção de um complexo de 
rodovias (o “rodoanel de São Paulo”), construído para desafogar o trânsito. Questionado 
sobre a destruição de áreas florestais, o secretário municipal de meio ambiente da cidade 
de São Paulo afirmou que o desmatamento causado pela estrada foi autorizado pelos 
órgãos ambientais competentes, e seria recompensado com o replantio de árvores e com 
a criação de quatro parques na cidade (Balazina, 2008). 
 
O raciocínio do secretário de meio ambiente paulistano demonstra a insignificância 
política que os órgãos ambientais brasileiros possuem na esfera do planejamento das 
cidades. Ante o imperativo de se converter mais e mais áreas ambientalmente 
importantes em solo sepultado por concreto, para o deslizar macio de uma frota de 
veículos já saturada e que não para de aumentar, acena-se com a fantasia de replantio de 
árvores e criação de parques. Se as árvores serão ou não plantadas, é irrelevante. 
Centenas de hectares de florestas foram destruídas, e uma floresta é muito mais do que a 
soma das árvores que por ventura venham a ser replantadas. 
 
A criação de parques, como propõe o secretário, têm pouca efetividade, primeiro porque é 
impossível protege-los de impactos humanos como o aquecimento global, ou poluição 
atmosférica. Não se pode murar a atmosfera, estarão cientes as autoridades ambientais 
brasileiras desse fato? 
 
Ademais, existe uma insuficiência crônica de recursos e pessoal qualificado para 
gerenciar essas áreas, o que dá margem a ocorrência de toda sorte de desmatamentos e 
outros impactos. No Brasil, comumente os menores orçamentos são destinados aos 
órgãos ambientais, seja na esfera municipal, estadual ou federal, em governos de 
esquerda ou de direita. 
 
As inter-relações entre as diferentes escalas do planejamento urbano, do quarto à 
moradia; da residência ao quarteirão e à cidade devem ser cuidadosamente 
considerados, no desenvolvimento urbano (Boyden, 1981, in Lawrence, 2003). A maneira 
como damos forma às cidades evidentemente repercute na biosfera. Cidades brasileiras 
como Maringá, descentralizada e altamente dependente do automóvel privado, geram 
impactos ambientais como a uma maior emissão de gases estufa. 
 
 30 
O desenvolvimento das cidades deve abarcar também um planejamento paisagístico 
conseqüente, que vá além da maquiagem cosmética de florezinhas coloridas isoladas no 
mar de concreto das edificações. Um planejamento que permita aos moradores o acesso 
aos benefícios da arborização, ao mesmo tempo que as facilidades de cidades mais 
compactas, incluindo aí uma oferta de equipamentos e produtos culturais (teatro, 
cinemas, música nos bairros, possibilidades de entretenimento paras as diferentes faixas 
etárias) igualmente sejam oferecidas. 
 
Também é importante discutir, novas formas de taxação do uso dos espaços públicos, 
muito embora no Brasil esse seja um tema espinhoso e impopular, dado o fato de que 
nossa carga tributária é uma das mais elevadas do mundo, e os serviços públicos em 
geral são de baixa qualidade. Não obstante, a questão é: quais são os custos ambientais 
embutidos na opção de moradia descentralizada e altamente dependente do automóvel? 
Nos últimos anos têm crescido nas cidades brasileiras o número de condomínios 
residências fechados em áreas anteriormente rurais. 
 
Aqueles que preferem as periferias verdes das cidades brasileiras, representadas por 
condomínios de classe média e alta, que buscam qualidade de vida e a proteção dos 
muros de suas cidadelas, e que pagam por isso, não deveriam também arcar com os 
impactos ambientais de sua opção? Numa situação ideal, a taxação desse modelo 
urbanístico poderia ser utilizada para obras de infra-estrutura básicas nas periferias 
habitadas por aqueles que não estão fugindo da cidade, ao revés, anseiam poder usufruir 
de serviços urbanos que sempre lhes foram negados. 
 
 
 
1.6 - Cidades compactas: desejáveis e mais sustentáveis? 
Existem pelo mundo vários dados que atestam uma realidade perturbadora. O percentual 
de aumento de solo urbano nas cidades (conversão de solo ambientalmente relevante em 
ruas e infra-estrutura de cidades) tem crescido mais do que a população dessas cidades. 
Nos EUA, por exemplo, entre 1982 e 1997 o aumento foi de inaceitáveis 34% (Grove, et al 
2006). Em Barcelona, a ocupação urbana do solo sofreu um incremento de 130% entre 
1973 e 1992, ao passo que a população cresceu apenas 16,7% (Terradas, 2001). 
 
Um estudo comparativo entre 15 cidades européias de vários países revelou que em 
todas as cidades investigadas, a área construída cresceu mais do que a população. Os 
 31 
dados cobrem um intervalo de tempo de 50 anos e revelam inequivocamente uma 
tendência de desenvolvimento de bairros residenciais menos densos (Kasanko, et al, 
2006). Em Palermo, por exemplo, enquanto que a população cresceu 38,1%, a área 
construída cresceu 220%. Deste percentual, 79% destinou-se a áreas residenciais, e 55% 
da urbanização ocorreu sobre áreas agrícolas (tabela 5). 
 
Tabela 5 Tendências de urbanização de cidades européias 
Cidade Crescimento 
Populacional 
Crescimento da 
Área 
Construída 
Crescimento da 
área construída 
residencial 
Urbanização 
em solos 
agrícolas 
Dresden - 9,4% 39% 67% 71% 
Milão 17,4% 75% 53% 100% 
Copenhagen 18,7% 52% 63% 72% 
Porto 23,3% 98% 61% 68% 
Praga 23,4% 50% 58% 83% 
Bruxelas 28,8% 85% 75% 84% 
Lyon 33,8% 75% 62% 86% 
Palermo 38,1% 220% 79% 55% 
Fonte: Kasanko, et al, 2006 
 
 
Embora o planejamento de cidades mais compactas seja uma meta da agenda política da 
União Européia, os esforços governamentais não se traduziram em resultados palpáveis. 
Com exceção de Helsinque e Talinn, nas cidades estudadas, há uma evidente da 
urbanização sobre áreas agrícolas. 
 
O fenômeno ocorre principalmente por três fatores: 1) a maior parte do solo disponível 
para o aumento da área construída é agrícola; 2) em geral solo agrícola é tecnicamente 
mais desejável para construções do que florestas, em termos econômicos e topográficos 
e, 3) áreas naturais são usualmente consideradas pelo valor recreativo, e assim 
protegidas da conversão em solo urbano. Duas tendências explicam a diminuição da 
compactação urbana nas cidades européias estudadas: uma maior preferência por 
residências individuais do quepor blocos de apartamentos, a qual por sua vez redunda e 
mais espaço por habitante (Kasanko, et al, 2006). 
 
Há evidências que cidades compactas influem no comportamento dos moradores, 
fazendo-os caminhar mais, diariamente. Na cidade de Belfast, em bairros de maior 
densidade, onde a distância de um morador para seu vizinho é de 5 m ou menos, a 
probabilidade de que um cidadão se desloque a pé para o trabalho é de 7%, para 
compras, 11%. Em bairros menos densos esses percentuais caem para 2% e 2%, 
 32 
respectivamente. Pessoas residindo em bairros densos tendem a usar mais espaços 
públicos como praças e parques (Cooper, 2001). 
 
Efetivamente, o apoio político e acadêmico à idéia da compactação urbana têm sido 
entusiástico em algumas nações, como o Reino Unido. Haughton (1997), por exemplo, 
defende a cidade compacta como um antídoto à conversão de solo agrícola em solo 
urbano: 
 
Cidades compactas podem conter menos natureza, uma vez que o solo é alocado mais 
parcimoniosamente para a urbanização, mas possivelmente cidades assim gerarão menos 
impactos ambientais externos, ao menos, se reduzirá a tomada de solo agrícola para o 
desenvolvimento urbano. 
 
 
Na Inglaterra, depois de 10 anos de debates entre políticos, militantes ambientalistas e 
empresários do setor imobiliário, foi aprovada uma lei que determina que 60% do 
desenvolvimento de cidades inglesas deve ocorrer dentro de seus limites municipais. Em 
princípio, uma vitória contra a especulação imobiliária desenfreada. Mas os partidários 
dessa solução raramente se perguntam se níveis elevados de adensamento urbano 
podem realmente ser alcançados (Breheny, 1997). 
 
Com a nova legislação inglesa sobre uso do solo, cresceu a urbanização dos chamados 
“brownfield sites”, antigas áreas industriais abandonadas. Mas essa usualmente é uma 
tarefa complicada, pois muitas vezes o nível de poluição do solo local é alto, e esses 
espaços estão localizados em pontos pouco atrativos, e reurbanizá-los demanda um 
volume bastante elevado de investimentos públicos (Breheny, 1997). 
 
Cidades compactas significam maior densidade populacional. Criar mais moradias em 
menor área, através, por exemplo, de conjuntos de apartamentos, não é uma tarefa 
complexa, do ponto de vista de engenharia. Mas acomodar pessoas, animais com 
necessidades biológicas, sociais e culturais diversas, seguramente é muito mais 
complicado. 
 
Surveys realizados nas principais cidades da Inglaterra atestam que, em se levando em 
consideração a opinião dos entrevistados, a compactação é uma solução profundamente 
impopular. Quanto mais compacto o bairro, menor é nível de satisfação com a moradia 
(tabela 6). Em áreas de baixa densidade (menos de 5 pessoas/ha), 68% dos 
entrevistados estão muito satisfeitos com o entorno. Ao revés, em áreas de alta 
 33 
densidade (40 pessoas/ha ou mais) apenas 37% estavam muito satisfeito com o bairro 
(Breheny, 1997). 
 
Seres humanos não possuem apenas uma história social, mas também uma história 
natural. A maior parte de nossa evolução aconteceu em espaços abertos, próximos a 
recursos como fontes de água, árvores frutíferas, sítios de caça. Elementos naturais em 
paisagens urbanas são obviamente apreciados, inclusive porque trazem diversidade 
visual, quebrando a monotonia do concreto. Para 64% dos entrevistados nos surveys 
ingleses, uma casa com quintal é considerada muito importante, percentual que sobe para 
80% no caso de famílias com crianças. 
 
Por outro lado, embora “flats” de um quarto em bairros compactos sejam extremamente 
impopulares entre os jovens, eles têm a preferência de 55% de moradores idosos e que 
vivam sós (Breheny, 1997). A preferência dos idosos por esse tipo de moradia é 
facilmente explicável. Espaços menores requerem menos manutenção, os flats são mais 
seguros do que casas e facilidades como farmácias e mercados estão mais próximos. 
 
Essas estatísticas demonstram um claro conflito entre os defensores de um maior 
adensamento urbano e os cidadãos, claramente inclinados a viver em espaços menos 
densos e mais descentralizados. Medidas de compactação urbana são bem-vindas, mas 
militantes ambientalistas, planejadores e políticos precisam ter em mente nossa condição 
animal. Não somos pombas, cuja evolução se deu em paredões rochosos, uma paisagem 
similar aos muros contínuos formados pelos edifícios das metrópoles (o que explica em 
parte porque elas, as pombas, se adaptaram bem aos ecossistemas urbanos). 
 
Somos primatas, uma espécie social de comportamento gregário. Precisamos de algum 
nível de adensamento, mas também são necessárias paisagens que nos ofereçam 
diversidade visual, que despertem a curiosidade intrínseca aos primatas. É perfeitamente 
compreensível que pais desejem casas com quintais para filhos que estão descobrindo o 
mundo. Evidências neurológicas indicam que crianças expostas a ambientes 
sensorialmente mais ricos apresentam um desenvolvimento cognitivo maior do que 
crianças confinadas em apartamentos (Ehrlich, 1974). 
 
Como é freqüente entre militantes ambientalistas, uma idéia transforma-se em panacéia. 
A realidade nos aponta um outro caminho: os méritos das cidades compactas são 
 34 
evidentes, mas a urbanização nesses termos deve ser submetida previamente a uma 
discussão desapaixonada de prós e contras. 
 
Não é possível, sem estudos similares, apontar que a preferência dos ingleses por 
residências em bairros menos adensados seja universal. Mas sem dúvida é uma hipótese 
interessante e bastante plausível. Quanto aos brasileiros, o que preferem? O que levam 
em conta as famílias ao decidir entre uma moradia adensada (apartamento) e uma que 
requer mais solo (casas com quintais)? São perguntas que cabem aos ecólogos urbanos 
responder. No Brasil, provavelmente a violência urbana generalizada seja um fator 
correlacionado positivamente à escolha por apartamentos. 
 
O impacto maior não está embutido em algum nível de descentralização, mas na 
expansão regulada por apetites mais e mais intensos por lucro imobiliário, aliada a usual 
conivência de gestores públicos com o surgimento de bairros cada vez mais afastados, 
enquanto que, nas cidades brasileiras, muitas vezes vazios urbanos não são ocupados. 
 
Na cidade de Sarandi, por exemplo, com a conivência dos poderes públicos, muitos 
bairros surgiram nos extremos do município, com escassez de infra-estrutura e serviços 
(poucas opções de transporte coletivo, por exemplo), a despeito de uma abundância de 
solo disponível (vazios urbanos) em áreas mais estruturadas (figura 1). 
 
Tabela 6 Satisfação com a moradia em cidades inglesas 
 Muito 
satisfeito 
(%) 
Medianamente 
satisfeito 
Neutro Medianamente 
insatisfeitos 
Muito 
insatisfeitos 
Centro da 
Cidade 
46% 38% 3% 8% 5% 
Áreas 
residenciais 
54% 36% 3% 5% 2% 
Residências 
Rurais 
64% 29% 3% 3% 1% 
Fonte: Breheny (1997) 
 
 
 
 35 
 
Figura 1. Vazios urbanos da cidade de Sarandi (em vermelho) 
 
 
No Brasil, as cidades difusas são e serão tendência predominante. Logo, urge que a 
voracidade do mercado seja regulada pelo planejamento e pela oposição organizada da 
sociedade civil contra abusos. Ao seu talante, o mercado optará por um urbanismo 
padronizado, menos custoso, ambientalmente pobre, visualmente desinteressante, 
sempre aliado a desperdícios de solo. Como acertadamente se referiu Terradas (2001), a 
essas questões, algum planejamento, mesmo sujeito a equívocos, é melhor que nenhum. 
 
Revistas científicas conceituadas como a Cities, Landscape and Urban Planning e Urban 
Ecology costumeiramente publicam artigos de autores favoráveis à compactação urbana.Para seus defensores, a expressão “cidade compacta” é praticamente um sinônimo de 
cidade sustentável. Mas esse ideário de planificação também tem críticos bastante 
incisivos. 
 
Para Michael Neuman (2005), a literatura sobre cidades compactas é deficiente de dois 
modos. Primeiro porque não há uma definição consensual sobre a expressão “cidades 
 36 
compactas”, a despeito do seu emprego corriqueiro. Ademais, segundo este autor, pouca 
evidencia suporta a hipótese que as cidades compactas sejam mais sustentáveis. 
 
Outro aspecto problemático das análises sobre cidades compactas é que elas usualmente 
estão focadas em um único aspecto: densidade populacional. Uma única variável 
norteando estudos de uma entidade tão complexa quanto uma cidade, o que empobrece 
as investigações. 
 
A questão correta, segundo Neuman (2005), não é a respeito da suposta maior 
sustentabilidade das cidades compactas, mas que processos fazem as cidades mais ou 
menos sustentáveis. Usando de uma metáfora o autor afirma que não faz sentido 
perguntar se um corpo (a cidade) é sustentável, mas ao invés, se questionar se o ser que 
habita esse corpo (a população) vive de modo sustentável. 
 
Os defensores da compactação urbana afirmam que essa medida diminui a circulação de 
veículos, e, portanto, a emissão de poluição. Certamente, a questão do transporte é um 
fator imprescindível a ser examinado e planejado se o objetivo é alcançar ecossistemas 
urbanos que perturbem menos a biosfera. 
 
As viagens intra-urbanas têm crescido velozmente nas últimas décadas. No Reino Unido, 
por exemplo, o aumento, entre 1952 e 1996 foi de 227%, sendo a maior parte desse 
crescimento atribuído a deslocamentos feitos por automóveis particulares. As distâncias 
percorridas por automóveis em 1996 eram em média 10 vezes maiores do que aquelas 
percorridas em 1952 (Cooper, 2001). 
 
Entretanto, estudos realizados por Breheny, Burton e Jenks (2000, in Neuman, 2005) 
apontam que cidades mais densas podem reduzir deslocamentos curtos para atividades 
locais, mas que deslocamentos mais longos visando empregos especializados, consumo 
sofisticado ou formas de lazer não encontradas nos núcleos urbanos são independentes 
da densidade urbana. Os autores concluem que o crescimento do número de proprietários 
de automóveis, viagens aéreas de fim de semana, viagens a negócios e padrões de vida 
crescentemente dispersos tornam inúteis os esforços de racionalizar os deslocamentos 
através do design urbano. 
 
 37 
Bouwman (2000, in Neuman, 2005) em investigação de cidades holandesas concluiu que 
a média de uso individual de energia para transporte diferiu apenas 5% em diferentes 
cenários urbanos (tabela 7). 
 
 
Tabela 7 Uso médio de energia em distintos cenários espaciais de cidades da Holanda 
Densidade Urbana Uso médio de energia por pessoa (MJ/dia) 
Muito fortemente urbanizado 50,9 
Fortemente urbanizado 54,5 
Urbanizado 54,5 
Fracamente urbanizado 48,4 
Rural 51 
Fonte: Neuman (2005) 
 
 
De acordo com Hall (2001, in Neuman, 2005), que fez uma apurada revisão de estudos 
relacionando compactação à diminuição do consumo de petróleo, em âmbito mundial, 
deslocamentos urbanos estão muito mais ligados aos preços de combustíveis e a renda 
do que a densidade populacional. 
 
Para Terradas (2001), a discussão em torno de cidades compactas ou difusas está 
ultrapassada. Este autor prefere a expressão Cidades Intensas, para se referir a cidades 
que, independentemente de sua maior ou menor compactação, possuem padrões de 
consumo que implicam num tecnometabolismo elevado, com conseqüências ambientais 
globais. 
 
1.7 - Sobre a pesquisa em ecologia urbana 
Usualmente, ecólogos encaram seres humanos meramente como fatores de perturbação 
e as cidades como ambientes extremos e indesejáveis. Contudo, seria mais efetivo 
reconceitualizar a teoria para melhor explicar as cidades desde um ponto de vista 
ecológico. 
 
A conversão de áreas prístinas, estudadas a partir de modelos conceituais tradicionais, 
em solo urbano, requer uma evidente apreciação do papel dos seres humanos nesse 
processo. Por exemplo, nos EUA embora a população venha crescendo relativamente 
devagar, a proporção de população habitando solo urbano, bem como o avanço do solo 
urbano tem aumentado dramaticamente. A respeito dessas tendências, ecólogos em geral 
evitam focar estudos em áreas urbanas (Picket, et al, 1994). 
 
 38 
Mesmo a literatura técnica trata a ecologia urbana sobretudo como a ecologia de espécies 
não humanas habitando as cidades. Certamente há muito interesse científico no estudo 
das espécies que conseguiram se adaptar às cidades. Entretanto, é chegado o momento 
para que os ecólogos submetam sua própria espécie às mesmas análises que foram 
reservadas a outros organismos com os quais dividimos o planeta. Humanos criam 
cidades, logo, são a espécie-chave em ecossistemas urbanos, dominantes em termos de 
fluxo de energia e biomassa animal (Rees, 1997). 
 
Ecossistemas urbanos podem ser estudados sob dois enfoques. Por um viés 
ecossistêmico, se estudam fluxos de matéria e energia, priorizando-se a magnitude e 
controle de fluxos de nutrientes, toxinas, resíduos e energia nos sistemas. 
 
A segunda abordagem metodológica é focada nas partes do mosaico urbano. A geração 
do mosaico, via interação e performance dos organismos, ou pela interação e 
comportamento dos vários segmentos sociais e instituições. Para este paradigma, 
interessa compreender as causas, estruturas e mudanças de padrões espaciais, e os 
processos que são afetados pelas dinâmicas espaciais. A pesquisa em ecologia urbana 
pode combinar essas duas abordagens, gerando mais conhecimento (PIckett, et al, 1997.) 
 
A lacuna de conhecimentos sobre ecologia urbana: 1) priva a ecologia básica do 
entendimento da mais disseminada e extremada forma de intervenção humana sobre a 
biosfera; 2) impossibilita à ecologia aplicada o acesso a opções de gestão nos núcleos 
urbanos; 3) limita a capacidade de prover aos cidadãos mais qualidade de vida, saúde e 
bem estar. Processos sociais, culturais, e econômicos devem ser relacionados com 
processos biológicos e físicos, num esforço de compreensão de áreas urbanas como 
sistemas integrados (Pickett, 1997). 
 
A ecologia urbana necessita de conceitos integrados, para os ecossistemas urbanos, 
capazes de satisfazer cientistas humanos e naturais. A questão é: como adicionar 
humanos aos modelos ecológicos usados para entender ecossistemas urbanos? O 
conceito de ecossistema pode ser usado como base conceitual, mas atributos sociais 
específicos de seres humanos precisam ser adicionados. Conhecimentos e retro-
alimentação entre os componentes naturais e humanos dos ecossistemas urbanos são 
atributos fundamentais para o surgimento de modelos de estudo integrados (Pickett, et al, 
1997). 
 
 39 
No que tange à ecologia urbana, algumas questões têm emergido e precisam ser 
respondidas. Entre elas: “qual é a ligação entre câmbios sociais (mudanças na renda ou 
porcentagem de pessoas empregadas em um bairro) e características ambientais desse 
espaço (estrutura da vegetação, erosão do solo, qualidade do ar, etc)”. E ainda: quais são 
as relações entre os diferentes tipos de uso do solo (agrícola, residencial) e a extensão, 
distribuição, estrutura, diversidade de espécies, e taxas de regeneração, crescimento e 
mortalidade da vegetação em dado período de tempo? (Grove e Burch, 1997). 
 
Também Grimm (et al, 2004) destaca a escassez de estudos sobre ecossistemas 
urbanos, todavia evidenciando que esses sistemas possuem uma “vantagem” em relação 
aos demais. Geralmente, em áreas urbanas,há uma abundância de dados coletados por 
numerosas agências, embora não sob um paradigma ecológico. 
 
Essa riqueza de dados é tremendamente importante, e deve ser analisada a partir de um 
quadro conceitual sócio-ecológico. É impossível promover estudos sobre ecossistemas 
urbanos sem a inclusão de variáveis sociais, além das variáveis ambientais. (Picket et al, 
2004). A inclusão de variáveis de outros campos científicos nos leva seguinte questão: em 
que extensão e de que maneiras os padrões e processos em curso nos sistemas urbanos, 
para que sejam compreendidos, requerem câmbios na teoria ecológica tradicional? 
 
 
Para Niemela (1999), os processos que ocorrem em outros ecossistemas também 
acontecem nos sistemas ecológicos urbanos. Portanto, não haveria necessidade de uma 
teoria distinta para a ecologia urbana. As teorias da biogeografia de ilhas, da 
metapopulação e a hipótese da perturbação intermédia seriam suficientes para estudos 
ecológicos em cenários urbanos. 
 
Por exemplo, Klausnitzer (in Niemela, 1999) descreve vários exemplos de uma correlação 
positiva entre a riqueza de espécies e a área da parcela urbana estudada, como prevê a 
teoria biogeográfica de ilhas, isto é, aumento do número de espécies proporcional ao 
aumento das áreas estudadas. 
 
Para estudos ecológicos nas cidades as teorias citadas por Niemela certamente são de 
grande validade. Mas se o foco é a ecologia das cidades, ecossistemas dominados por 
primatas complexos, onde dinâmicas ambientais estão inexoravelmente inter-relacionadas 
a dinâmicas socioeconômicas, políticas e culturais, os resultados das investigações nem 
sempre estarão em consonância com as teorias. 
 40 
 
Por exemplo, em nossa pesquisa sobre a vegetação de quintais da cidade de Sarandi 
(relatada no capítulo 2), encontramos uma maior riqueza de espécies em um bairro cuja 
área média dos quintais era de pouco mais de 100 m2, e a menor riqueza, no bairro cujos 
quintais tinham área de 264 m2 em média. 
 
Adicionar ou não humanos ao estudo de ecossistemas é na verdade uma questão 
irrelevante. De fato, a influência humana se estende por toda a biosfera, e quiçá sequer 
exista um ecossistema realmente prístino, a salvo de alguma influência humana (poluição 
ou introdução de espécies exóticas, por exemplo). Por outro lado, simplesmente introduzir 
humanos como organismos componentes dos ecossistemas e estudá-los meramente a 
partir de características como sua densidade populacional não é incorreto, mas, 
certamente, inadequado. Tal enfoque é pobre, porque desconsidera nossas 
características sociais e culturais (Picket, et al, 1997). 
 
A respeito dos ecossistemas urbanos, é fundamental examinar como dinâmicas biológicas 
e mecanismos de alocação social tais como intercâmbios econômicos, autoridade, 
tradições, e conhecimento afetam a distribuição de recursos como energia, materiais, 
nutrientes, população, informação genética e não genética, trabalho, capital, 
organizações, crenças e mitos (May, 2004). 
 
Somos criaturas sociais com muitas capacidades de manipulação do ambiente e 
adaptação por aprendizagem. Erigimos instituições com enormes subsídios energéticos 
que nos permitem uma vasta alteração da natureza. Essas características humanas, 
geralmente estudadas por sociólogos, precisam ser levadas em conta para a 
compreensão dos ecossistemas urbanos (Pickett, et al, 1997). 
 
Dada a presença e impactos dos humanos não apenas em ecossistemas urbanos, mas 
em toda a biosfera, necessitamos de uma mudança de mentalidades. E os ecossistemas 
urbanos, devido às evidentes influências de pessoas, instituições e ambiente construído, 
são os melhores laboratórios para se examinar possíveis refinamentos da teoria ecológica 
(Grimm et al, 2004). 
 
Todas as espécies sociais são caracterizadas por possuírem vários níveis de padrões e 
processos de diferenciação social (Wilson, 1980). O conceito de diferenciação social é 
importante para compor abordagens metodológicas de estudos de ecossistemas urbanos 
 41 
porque esse fator afeta a alocação de recursos críticos (naturais, socioeconômicos e 
culturais). Deste modo, não se pode compreender a composição de fauna ou flora de 
uma área urbana sem se conhecer a composição social desse espaço (Grove e Burch, 
1997). 
 
Processos e padrões no comportamento de populações urbanas estão profundamente 
ligados a pressões diretas pela exploração de recursos naturais, respondendo, direta ou 
indiretamente, por impactos como poluição atmosférica ou introdução de espécies 
exóticas nocivas. Tais ligações são outra forte motivação para a integração das ciências 
sociais e ambientais em práticas de gestão dos ecossistemas urbanos. 
 
Para se compreender as mudanças que nós perpetramos na paisagem, é necessário 
recorrermos à sociologia. Há uma hierarquia opera nas sociedades humanas: renda, 
conhecimento, status, território, e poder. Alguns grupos têm mais acesso a esses 
recursos do que outros, o que provoca uma diferenciação espacial conspícua. Tal como 
os mosaicos naturais afetam a geração, fluxo e concentração de recursos em uma dada 
região, o mesmo ocorre com os ecossistemas urbanos. 
 
Entretanto, uma confusão comum entre pesquisadores das ciências naturais que não 
estudam pessoas ou outras espécies sociais é a afirmação de que mensurações de 
comunidades humanas são muito difíceis ou mesmo impossíveis. Na verdade as 
dificuldades estão ligadas mais à complexidade das questões levantadas do que aos 
fenômenos mensurados. Muitos estudos de ecossistemas não humanos possuem 
questões teóricas que requerem apenas medições simples, elementares, e nos 
ecossistemas humanos, frequentemente dados diversos possuem acurácia elevada, e 
revelam facetas importantes desses ecossistemas. (Grove e Burch, 1997).

Continue navegando