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21. RELAÇÕES DE PARENTESCO 21. RELAÇÕES DE PARENTESCO 0 21. RELAÇÕES DE PARENTESCO SUMÁRIO: 21.1 Tentativa conceitual – 21.2 Classificação: 21.2.1 Natural e civil; 21.2.2 Biológico ou consanguíneo; 21.2.3 Linha reta; 21.2.4 Linha colateral; 21.2.5 Grau – 21.3 Afinidade – 21.4 Obrigação alimentar – Leitura complementar. Referências legais: CF 226, 227 § 6.º, 229 e 230; CC 1.591 a 1.595; (LRP 57 § 8º). 21.1 Tentativa conceitual Parentesco e família não se confundem, ainda que dentro do conceito de família esteja contido o parentesco mais importante: a filiação.1 As relações de parentesco são os vínculos decorrentes da consanguinidade e da afinidade que ligam as pessoas a determinado grupo familiar. Cônjuges e companheiros não são parentes, apesar de integrarem a família, mantendo vínculo de afinidade com os parentes do par. Os vínculos de afinidade surgem, quando do casamento e da união estável, com os parentes do cônjuge ou do companheiro (CC 1.595). A afinidade é considerada um vínculo de menor intensidade,2 distinção que não se justifica. Essa visão estreita não vence hoje o conteúdo socioafetivo ampliador das relações familiares.3 De qualquer forma, a lei não se preocupou em distingui-las, tratando os parentes consanguíneos e por afinidade no capítulo “Das relações de parentesco” (CC 1.591 a 1.595). Além de um vínculo natural, os elos de parentais não se constituem e nem se desfazem por ato de vontade. O parentesco também é um vínculo jurídico estabelecido por lei, que assegura direitos e impõe deveres recíprocos. A espécie de parentesco, a maior ou menor proximidade dos parentes, dispõe de reflexos jurídicos diversos, a depender do grau de intensidade da solidariedade familiar.4 De modo geral, atenta-se ao critério da proximidade: os parentes mais próximos são os primeiros a ser convocados. Basta lembrar a obrigação alimentar e a ordem de vocação hereditária. As profundas alterações que ocorreram na família se refletem nos vínculos de parentesco. A própria Constituição Federal (227 § 6.º) encarregou-se de alargar o conceito de entidade familiar ao não permitir distinções entre filhos, afastando adjetivações relacionadas à origem da filiação. Ocorreu verdadeira desbiologização da paternidade-maternidade-filiação e, consequentemente, do parentesco em geral. Assim, deve-se buscar um conceito plural de paternidade, de maternidade e de parentesco em sentido amplo, no qual a vontade, o consentimento, a afetividade e a responsabilidade jurídicas terão missões relevantes.5 A fantástica evolução da engenharia genética e o surgimento das mais diversas formas de reprodução assistida embalam o sonho de qualquer pessoa que deseja ter um filho, não sendo mais possível limitar os vínculos de parentesco à verdade biológica. O Código Civil, ao tratar, ainda que de forma singela, das presunções de paternidade, reconhece a filiação fruto de concepção artificial homóloga (CC 1.597 III e IV) e heteróloga (CC 1.597 V). Todas essas nuances geram sérias dificuldades ao se tentar definir o que seja parentesco. Afirmar que é uma relação que vincula entre si pessoas que descendem umas das outras ou descendem de um tronco comum abrange só o parentesco por consanguinidade,6 deixando de fora o parentesco decorrente da adoção, da socioafetividade, bem como os vínculos de afinidade. Como o legislador olvidou-se de regular as famílias parentais, ou seja, as entidades familiares formadas entre os parentes colaterais, não estabeleceu os vínculos de parentesco que geram. Como as uniões homoafetivas também constituem entidade familiar, não há como deixar de reconhecer a formação de vínculo de parentesco. 21.2 Classificação Como as estruturas familiares dispõem de diversas origens, vários são os critérios utilizados para classificar as relações de parentesco, a depender da identificação que se queira estabelecer entre duas pessoas.7 O parentesco decorre das relações conjugais, de companheirismo e de filiação, maternal ou paternal. Pode ser natural, biológico, civil, adotivo, por afinidade, em linha reta ou colateral. Todas as distinções e classificações feitas de modo minucioso pela lei dispõem de enorme importância. A identificação dos vínculos de parentesco tem reflexos nos impedimentos matrimonias, ante a proibição de incesto: os parentes em linha reta – pais e filhos, avós e netos – não podem casar (CC 1.521 I). Em sede de alimentos também é fundamental identificar os graus de parentesco em face da reciprocidade da obrigação alimentar. Os primeiros convocados a prestar alimentos são os parentes mais próximos (CC 1.696). No direito sucessório, a espécie de parentesco determina o modo de participar da herança, segundo a ordem de vocação hereditária (CC 1.829).8 As distinções entre parentesco em linha reta, em linha colateral e por afinidade são de duas ordens. Os parentes em linha reta descendem uns dos outros. São parentes na linha colateral quem tem um ascendente comum. O parentesco em linha reta é ilimitado e, na linha colateral, limita-se ao quarto grau, ao menos para efeitos jurídicos. Os vínculos em linha reta são perpétuos – quer decorram de parentesco, quer de afinidade –, não se extinguindo nem quando findo o casamento ou a união estável (CC 1.595 § 2.º). Quanto à linha colateral, se a relação é por consanguinidade, o parentesco se estende até o quarto grau. Em se tratando de afinidade, o limite é o segundo grau. Ambos terminam quando finda o relacionamento. 21.2.1 Natural e civil Historicamente, sempre se reconheceu que os vínculos de consanguinidade geram o que se chama de parentesco natural, denominando-se de parentesco civil o decorrente de adoção. A diferenciação entre o parentesco consanguíneo e o civil que repercute na classificação dos filhos em naturais e civis, funda-se em distinção que não mais se justifica. É tida como discriminatória, principalmente em face da regra constitucional (CF 227 § 6.º): Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. Ou seja, filhos são filhos, sem qualquer adjetivação. O desenvolvimento das modernas técnicas de reprodução assistida ensejou o que passou a ser chamado de desbiologização da parentalidade, impondo o reconhecimento de outros vínculos de parentesco. Assim, parentesco civil não é somente o que resulta da adoção. Também o é o que decorre de qualquer outra origem que não seja a biológica. Não há como deixar de reconhecer que a concepção decorrente de fecundação heteróloga (CC 1.597 V) gera parentesco civil.9 O prestígio da verdade afetiva frente à realidade biológica impôs o alargamento do conceito de filiação. Nos dias atuais, como afirma Guilherme Calmon Nogueira da Gama, paternidade, maternidade e filiação não decorrem exclusivamente de informações biológicas ou genéticas – dá-se relevo a sentimentos nobres, como o amor, o desejo de construir uma relação afetuosa, carinhosa, reunindo as pessoas num grupo de companheirismo, lugar de afetividade, para o fim de estabelecer relações de parentesco.10 Muito se questiona se a lei civil enlaçou o critério socioafetivo. Como bem observa Sérgio Gischkow Pereira, tudo indica que o legislador dele não cogitou. A doutrina e a jurisprudência vêm se esforçando por detectá-lo.11 Afirma-se que existe espaço para o reconhecimento de outros vínculos além da consanguinidade e da adoção, em face da amplitude da expressão “outra origem” (CC 1.593): O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem. Assim, “outra origem” não significa mais e tão somente o parentesco decorrente da adoção, mas o parentesco que tem origem diversa da consanguínea.12 Também a referência a veementes presunções resultantes de fatos já certos (CC 1.605 II) diz com o conceito de posse de estado de filho, nada mais do que afiliação socioafetiva. Desse modo, a filiação pode constituir- se pela incidência direta de uma lei, que regula a atribuição do estado de filho, ou da posse de estado: situação fática prolongada de convivência e afetividade que conduz à paternidade.13 21.2.2 Biológico ou consanguíneo Parentes consanguíneos são as pessoas que têm entre si um vínculo biológico. Assim, são parentes as pessoas que descendem umas das outras, ou têm um ascendente comum. O estabelecimento dos elos de parentesco sempre tem origem em um ascendente: pessoa que dá origem a outra pessoa. Descendentes são os parentes que se originam a partir da filiação. Os vínculos de ascendência e descendência natural têm origem biológica, mas podem decorrer da adoção, que gera o desligamento do adotado dos parentes consanguíneos. Quando ocorre a perda do poder familiar, ainda persiste o vínculo de parentesco natural para efeitos outros, como, por exemplo, a obrigação alimentar e os impedimentos matrimoniais. O casamento e a união estável também geram vínculo de ascendência e descendência, ainda que por afinidade. 21.2.3 Linha reta Falar em linha de parentesco é identificar a vinculação da pessoa a partir de um ascendente comum. A identificação da linha de parentesco é o que permite distinguir parentes em linha reta dos parentes em linha colateral. Em linha reta são aqueles que descendem uns dos outros. Na linha colateral, as pessoas relacionam- se com um tronco comum, sem descenderam umas das outras. O parentesco em linha reta leva em consideração a relação de ascendência e de descendência entre os parentes. O parentesco em linha colateral funda-se na ancestralidade comum, sem relação de ascendência ou descendência. O parentesco em linha reta é infinito, nos limites que a natureza impõe à sobrevivência dos seres humanos.14 Assim, não tem fim o parentesco entre ascendentes e descendentes: bisavô, avô, filho, neto, bisneto etc. São todos parentes. Por mais afastadas que estejam as gerações, serão sempre parentes entre si as pessoas que descendem umas das outras.15 É o que diz o Código Civil (1.591): são parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes. Dependendo do ângulo que se visualiza, o parentesco em linha reta é ascendente ou descendente, conforme se encare o parentesco subindo da pessoa a seu antepassado, ou descendo, sem qualquer limitação.16 Uma pessoa tem uma relação de parentesco em linha reta ascendente com seus pais, avós, bisavós etc. Cabe um exemplo: parte-se do neto (C), subindo-se ao pai (B) até o avô (A), e, assim, sucessivamente. Com referência aos filhos, netos, bisnetos etc., a relação de parentesco é de linha reta descendente. De novo o exemplo: olha-se a partir do pai (A), frente ao filho (B) e ao neto (C). Todas as pessoas, sob o prisma de sua ascendência, têm duas linhas de parentesco, pois descendem de duas pessoas. A linha de ascendência bifurca-se sucessivamente entre os ascendentes paternos e maternos. Chama-se linha paterna o parentesco com o genitor e com os ascendentes dele, daí avós e bisavós paternos. Só o exemplo socorre. O parentesco de alguém (A) com o pai (B) e com os seus ascendentes – avós (D e E) e bisavós paternos (H, I, J e K) – se estende sem qualquer limite. O parentesco em linha reta ascendente materna diz com os pais e avós da mãe: avós e bisavós maternos. Assim, o parentesco em linha reta ascendente materna se constitui com a mãe (C), os avós (F e G) e os bisavós maternos (L, M, N e O). 21.2.4 Linha colateral Vínculos de parentesco igualmente se estabelecem quando, entre duas pessoas, existe um ancestral comum, fazendo surgir entre ambas uma relação de parentesco na linha colateral. Os parentes colaterais provêm de um tronco comum, não descendendo uns dos outros. Portanto, não existe parente colateral de primeiro grau. A contagem se faz indo até o ascendente comum, por exemplo, o mesmo pai, mesmo avô. O parentesco colateral encerra-se no quarto grau (CC 1.592): São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra. Os irmãos são parentes em segundo grau na linha colateral. Tios e sobrinhos são parentes colaterais de terceiro grau, enquanto os sobrinhos-netos, tios-avós e primos são parentes colaterais em quarto grau. Assim, tanto os irmãos (B e C) como os primos (D e E) são parentes colaterais. Também o são o tio (B) frente ao sobrinho (E) e o tio-avô (B) em relação ao sobrinho-neto (G). Todos têm como ascendente comum (A). Além desses, existem outros graus de parentesco, mas, para efeitos jurídicos, só é reconhecido o vínculo até o quarto grau. 21.2.5 Grau Outro critério de classificação diz com os graus de parentesco, ou seja, o número de gerações que separa os parentes. É distinta a forma de contagem dos graus de parentesco, entre os parentes em linha reta e os parentes em linha colateral ou transversal (CC 1.594). Na linha reta, identifica-se o grau de parentesco pelo número de gerações que os separam. Conta-se o intervalo entre uma geração e outra. Assim, pai (A) e filho (B) são parentes na linha reta em primeiro grau; avó (A) e neto (C) são parentes em segundo grau; bisavô (A) e bisneto (D) são parentes na linha reta em terceiro grau, e assim por diante. Na linha colateral, o parentesco também é contado pelo número de gerações entre os parentes, mas é necessário subir até o ascendente comum e depois descer até o outro parente para se identificar o grau de parentesco (CC 1.594). Cabem alguns exemplos. Irmãos (B e C) são parentes em segundo grau, eis que uma geração separa cada um do pai (A), que é o ascendente comum a ambos. Tio (B) e sobrinho (E) são parentes em terceiro grau, pois (A) é o ascendente comum, pai de um e avô do outro. Primos (D e E) são parentes em quarto grau, têm em comum o avô (A). Tio-avô (B) e sobrinho-neto (G) são igualmente parentes colaterais de quarto grau. Quanto aos irmãos, ainda é feita uma distinção por estirpe. Os filhos do mesmo pai e da mesma mãe são chamados de irmãos germanos ou bilaterais por terem parentesco bilateral. Os filhos apenas do mesmo pai ou somente da mesma mãe são irmãos unilaterais (os chamados meio-irmãos). Essa distinção ganha relevo no direito sucessório, quando são chamados à sucessão os parentes colaterais. Somente há igualdade na partilha se todos forem irmãos bilaterais ou todos unilaterais. Concorrendo à herança irmãos unilaterais e bilaterais, estes têm direito ao dobro da parte destinada ao meio-irmão (CC 1.841). É flagrante a inconstitucionalidade de tal distinção.17 Afinal, não permite a Constituição qualquer tratamento discriminatório entre filhos, reconhecendo inclusive ao adotado os mesmos direitos. Nada justifica assegurar aos irmãos direitos sucessórios diferenciados, principalmente quando a obrigação alimentar dos irmãos germanos e unilaterais é a mesma (CC 1.697). A discriminação, além de inconstitucional, é, sem dúvida, injusta.18 21.3 Afinidade Os vínculos de afinidade e de parentesco, ainda que tratados em conjunto pelo legislador, não se confundem, mas ambos geram direitos e obrigações. A afinidade tem origem na lei e se constitui quando do casamento ou da união estável e vincula o cônjuge e o companheiro aos parentes do outro. A afinidade associava-se apenas ao casamento, mas, com a constitucionalização da união estável, a lei estendeu-lhe os vínculos de afinidade (CC 1.595): Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade. No casamento é fácil identificar quando tem início a relação de afinidade: na celebração do matrimônio. A dificuldade é estabelecer o termo inicial do vínculo de afinidade em se tratando de união estável. Como se trata de entidade familiar que se constitui com o passar do tempo, é necessário um estágio de convivência eo atendimento aos pressupostos legais (CC 1.723) para o seu reconhecimento.19 Assim, se é difícil a identificação do momento em que se constitui a união estável, não é fácil saber o momento em que nasce o vínculo de afinidade. Os parentes afins não são iguais e nem são equiparados aos parentes consanguíneos, mas existe certa simetria no que diz com linhas, graus e espécies. O vínculo que se estabelece é tanto em linha reta como colateral. A afinidade em linha reta não tem limite de grau (sogro, nora, genro) e se mantém mesmo com a dissolução do casamento e da união estável (CC 1.595 § 2.º). A afinidade também comporta duas linhas – a linha reta e a linha colateral –, e conta-se do mesmo modo. Na linha colateral, a afinidade não passa do segundo grau e se restringe aos cunhados. Esse vínculo só existe durante a vigência da união matrimonial ou estável. Solvida a entidade familiar, desaparece a afinidade entre os colaterais. O vínculo de afinidade se estabelece também com relação aos filhos de um dos cônjuges ou companheiros. Assim, o filho de um passa a ser filho por afinidade do seu cônjuge ou parceiro. Na ausência de melhor nome, costuma-se chamar de padrasto ou madrasta e enteado os parentes afins de primeiro grau em linha reta. O padrasto ou a madrasta podem adotar o enteado. É o que se chama de adoção unilateral. Uma das hipóteses em que o adotante não se submete ao malfadado cadastro (ECA § 13 I). A lei também admite ao enteado a adoção do nome do padrasto ou madrasta, mas sem excluir o vínculo parental anterior (LRP 57 § 8º). Vem a jurisprudência reconhecendo a constituição de uma filiação socioafetiva com a imputação de obrigação alimentar ao padrasto. Dissolvido o casamento ou a união estável, o vínculo de afinidade não se dissolve integralmente. Permanece com relação aos parentes em linha reta. Nem a morte solve o vínculo de afinidade. Ou seja, não existe “ex-sogro”, “ex-sogra” ou “ex-enteado”. Persistindo o vínculo de parentesco, permanece o impedimento matrimonial entre eles. Já com relação aos demais, não há qualquer óbice. Logo, nada impede o casamento com irmãos, tios, sobrinhos ou primos do ex-cônjuge ou ex-companheiro. A afinidade é de ordem pessoal, não se ampliando além dos limites traçados na lei. Assim, não se vinculam os parentes dos cônjuges e companheiros. Os afins dos cônjuges não são afins entre si, porque afinidade não gera afinidade.20 Portanto, os sogros não são parentes entre si. Não há impedimento de qualquer ordem, nem para o casamento, de modo que os pais de um casal podem contrair matrimônio. O viúvo, o divorciado ou o ex-companheiro não pode casar nem com os pais nem com os filhos do ex-cônjuge ou ex-companheiro (CC 1.521 II). O vínculo de afinidade tem por fito muito mais o estabelecimento de impedimentos de ordem moral, para evitar a aquisição de algum direito ou vantagem em face da aproximação afetiva que ocorre entre as famílias.21 Solvido o casamento ou a união estável, impositiva a fixação do direito de visita dos avós aos netos, direito agora reconhecido legalmente.22 Afinal, o vínculo de afinidade não se rompe. Apesar da falta de previsão legal, não há por que vetar o direito de visita entre tios e sobrinhos. Mais do que cabível, é recomendável assegurar a visitação, quando comprovado que atende aos interesses do infante o contato com quem mantém vínculos afetivos. A preocupação atual é com o bom desenvolvimento e bem-estar de crianças e adolescentes, revelando-se saudável a convivência familiar. 21.4 Obrigação alimentar Uma das finalidades da perfeita identificação dos vínculos de parentesco não é só garantir direitos, mas também atribuir obrigações. A obrigação alimentar é imposta a todos os parentes. A lei é enfática e reafirma essa responsabilidade: podem os parentes… (CC 1.694); se o parente… (CC 1.698). Como o parentesco em linha reta é infinito, também o é a obrigação alimentar. Pais, filhos, avós, netos etc. tem obrigação alimentar de um para com o outro. O parentesco na linha colateral vai até o quarto grau, e a obrigação alimentar se estende além dos irmãos, alcançando tios, sobrinhos, tios-avós, sobrinhos-netos e primos. Há resistência da doutrina em face da explicitação feita pela lei, com relação ao dever de alimentos dos irmãos germanos e unilaterais (CC 1.697). Porém, como o direito hereditário alcança todos os graus de parentesco (CC 1.829), difícil é não atribuir obrigação alimentar em favor de quem é herdeiro. É atribuir direito a quem não é imposta obrigação. Quem é herdeiro de alguém deve ter obrigação, ao menos, de garantir-lhe a subsistência. Dissolvido o casamento ou a união estável, não se extingue o parentesco por afinidade na linha reta (CC 1.595 § 2.º). Ora, se subsiste o vínculo de parentesco por afinidade, para além do fim do casamento e da união estável, a obrigação alimentar também deve permanecer. Dissolvido o casamento ou a união estável, possível é tanto o ex-sogro pedir alimentos ao ex-genro, como este pedir alimentos àquele. Portanto, não dispondo o ex-cônjuge ou o ex- companheiro de condições de alcançar alimentos a quem saiu do relacionamento sem condições de prover o próprio sustento, os primeiros convocados são os parentes consanguíneos. Na impossibilidade de estes prestarem algum auxílio, pela permanência do vínculo de afinidade, que tem por base a solidariedade familiar, é de se reconhecer a responsabilidade alimentar subsidiária e de caráter complementar dos parentes por afinidade. Claro que a tese não tem o respaldo da doutrina e não vinga na justiça. Como o vínculo permanece, mesmo solvidos os laços de convivência, vem a justiça reconhecendo a obrigação alimentar do padrasto para com o enteado. De qualquer forma, quando se passa a falar em paternidade alimentar,23 é de se repensar a obrigação decorrente da paternidade afetiva também do genitor afim. Leitura complementar BARBOZA, Heloisa Helena. Efeitos jurídicos do parentesco socioafetivo. Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, Porto Alegre, IBDFAM/Magister, n. 9, p. 25-34, abr.-maio 2009. DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2013. 1. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 26. 2. Arnoldo Wald, Direito de família, 36. 3. Waldyr Grisard Filho, Famílias reconstituídas…, 66. 4. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Das relações de parentesco, 107. 5. Idem, 118. 6. Silvio Rodrigues, Direito civil: direito de família, 289. 7. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 26. 8. Maria Berenice Dias, Manual das sucessões, 37. 9. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, A reprodução assistida heteróloga…, 16. 10. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Das relações de parentesco, 118. 11. Sérgio Gischkow Pereira, Direito de família, 86. 12. Silvio Rodrigues, Direito civil: direito de família, 290. 13. Roberto Paulino de Albuquerque Júnior, A filiação socioafetiva no direito brasileiro…, 64. 14. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 17. 15. Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 199. 16. Idem, 199. 17. Cláudio Grande Jr., A inconstitucional discriminação entre irmãos…, 86. 18. Maria Berenice Dias, Manual das sucessões, 45. 19. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 36. 20. Sílvio Venosa, Direito civil: direito de família, 272. 21. Paulo Lôbo, Código Civil comentado…, 35. 22. L 12.398/11. 23. Rolf Madaleno, Paternidade alimentar, 195.
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