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Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 1 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar 1. INTRODUÇÃO No direito processual comparado, moderno, especialmente, no europeu, a exemplo de Portugal, Suiça, França, Bélgica, Áustria, Alemanha, a fase de cumprimento de sentença e o processo executivo de título extrajudicial, o papel do magistrado é restrito aos atos decisórios para dirimir eventual conflito. O magistrado não tem um papel frequente/ordinatório como ocorre no direito processual brasileiro. Não cabe ao juiz efetuar os principais atos executivos, que são transferidos para a figura do “agente executivo”, que funciona como auxiliar da justiça, que pode ser um profissional liberal ou um funcionário judicial, designado pelo exequente dentre os registrados em lista oficial, a quem se atribui o desempenho das tarefas executivas, exercidas em nome do tribunal1. Em terras lusitanas (Portugal), o agente de execução “é um misto de profissional liberal e funcionário público”. A presença desse agente não retira a natureza jurisdicional do processo executivo, mas implica na menor intervenção do juiz nos atos processuais e também na diminuição dos atos praticados pela Secretaria. O juiz exerce a função de controle e intervém em caso de litígio. É da competência, por exemplo, do agente executivo, a citação, e a notificação no processo executivo e só ocorrerá a interferência do juiz para decidir oposição à execução, graduação dos créditos, impugnações de atos e decisões do agente executivo2. Como se vê, no direito processual europeu moderno, pode-se afirmar que o processo executivo foi parcialmente desjudicializado, pois a maioria dos atos é feita extrajudicialmente. Não se eliminou a judicialidade do processo executivo, porém reduziu profundamente a intervenção judicial na fase de realização da prestação a que o devedor foi condenado. Tal intervenção, quase sempre, se dá nas hipóteses de litígios incidentais surgidos no curso do procedimento executivo, o que demonstra a preocupação comum de reduzir, quanto possível, a sua judicialização. Com as reformas do CPC/1973 ocorridas em 2005/2006, aboliu-se a instauração do processo autônomo de execução de sentença (actio iudicati). Essa reforma trouxe para o processo 1 THEODORO JÚNIOR, Humberto. et al. Novo CPC – Fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: Forense, 2015. 2 Idem. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 2 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar executivo a dualidade do processo, o procedimento híbrido, a instituição da antecipação dos efeitos da tutela, sumariedade, ex officio etc. Na exposição de motivos da Lei 11.232/2005 que alterou o processo de cumprimento de sentença do CPC/1973, foi adotada “uma sistemática mais célere, menos onerosa e mais eficiente para as execuções de sentença que condena ao pagamento de quantia certa”3. As mudanças trazidas por essa lei causaram reações favoráveis e desfavoráveis, como a crítica de Leonardo Greco que diz que essa reforma fortaleceu a posição do credor, mas em contrapartida fragilizou a posição do devedor. Os favoráveis as mudanças afirmam que trouxeram celeridade e eficiência para o processo executivo. Athos Gusmão Carneiro concluiu que a reforma unificou o processo de condenação e execução, cumprindo com propriedade a garantia de duração razoável do processo e medidas de aceleração da prestação jurisdicional, incluída entre as garantias fundamentais pela Emenda Constitucional nº 45/2004, com a instituição do inciso LXXVIII, do art. 5º, da CF/884. Fazendo-se uma retrospectiva de um passado recente, antes das reformas processuais do ano de 2005/2006, a execução de sentença (que depois foi nominada de cumprimento de sentença) era formada por dois processos: o de conhecimento e o executivo. No de conhecimento o juiz examinava a lide para descobrir a regra jurídica a ser aplicada ao caso concreto e terminava com o trânsito em julgado da sentença. Enquanto o processo de execução providenciava as operações práticas necessárias para efetivar o conteúdo da norma e iniciava, à semelhança do processo executivo de título extrajudicial, com a abertura de processo autônomo, com uma nova distribuição, recebia um novo número de processo, apensava-se ao processo de conhecimento, fazia-se a citação para pagamento e conferia prazo para embargos, enfim, era um novo processo e demorado. Com as reformas de 2005/2006, o legislador, de acordo com Alexandre Freitas Câmara, alterou a natureza jurídica da execução de sentença, que passou de processo autônomo a fase do processo, isto é, a execução de sentença civil adotou, como regra, o processo sincrético, 3 LIVRAMENTO, Geraldo Aparecido do. Execução no novo CPC. Leme (SP): JH Mizuno, 2016. 4 THEODORO JÚNIOR, op cit. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 3 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar visto que foram reunidas na mesma relação processual os atos cognitivos e os executivos, pois o juiz, ao decidir a causa, realizará os atos executivos, sem a necessidade da proposição de um novo processo. O juiz emite a sentença e, logo após o seu trânsito em julgado, se encarrega de promover o seu cumprimento, sem a necessidade da instauração de uma nova relação processual5. O novo CPC adotou a mesma sistemática introduzida pelas reformas processuais de 2005/2006, não aboliu, nem em parte, a judicialização do processo executivo, contudo, pode-se verificar, principalmente, dentro do processo executivo de título extrajudicial, uma certa autonomia na atuação das partes e mais significativa participação nos atos executivos e na solução final do processo. Com isso, reconheceu o legislador, acompanhando o entendimento da melhor doutrina, que as partes não são apenas figurantes passivos da relação processual, mas agentes ativos com poderes e deveres para uma verdadeira e constante cooperação na busca do provimento final. A exemplo dessa nova postura cooperativa e flexibilização do excesso de publicismo (redução da intervenção judicial/magistrado, pois o processo passar a ser propulsionado a interesse do credor), destacam-se: à nomeação de bens à penhora, cuja iniciativa passou basicamente para o exequente/credor, que também assumiu o comando da expropriação dos bens penhorados, podendo, desde logo, adjudicá-los ou submetê-los a venda particular, evitando os inconvenientes da hasta pública (leilão e praça). Por parte do executado/devedor abriu-se a possibilidade de substituição da penhora, desde que sem prejuízo do direito do credor e a defesa do executado independe de prévia penhora etc. Em suma, o processo executivo de título extrajudicial sofreu algumas importantes mudanças, ou melhor dizendo, se revestiu do aspecto cooperativo, mas não se afastou da tônica do processo executivo civil inserido no CPC/1973, reformado pela Lei de 11.232/2005. Ao longo deste curso, trataremos, dentro do possível, com mais vagar, as principais mudanças trazidas pelo novo CPC para o processo executivo, com uma didática voltada para a prática processual a ser desempenhada nas secretarias de vara. 5DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. v. I: tomo 2. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.312 Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença eExecução de Título Extrajudicial 4 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar 2. DA EXECUÇÃO EM GERAL Para um melhor entendimento do processo executivo, faz-se oportuno, traçar um paralelo entre o processo de conhecimento, o processo executivo e o cumprimento de sentença. A atuação jurisdicional no processo de conhecimento é bem distinta daquela observada no processo de execução, razão pela qual existem regras e sistemática próprias para cada um deles. Há duas formas de execução civil: cumprimento de sentença (que não forma novo processo, salvo nos casos de sentença arbitral, penal, condenatória ou estrangeira) e a execução por título extrajudicial, que sempre inicia com a formação de um novo processo. O cumprimento da sentença é tratado no Livro I da Parte Especial, a partir do art. 513 do CPC. O Livro II da Parte Especial aplica-se ao processo de execução por título extrajudicial e contem regras que não são apenas de natureza procedimental, mas que dizem respeito aos mecanismos da execução em geral, aplicando-se supletivamente ao cumprimento da sentença se não forem incompatíveis, nem contrariarem alguns dos dispositivos específicos de cada tipo de execução. Podemos assim sistematizar: EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Natureza de processo autônomo Não tem natureza de processo autônomo (trata-se de uma fase processual) Fundada em título executivo extrajudicial Fundada em título executivo judicial Mediata, pois sempre implica na formação de um novo processo autônomo Imediata – sem novo processo Não pressupõe, necessariamente, uma prévia definição por meio do processo de conhecimento, pois os títulos executivos extrajudiciais permitem o acesso à atividade jurisdicional executiva, sem qualquer discussão prévia sobre o direito do exequente Será sempre precedido de um processo civil de conhecimento de cunho condenatório, salvo se fundado em sentença arbitral, penal condenatória ou estrangeira. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 5 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar Na fase de conhecimento, o juiz faz a cognição da relação jurídica e da demanda apresentada6 e ao final realiza a prestação jurisdicional na fase de conhecimento, com a prolação de uma sentença que se traduz na imposição da solução jurídica para a lide, salvo quando a composição da lide resultar de transação entre as partes, quando será uma sentença homologatória de acordo firmado através de conciliação e/ou mediação. Ambas as sentenças passarão a ser obrigatórias para todos os sujeitos do processo (autor, réu, Estado e terceiros/intervenientes juridicamente envolvido e interessados). A fase de cumprimento de sentença, como o nome já induz, é a realização material do direito do credor, uma vez que o processo de conhecimento não se encerra com a sentença, prossegue na mesma relação processual até alcançar a concretização da prestação a que tem direito o credor e a que está obrigado o devedor, razão pela qual o processo de conhecimento é chamado de sincrético (misto), pois estabelece a prestação e busca sua realização com os atos executivos próprios do cumprimento de sentença. O processo executivo de título extrajudicial que é um processo autônomo, no qual o direito à prestação já vem previamente estabelecido, fundado em título executivo extrajudicial, não se faz admissibilidade do direito do exequente, preocupa-se apenas em verificar a regularidade do título (liquidez, certeza e exigibilidade) e já prossegue com os atos constritivos/executórios para garantia do juízo (pagamento do débito). 2.1 Da função executiva Os provimentos judiciais/sentença decorrem da natureza da pretensão das partes (do bem da vida perseguido), cuja classificação pela doutrina é dividida em TRINÁRIA e QUÍNTUPLA. Os adeptos da corrente TRINÁRIA seguem a doutrina de LIEBMAN e os da QUÍNTUPLA seguem a doutrina de PONTES DE MIRANDA. Para a TEORIA TRINÁRIA há três espécies de sentença: a) meramente declaratória b) constitutiva c) condenatória. 6 Conhece, estuda, analisa os fatos, colhe as provas, faz juízo de valor, dar oportunidade para o contraditório, se empenha pela solução consensual do litígio através da autocomposição etc. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 6 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar Enquanto para a TEORIA QUÍNTUPLA, há cinco espécies de sentença: a) declaratória; b) condenatória; c) constitutiva; d) executiva; e) mandamental A discussão entre as duas teorias limita-se a uma questão de classificação, com poucos resultados práticos dignos de destaque. Mais adequada e certamente útil é a exata definição dos elementos que compõem cada uma dessas espécies ou subespécies7. Nem todos os direitos reconhecidos judicialmente por sentença exigem a função executiva para levar a efeito a pretensão de deduzida em juízo, porque a sentença, por si só, já satisfaz o demandante, pois se realiza de modo independente, dispensando a função executiva. A exemplo disso, temos os PROVIMENTOS MERAMENTE DECLARATÓRIOS E CONSTITUTIVOS, que não demandam execução, SÃO AUTOSUFICIENTES, com exceção dos honorários sucumbenciais. Dentro de uma mesma sentença podem conviver mais de uma eficácia. A sentença pode ser declaratória e condenatória, constitutiva e condenatória, razão pela qual quando se tratar de provimento misto, a parte condenatória deverá ser concretizada pela via executiva. Segue abaixo um quadro resumo e conceitual: TIPO DE PROVIMENTO DESCRIÇÃO EXEMPLO SENTENÇA CONDENATÓRIA Quando a satisfação do vencedor dependerá dos bens porventura integrantes do patrimônio do vencido. Sentença procedente em ação de cobrança. SENTENÇA EXECUTIVA LATO SENSU Quando satisfação visa a recuperar bem integrante do patrimônio do vencedor. Sentença procedente em reintegração de posse. SENTENÇA DECLARATÓRIA É a declaração da existência ou inexistência de uma relação jurídica de direito material. A certeza jurídica é o bem da vida tutelado. Sentença que declara nula cláusula contratual. (Súmula 181, STJ e arts. 19 e 20, NCPC) 7NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 5a. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2013. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 7 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar SENTENÇA CONSTITUTIVA Tem eficácia constitutiva, de criação, modificação ou extinção. é a alteração da situação jurídica, necessariamente com a criação de uma situação jurídica diferente da existente antes de sua prolação, com todas as conseqüências advindas dessa alteração. Sentença homologatória de Divórcio SENTENÇA MANDAMENTAL Caracteriza-se pela existência de uma ordem do juiz dirigida à pessoa ou órgão para que faça ou deixe de fazer algo, não se limitando, portanto, à condenação do réu. A satisfação da sentença mandamental é feita pelo cumprimento da ordem, não existindo processo ou fase de execução subsequente a ela visando tal satisfação. Sentença que julga procedente pedido de exibição de documentos. Esse breve apanhado sobre a classificação das sentenças facilitará o entendimentodentro da teoria geral da execução que há provimentos judiciais que dispensam a fase executiva para produzir seus efeitos. A função executiva se traduz, em suma, em um procedimento de expropriação de bens para garantia de um crédito, buscando-se o cumprimento de uma obrigação pecuniária. Como já afirmado, o provimento condenatório exige a função executiva para realizar o direito material reconhecido na sentença, os demais provimentos são autoexecutáveis. Nesse contexto, para efeito de dirimir eventual dúvida, é importante fazer a distinção entre a sentença executiva e a condenatória: na sentença condenatória, o direito é de crédito, buscando-se o cumprimento de uma obrigação pecuniária [exemplo: reparação por dano moral], enquanto na sentença executiva o direito é real (coisa), buscando-se a retomada de coisa que está injustamente no patrimônio do executado [exemplo: reintegração de posse de imóvel]. Nessa visão, a sentença condenatória retira algo do patrimônio do executado que até a sentença lá estava legitimamente, enquanto na sentença executiva se retoma bem que pertence ao exequente, que estava injustamente com o executado8. 8NEVES, op cit. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 8 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar 3. PRINCÍPIOS GERAIS DO PROCESSO EXECUTIVO 3.1 Considerações gerais O processo civil moderno vem seguindo a tendência mundial do constitucionalismo democrático, de fazer a interpretação constitucional de todo o seu ordenamento jurídico, tendo a constituição como “o fiel da balança” de todas as normas infraconstitucionais. O Brasil segue a cultura da codificação de seu ordenamento jurídico, e, aos poucos, traz para dentro de seus códigos as normas constitucionais [o fenômeno conhecido como constitucionalização do direito]. No meio jurídico, especialmente entre doutrinadores, tem surgido a crítica de que se já está na Constituição (Lei maior), não se faz necessário repetir as mesmas normas na legislação infraconstitucional. Mas como a cultura da codificação defende que para ter segurança jurídica precisa estar escrito, tem prevalecido a técnica de repetir os princípios constitucionais na legislação infraconstitucional. Uma das maiores preocupações do Novo Código de Processo Civil é a de conceber um novo formalismo que se adeque às diretrizes do processo democrático, de modo a evitar que as formas processuais sejam estruturadas e interpretadas em discordância com o modelo constitucional do processo9. O CPC de 2015, percorrendo esse caminho, elencou e corporificou em diversos artigos os princípios constitucionais do processo previstos na Constituição Federal de 1988. Em relação a tutela jurisdicional executiva merecem destaques os seguintes dispositivos: Art. 4º As partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. Adiante, trataremos dos princípios que informam o sistema processual executivo 9 THEODORO JÚNIOR, Humberto. et al. Novo CPC – Fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 9 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar brasileiro e, em breves linhas, discorreremos sobre a importância e o papel dos princípios no ordenamento jurídico. A doutrina moderna, e.g., J. J. Canotilho, Luís Roberto Barroso, Paulo Bonavides, Robert Alexy, Ronald Dworkin, que, ao contrário do que defendia a doutrina clássica, para a qual existiam distinções entre princípios e normas, passa a entender que as normas são o gênero do qual fazem parte as espécies princípios e regras, já que ambos exprimem um dever ser. Portanto, princípio é norma jurídica e deve ser obedecido e aplicado, daí a importância de estudá-los. Para Dworkin, o princípio é um “padrão que deve ser observado, não porque vá promover ou assegurar uma situação econômica, política ou social considerada desejável, mas porque é uma exigência de justiça ou equidade ou alguma outra dimensão da moralidade” (DWORKIN, 2007, p. 36). São eles que orientarão o sentido da sentença proferida pelo juiz, evitando, assim, que as decisões sejam juízos discricionários do juiz e que o direito se desvincule da moral. Princípio é espécie do gênero norma jurídica e deve ser observado na interpretação e na aplicação da lei ao caso concreto. Sua observância é obrigatória. Além dos princípios gerais do processo inseridos tanto no Código de Processo Civil quanto na Constituição Federal, o processo de execução tem sustentação em princípios específicos. Para o nosso curso adotamos 09 (nove) princípios, os quais foram extraídos da doutrina e do próprio Código de Processo Civil de 2015. Senão vejamos: 1. PRINCÍPIO DA LIVRE-INICIATIVA (INÉRCIA DA JURISDIÇÃO CIVIL) Segundo a regra do art. 778 do CPC, a execução depende da promoção dos legitimados ativos que ali estão arrolados. Esse princípio fica evidenciado tanto quando a execução de título executivo extrajudicial é ajuizada pelo exequente, detentor do título em que se funda a execução, quanto no cumprimento de sentença (execução de título judicial), cuja fase processual só é inaugurada por Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 10 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar impulso e a pedido da parte credora (§1º, art. 513 CPC), como veremos adiante, mais amiúde. 2. PRINCÍPIO DA REALIDADE OU DA PATRIMONIALIDADE O princípio da realidade ou da patrimonialidade implica em dizer que o devedor responde com os seus bens presentes e futuros, e não com sua pessoa, para cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei (art. 789 do CPC). Dentre estas restrições podemos citar a lei de alimentos, assim como dos dispositivos do novo CPC, que permitem a prisão civil do devedor quando se tratar do pagamento de prestação alimentícia em razão do parentesco – devedor de alimentos decorrentes de direito de família, isto é, de casamento, união estável e parentesco. Nesse tópico, a priori, é importante enfatizar que a prisão do devedor de alimentos não garante o juízo, ou seja, não paga a dívida, mas sim, é uma forma de coerção para que o devedor, bem como uma forma de inibir que o obrigado a prestar alimentos evite o inadimplemento. Não existe mais a prisão civil do depositário infiel, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal no RE 466.343, tanto nos casos de alienação fiduciária em garantia quanto nos demais casos, incluindo depositário infiel (esse entendimento converteu-se, depois, na Súmula Vinculante 25 do STF). Os meios de coerção, como a multa periódica (astreints), a busca e apreensão e a tomada de bens não violam esse princípio, já que dizem respeito aos bens do devedor, não à sua pessoa. Portanto, no ordenamento jurídico brasileiro não há prisão por dívida, salvo as exceções estabelecidas em lei. 3. PRINCÍPIO DO EXATO ADIMPLEMENTO O objetivo da execução é a plena satisfação do direito do credor, e este princípio deixa consagrado que a execução deve alcançar o patrimônio na medida suficiente e necessária para satisfação do crédito. Esse princípio impõe que a execução se limite àquiloque seja suficiente para o Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 11 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar cumprimento da obrigação. O art. 831 do CPC estabelece que: “A penhora deverá recair sobre tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal atualizado, dos juros, das custas e dos honorários advocatícios”. Por isso quando o montante penhorado for suficiente para garantir o juízo (garantir o pagamento da dívida), o juiz suspenderá a expropriação dos bens, não prosseguirá na busca de bens, pois já garantido o juízo. Contra o descumprimento desse princípio o devedor poderá lançar mão dos meios de defesa (embargos ou impugnação) sob a tese de excesso de execução. 4. PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE DO PROCESSO DO CREDOR Esse princípio tem vínculo direto com o Princípio da Livre Iniciativa, em verdade, pode-se afirmar que um seja a extremidade do outro, uma vez que aquele orienta que o início do processo executivo é a requerimento do credor e esse diz que o credor pode desistir da execução a qualquer tempo, sem necessidade de consentimento do devedor (art. 775 do CPC), com exceção da seguinte hipótese: se houver impugnação ou embargos, que não versarem apenas sobre questões processuais, mas matéria de fundo (direito), caso em que o executado-embargante poderá desejar o pronunciamento do juiz a respeito. Em relação à desistência da execução, conforme determinam o parágrafo único e os incisos I e II do art. 775, será observado o seguinte: a) serão extintos a impugnação e os embargos que versarem sobre questões processuais, pagando o exequente as custas processuais e os honorários advocatícios; b) nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do impugnante ou do embargante. Em suma, a desistência é livre quando: • a execução não estiver impugnada ou embargada; • a impugnação ou os embargos opostos versarem sobre matéria processual. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 12 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar Ao extinguir a execução, por desistência, o juiz condenará o credor ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Importante ressaltar que, se a desistência ocorrer sem que o executado tenha sido citado ou apresentado defesa, não haverá necessidade de sua concordância para a desistência do processo de execução. Para um melhor esclarecimento, não se deve confundir desistência com renúncia. Na desistência da execução, o exequente pode propor novamente, ou seja, renovar o pedido, desde que não tenha ocorrido a prescrição ou a decadência do direito. Enquanto que na renúncia, ele abre mão do direito material em que se funda a ação e não tem mais o direito ao crédito que pleiteava. Na renúncia da execução, se o devedor tiver embargado, estes serão julgados procedentes e o exequente ficará obrigado ao pagamento das verbas de sucumbência. Nesse contexto cabe trazer ao debate um novo instituto do processo executivo: a responsabilidade do exequente por indevida ação de execução, prevista nos arts. 776 e 777 do NCPC. Essa nova regra processual tem o condão de inibir e punir o exequente que ajuizou ação contra executado que teve seu patrimônio agredido pela força estatal por uma dívida inexistente. Implica em responsabilidade do exequente por indevida ação de execução, quando a sentença, transitada em julgado, nos respectivos embargos à execução, declarar como inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que ensejou a execução. Assim ocorrendo, o exequente estará obrigado, além da pena constante do art. 940 do Código Civil, isto é, pagar o equivalente da importância que exigiu, também ao pagamento dos danos sofridos pelo executado, sendo que estes serão apurados nos próprios autos, por via de liquidação de sentença, e exigidos por via de cumprimento de obrigação de pagar quantia certa10. Exemplo (caso hipotético): Durval ajuizou execução de título extrajudicial fundada em duplicata, em face de Joel, que embargou à execução alegando a inexigibilidade da obrigação em razão do título executivo tratar-se de uma duplicata fraudulenta (inciso I, art. 917, NCPC. O juiz acolheu os embargos e declarou por sentença, a inexistência da 10 LIVRAMENTO, Geraldo Aparecido do. Execução no novo CPC. Leme (SP): JH Mizuno, 2016. p. 130-131. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 13 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar obrigação por estar provado que a duplicata foi produto de fraude e em consequência julgou extinta a execução, na forma do art. 924, inciso III, do NCPC. A sentença transitou em julgado. 5. PRINCÍPIO DA UTILIDADE Esse princípio informa que a execução só se justifica se trouxer alguma vantagem para o credor, pois a sua finalidade é trazer a satisfação total ou parcial do crédito. Nesse entendimento, o art. 836 do NCPC afirma que “Não se levará a efeito a penhora quando ficar evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução”, razão pela qual, identifica-se que esse princípio faz interação com o princípio do exato inadimplemento. 6. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE É estabelecido no art. 805 do NCPC: “Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado”. Esse princípio, embora a execução seja a favor do credor e em seu melhor benefício, estabelece um critério judicial que beneficia o devedor, conferindo equilíbrio à relação processual/material, uma vez que havendo modos equivalentes para alcançar o resultado almejado pelo credor, há de prevalecer o menos gravoso ao devedor. Exemplo: o devedor possui dois automóveis, ambos satisfazem o crédito, com o mesmo valor e liquidez, contudo, um dos veículos é um fusca ano 1976 deixado por herança pelo pai do devedor, restaurado e costumizado e outro é um veículo comum de passeio, sem nenhum valor sentimental. Segundo esse princípio e o dispositivo legal que o sustenta, não há razão para que o credor exija que a penhora recaía sobre o automóvel que tem valor sentimental. Ainda que a execução seja em benefício do credor, não se pode usá-la para impor ao devedor desnecessários incômodos, humilhações, ofensas ou sofrimentos (ônus desnecessários)11. 11 LIVRAMENTO, op. cit. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 14 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar 7. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO O art. 5º da, LV, da CF/88 assegura o contraditório a todos os procedimentos jurisdicionais e administrativos e não seria diferente com a execução civil. Não se trata de um princípio específico da execução civil, mas do processo geral e fundamental no Estado Democrático de Direito. Embora haja particularidades no processo de execução civil, o contraditório, obrigatoriamente deve estar presente. O executado deve ser citado (quando a execução for fundada em título executivo extrajudicial) e intimado de todos os atos do processo, tendo oportunidade de se manifestar, por meio de advogado. Quando há cálculos de liquidação, penhora e avaliação de bens, ou qualquer outro incidente processual, ele terá oportunidade de se manifestar. Em suma, o executado poderálançar mão de todos os meios de defesa/impugnação admitidos no processo executivo. 8. PRINCÍPIO DO RESPEITO À DIGNIDADE HUMANA O princípio constitucional do respeito à dignidade humana está contemplado no processo de execução civil no dispositivo legal contido no art. 833 do NCPC, no qual consta o rol dos bens impenhoráveis. Esse princípio mestre visa resguardar os direitos e garantias fundamentais do devedor, não permitindo que o executado seja posto em situação incompatível com a dignidade da pessoa humana, capaz de provocar a miséria em sua família, garantindo-lhe o mínimo existencial, a exemplo da impenhorabilidade do imóvel residencial, bem de família e do salário, garantindo o direito à moradia e ao sustento. A exceção que trata a Lei de Alimentos tem a mesma finalidade – garantir o mínimo existencial ao alimentado. 9. PRINCÍPIO DA CUMULATIVIDADE DE VÁRIAS EXECUÇÕES Em interação com o princípio geral da economia processual, o princípio da cumulatividade de várias execuções está previsto no art. 780, do NCPC. Novo CPC: Prática de Secretaria de Vara, Cumprimento de Sentença e Execução de Título Extrajudicial 15 Facilitadora: Jacilene Vieira de Alencar Esse princípio confere ao exequente o direito e a possibilidade de cumular execuções em um só processo, ou seja, uma só ação executiva de título extrajudicial pode ser fundada em mais de um título e de espécie diferente (v.g cheque, duplicata, contrato de locação), contanto que ocorra identidade das partes, a competência do juízo para conhecer as pretensões e a uniformidade do procedimento.
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