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A usucapião pró-família e a culpa pelo abandono do lar

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65
UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
MARINA CASAGRANDE CARIONI
A USUCAPIÃO PRÓ-FAMÍLIA E A CULPA PELO ABANDONO DO LAR
Florianópolis	
2016
MARINA CASAGRANDE CARIONI
A USUCAPIÃO PRÓ-FAMÍLIA E A CULPA PELO ABANDONO DO LAR
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientadora: Prof. Deisi Cristini Schveitzer, MSc.
Florianópolis
2016
Dedico a meus pais, Rodrigo Carioni e Denise Casagrande Carioni e a minha irmã Ana Carolina Casagrande Carioni.
agradecimentos
A meus pais pelo carinho e amor proporcionados por toda a vida.
A minha orientadora Deisi Cristini Schveitzer, pelos ensinamentos, compreensão e dedicação.
“Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” (Antoine de Saint-Exupéry).
resumo
O presente trabalho monográfico teve como objetivo o estudo dos requisitos da usucapião pró-família, modalidade instituída pela Lei nº 12.424 de 16 de junho de 2011 e inserida no art. 1.240-A do Código Civil de 2002, e a culpa pelo abandono do lar. Inicialmente, foram abordados os aspectos relevantes dos institutos da posse, como as teorias, o conceito, a classificação e seus efeitos, seguidos dos aspectos relevantes da propriedade, destacando-se o conceito, os elementos, as principais características, a função social e as formas de aquisição da propriedade móvel e imóvel. Em seguida, tratou-se dos aspectos relevantes da usucapião, discorrendo sobre o conceito, os fundamentos, os pressupostos, a usucapião de bens públicos e as modalidades do instituto. Finalmente, abordou-se a usucapião pró-família, tema central da monografia, como os aspectos do art. 1.240-A do CC/2002, os principais requisitos, a competência para julgar e processar, e a culpa pelo abandono do lar, questão extinta pela Emenda Constitucional nº 66 de 2010. O estudo foi elaborado através de pesquisa documental e bibliográfica, método de abordagem dedutivo e exploratório.
Palavras-chave: Posse. Propriedade. Usucapião. Usucapião pró-família.
sumário
1	introdução	12
2	ASPECTOS RELEVANTES DOS INSTITUTOS DA POSSE E DA PROPRIEDADE	13
2.1	POSSE	13
2.1.1	Teorias da posse e o conceito	13
2.1.2	Classificação da posse	16
2.1.3	Efeitos da posse	18
2.2	Propriedade	20
2.2.1	Conceito e elementos da propriedade	21
2.2.2	Principais características	22
2.2.3	Função social da propriedade	23
2.2.4	Formas de aquisição da propriedade móvel	24
2.2.5	Formas de aquisição da propriedade imóvel	26
3	aspectos relevantes da USUCAPIÃO	28
3.1	Conceito e fundamentos	28
3.2	Pressupostos	29
3.3	A (IM)possibilidade de Usucapião de bens públicos	30
3.4	Modalidades de usucapião de bens imóveis	32
3.4.1	Usucapião extraordinária	32
3.4.2	Usucapião ordinária	34
3.4.3	Usucapião especial rural	35
3.4.4	Usucapião especial urbana	37
3.4.5	Usucapião especial urbana coletiva	38
3.4.6	Usucapião indígena	39
3.4.7	Usucapião imobiliária administrativa	40
3.4.8	Ação de Usucapião no Novo Código de Processo Civil	41
4	A USUCAPIÃO PRÓ-FAMÍLIA	44
4.1	Os aspectos DO ART. 1.240-A DO CÓDIGO CIVIL DE 2002	44
4.2	OS PRINCIPAIS REQUISITOS da usucapião pró-família	45
4.2.1	Imóvel urbano de área não superior a 250 m²	46
4.2.2	Imóvel único de propriedade dos ex-cônjuges ou ex-companheiros	47
4.2.3	Prazo de dois anos	49
4.2.4	Benefício concedido uma única vez	50
4.3	da competência para julgar e do processamento	51
4.4	A CULPA PELO ABANDONO DO LAR	52
5	conclusão	57
REFERÊNCIAS	59
1
introdução
A presente monografia é direcionada à matéria de Direito Civil, mais especificamente, Direito das Coisas, localizado no Livro III do Código Civil Brasileiro de 2002, e tem como tema principal a aquisição de propriedade imóvel através da usucapião pró-família.
A Lei nº 12.424, de 16 de junho de 2011, criou a modalidade da usucapião pró-família, a qual acrescentou o art. 1.240-A no Código Civil de 2002, possibilitando ao residente que permaneceu no imóvel postular sua propriedade integral após dois anos do abandono do lar pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro.
A usucapião pró-família viabilizou a regularização da propriedade nos casos de término de sociedade conjugal em que o ex-cônjuge ou ex-companheiro deixa de prover com as necessidades da família e do imóvel. 
No entanto, essa nova modalidade, que visa proteger a pessoa que foi abandonada e permaneceu no imóvel, reintroduziu ao Direito Civil Brasileiro a discussão do elemento culpa no fim do relacionamento, questão já dominada pela jurisprudência.
Assim, tem-se o seguinte problema: quais os requisitos legais e entendimentos jurisprudenciais sobre a usucapião pró-família?
Para a elaboração desta monografia foi utilizado o método de abordagem dedutivo que partirá de uma premissa geral, um modelo extremamente genérico, para uma premissa especifica, que é identificar os requisitos da usucapião pró-família. O tipo de pesquisa aplicado foi o exploratório, a partir do estudo de legislações, livros, artigos científicos, jurisprudências dos Tribunais e enunciados das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. Para tanto, adotou-se a técnica de pesquisa documental e bibliográfica, empregando-se para isso a legislação vigente e as doutrinas referentes ao tema em estudo.
Este trabalho é composto por cinco capítulos, em que inicialmente tem-se a introdução, permitindo a apresentação do tema objeto de estudo. O segundo capítulo abordará os aspectos relevantes da posse e da propriedade. No terceiro capítulo, estarão dispostas as modalidades de usucapião. No quarto capítulo serão analisados os requisitos da usucapião pró-família. Por fim, o quinto capítulo trará a conclusão acerca do tema estudado.
ASPECTOS RELEVANTES DOS INSTITUTOS DA POSSE E DA PROPRIEDADE
O presente capítulo abordará os institutos da posse e a propriedade. Com relação à posse, serão analisadas as teorias que exprimem a sua definição, classificação, natureza jurídica e seus efeitos. Quanto ao instituto da propriedade, o conceito e atribuições, características, função social e, por fim, as modalidades de sua aquisição.
POSSE
A relevância do estudo da posse para esta monografia é justamente por ser um requisito presente em todas as modalidades da usucapião. Por ora, serão abordadas as teorias, o conceito, a classificação e os efeitos.
Teorias da posse e o conceito
Entre as teorias que conceituam o instituto da posse, destacam-se a teoria subjetiva, idealizada por Friedrich Karl Von Savigny, e a teoria objetiva, que tem como propugnador Rudolf Von Ihering.[1: Em 1803, aos 24 anos de idade, Friedrich Karl Von Savigny elaborou a sua monografia Recht dês Besitzes, o Tratado da Posse. (FARIAS; ROSENVALD, 2013).][2: “A teoria objetiva, de Von Ihering, foi por ele próprio exposta, em termos simplificados, após ter sido desenvolvida, com maior fôlego, em outras obras de notável repercussão, que trouxeram novas luzes à compreensão do fenômeno da posse.” (GOMES, 2012).]
Savigny entendeu que a posse é caracterizada pela união de dois elementos, o corpus e o animus. O primeiro elemento é objetivo, que representa a detenção física sobre a coisa, enquanto o segundo é o elemento subjetivo, que se traduz pela intenção de possuir a coisa e sobre ela exercer o direito como se proprietário fosse. (GONÇALVES, 2014).
Com as mutações ocorridas na teoria subjetiva, o corpus passou a não consistir somente no contato físico, direto e permanente com a coisa, mas também na possibilidade de exercer contato, tendo a coisa sempre à disposição. O mesmo ocorreu com o animus, que dizia respeito apenas ao domínio, mas que passou a abranger os direitos reais, a fim de dar possibilidade de posse sobre as coisas incorpóreas. (MONTEIRO;MALUF, 2012).
A presença dos dois elementos é indispensável para a caracterização da posse, uma vez que, inexistente o corpus, não há relação de fato entre a pessoa e a coisa, e se inexistente o animus, não existirá a posse, mas sim a mera detenção. (RODRIGUES, 2009).
O detentor ou fâmulo da posse, como é conhecido, possui a coisa em nome alheio, em virtude de situação de dependência econômica ou de vínculo de subordinação com a outra pessoa. A mera detenção é a posse natural, que não gera a possibilidade de invocar a proteção possessória, pois afastado o elemento econômico da posse. (DINIZ, 2012).
O conceito de detentor é previsto no art. 1.198 do Código Civil de 2002:
Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário. (BRASIL, 2002).
Quanto à detenção, o Enunciado nº 493, aprovado na V Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, entendeu que o detentor do bem pode defender a posse alheia exercendo a autodefesa. (BRASIL, 2011). E ainda, o Enunciado nº 301 da IV Jornada de Direito Civil complementa que, não existindo mais relação de subordinação, é possível a conversão da detenção em posse. (BRASIL, 2006).[3: Os Enunciados são aprovados nas Jornadas de Direito Civil, realizadas pelo Conselho de Justiça Federal (CJF) e pelo Centro de Estudos Jurídicos do CJF, onde especialistas e convidados elaboram estes enunciados para dar à lei uma melhor interpretação de seus dispositivos. (SALOMÃO, 2006).]
Na teoria subjetiva de Savigny, o elemento animus é o que distingue o possuidor do detentor, uma vez que o elemento corpus, aos olhos de outrem, aparenta uma relação idêntica entre possuidor e detentor com a coisa. (VENOSA, 2014). 
Em contrapartida, Ihering concluiu que somente a presença do elemento corpus é suficiente para definir a posse. Para ele, corpus, além de ser o poder físico sobre a coisa, também consiste no interesse do possuidor em utilizar-se economicamente da coisa. A intenção de ter a coisa para si ou a comprovação da vontade de possuir independem neste caso. (RIZZARDO, 2014).
O teórico não entendeu que a vontade (animus) deve ser excluída, mas que este elemento está implícito no poder sobre a coisa (corpus), uma vez que ambos os elementos são vinculados e inseparáveis. (MALUF; MONTEIRO, 2012). 
Com efeito, Carnacchioni (2014, p. 25) ao comparar as duas teorias instrui que “a teoria objetiva incorporou o animus ao corpus, ao contrário da teoria subjetiva, que dissocia e analisa os dois elementos em separado.”
A posse não significa a mera detenção da coisa, mas é evidenciada pela ação do possuidor que age como se proprietário fosse, diante da função econômica da coisa, exteriorizando-se o animus. (RODRIGUES, 2003).
O ordenamento jurídico brasileiro desde o CC/1916, no art. 485, adotou a teoria objetiva, sendo que em uma interpretação do art. 1.196 do CC/2002, que define a figura do possuidor, é possível atribuir o conceito de posse como sendo o exercício de fato, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. (BRASIL, 2002). Estes poderes, estabelecidos no art. 1.228 do CC/2002, são o de usar, gozar, dispor e reaver, e que serão posteriormente analisados. (BRASIL, 2002).
Assim, nas palavras de Pereira (2004, p. 14), a posse “é uma situação de fato, em que uma pessoa, que pode ou não ser a proprietária, exerce sobre uma coisa atos e poderes ostensivos, conservando-a e defendendo-a.”
Tepedino e Rentería (2011) ressaltam que o poder de fato sobre a coisa “se assemelha ao exercício da propriedade – visto se materializar na prática de qualquer ato por meio do qual a propriedade se exterioriza – mas que não se identifica com o exercício da propriedade.”
Acrescenta Tarturce (2016, p. 40) que mesmo sendo a posse uma exteriorização da propriedade, com ela não se confunde:
É cediço que determinada pessoa pode ter a posse sem ser proprietária do bem, uma vez que ser proprietário é ter o domínio pleno da coisa. A posse pode significar apenas ter a disposição da coisa, utilizar-se dela ou tirar dela os frutos com fins socioeconômicos.
Com efeito, a posse é vista sob a perspectiva econômica e não com a atribuição psicológica e, para seu reconhecimento, é necessário apenas do elemento corpus com a manifestação do exercício de um direito. (MATHIAS, 2008).
Nesta senda, há posse não somente quando o proprietário exerce o domínio, ou quando alguém é autorizado a ocupar situações jurídicas reais ou obrigacionais sobre o bem pelo proprietário. Há situações, em que mesmo contra a vontade do proprietário, uma pessoa obtém o aproveitamento econômico sobre certo bem (FARIAS; ROSENVALD, 2012). Portanto a posse “é um direito autônomo à propriedade, que representa o efetivo aproveitamento econômico dos bens para o alcance de interesses sócios e existenciais merecedores de tutela.” (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p. 71).
Dessa forma, será demonstrado como a posse pode ser classificada.
Classificação da posse
O ordenamento jurídico classifica a posse em diversas espécies, assim, faz-se necessária a analise das modalidades mais utilizadas.
A posse pode ser direta e indireta. A distinção entre elas é disciplinada no art. 1.197 do CC/2002:
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto. (BRASIL, 2002).
Posse direta é aquela exercida por quem está em contato direto com a coisa. Indireta é a posse exercida por intermédio de outra pessoa. (TARTUCE, 2014).
Outra classificação é a posse justa e injusta, disciplinada no art. 1.200 do CC/2002 que conceitua a posse justa como “a posse que não for violenta, clandestina ou precária.” (BRASIL, 2002). Assim, é injusta a posse que apresenta os vícios da violência, clandestinidade ou da precariedade.
Violenta é a posse adquirida por meio do uso indevido da força física ou moral. Clandestina é a posse obtida de forma oculta, sem ciência dos interessados. Precária é a posse conquistada mediante o abuso de confiança por quem já detém a coisa, em razão de uma relação jurídica e deixa de restituir na data previamente fixada. Nesta última, a posse deixa de ser justa e passa a ser ilegítima, diante do abuso de confiança. (WALD, 2011). A posse mansa ocorre quando os atos de terceiros não influem nela, e assim, tem-se a impressão de que o possuidor é realmente o proprietário. (RIBEIRO, 2003).
A posse também pode ser de boa-fé e de má-fé. O CC/2002 prevê no art. 1.201 que a posse de boa fé ocorre quando o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa. (BRASIL, 2002). Assim, o possuidor de boa-fé entende que sua posse foi adquirida de maneira lícita, livre dos vícios da violência, clandestinidade ou precariedade, ao contrário do possuidor de má-fé, que mantém a posse da coisa mesmo ciente de que é viciada. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014). O art. 1.202 do CC/2002 complementa que “a posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente.” (BRASIL, 2002).
Ainda, a posse pode ser nova e velha. A posse nova é a defendida em juízo dentro do prazo de ano e dia a contar da data da turbação ou esbulho. Já na posse velha, o interdito possessório é ajuizado há mais de ano e dia. (COELHO, 2012). No caso da posse nova, o art. 558 do Novo Código de Processo Civil (CPC) estabelece:
Art. 558.  Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho afirmado na petição inicial.
Parágrafo único.  Passado o prazo referido no caput,será comum o procedimento, não perdendo, contudo, o caráter possessório. (BRASIL, 2015).
Caso a posse seja nova, caberá ação de força nova e o procedimento será especial, com a possibilidade de concessão de liminar. O rito especial é disciplinado nos arts. 560 a 566 do CPC/2015. Contrariamente é o caso da posse velha, em que a ação será de força velha e o procedimento comum, não cabendo liminar. (TARTUCE, 2015).
A posse também é classificada em natural, civil ou jurídica. A posse natural é o exercício de poderes sobre a coisa, e a posse civil ou jurídica é aquela que é transmitida ou adquirida pelo título. (GONÇALVES, 2014).
A Ad interdicta é a posse contemplada pelas ações possessórias, que são as ações de reintegração e manutenção de posse e o interdito proibitório. A Ad usucapionem é a posse adquirida em virtude de sua prescrição aquisitiva, ou seja, pelo período de tempo decorrido. (NADER, 2013).
A composse ocorre quando há simultaneidade no exercício da posse, e para sua existência é necessária a pluralidade de sujeitos e a coisa indivisa ou em estado de indivisão. Divide-se em composse pro indiviso e composse pro diviso. (DINIZ, 2012). A primeira verifica-se quando os possuidores tem em conjunto apenas uma parte ideal do bem, e é conceituado pelo art. 1.199 do CC/2002, como “se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.” (BRASIL, 2002), ou seja, não é possível a determinar a fração de cada compossuidor. De outro modo é a composse pro diviso, em que apesar de não haver divisão de direito, cada compossuidor sabe qual é a sua parte de uso. (DINIZ, 2012).
Efeitos da posse
A doutrina pátria e o CC/2002 elencam como os efeitos da posse a defesa, a percepção dos frutos, a responsabilidade pela perda e deterioração da coisa, a indenização e retenção das benfeitorias e a usucapião.
O direito de defesa da posse desdobra-se em dois. O primeiro é a possibilidade do possuidor de exercer o desforço imediato e a legítima defesa, sem necessitar do judiciário. O segundo é o direito de invocar as ações possessórias para proteção da posse. (COELHO, 2012).
A legítima defesa é prevista no § 1º do art. 1.210 do CC/2002, em que “o possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.” (BRASIL, 2002).
A defesa tem como objetivo evitar o incômodo da posse, o que ocorre na turbação. Por sua vez, o desforço opera-se na recuperação da posse perdida, resultante do esbulho. A lei impõe os limites de imediatismo e de moderação entre a agressão e a reação, no entanto, não estabelece prazo para considerar a defesa imediata. (DONIZETTI; QUINTELA, 2014).
Quanto ao desforço possessório, o Enunciado nº 494, da V Jornada de Direito Civil, concluiu que a expressão “contando que se faça logo” deve ser interpretada como a reação imediata ao esbulho ou à turbação, ressalvados os demais casos em que o possuidor deve recorrer ao Juízo. (BRASIL, 2011).
Os interditos possessórios, ou as chamadas ações possessórias, são divididos em três espécies, conforme o art. 1.210 do CC/2002, em que “o possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.” (BRASIL, 2002). 
O esbulho ocorre quando o possuidor perde a posse do bem, ou seja, ocorre o desapossamento de maneira violenta ou pacífica. É cabível a ação de reintegração de posse, para que a coisa retorne ao possuidor esbulhado. Na turbação, os atos praticados por terceiro objetivam romper o vínculo entre a coisa e seu possuidor, assim, este tem direito à ação de manutenção de posse, para que nela permaneça. Por sua vez, a ameaça de turbação ou esbulho evidencia-se pelos atos preparatórios de terceiro que visa a usurpação da posse, sendo possível que o possuidor postule ao juiz a fixação de pena pecuniária àquele que objetiva concretizar os atos de turbação ou esbulho. (COELHO, 2012).
Quanto à percepção dos frutos, dispostos nos arts. 1.214, 1.215 e 1.216, do CC/2002, o possuidor de boa-fé somente tem direito aos frutos percebidos, mas não aos frutos pendentes e nem aos colhidos antecipadamente, e estes devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio. (GONÇALVES, 2014). No que diz respeito ao possuidor de má-fé, este responderá pelos frutos colhidos, percebidos, e os que deixou de perceber, por culpa sua, desde constituída a má-fé. No entanto, terá direito às despesas de produção e custeio. (TARTUCE, 2014).[4: “O termo fruto equivale às utilidades econômicas periodicamente produzidas pelo bem principal.” (RIZZARDO,2014, p. 127)]
Na responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa, elencadas nos arts. 1.217 e 1.218 do CC/2002, o possuidor de boa-fé somente responderá civilmente pela perda ou deterioração da coisa possuída quando lhe der causa. (BRASIL, 2002). Com relação ao possuidor de má-fé, tem a responsabilidade de indenizar o proprietário ou possuidor legítimo, independente de culpa, eximindo-se caso o possuidor comprove que a perda ou deterioração ocorreria igualmente na posse do reivindicante. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014).
Quanto às benfeitorias, o art. 96 do CC/2002 classifica em três categorias. São necessárias aquelas que objetivam a conservação do bem ou que evitem a deterioração. Úteis, as que aumentam ou facilitam o uso do bem. Voluptuárias são as destinadas ao lazer, não aumentando o uso habitual do bem (BRASIL, 2002). Os efeitos com relação às benfeitorias são elencados nos arts. 1.219, 1.1220, 1.121 e 1.122 do CC/2002. Em se tratando de possuidor de boa-fé, deve ser indenizado pelas benfeitorias necessárias e úteis, podendo exercer o direito de retenção caso não seja indenizado. Quanto às benfeitorias voluptuárias, se de boa-fé, poderá levantá-las, sem danificar a coisa. Por sua vez, o possuidor de má-fé terá direito de indenização às benfeitorias necessárias, não possuindo direito de retenção ou levantamento. (BRASIL, 2002).
A usucapião é o meio de se adquirir a propriedade móvel ou imóvel pela posse prolongada no tempo fixado em lei. A posse deve ser mansa, pacífica, contínua e ininterrupta. (WALD, 2011). O capítulo 3 abordará este instituto.
Propriedade
Após a análise do instituto da posse, esta seção abordará o direito real da propriedade, destacando inicialmente o conceito e os elementos, perpassando pelas principais características e a sua função social. Por fim, o objeto de estudo será as formas de aquisição da propriedade móvel e imóvel.
Conceito e elementos da propriedade
A propriedade é um direito real e também um direito fundamental, expresso no caput do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), em que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” (BRASIL, 1988, grifo nosso).
Como direito real, deve ser compreendida como o direito que vincula o proprietário à toda coletividade, com relação a um bem. Este direito atribui ao proprietário os poderes de usar, gozar, dispor e reaver e o direito de possuir o bem, desde que atenda a função social e, ainda, que a propriedade alheia seja respeitada pela coletividade, conferindo ao Estado o direito de exigir o cumprimento da função social do bem. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014).
Assim, de acordo com Farias e Rosenvald (2013, p. 263), a propriedade é “como uma relação jurídica complexa formada entre o titular do bem e a coletividade de pessoas.”
O CC/2002 em seu art. 1.228 descreve os poderes inerentes ao proprietário de usar, gozar, dispor e reaver a coisa. (BRASIL, 2002).
Usar é a possibilidade de o proprietário desfrutar das utilidades que a coisa oferece,sem destruí-la. Gozar é o poder do proprietário de perceber os frutos que a coisa produz, ou seja, de explorá-la economicamente. Dispor consiste na capacidade de o proprietário se desfazer da coisa, por meio do consumo ou da alienação, ou de dar-lhe destinação diversa. Reaver é o direito que o proprietário tem de recuperar a coisa por quem injustamente a possua por meio de ação reivindicatória. (NADER, 2013). 
Ensina Tartuce (2016) que nessa ação o autor deve provar o seu domínio, oferecendo prova da propriedade, com o respectivo registro e descrevendo o imóvel com as suas confrontações, devendo ainda, demonstrar que a coisa reivindicada esteja na posse injusta do réu.
Principais características
Entre as principais características do direito de propriedade trazidos pela doutrina tem-se a exclusividade, a perpetuidade, o absolutismo e a elasticidade.
A exclusividade, de acordo com o art. 1.231 do CC/2002, é presunção relativa da propriedade, pois se admite prova em contrário. (BRASIL/2002). Nesta característica, não é possível que a mesma coisa pertença exclusivamente e simultaneamente a mais de duas pessoas, com exceção do condomínio, em que cada condômino é titular de uma fração ideal do bem. (TARTUCE, 2014). No caso do condomínio, acrescenta Wald (2011, p. 143) que “o que ocorre não é a propriedade de diversas pessoas sobre o mesmo objeto, mas a de cada condômino sobre uma fração ideal do objeto em condomínio.”
É perpétua, pois não se extingue pelo não uso, permanecendo enquanto não houver causa modificativa ou extintiva. (DINIZ, 2012). Ensina Gomes (2012, p. 109) que “por exceção, admite-se propriedade revogável que se configura quando, no próprio título de sua constituição, por sua própria natureza ou pela vontade do agente ou das partes, se contém condição resolutiva.” No entanto, caso o proprietário deixe de usar a propriedade poderá “implicar sanções do sistema jurídico se os deveres sociais do proprietário não forem adimplidos.” (CARNACCHIONI, 2014, p. 177).
É absoluta diante de seu caráter erga omnes. O proprietário pode usar, gozar, dispor e reaver como melhor entender, observadas as limitações impostas do interesse coletivo. (TARTUCE, 2014). Ainda, segundo Mathias (2008, p. 44), através do absolutismo, “o proprietário exclui ou impede a ingerência de terceiros. Tem o proprietário direito sobre o solo, espaço aéreo e subsolo, limitado verticalmente pela utilidade.”
Ademais, a propriedade é elástica, pois pode ser distendida ou contraída no seu exercício, a medida que seus atributos são adicionados ou retirados. (GOMES, 2012). A elasticidade resulta do desmembramento dos poderes inerentes à propriedade para terceiros, sem deixar de ser propriedade, modificando-se de propriedade plena para limitada. (FARIAS; ROSENVALD, 2013).
Por fim, a propriedade é limitada pela ordem constitucional (MELO, M., 2009). 
Função social da propriedade
A CRFB 1988, em seu art. 5º, incisos XXII e XXIII, assegura o direito à propriedade e que ela atenderá sua função social. (BRASIL, 2002). A função social da propriedade serve para que a sociedade mantenha-se saudável, para que as pessoas tenham acesso aos bens necessários e para que impulsione a economia, de modo a gerar empregos e renda. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014). 
Tem-se a ideia de que o proprietário deve agir como um funcionário na gerência do bem, de modo que contribua para sua função. (GONÇALVES, 2014) 
O art. 1.228, § 1º, do CC/2002 dispõe sobre a função social do bem:
Art. 1.228. § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. (BRASIL, 2002).
Observa-se na norma citada que ordenamento jurídico reconheceu na propriedade também a sua função socioambiental, dando atenção aos ambientes naturais e culturais. (TARTUCE, 2014).
O princípio da função social da propriedade está vinculado ao exercício da propriedade, e não somente à produtividade do bem ou destinação socioeconômica. A busca pelo direito de propriedade é equilibrada pela satisfação de interesses particulares e pela função social, de modo a atender o interesse público e o cumprimento de deveres com a sociedade. (DINIZ, 2012).
Atualmente, a propriedade está ligada ao exercício do domínio, com o devido respeito à função social, de objetivo financeiro e social, que ocasiona a produção de frutos, empregos, de modo gerar um equilíbrio à sociedade, intuito da CRFB/1988 em seu estado democrático de direito. (MELO, M., 2011).
Apesar da propriedade e o domínio serem interligados, devem ser examinados de forma independente. A propriedade “representa a titularidade formal do direito subjetivo”, enquanto o domínio diz respeito aos poderes do proprietário de usar, gozar, fruir e dispor da coisa (CARNACCHIONI, 2014, p. 149). Farias e Rosenvald (2013, p. 263) complementam que “o direito subjetivo de propriedade concerne à relação jurídica complexa que se forma entre aquele que detém a titularidade formal do bem (o proprietário) e a coletividade de pessoas.”
O proprietário e possuidor tem o dever de tornar operativa sua propriedade, pois assim estará protegido pelo ordenamento jurídico. Cabe ao Estado regular a intervenção das propriedades abandonadas e de redistribuí-las aos interessados. (VENOSA, 2014).
Ainda, a função social da propriedade deve ser compreendida aos bens imóveis e móveis. O destaque à propriedade rural é justificado pelo passado, onde a terra era o principal meio de rendimento. (GOMES, 2012).
Para Tartuce (2016) a função social é intima à própria construção do conceito, como direito complexo que é, a propriedade não pode sobrelevar outros direitos, particularmente aqueles que estão em prol dos interesses da coletividade.
Formas de aquisição da propriedade móvel
A aquisição da propriedade móvel é classificada em originária e derivada. Nas originárias não ocorre a transferência da propriedade, como o caso da ocupação, da especificação, do achado do tesouro e a usucapião. Já nas derivadas, há a transferência da propriedade, como acontece na confusão, comistão, adjunção e tradição. (TARTUCE, 2014).
A ocupação é disciplinada no art. 1.263 do CC/2002, como “quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.” (BRASIL, 2002). Consiste na apropriação do bem, sem dono (res nullius) ou abandonado (res derelicta), pela pessoa que tem a intenção de ser proprietária. (GONÇALVES, 2014, p. 327).
A especificação, segundo Melo, M. (2009, p. 182) ocorre quando “uma pessoa, trabalhando em determinada matéria-prima, obtém uma coisa nova.” Conforme o art. 1.269 do CC/2002, quem “trabalhando em matéria-prima em parte alheia, obtiver espécie nova, desta será proprietário, se não se puder restituir à forma anterior.” No caso da boa-fé, o art. 1.270 do CC/2002 dispõe que “se toda a matéria for alheia, e não se puder reduzir à forma precedente, será do especificador de boa-fé a espécie nova” Encerrando o instituto, o art. 1.271 do CC/2002 garante indenização para o especificador de boa fé, excluindo-se o de má-fé. (BRASIL, 2002).
O achado do tesouro, regrado pelo art. 1.264 do CC/2002, exige quatro requisitos concorrentes, quais sejam, ser antigo, estar enterrado ou oculto, ser o proprietário desconhecido, e por fim, que o descobridor tenha encontrado casualmente. (BRASIL, 2002).
A usucapião é dividida em ordinária e extraordinária. A ordinária, prevista no art. 1.260 do CC/2002, rege que será adquirida a propriedade por “aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente durante três anos, com justo título e boa-fé”. Já a usucapião extraordinária, disposta no art. 1.261 do CC/2002, diferencia-se da ordinária, em virtude do prazo ser de cinco anos e independer do título e da boa fé. (BRASIL, 2002).
A confusão,a comistão e a adjunção são regulamentadas pelo art. 1.272 do CC/2002, como “as coisas pertencentes a diversos donos, confundidas, misturadas ou adjuntadas sem o consentimento deles, continuam a pertencer-lhes, sendo possível separá-las sem deterioração.” (BRASIL, 2002). 
Confusão é a mistura de coisas líquidas, comistão é a mistura de coisas sólidas ou secas, e adjunção é a sobreposição de uma coisa sobre a outra que não podem ser separadas sem que estraguem. (DINIZ, 2012).
Tradição é a entrega do bem móvel ao adquirente, conforme prevê o art. 1.267 do CC/2002:
Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição. Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico. (BRASIL, 2002).
Quanto às espécies de tradição, real é a entrega efetiva do bem, simbólica é a entrega de algo que represente a tradição, e ficta implica a traditio brevi manu, ou seja, aquele que possuía em nome alheio, passa por força de manifestação de vontade, a possuir em nome próprio. Há ainda a tradição ficta pelo constituto possessório, que, ao contrário da traditio brevi manu, diz respeito àquele que possuía em nome próprio, passa por força de manifestação de vontade, a possuir em nome alheio. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014).
Formas de aquisição da propriedade imóvel
Assim como na aquisição de propriedade móvel, divide-se aqui também em modalidade originária e derivada. Na primeira, não há transmissão da propriedade entre sujeitos. É o caso das acessões e da usucapião. Por outra via, é derivada quando ocorre a uma relação de negócio, transmitindo a propriedade a outrem, como o registro imobiliário. (GONÇALVES, 2014). 
As acessões estão descritas nos arts. 1.248 a 1.259 e dividem-se em naturais, que é o caso da formação de ilhas, da aluvião, da avulsão e do abandono do álveo, e em artificiais, como as plantações e construções. (TARTUCE, 2014).
A formação de ilhas se dá pelas correntes que depositam gradualmente areia, cascalho ou fragmentos de terra, trazidos pela própria corrente ou pelo rebaixamento das águas, tornando-se visível parte do fundo ou do leito. (DINIZ, 2012).
O conceito de aluvião é disciplinado pelo art. 1.250 do CC/2002 como “os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização”. A avulsão, de acordo com o art. 1.251 do CC/2002, ocorre quando “por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se indenizar o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver reclamado.” (BRASIL, 2002).
Por sua vez, o conceito de álveo abandonado é disciplinado pelo art. 9º do Código das Águas, Decreto nº 24.643 de 1934, como “a superfície que as águas cobrem sem transbordar para o solo natural e ordinariamente enxuto”. Ou seja, o álveo surge com o desaparecimento do rio, por uma mudança em seu leito ou pela seca. (BRASIL, 1934).
Ademais, de acordo com o art. 1.253 do CC/2002 as plantações e construções presumem-se realizadas pelo proprietário do terreno e a sua custa, admitindo prova contrário. (BRASIL, 2002). São conhecidas como acessões artificiais ou industriais, e regulam-se pelo princípio de que os acessórios, que seriam a semeadura, a plantação ou a construção, seguem o principal, ou seja, o solo. Assim, presume-se relativamente que o proprietário do solo é também titular do quanto a ele se agregar, mas que admite-se prova em contrário. (MATHIAS, 2008).
Por fim, conforme o art. 1.245 do CC/2002 “transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.” (BRASIL, 2002). Maluf e Monteiro (2012) apontam que para a aquisição da propriedade imóvel pelo registro público, além do acordo de vontade entre as partes devem estar presentes dois requisitos: a escritura pública se o imóvel é superior a trinta vezes o maior salário mínimo do país (art. 108 do CC/2002), e o registro do título translativo na circunscrição imobiliária competente (Lei nº 6.015/1973). Nos parágrafos do citado artigo há uma presunção de autenticidade, pois enquanto a compra e a venda não for registrada, o vendedor indicado no registro é considerado dono para todos os efeitos (art. 1.245, § 1º, do CC/2002) e o registro prepondera até a impugnação de ações específicas (art. 1.245, § 2º, do CC/2002), através das quais será possível a desconstituição da aquisição. (PENTEADO, 2012).
O capítulo a seguir abordará os aspectos relevantes da usucapião, como seu conceito, fundamento, requisitos e modalidades.
aspectos relevantes da USUCAPIÃO
O presente capítulo abordará o instituto da usucapião, iniciando pelo seu conceito e fundamento e, seguidamente, seus pressupostos e modalidades.
Conceito e fundamentos
A usucapião é o modo originário de aquisição da propriedade, através da posse mansa, pacífica e prolongada por um determinado tempo fixado na lei. O legislador permitiu ao possuidor a aquisição ao direito de propriedade, pela prescrição aquisitiva, com a finalidade de estimular a paz social e de reduzir ao proprietário o ônus da prova de seu domínio. (RODRIGUES, 2003). Assim, a propriedade pode ser adquirida pelo possuidor, após certo prazo, desde que cumpridos os requisitos de posse mansa, pacífica, ininterrupta e com animus domini, sem que haja impugnação de seu titular. (RIZZARDO, 2014). 
Visa garantir a segurança e estabilidade à propriedade, acabando com as dúvidas acerca da posse, de modo que atenda a função social da propriedade. (TARTUCE, 2014).
A doutrina diverge quanto à usucapião e os modos originário e derivado de aquisição da propriedade. Entretanto, adota-se a primeira teoria, uma vez que inexiste a alienação pelo proprietário anterior, ou seja, a transmissão do direito, mas sim, a aquisição pela posse exercida pelo usucapiente. (DINIZ, 2012). Não obstante o término do direito à propriedade pelo antigo proprietário inexiste vínculo entre aquele e o novo possuidor (GOMES, 2012).
Nesse sentido, Pontes de Miranda (2012, p. 201) explica que:
Na usucapião, o fato principal é a posse, suficiente para originariamente se adquirir; não para se adquirir de alguém. É bem possível que o novo direito se tenha começado a formar, antes que o velho se extinguisse. Chega momento em que esse não mais pode subsistir, suplantado por aquele. Dá-se, então, impossibilidade de coexistência, e não sucessão, ou nascer um do outro. Nenhum ponto entre os dois marca a continuidade. Nenhuma relação, tampouco, entre o perdente do direito de propriedade e o usucapiente.
O instituto da usucapião não se confunde com a prescrição. A primeira diferença entre elas é que a usucapião extingue ações reais ou pessoais, por sua vez, a prescrição é o modo de aquisição dos direitos reais. (BEVILÁQUA, 2003). Ainda, a prescrição ocorre com a inércia de quem detém do direito, ou seja, é negativa, não produz efeitos, enquanto a usucapião é positiva, uma vez que o proprietário perde a propriedade para o possuidor. Portanto, não ocorre a prescrição aquisitiva, pois a prescrição opera-se no Direito das Obrigações, ao tempo que, a usucapião diz respeito aos Direitos Reais. (GOMES, 2012).
Pressupostos
Para a aquisição da propriedade por meio de usucapião, alguns requisitos são importantes. A seguir serão identificados os principais pressupostos.
Na posse com intenção de dono, ou animus domini, como já explicado anteriormente, na Teoria da Posse de Savigny, o possuidor age como se dono fosse. A posse mansa e pacífica, isto é, exercida sem oposição, ocorre quando o possuidor não é contestado em momento algum pelo proprietário. O terceiro requisito é a posse justa,aquela livre dos vícios da violência, clandestinidade ou precariedade. Ainda, a posse deve ser de boa-fé e com justo título. (TARTUCE, 2014).[5: A usucapião extraordinária prevista no art. 1.238 do CC/2002 dispensa a boa-fé e o justo título. (BRASIL, 2002).]
Ensina Gonçalves (2014, p. 97, grifo do autor) que “justo título, em suma, é o que seria hábil para transmitir o domínio e a posse se não contivesse nenhum vício impeditivo dessa transmissão”. O título deve ser entendido como o fato gerador, e não somente como um documento que demonstra a propriedade. É intimamente ligado à boa-fé, pois aquele que possui a coisa obtida de forma violenta, clandestina ou precária não tem justo título. (VENOSA, 2014).
O art. 1.201, parágrafo único, do CC/2002, disciplina que se presume a boa-fé do possuidor do justo título, mas que tal presunção é relativa, admitindo-se prova em contrário. (BRASIL, 2002). Ainda, a I Jornada de Direito de Direito Civil aprovou o Enunciado nº 86, que abrangeu à expressão todos os atos jurídicos hábeis à transferência da propriedade, independentemente de registro. (BRASIL, 2002).
Por último, a posse deve ser contínua e duradoura, ou seja, sem intervalos e interrupções. (DINIZ, 2012). O art. 1.243 do CC/2002 admite a soma da contagem do tempo para acrescentar à sua posse a dos seus antecessores, desde que todas sejam contínuas, pacíficas, com justo título e de boa-fé. (BRASIL, 2002).
A (IM)possibilidade de Usucapião de bens públicos
A CRFB/1988, nos arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único, e ainda, o CC/2002, no art. 102 e a Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal (STF) vedam a usucapião de bens públicos, ainda que alguns doutrinadores defendam a possibilidade. (BRASIL, 1988, 2002, 1964).
Conforme o art. 99 do CC/2002 são considerados bens públicos os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças, os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias e os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades. (BRASIL, 2002)
Farias e Rosenvald (2013, p. 404) discordam da impossibilidade de usucapião de bens públicos:
A nosso viso, a absoluta impossibilidade de usucapião sobre bens públicos é equivocada, por ofensa ao valor (constitucionalmente contemplado) da função social da posse e, em última instância, ao próprio princípio da proporcionalidade. Os bens públicos deveram ser divididos em materialmente e formalmente públicos. Estes seriam aqueles registrados em nome da pessoa jurídica de Direito Público, porém excluídos de qualquer forma de ocupação, seja para moradia ou exercício de atividade produtiva. Já os bens materialmente públicos seriam aqueles aptos a preencher os critérios de legitimidade e merecimento, postos dotados de alguma função social.
A respeito, Carnacchioni (2014, p. 227) complementa que as vedações quanto à usucapião de bens públicos sem a observância do princípio da função social da propriedade contrariam as normas constitucionais, e que esta proibição “é um estímulo para o Estado manter a sua inércia em relação à concretização de deveres fundamentais de assistência e social (deveres positivos de prestação), principalmente no âmbito urbanístico e ambiental”. Ainda, ressalta que a usucapião de bens públicos é permitida por meio da modalidade especial urbana coletiva.
Já, para Rodrigues (2002) é possível a usucapião de bens públicos dominicais, como as terras devolutas, pois estas seriam prescritíveis.
Por outro lado, Fiuza (2015), critica àqueles que defendem a usucapião de bens públicos com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, pois ao contrariar as normas jurídicas “estar-se-á olvidando a dignidade dos destinatários da reforma agrária, do planejamento urbano e dos eventuais beneficiários da utilização que eventualmente a Administração Pública venha a conferir ao imóvel.”
Nesse contexto, Carvalho Filho (2007, p. 977) acerca da impossibilidade:
A imprescritibilidade significa que os bens públicos são insuscetíveis de aquisição por usucapião, e isso independentemente da categoria a que pertençam. [...] Desse modo, mesmo que o interessado tenha a posse de bem público pelo tempo necessário à aquisição do bem por usucapião, tal como estabelecido no direito privado, não nascerá para ele o direito de propriedade, porque a posse não terá idoneidade de converter-se em domínio pela impossibilidade jurídica do usucapião. O novo Código Civil espancou qualquer dúvida que ainda pudesse haver quanto à imprescritibilidade dos bens públicos, seja qual for a sua natureza. Nele se dispõe expressamente que “os bens públicos não estão sujeitos a usucapião” (art. 102).
A jurisprudência tem consolidado o entendimento da impossibilidade de usucapião de bens públicos, como se depreende das decisões dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina e Paraná. Em 2013, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina entendeu ser impossível o reconhecimento do pedido da usucapião de imóvel público:
USUCAPIÃO. BEM IMÓVEL PÚBLICO. EXPRESSA VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL (ART. 183, § 3º) E INFRACONSTITUCIONAL (ART. 102 DO CÓDIGO CIVIL). CARÊNCIA DE AÇÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. O pedido para o reconhecimento da prescrição aquisitiva de imóvel público é juridicamente impossível e enseja a extinção do processo sem resolução de mérito por carência de ação, ao colidir frontalmente com a previsão inserida no ordenamento jurídico de que bens públicos são inusucapíveis, de modo que não poderá ser atendido à medida que os fatos que o sustentam não geram o direito perseguido (direito de usucapir). (SANTA CATARINA, 2013, grifo nosso).
E na mesma linha, o Tribunal de Justiça do Paraná, em 2005, decidiu a inaplicabilidade de usucapião em bens públicos:
 
AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - BEM PÚBLICO - POSSE - PERMISSÃO E TOLERÂNCIA DE USO A TÍTULO PRECÁRIO - MERO DETENTOR - AÇÃO PRÓPRIA PARA A RETOMADA - CONFIGURAÇÃO DO ESBULHO - INAPLICABILIDADE DE USUCAPIÃO EM BENS PÚBLICOS - SÚMULA 340 DO STF E § 3º DO ART. 183 DA CF/88 - SENTENÇA MANTIDA. "1 - A ocupação de bem público, mesmo que por longo período, não induz posse, mas constitui mera detenção por tolerância do ente público. 2 - Comete esbulho aquele que ocupa irregularmente imóvel público e não devolve quando solicitado, sendo cabível a Ação de Reintegração de Posse, não necessitando da ação petitória reivindicatória. 3 - Os bens públicos não podem ser adquiridos por usucapião. Súmula nº 340 do STF e § 3º da CF/88. 4 - Recurso conhecido, mas a que se nega provimento". (PARANÁ, 2005, grifo nosso).
Assim, percebe-se que grande parte da doutrina e da jurisprudência defende a vedação à usucapião dos bens públicos.
Modalidades de usucapião de bens imóveis
A seguir serão expostas as modalidades de aquisição de bens imóveis pela usucapião.
Usucapião extraordinária
Prevista no art. 1.238 do CC/2002, tem como requisitos o animus domini, a posse mansa, pacífica, contínua, ininterrupta e sem oposições pelo lapso temporal de quinze anos. Não há necessidade da comprovação de boa-fé do possuidor e o justo título é dispensado. (BRASIL, 2002).
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. 
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. (BRASIL, 2002).
Carnacchioni (2014, p. 239) explica que o possuidor de má-fé poderá adquirir a propriedade pela usucapião extraordinária, até mesmo se a posse detém de precariedade “se os possuidores diretos, que têm relaçãojurídica com os possuidores indiretos, após a extinção desta relação, permanecem na coisa sem oposição.”
Nesta senda, sobre a alteração do título de posse, o Enunciado nº 237 aprovado na III Jornada de Direito Civil, elucida que é cabível “na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeito a caracterização do animus domini.” (BRASIL, 2004).
Por sua vez, o parágrafo único do art. 1.238 do CC/2002 é fundado na posse-trabalho, em que o possuidor deve ter estabelecido moradia ou obras de serviço de caráter produtivo, assim o lapso temporal será reduzido para dez anos. (GONÇALVES, 2014). Nessa hipótese também é dispensada a comprovação do justo título e da boa-fé.
A CRFB de 1988 ao prever a valorização da dignidade da pessoa humana, da solidariedade e do trabalho, favoreceu àqueles que mantém a propriedade com a finalidade socioeconômica, garantindo-lhes a redução do prazo de aquisição. (MELO, H., et al., 2008).
Sobre o caráter social da posse, o Ministro Luis Felipe Salomão do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento do REsp 1.088.082/RJ, escreveu:
Em realidade, a redução do lapso temporal promovida pelo art. 1.238, único, aliada à regra específica de transição eleita pelo legislador ordinário, no art. 2.029 do Código Civil, agasalham e dignificam a função social da propriedade, cujo exercício pelo possuidor do imóvel acarreta consequências jurídicas diferenciadas, se comparadas àquelas decorrentes da posse desqualificada, sem destinação social necessária, a prevista no caput do art. 1.238.
E foi exatamente este o propósito do legislador ao engendrar prazo e regra de transição diferenciados para o usucapião extraordinário, qualificado pela "posse-trabalho": a um só tempo, não se olvidar da segurança jurídica dos proprietários, até então inertes em seu direito de propriedade, e positivar em nível infraconstitucional um comando conformador da função social da propriedade. (BRASIL, 2010).
No que se refere à aquisição do domínio, Venosa (2010, p. 213) aduz que “aquele que eventualmente o perde sofre punição por sua desídia e negligência em não cuidar do que é seu.”
Ainda, insta salientar que a pessoalidade não é requisito dessa modalidade, sendo possível a soma de posses com antecessores ou sucessores, contanto que as posses sejam mansas, pacíficas, ininterruptas e com animus domini. (CARNACCHIONI, 2014).
Por fim, após o prazo decorrido, é possibilitada ao possuidor a requisição ao magistrado para que o declare proprietário e assim asseverar o seu direito de dono (GOMES, 2012).
Usucapião ordinária
A usucapião ordinária é disciplinada no art. 1.242 do CC/2002 e dispõe que “adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.” (BRASIL, 2002). Ao contrário da usucapião extraordinária, nesta, exige-se a comprovação de boa-fé e justo título, além da posse mansa, pacífica, ininterrupta com animus domini pelo lapso temporal de dez anos.
Destaca Wald (2011, p. 216) que “a boa fé é a convicção que o usucapiente tem de ser proprietário do bem que está na sua posse. A má-fé superveniente, ou seja, posterior à aquisição, impede o usucapião ordinário.”
O parágrafo único do art. 1.242 do CC/2002, disciplina a modalidade de usucapião tabular e reduz o prazo da usucapião ordinária para cinco anos quando presentes dois requisitos. O primeiro refere-se à aquisição do bem deve ter ocorrido de maneira onerosa, com base em registro do título no Registro de Imóveis que foi posteriormente cancelado, desde que comprovado o adimplemento pelo possuidor. O segundo requisito diz respeito ao uso do local como moradia ou ao investimento nele realizado. Esta modalidade é conhecida como usucapião tabular. (COELHO, 2012).
A respeito do título cancelado, Carnacchioni (2014, p. 243) ressalta o motivo que obsta o efeito do título:
A principal causa ou vício substancial que impede a sua plena eficácia é a venda e aquisição a non domino, caso em que o transmitente não é o legítimo dono da coisa transferida. Por não ser o proprietário legítimo, embora o título, em tese, na aparência, seja hábil para transferir a propriedade, será ineficaz porque o transmitente não é o dono.
Carnacchioni (2014) também destaca que além da venda e aquisição a non domino, o título pode evidenciar agressão a interesse privado, o que gera anulação, ou agressão a interesse público, que constitui nulidade. Logo, esses vícios no título dão a ele força de justo título para a usucapião ordinária.
Ainda, sobre a usucapião tabular, Tartuce e Simão (2013, p. 165) complementam:
A posse-trabalho é que deve ser tida como elemento fundamental para a caracterização dessa forma de usucapião ordinária, fazendo com que o prazo caia pela metade. Deve-se então concluir que a existência do título registrado e cancelado é até dispensável, pois o elemento é acidental, formal. A posse-trabalho, em realidade, é o que basta para presumir a existência da boa-fé (aqui é a boa-fé objetiva, que está no plano da conduta) e do justo título. 
Sobre o lapso temporal, Ribeiro (2012, p. 831) observa que “precisa estar completado quando promovida a ação declaratória de usucapião, sob pena de extinção do processo por ausência de uma de suas condições.”
A usucapião ordinária é chamada também de usucapião abreviada, uma vez que seu prazo é reduzido. Diferencia-se da usucapião extraordinária não somente pelo tempo, mas também pela necessidade de provar-se o justo título e a boa fé. (RIBEIRO, 2006).
Usucapião especial rural
A usucapião especial rural ou pro labore está disciplinada pelo art. 191 da CF/1988 e foi reproduzida no art. 1.239 do CC/2002:
Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. (BRASIL, 2002).
Portanto, a posse deve ser mansa, pacífica, contínua e contemplada com animus domini, pelo lapso temporal de cinco anos ininterruptos, com área extensa máxima de cinquenta hectares, não podendo ter o proprietário outro imóvel urbano ou rural, e desde que a utilize para subsistência ou trabalho e nela fixe o domicílio. A comprovação de justo título e boa-fé é dispensada. Percebe-se que o legislador não limitou o número de vezes que o possuidor pode pleitear a usucapião especial rural. (CARNACCHIONI, 2014).
O objetivo desta modalidade de usucapião é a fixação do homem no campo, para neste morar e trabalhar, dando produtividade ao imóvel rural. (MONTEIRO; MALUF, 2012). Somente a pessoa natural que dar a função social da posse poderá pleitear a propriedade, sendo esta abrangida pela pessoalidade, impedida a soma ou acessão de posses. (CARNACCHIONI, 2014).
Sobre a área de cinquenta hectares, o Enunciado nº 312 aprovado na IV Jornada de Direito Civil, orientou que “observado o teto constitucional, a fixação da área máxima para fins de usucapião especial rural levará em consideração o módulo rural e a atividade agrária regionalizada”. Ainda, o Enunciado nº 313 da mesma Jornada entendeu que não é possível a usucapião especial rural quando a área for superior ao estabelecido em lei, ainda que o pedido de usucapir restrinja-se somente a uma parte da área. (BRASIL, 2006).
Ademais, o art. 3º da Lei nº 6.969/1981 restringe áreas rurais que não podem ser adquiridas pela usucapião:
Art. 3º - A usucapião especial não ocorrerá nas áreas indispensáveis à segurança nacional, nas terras habitadas por silvícolas, nem nas áreas de interesse ecológico, consideradas como tais as reservas biológicas ou florestais e os parques nacionais, estaduais ou municipais, assim declarados pelo Poder Executivo, assegurada aos atuais ocupantes a preferência para assentamento em outras regiões, pelo órgão competente.
Parágrafo único. O Poder Executivo,ouvido o Conselho de Segurança Nacional, especificará, mediante decreto, no prazo de 90 (noventa) dias, contados da publicação desta Lei, as áreas indispensáveis à segurança nacional, insuscetíveis de usucapião. (BRASIL, 1981).
Por fim, Melo, M. (2011, p. 125), diz que essa reforma agrária “exige um comprometimento muito mais sério com relação a toda uma implementação de medidas sociais e de infraestrutura nos lotes para que as famílias rurais possam viver com dignidade no campo”. É estabelecido o princípio ruralista, em que o proprietário da terra deve ser aquele que nela esforçou-se e manteve a sua moradia e de sua família. (GONÇALVES, 2014).
Usucapião especial urbana
Criada pela CRFB de 1988, no art. 183, reiterado no art. 9º do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) e no art. 1.240 do CC/2002, prevê:
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. (BRASIL, 2002).
Os requisitos dessa modalidade de usucapião são o animus domini, área urbana não superior a 250 m², posse mansa e pacífica de cinco anos ininterruptos sem oposição, imóvel com finalidade de moradia, não ser proprietário de outro imóvel rural ou urbano, e o deferimento apenas uma única vez da usucapião especial urbana. Não há necessidade de provar a boa-fé e o justo título.
Carnacchioni (2014, p. 253) dispõe que “o objetivo primordial da usucapião especial urbana é concretizar o direito social e fundamental de moradia previsto no art. 6º da CF/1988.”
Em se tratando de usucapião especial urbana, o Enunciado nº 85 aprovado na I Jornada de Direito Civil compreendeu que área urbana é o imóvel edificado ou não, incluindo-se as unidades autônomas vinculadas a condomínios edilícios. (BRASIL, 2002). E ainda, o Enunciado nº 314 da IV Jornada de Direito Civil entendeu que havendo usucapião de área de condomínio, não se computa, para fins de metragem máxima, a extensão da área comum, devendo ser levada em conta somente a área individual. (BRASIL, 2006). 
Outrossim, é vedada a soma do prazo do possuidor com quem lhe antecedeu, porém é permitida a sucessão da posse, desde que o sucessor já resida no imóvel quando da ocorrência do óbito, garantindo assim, a proteção do núcleo familiar. (FARIAS; ROSENVALD, 2013).
Usucapião especial urbana coletiva
O art. 10 da Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) preceitua que o imóvel deve situar-se em áreas urbanas e ser superior a duzentos e cinquenta metros quadrados. Os possuidores devem ser de baixa renda e devem exercer a moradia conjunta, sem a possibilidade de identificar a área de cada um. Ainda, é requisito os possuidores não serem proprietários de outro imóvel urbano ou rural. (BRASIL, 2001).
E prossegue Melo, M. (2011, p. 123):
Uma vez preenchidos os requisitos legais, será lícito aos possuidores, em estado de composse, ou, servindo-se de substituto processual, ajuizar a ação para declarar a usucapião coletiva. A associação de moradores, legitimada para propor a demanda, deverá estar devidamente registrada no cartório das pessoas jurídicas e contar com a autorização expressa dos moradores interessados. Importante registrar que nessa modalidade coletiva de usucapião a lei especial admite a soma de posses por ato inter vivos, contanto que a posse do sucedido e do sucessor sejam contínuas e pacíficas.
O objetivo da usucapião especial urbana coletiva é o de regularizar a situação da população de baixa renda nas ocupações coletivas, conhecidas como favelas. (DONIZETTI; QUINTELLA, 2014). Complementa Penteado (2012, p. 326) com relação à identificação dos terrenos que “devem ter problemas que demandem esclarecimento do ponto de vista registral, normalmente com sobreposição de áreas ou mesmo com ausência de documentação apropriada”. Essa modalidade de usucapião gera um condomínio entre os possuidores. (COELHO, 2012).
Ainda, registra-se que tal modalidade protege a coletividade de pessoas ao permitir a acessão de posses, sendo que o possuidor possa somar sua posse com o antecessor, desde que sejam mansas, pacíficas e ininterruptas. (CARNACCHIONI, 2014).
Usucapião indígena
É regulada pelo art. 33 da Lei nº 6.001/1973, o Estatuto do Índio:
Art. 33. O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos consecutivos, trecho de terra inferior a cinqüenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às terras do domínio da União, ocupadas por grupos tribais, às áreas reservadas de que trata esta Lei, nem às terras de propriedade coletiva de grupo tribal. (BRASIL, 1973).
São condições para sua aquisição a posse mansa, pacífica, ininterrupta e com animus domini, diferenciando-se da usucapião rural pelo fato de não ser obrigatória a residência no local e sua produtividade. (CARNACCHIONI, 2014).
Este modo de usucapião diz respeito à área máxima de 50 hectares de posse pelo lapso temporal de dez anos, entretanto é criticada, uma vez que o art. 191 da CRFB/1988 faculta-lhes a mesma pretensão pelo prazo reduzido de cinco anos na modalidade de usucapião rural. Apesar de a usucapião rural estabelecer o requisito de o possuidor não ser titular de outro imóvel, esta modalidade é absorvida pela usucapião extraordinária, a qual determina a posse por no mínimo dez anos e não restringe o tamanho da área. (FARIAS; ROSENVALD, 2013).
De acordo com a referida norma, são beneficiados pela usucapião os índios integrados ou não. São considerados índios isolados aqueles que vivem em comunidade inexplorada ou de pouco escasso conhecimento. Os índios rumo à incorporação mantêm a vida nativa, mas acatam ações e modos de existência da sociedade, carecendo destas para o próprio sustento. Ainda, são índios integrados os que já estão inclusos na vida em sociedade e exercendo os diretos civis, mesmo que preservada sua cultura. (BRASIL, 1973).
Sarmento (2013, p. 51) explica que “caso o indígena esteja reintegrado à comunhão nacional ou tenha êxito em sua solicitação da liberação da tutela, poderá diretamente propor a ação de usucapião, ou, então, deverá fazê-lo com a assistência da FUNAI.”
Usucapião imobiliária administrativa
Instituída pela Lei nº 11.977/2009, que originou o programa “Minha Casa Minha Vida”, regularizou a situação de pessoas carentes, com a finalidade de urbanizar a terra, por meio da infraestrutura e integração. Essa modalidade é processada no Cartório de Registro de Imóveis, não necessitando de processo judicial. (GONÇALVES, 2014).
Art. 60. Sem prejuízo dos direitos decorrentes da posse exercida anteriormente, o detentor do título de legitimação de posse, após 5 (cinco) anos de seu registro, poderá requerer ao oficial de registro de imóveis a conversão desse título em registro de propriedade, tendo em vista sua aquisição por usucapião, nos termos do art. 183 da Constituição Federal. 
§ 1o Para requerer a conversão prevista no caput, o adquirente deverá apresentar: 
I – certidões do cartório distribuidor demonstrando a inexistência de ações em andamento que versem sobre a posse ou a propriedade do imóvel; 
II – declaração de que não possui outro imóvel urbano ou rural; 
III – declaração de que o imóvel é utilizado para sua moradia ou de sua família; e 
IV – declaração de que não teve reconhecido anteriormente o direito à usucapião de imóveis em áreas urbanas (BRASIL, 2009). 
De acordo com a lei, além dos requisitos comuns a todas as modalidades de usucapião, é necessária a decorrência do lapso temporal de cinco anos, não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural, utilizar o imóvel para fins de moradia, e a não aquisiçãode imóvel urbano anterior pela usucapião.
Conforme o art. 59 da Lei nº 11.977/2009 “a legitimação de posse devidamente registrada constitui direito em favor do detentor da posse direta para fins de moradia.” (BRASIL, 2009). Essa legitimação é elencada nos §§ 1º e 2º do art. 59:
Art. 59, § 1º A legitimação de posse será concedida aos moradores cadastrados pelo poder público, desde que:
I - não sejam concessionários, foreiros ou proprietários de outro imóvel urbano ou rural;
II - não sejam beneficiários de legitimação de posse concedida anteriormente.
§ 2º A legitimação de posse também será concedida ao coproprietário da gleba, titular de cotas ou frações ideais, devidamente cadastrado pelo poder público, desde que exerça seu direito de propriedade em um lote individualizado e identificado no parcelamento registrado. (BRASIL, 2009).
Carnacchioni (2014, p. 273) discorre que “tais requisitos evidenciam o caráter social e a finalidade da legitimação de posse, qual seja, a concretização do direito social de moradia.”
Ainda, a modalidade prevê o auxílio pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, por meio de doações de terrenos e a isenção tributária nas construções destinadas às habitações populares. Tem prioridade os ocupantes de instalações irregulares, visto que estão situadas em áreas de risco. (NADER, 2013). 
Assim, vinculada ao direito social de moradia, fundamentado no art. 6º da CRFB/1998, a usucapião imobiliária administrativa busca a regularização de assentamentos irregulares e a concessão de títulos de propriedade aos ocupantes. (CARNACCHIONI, 2014).
Ação de Usucapião no Novo Código de Processo Civil
A usucapião extrajudicial foi incluída no ordenamento jurídico no art. 216-A da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973) pelo art. 1.071/CPC2015:
Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com: 
I - ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias;
II - planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização profissional, e pelos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes; 
III - certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente;
IV - justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel. 
§ 1o O pedido será autuado pelo registrador, prorrogando-se o prazo da prenotação até o acolhimento ou a rejeição do pedido.
§ 2o Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, esse será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar seu consentimento expresso em 15 (quinze) dias, interpretado o seu silêncio como discordância. 
§ 3o O oficial de registro de imóveis dará ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal e ao Município, pessoalmente, por intermédio do oficial de registro de títulos e documentos, ou pelo correio com aviso de recebimento, para que se manifestem, em 15 (quinze) dias, sobre o pedido.
§ 4o O oficial de registro de imóveis promoverá a publicação de edital em jornal de grande circulação, onde houver, para a ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão se manifestar em 15 (quinze) dias. 
§ 5o Para a elucidação de qualquer ponto de dúvida, poderão ser solicitadas ou realizadas diligências pelo oficial de registro de imóveis. 
§ 6o  Transcorrido o prazo de que trata o § 4o deste artigo, sem pendência de diligências na forma do § 5o deste artigo e achando-se em ordem a documentação, com inclusão da concordância expressa dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula, se for o caso. 
§ 7o Em qualquer caso, é lícito ao interessado suscitar o procedimento de dúvida, nos termos desta Lei. 
§ 8o Ao final das diligências, se a documentação não estiver em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido.
§ 9o A rejeição do pedido extrajudicial não impede o ajuizamento de ação de usucapião. 
§ 10.  Em caso de impugnação do pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, apresentada por qualquer um dos titulares de direito reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, por algum dos entes públicos ou por algum terceiro interessado, o oficial de registro de imóveis remeterá os autos ao juízo competente da comarca da situação do imóvel, cabendo ao requerente emendar a petição inicial para adequá-la ao procedimento comum. (BRASIL, 2015).
Assim, o interessado deverá pleitear a usucapião com os seguintes documentos: ata notarial lavrada pelo tabelião com tempo de posse e seus antecessores; planta e memorial descritivo assinada por profissional habilitado; certidões negativas dos distribuidores do local do imóvel e do domicílio do requerente; justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como pagamento de impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel. Após, o oficial do Cartório de Registro de Imóveis notificará a União, o Estado, o Distrito Federal e o Município para se manifestarem no prazo de 15 (quinze) dias. Ainda, publicará em edital de jornal de grande circulação para cientificar terceiros interessados e se manifestarem por até 15 (quinze) dias. Não havendo manifestações, o Oficial registrará a aquisição do bem em sua respectiva matrícula ou abrindo-se uma nova matrícula. Caso o pleito da usucapião extrajudicial seja negado pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis, ou ainda, impugnado pelos interessados, o interessado poderá requerer ao Poder Judiciário, conforme estabelecem os parágrafos 9º e 10º do art. 216-A da Lei nº 6.015/1973. (COSTA, 2015).
Trata-se de conceder ao autor da ação de usucapião uma via alternativa da judicial. Ademais, apesar de o texto da norma limitar-se a figura do advogado dativo, àqueles que não têm a possibilidade de suportar as despesas de honorários advocatícios, serão representados pela Defensoria Pública, conforme o art. 185 do CPC/2015. (TARTUCE, 2015).
Dornelles e Cassel Júnior (2015) defendem a nova modalidade “pensando na celeridade que os Serviços Notariais e Registrais podem dar aos procedimentos de jurisdição voluntária e naqueles em que não há litígios, e tendo certeza da segurança jurídica que os caracterizam.”
Paiva (2015) complementa que a aquisição terá a duração aproximada de 90 a 120 dias, pois o procedimento é semelhante ao da retificação consensual dos arts. 212 e 213 da Lei de Registros Públicos.
A USUCAPIÃO PRÓ-FAMÍLIA
Neste capítulo, será abordada a usucapião pró-família, seus requisitos e a análise da culpa, tema central deste trabalho.
Os aspectos DO ART. 1.240-A DO CÓDIGO CIVIL DE 2002
No dia 16 de junho de 2011 foi publicada a Lei nº 12.424, que dispõe sobre o Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas.
O art. 9º desta Lei institui uma nova modalidade de usucapião, conhecida como usucapião pró-família, a qual foiinserida no art. 1.240-A do CC/2002 e que gerou discussões acerca da constitucionalidade do dispositivo:
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1º O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. (BRASIL, 2002).
Para parte da doutrina o dispositivo é inconstitucional, pois a modalidade violou o princípio da vedação ao retrocesso e reintroduziu a discussão de culpa pelo fim do relacionamento e abandono do lar, questão já resolvida pela Emenda Constitucional n° 66/2010. (AMGARTEN, 2016).
A lei teve como objetivo preservar e proteger um teto de moradia para o cônjuge ou convivente que permanece no imóvel. Por ser usucapião, todos os princípios devem ser aplicados, não podendo converter a posse animus domini em posse decorrente de negócio jurídico. (VENOSA, 2014).
Trata-se de uma norma protetiva aos cônjuges ou companheiros que permanecem na residência familiar. Não inclui as separações legais, em que são discutidos os direitos patrimoniais. É irrelevante o cumprimento de prestações alimentares por aquele que deixou a residência, importando somente o afastamento e a omissão em tornar oficial a separação e a partilha de bens. A lei protege também os casais homoafetivos, uma vez que reconhecidos pelo ordenamento jurídico os direitos gerados por essa união. Com relação aos casais que exercem somente a posse e não possuem o domínio registral do imóvel, pensa-se que a solução é admitir a usucapião, desde que observados também os requisitos do art. 1.240 do Código Civil. Além dos cônjuges e companheiros, os terceiros poderão litigar, caso no nome esteja registrado o imóvel. Neste caso, o prazo computado poderá ser o do abandono e mais o prazo anterior da vida em comum para assim completar cinco anos. (RIZZARDO, 2014).
Atualmente, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132/RJ, entende que a união estável abrange a união homoafetiva. (FARIAS; ROSENVALD, 2013). No mesmo rumo, o Enunciado nº 500 aprovado na V Jornada de Direito Civil dispôs que “a modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe a propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive homoafetivas”. (BRASIL, 2011).
Tartuce (2012) elogia a nova modalidade de usucapião pró-família e aduz ser a solução, pois “é comum que o cônjuge que tome a iniciativa pelo fim do relacionamento abandone o lar, deixando para trás o domínio do imóvel comum.”
OS PRINCIPAIS REQUISITOS da usucapião pró-família
Para que seja arguida a usucapião familiar é necessário o preenchimento de elementos, sendo alguns requisitos já previstos em outras modalidades, como a posse mansa, pacífica, contínua, com animus domini e o prazo de dois anos. Ainda, é necessária a área máxima de 250 m², o que também se exige na usucapião especial urbana.
Além desses pressupostos, o imóvel deve pertencer a duas pessoas, sejam ex-cônjuges ou ex-companheiras, utilizado para sua residência ou da família, onde houve o abandono do lar por um dos dois, com o lapso temporal mínimo de (dois) anos após a saída daquele. Ainda, o benefício só poderá ser concedido uma única vez e o beneficiado não pode ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (BRASIL, 2002).
A seguir serão elencados os principais requisitos para a usucapião pró-família.
Imóvel urbano de área não superior a 250 m²
No que tange à área urbana, o Enunciado nº 85 aprovado na I Jornada de Direito Civil explicou que “entende-se por ‘área urbana’ o imóvel edificado ou não, inclusive unidades autônomas vinculadas a condomínios edilícios.” (BRASIL, 2002). E ainda, sobre o tamanho da área, o Enunciado nº 314 aprovado na IV Jornada de Direito Civil esclareceu que “não se deve computar, para fins de limite de metragem máxima, a extensão compreendida pela fração ideal correspondente à área comum.” (BRASIL, 2006).
Apesar do propósito do legislador de abranger os casais de baixa renda, essa modalidade teve alcance generalizado e independente do padrão do imóvel, atingindo inclusive propriedades de alto valor em áreas nobres. (NADER, 2013).
No que diz respeito à área máxima de 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados), Fonseca (2011) não concorda, uma vez que um imóvel deste tamanho pode ter um elevado valor econômico e “cujo valor ultrapassa a casa dos três milhões de reais – e que a perda, ainda que parcial, desse montante pode empobrecer sobremaneira aquele que ‘abandonou’ o lar e enriquecer injustificadamente o outro que nele ficou albergado.” 
Acerca do requisito do imóvel ser urbano Gimenez (2012) tece crítica:
 Nesse diapasão resta difícil de compreender, por que a nova lei privilegiou somente as pessoas, cujos bens sejam urbanos, quando reconhecidamente, na zona rural às necessidades motivadoras da proteção, encontram-se igualmente presentes. Acrescente-se a isso que, os moradores da zona rural se encontram, na maior parte das vezes, mais distantes das políticas públicas protetivas. 
Complementa Donizetti (2011) que a lei não abrangeu quem vive em área rural, sendo “essa pessoa, abandonada pela sorte e pelo cônjuge, também o foi pelo legislador, que não se dignou em lhe conferir a prerrogativa de aquisição da pequena área de terras onde mora.”
Nessa esteira, Silva, L. (2012) destaca que a localização do domicílio não é justificativa para tratamento diferenciado, pois os efeitos do abandono são os mesmos, seja na zona rural ou na zona urbana.
Imóvel único de propriedade dos ex-cônjuges ou ex-companheiros
O objeto da usucapião é a outra metade do imóvel que pertence ao ex-cônjuge ou ao ex-companheiro, pois a outra parte já pertence ao usucapiente, seja pelo regime de bens adotados na constância do casamento, seja pelo condomínio existente. Portanto, se o imóvel integrar exclusivamente o patrimônio do ex-cônjuge ou ex-companheiro não poderá ser objeto de usucapião. O abandono do lar pelo ex-consorte deve ser voluntário e injustificado, sendo fundamental a verificação do elemento culpa. (NADER, 2013).
Silva, L. (2012) faz referência ao imóvel em comum e aos regimes de bens entre os cônjuges e companheiros, onde a usucapião pró-família pode estar presente. É o caso do regime de comunhão total, parcial e de participação final de aquestos, caso conste no acordo o imóvel comum, ou ainda, de separação legal. Assim dispõe a Súmula nº 377 do STF, que no regime de separação legal de bens, os bens adquiridos na constância do casamento se comunicam. (BRASIL, 1964). No caso da separação convencional de bens não é possível a aquisição do imóvel pela usucapião familiar, pois os bens não se comunicam, restando a aplicação das outras modalidades de aquisição com o prazo maior. (SILVA, L. 2012).
Amgarten (2016) complementa que não há usucapião pró-família quando houve divórcio com partilha de bens, pois “se um dos ex-cônjuges ou ex-companheiros permitir a posse exclusiva do outro, comumente, configurará mera tolerância de uso e, portanto, não se poderá falar em usucapião.”
Simão (2011) define a extinção de fato como “o fim da comunhão de vidas entre cônjuges e companheiros que não se valeram de meios judiciais ou extrajudiciais para a formalização do rompimento”. Isto é, com a separação de fato, inicia-se o prazo para aquisição do imóvel pela usucapião pró-família.
Acerca do tema, corrobora o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios:
DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO LITIGIOSO. BEM IMÓVEL. USUCAPIÃO ESPECIAL POR ABANDONO DO LAR (ARTIGO 1.240-A DO CÓDIGO CIVIL). USUCAPIÃO FAMILIAR OU PRÓ-FAMÍLIA. REQUISITOS.

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