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UNINA Licenciatura em Pedagogia Karoline Teixeira Rocha A EXPERIÊNCIA DE ANGICOS E O LEGADO DE PAULO FREIRE Óleo / 2025 A EXPERIÊNCIA DE ANGICOS E O LEGADO DE PAULO FREIRE A experiência de Angicos, realizada em 1963 no Rio Grande do Norte, é considerada um marco histórico na educação brasileira e mundial. Desenvolvida sob a orientação de Paulo Freire, essa iniciativa buscou alfabetizar adultos em apenas quarenta horas, utilizando um método que se diferenciava radicalmente das práticas tradicionais de ensino. Em um contexto de profundas desigualdades sociais e de altos índices de analfabetismo, especialmente no Nordeste, a proposta representava uma possibilidade concreta de democratizar o acesso ao saber e de transformar a relação entre sujeitos e conhecimento. O Brasil vivia, naquele período, um cenário de instabilidade política e de intensas demandas sociais. O governo de João Goulart buscava implementar reformas de base, entre elas a educacional, em um ambiente marcado pela polarização ideológica. Nesse contexto, a alfabetização de adultos ganhava centralidade, não apenas como resposta a uma carência social, mas também como um ato político. Em Angicos, as aulas foram organizadas em círculos de cultura, com metodologias que priorizavam o diálogo, a troca de experiências e a valorização dos saberes prévios dos alfabetizandos. As chamadas 'palavras geradoras', extraídas do vocabulário cotidiano dos participantes, possibilitavam que o processo de leitura e escrita fosse com base na realidade vivida, ao mesmo tempo em que despertavam reflexões críticas sobre o mundo. O uso de imagens e fichas ilustrativas reforçava esse vínculo entre palavra e experiência concreta, tornando o aprendizado mais significativo. A experiência, contudo, não se limitou ao campo pedagógico. O êxito de Angicos atraiu atenção nacional e internacional, inspirando a criação do Programa Nacional de Alfabetização. Entretanto, setores conservadores, sobretudo ligados ao latifúndio e ao regime militar que se instalaria em 1964, enxergaram o método como uma ameaça, por estimular a consciência crítica dos trabalhadores. Como consequência, Paulo Freire foi preso e exilado, e seus projetos interrompidos pelo regime autoritário. Assim, a experiência de Angicos tornou-se não apenas um símbolo de inovação pedagógica, mas também de resistência e de luta pela democratização da educação. O legado de Paulo Freire permanece vivo. Sua concepção de educação como prática de liberdade continua a inspirar projetos de alfabetização de jovens e adultos e movimentos de educação popular. Em um cenário atual marcado por desigualdades, padronizações curriculares e desafios sociais persistentes, suas ideias sobre o diálogo, valorização da cultura dos educandos e articulação entre educação e transformação social mostram-se ainda mais relevantes. Portanto, a experiência de Angicos não deve ser vista apenas como um episódio histórico isolado, mas como parte de um processo de construção de uma pedagogia crítica que continua a desafiar educadores e gestores a repensarem suas práticas. O exemplo de Paulo Freire, ainda hoje, nos convoca a fazer da educação um espaço de esperança e de transformação, reafirmando o direito de todos à leitura, à escrita e à cidadania plena. Referências CARVALHO, Vicente Vitoriano Marques. As imagens no “Método Paulo Freire” na experiência de Angicos (RN) – 1963. Revista Educação em Questão, 2004. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1968. STRECK, Danilo R. Ecos de Angicos: temas freireanos e a pedagogia atual. Pro-Posições, Campinas, v. 25, n. 1, p. 65-80, 2014. Instituto Paulo Freire. Cronologia – 50 Anos de Angicos e do Programa Nacional de Alfabetização. Disponível em: . IFCE. Livro resgata memória da 1ª turma de Paulo Freire em Angicos. Disponível em: .