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Newton da Cruz Rocha, PhD Fisiologia Veterinária Comparada: Glândula Mamária e Lactação Brasil 2016, v-1.0.0 Newton da Cruz Rocha, PhD Fisiologia Veterinária Comparada: Glândula Mamária e Lactação Fisiologia da lactação comparada em ani- mais. Brasil 2016, v-1.0.0 Sumário Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 O Autor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 I Embriologia, Histologia e Anatomia 8 1 Origem das glândulas mamárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 2 Período pós-natal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 3 Período pré-puberdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 4 Início da lactação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 5 Anatomia e histologia das glândulas mamárias . . . . . . . . . . . . . . . . 15 6 Inervação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 7 Estrutura interna da glândula (anatomia funcional) . . . . . . . . . . . . . . 19 II Fisiologia e Bioquímica 20 8 Estrutura dos alvéolos e algumas funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 9 O colostro e as imunoglobulinas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 10 Problemas hormonais e controle da lactação . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 11 Fatores que afetam a lactação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 11.1 Centros da fome e da saciedade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 11.2 Raça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 11.3 Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 11.4 Balanço hormonal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 11.5 Clima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 11.6 Manejo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 11.7 Variações sazonais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 11.8 Uso de medicamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 11.9 Intervalo entre partos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 III Aleitamento 35 12 Componentes do leite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 13 Composição do colostro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 IVPatologias do úbere 41 14 Patologias do úbere . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 14.1 Mamite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 14.2 Contaminantes do leite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 V Outros animais 44 15 Glândulas mamárias de outros animais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 16 Outros animais mamíferos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Apêndices 57 APÊNDICE A Tabelas com análises sanguíneas . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 5 Introdução Há, provavelmente, não mais do que duas grandes importâncias do leite para os mamíferos. Uma delas é que um mamífero ao nascer não possui outro tipo de alimento que não seja o leite materno e cuja composição é sem dúvida um alimento completo onde todos os princípios nutritivos estão presentes, embora alguns não sejam tão ricos como deveriam ser. Talvez o problema da importância não seja apenas do baixo teor do elemento no leite, mas a pequena reserva trazida pelo recém-nascido em algumas espécies ou em nutrientes armazenados no organismo do recém-nascido e que, dependendo do número de crias, pode acarretar dificuldades para as mesmas pela divisão do volume de leite entre um grande número de filhotes: Um bom exemplo de tal alteração é a anemia ferropriva dos leitões. A segunda grande importância do leite para as crias é a presença de anticorpos maternos e repassados às mesmas pela amamentação, porém entre os mamíferos há aqueles cuja placenta é impermeável aos anticorpos e, portanto as crias nascem com praticamente zero de defesas. Dependendo do número de camadas da placenta há espécies que recebem parte dos anticorpos via placenta e o complemento através das primeiras mamadas e, assim, complementam suas defesas. Embora tenhamos em mente que a espécie humana representa o auge do desenvolvimento entre os mamíferos, se observarmos pelo lado da capacidade de lactação este conceito pode ser outro pelo papel que o leite desempenha para a cria e também pelo lado econômico, uma vez que o volume de leite entre os bovinos, dependendo da raça, pode atingir volumes que hoje em dia em concursos leiteiros já atinge 80 Kg de leite/dia, em três ordenhas (6:00 h, 14:00 h e 22:00 h). Assim, teríamos que considerar, neste aspecto, tais animais como sendo mais desenvolvidos do que os humanos, em virtude do volume de leite. No lado oposto estão os pequenos mamíferos primitivos, como os monotremas re- presentados pelo Ornithorhynchus anatinus e pelo Tachyglossus aculeatus que apresentam em média 50 centímetros de tamanho, são ovíparos com cerca de três ovos por postura, fazem ninhos subterrâneos, apresentam um “bico” como patos e têm a glândula mamária mais rudimentar que se conhece. Seu nascimento requer uma formação de ovo como de ave desde a saída do ovário até a postura, onde necessita de mais ou menos 10 a 15 dias de incubação. Após este período precisam se alimentar do leite materno para poderem ganhar a liberdade dos ninhos (mais ou menos 90 a 120 dias). Em tais animais as glân- dulas estão distribuídas longitudinalmente e são rudimentares; o leite brota como se fosse um “suor” e é lambido pelos filhotes (lembrar que as glândulas mamárias são glândulas da pele modificadas que se tornam mais diferenciadas em animais mais desenvolvidos). Outros animais semelhantes em termos de imaturidade são os Marsupiais da Austrália (cangurus) que “nascem” como se fosse de um parto prematuro e então se arrastam para 6 Introdução a bolsa (migração) onde se alojam para sobreviver, já que o leite está disponível nas glândulas mamárias. Ao atingirem uma fase que podem deixar a bolsa já estarão bem desenvolvidos e aptos para terem vida independente. Aliás, o termo marsupial vem do latim marsupium = bolsa. (ou ainda do grego marsypion, ou talvez da palavra iraniana marshu = ventre). Um aspecto importante é que a composição do leite, dentre seus componentes, varia entre as várias espécies, pois as crias de diferentes gêneros, classes e espécies necessitam de diferentes concentrações dos vários componentes. Assim, como exemplos, podemos citar que o leite de baleia é riquíssimo em gorduras (primeiro lugar) e proteínas (segundo lugar), enquanto que o dos eqüinos é pobre em gorduras e proteína, porém rico em lactose. Nos cangurus o leite é pobre em gordura e minerais, mas é rico em proteínas, embora extremamente pobre em lactose. Em geral os animais que vivem em ambientes gelados tendem a apresentar altos teores de gordura, como é o caso das baleias, focas ou ursos polares. Nos bovinos há pequenas variações entre as raças, mas em geral há equilíbrio entre as mesmas quando se comparam as gorduras, as proteínas, os minerais e a lactose. Desta forma, os valores variam pouco entre as várias raças. Como um exemplo, as gorduras variam entre 4,0 e 5,5%, as proteínas entre 3,1% e 3,9%; os minerais entre 0,7% e 0,8% e a lactose entre 4,7% e 5,1%, embora já tenhamos presenciado em concurso leiteiro, trabalhando em Exposição Agropecuária (RJ), vaca mestiça com teor de 7% de gordura. Tais percentagens dos elementos no leite fornecem, para as crias, as necessidades das mesmas em seus períodos iniciais de vida. 7 O Autor O presente texto faz partede um futuro livro de fisiologia, de minha autoria e pretendemos lançar em breve. A matéria de fisiologia foi minha dedicação durante cerca de 50 anos como professor e pesquisador. Ao longo de meu tempo de serviço fiz um estágio e três cursos de pós-graduação. Estagiei com Analista de Alimentos comprados e distribuídos pelo Exército a vários quartéis (análise bioquímica dos alimentos) durante um ano. Mestrado em Bioquímica (conceito A), cuja tese foi enviada para a Biblioteca do Congresso Americano, onde foi catalogada e por várias vezes foi usada lá com referência bibliográfica (conceito A). Mestrado em Reprodução Animal (5 anos de duração) realizada na UFF e (conceito A) e Doutorado em Biologia Animal realizado na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (Instituto de Biologia-Seropédica) obtendo conceito A. Durante 15 anos trabalhei no Laboratório de Biologia Animal da PESAGRO-RIO como chefe e Pesquisador de uma seção e tive a oportunidade de realizar vários trabalhos e centenas de diagnósticos. Vários trabalhos foram da área de Reprodução Animal tendo em vista a finalidade do Laboratório que chefiava. Por tais motivos surgiram vários casos que geraram trabalhos que somados com os da UFF atingiram mais de 80. Assim, resol- vemos usar nossa experiência como professor Universitário e pesquisador para escrever um livro de fisiologia animal e que será lançado futuramente. Como exemplo, resolvemos lançar o capítulo sobre lactação por termos realizado vários trabalhos na área e por sua importância. Posteriormente pretendemos lançar o livro de Fisiologia Animal. Finalizando gostaríamos de esclarecer que ao longo dos anos tivemos o prazer de lecionar em vários cursos que possuem fisiologia em seus currículos como ocorria no Instituto Biomédico da UFF, onde todas as profissões da área Biomédica, (oito ao todo). Desta forma gostaríamos de desejar que gostem e aprovem o conteúdo do tema escolhido e que dá uma boa idéia sobre a lactação e sua importância dentro da fisiologia e que incluem vários autores que descreveram o assunto em vários livros. Grato pela atenção, Professor Newton da Cruz Rocha Parte I Embriologia, Histologia e Anatomia 9 1 Origem das glândulas mamárias As glândulas mamárias são consideradas como derivadas do epitélio ectodérmico e do ponto de vista embrionário são consideradas glândulas da pele, assim como as glân- dulas sudoríparas, embora modificadas devido as suas transformações posteriores. São, portanto, glândulas da pele modificadas. É interessante notar que, embora não seja uma glândula mamária, o inglúvio (ou papo), em algumas aves (Columbiformes) apresenta uma descamação à época da eclosão dos ovos e forma uma “secreção” que se denominou “leite de papo”. Tal secreção serve para alimentar os filhotes por regurgitação do material para os bicos das crias. É importante ressaltar que os estudos mostraram que o hormônio responsável por tal secreção é a prolactina, ou seja, o mesmo hormônio que estimula a produção do leite em mamíferos. Tal ocorrência parece mostrar mais uma conexão, ou transição, entre aves e mamíferos, como os monotremos (Ornitorrincos) que põem ovos, apresentam bicos, mas não são aves, pois são mamíferos. Figura 1: Esquema de úbere de 4 câmaras como as de bovinos. Podem ocorrer divisões diferentes em outras espécies, formando, por exemplo somente 2 câmaras (como caprinos). Em suínos, cada teta tem sua câmara própria. Durante a formação do embrião as glândulas mamárias formam uma fileira a cada lado da linha média ventral, indo desde a região torácica até a região inguinal. Em função de seu formato foi denominada “linha do leite” e existe em ambos os sexos. Durante o período da gestação ocorre um processo de regressão das glândulas não pertencentes à 10 Capítulo 1. Origem das glândulas mamárias espécie, ou seja, só permanecem aquelas que no adulto deverão persistir. Como exemplo na espécie humana, nos primatas e até elefantes só permanecem as peitorais; nas cadelas, gatas, leitoas e outras, persistirão várias na linha do leite; nas vacas permanecerão as quatro últimas glândulas com quatro tetas; nos pequenos ruminantes restará apenas um par de glândulas inguinais e com duas tetas cada (Figura 1) Normalmente cada teta corresponde a uma glândula, porém nos equídeos (para alguns autores), para cada teta há um par de glândulas, diferentemente dos pequenos ruminantes. Dependendo da espécie, pode haver um só canal para drenar o leite de cada glândula, ou pode haver um conjunto de canais para cada glândula (cadela, com média de 15 canais, na gata de 4 a 8 canais e suínos dois); nos bovinos há um só canal para cada uma das quatro glândulas e que forma a cisterna de cada teta (Figura 2). Figura 2: A cisterna é única em cada glândula mamária de caprinos. Nestes animais, a glândula está representada por um par, porém não são comunicantes. Nas espécies em que o número de tetas é menor do que aquelas, originais na linha do leite, há uma regressão das que não irão participar na vida adulta da fêmea; entretanto a regressão pode não ser total e permanecerem tetas supranumerárias, até mesmo em seres humanos, embora normalmente não funcionem. Nos bovinos e outros ruminantes é comum encontrarmos pequenas tetas supranumerárias na região posterior da glândula, porém não funcionais. Até mesmo na espécie humana pode ocorrer, em ambos os sexos, uma glândula supranumerária do lado direito ou esquerdo, abaixo da glândula de localização normal, porém rara, não funcional e geralmente atrofiada (já presenciamos tal caso em ambos os sexos). 11 2 Período pós-natal Após a involução da linha do leite, durante a gestação, há uma parada do cres- cimento da mama até o nascimento. Ao nascer não há diferença entre as glândulas de machos e de fêmeas, sendo todas formadas histologicamente de modo igual. Muitas vezes se observa certa quantidade de secreção nas glândulas do recém-nascido que seria um leite “rudimentar” e que em linguagem espanhola foi denominado de “leche de brujas”, termo que também é usado para o leite em novilhas de primeira cria e que aparece cerca do quinto mês de gestação. Tal secreção parece ser nos recém-nascidos, uma ação dos hormô- nios maternos circulantes e já pudemos apreciar tais efeitos, mesmo em seres humanos. Mais uma vez se mostra o potencial das glândulas mamárias para a secreção, pois em seres humanos (e até em animais) o uso de hormônios femininos pode promover aumento significativo de glândulas mamárias (ginecomastia). Até mesmo em algumas patologias, ou uso de certos medicamentos, podemos observar efeitos semelhantes. No homem, tumo- res testiculares feminizantes (secreção de hormônios femininos) como o tumor das células de Sertoli, uso de dietilestilbestrol (em casos de câncer de próstata), senilidade, castra- ção e uso de medicamentos que ainda não se conhece bem os efeitos sobre a inibição dos hormônios testiculares, ou mesmo ativação de hormônios femininos (metoclopramida, haloperidol, omeprazol, amiodarona e muitos outros). Há possibilidade de interferência nas enzimas que atuam na síntese dos hormônios. Aliás, um dos grandes problemas da terapêutica é indicar medicamentos sem efeitos colaterais indesejáveis, o que é quase im- possível. Na nossa própria área de atuação (Medicina Veterinária) temos um problema que é o uso atual de hormônio do crescimento em vacas de leite para aumentar a produ- ção leiteira. Para o animal certamente deverá ocorrer sobrecarga hepática para desdobrar o hormônio sintético em excesso, e cujo uso sem intervalo entre gestações poderá estar acarretando problemas que ainda não sabemos. Para os usuários do leite só o tempo dirá se há, ou não, um efeito indesejável. Inicialmente o uso do GH para aumentar a lactação foi proibido, mas hoje está legalizado. Proteína Total Cálcio Fosfato Grupo I 13,74 mg/dL 6,67 mg/dL 4,46 mg/dL Grupo II 10,08 mg/dL 7,24 mg/dL 4,87 mg/dL Tabela 1:Alguns valores hematológicos de 20 vacas mestiças Gir-Holanda, 3/4 de sangue, 33m de altitude, em pastagens nativas. O grupo I com 10 fêmeas lactantes e gestantes. O grupo II com gestantes em final de lactação e não-lactantes. Os níveis de proteína total mostram queda de 27% no grupo II e ainda uma elevação do cálcio e fostato em 9%. A relação cálcio/fosfato foi mantida em 1,5:1. Estudo realizado em Itaguaí (Seropédica) em 1990. Dosagens no Lab. Biol. Animal da Pesagro-Rio, em Niterói. ROCHA, N. C., PAES RIBEIRO, A. G., ALVES, P. M. e RODRIGUES, E. 3 Período pré-puberdade Do nascimento até o início da puberdade as glândulas mamárias ficam em “si- lêncio” fisiológico, ou seja, não se diferenciam nos dois sexos. Com a aproximação da puberdade os hormônios masculinos não promovem seu aumento e podemos dizer que poderia haver até inibição. Não há também secreção de nenhum tipo. No sexo feminino, ao contrário, o início dos ciclos (estrais ou menstruais) vai se repetindo e promovendo um desenvolvimento progressivo e ordenado das glândulas mamárias, estruturando-as para que possam servir como secretoras e armazenadoras do leite entre as amamentações ou ordenhas. Como os ciclos que se repetem são resultado da sequência de estrógenos e progesterona (liberados pelos ovários em função do eixo hipotálamo-hipófise) que não só agem na hipófise (retroalimentação), mas também no útero, comportamento, vagina e glândulas mamárias, eles promovem duas fases distintas: A multiplicação de ductos ma- mários (geralmente estrógenos) e crescimento e desenvolvimento dos alvéolos mamários (progesterona) ou ainda uma soma dos dois, adequadamente, para que as mamas possam desempenhar suas funções secretoras. Como o processo é repetitivo, as glândulas crescem progressivamente até um deter- minado ponto, que normalmente limita seu tamanho ao final da puberdade, pois a mama só volta a ter tamanhos maiores, quando no final da gestação e o inicio da lactação. Outro problema que pode afetar o tamanho da mama, mas não afeta sua capacidade de produ- ção (para mais) é o seu teor de gordura estrutural, pois uma glândula pode ser grande (quantidade de gordura), mas não ter alta produção. Nestes casos se observa que ao fi- nal de um esgotamento total (manual ou por ordenha mecânica), uma glândula de alta produção e túrgida antes do esgotamento torna-se flácida e bem menor após a ordenha. As que diminuem pouco de tamanho após ordenha total, permanecendo como se estivesse cheia, é normalmente glândula “gorda” e sua produção não corresponde à aparência do seu tamanho inicial. 13 Duração do ciclo Ovulação Gestação Lactação Humana 28/28 dias na metadedo ciclo 9 meses 6 meses* Bovinos 21/21 dias 12h apóso cio ±280 dias ±300 dias Búfalos 18-28 dias(anual) 3h a 60h do cio 315 dias ±300 dias Caprinos 18 dias(anual) ±10h após o início ±150 dias ±315 dias Cadela (variável com as estações do ano) ±8 dias início do cio (até 3 dias) 63 dias 50 a 60dias Suínos 21 dias 1 a 2 diasapós o início ±113 dias 30 a 40 dias Ovinos 15-16 dias ±21h apóso início ±147 dias 100 a 140 dias Lagomorfos ovulaçãonão-espontânea 10h a 12h após a cópula (induzida) 30 a 32 dias ±30 dias Gata receptividade demonstrada por uivos e miados 24h após a cópula 65 dias 6 a 8 semanas Camundonga 4 dias até 3h após oinício do cio 21 dias 16 a 18 dias Cobaia (Cavia) 16 dias primeiras 10h 63 dias 10 a 20 dias Equinos ±3 semanas do início aofinal do cio 11 meses 3 a 4 meses Ratas 4 a 5 dias ±9h após oinício do cio ±22 dias 18 a 20 dias Tabela 2: Ciclo ovariano em humanos e estrais em alguns animais, e tempo de ovulação, gestação e lactação. Os dados variam dependendo da idade, alimentação, cativeiro, presença de machos, estações do ano, raça, número de filhotes, estimulação da glândula, posição geográfica (sul, sudeste, norte do Brasil - situação equatorial, como caprinos). (*) Já foram observados casos de até 2 anos. 4 Início da lactação Uma vez tenha ocorrido o parto, a expulsão da placenta arrasta o que restava de hormônios sexuais circulantes (no caso de bovinos coincide com a regressão do corpo lúteo de gestação) quando haverá uma liberação da prolactina que irá utilizar a preparação pré- via de ductos e alvéolos mamários. Os alvéolos apresentam uma estrutura funcional capaz de secretar o seu produto básico – o leite. Haverá necessidade de um conjunto enorme e variado de fatores hormonais, sanguíneos, alimentares, climáticos, raciais e outros que serão abordados mais adiante. Para isto a mama deve contar com um grande suprimento sanguíneo arterial e um bom nível de escoamento venoso e linfático, pois ambos são fun- damentais para que não haja insuficiência do suprimento dos precursores nem falta de escoamento veno-linfático, o que levaria a um quadro de edema (o que não é incomum em várias situações) (Figura 4). Embora a prolactina seja o comando da secreção não podemos esquecer outros hormônios, como os que mantêm os níveis de glicose circulante para boa oferta à glândula (alvéolos). Os da tireoide aumentam o metabolismo e, por- tanto, a capacidade conversora dos alvéolos (dos precursores em componentes do leite), os das adrenais (corticosteroides) que mantêm a normalidade funcional da glândula e não permite sua falência, como no caso de desequilíbrio metabólico de ácidos graxos normais pelos corpos cetônicos: acetona, ácido acetoacético e o β-hidroxibutirato, comentados mais adiante em patologia da lactação (cetose). Figura 3: Abastecimento sanguíneo unilateral em bovinos. 15 5 Anatomia e histologia das glândulas ma- márias Nas vacas existem quatro glândulas que drenam para dentro das cisternas das te- tas, também em número de quatro. Sua sustentação se dá através de ligamento suspensor o que dá estabilidade e sustentação quando a glândula está cheia e é muito importante em vacas com grande produção leiteira. Sua flacidez pode levar a uma “queda” da glândula, deslocando-a. Há citações variáveis sobre o peso de um úbere de vaca vazio ou cheio. Entre as vacas de raça holandesa (Holstein-Frisian) há informações de peso que pode atingir até 75 Kg; há, entretanto, informações de pesos menores (30 Kg) quando vazio, porém um úbere cheio de leite pode apresentar pesos superiores a 100 Kg. Os dois quartos posterio- res são mais volumosos e em geral apresentam maior produção de leite. Internamente os quartos anteriores e posteriores se encontram separados, porém com uma lâmina divisória bem mais tênue do que o ligamento longitudinal que é mais forte e no conjunto formam o ligamento suspensório. Desta forma uma infecção (mamite) em um dos quartos se pro- pagará mais facilmente no sentido longitudinal (ântero-posterior ou inverso, do que entre os quartos homolaterais). O sistema arterial é fornecido pela aorta abdominal que se ramifica em pudendas externa e perineal, que por fim se subdividem em ramos craniais e caudais, além da vascu- larização cutânea. Um ramo arterial forma a artéria perineal que atinge a parte posterior da glândula. As veias são satélites e retornam pelos trajetos paralelos aos das artérias, como pudenda externa e abdominal subcutânea. A superfície da glândula apresenta veias túrgidas na lactação e podem ser vistas bem pronunciadas e até certo ponto dão uma ideia da boa produção leiteira da vaca (Figura 4). Há dois trajetos básicos: Uma parte vai para a veia cava e outra parte para a abdominal subcutânea. Além das veias a drenagem linfática colabora com inúmeros vasos e gânglios e vão convergir para os vasos linfáticos abdominais que terminam nas cisternas sub-diafragmáticas e daí atingem o ducto torá- cico. Para alguns autores a drenagem linfática pode chegar a representar 40% da retirada do material drenado. 16 Capítulo 5. Anatomia e histologia das glândulas mamárias Figura 4: Veias túrgidas bastante pronunciadas em vaca leiteira.17 6 Inervação A principal inervação motora da glândula se refere aos músculos lisos das artérias e aos esfíncteres, sendo de origem vegetativa simpática. Há ainda as fibras sensitivas, im- portantes principalmente, as das tetas pelo fato de que ao serem estimuladas atingem a medula espinhal e daí chegam até o encéfalo e o ponto principal é núcleo paraventricular com duas porções látero-superiores ao ventrículo médio (3º ventrículo). Tal núcleo é res- ponsável pela resposta hormonal de liberação do hormônio ocitocina que ao penetrar na circulação percorre o corpo e atinge os alvéolos mamários, que se contraem e expulsam o leite para as cisternas da glândula e da teta, abrindo a roseta de Fürstemberg (Figura 5), o que permite a descida do leite durante a ordenha manual ou mecânica. Quando a vaca se estressa, de alguma forma, tal efeito diminui ou até desaparece (por antagonismo). O leite não desce durante algum tempo e se diz que a vaca “escondeu o leite”. Ao soltá-la com a cria, alguns minutos depois, a fêmea relaxa e ao ser estimu- lada pela cria (presença, odores, características, ruídos, e pequenas cabeçadas contra o úbere), o leite é liberado. Provavelmente há um mecanismo inibidor pelos adrenérgicos (estresse momentâneo) que segundo se admite pode haver vasoconstrição intensa inclu- sive nas artérias que penetram na glândula (principalmente pudendas externas) o que diminui a chegada do hormônio ocitocina até aos alvéolos. Não se pode esquecer que a vida média (t½) da ocitocina, admitida hoje, seja de apenas 4 a 7 minutos na corrente circulatória. Tendo em vista o volume corporal a ser percorrido havendo diminuição do calibre vascular haverá dificuldade para a chegada hormonal (ocitocina) ao seu destino (alvéolos mamários). Podemos resumir o trajeto do estímulo e da resposta hormonal de maneira es- quemática, como segue: Estímulo da inervação sensitiva da teta → nervos sensitivos → medula espinhal ascendente→ tálamo→ núcleo paraventricular→ liberação da ocitocina → neurônios descendentes e transporte pela neurofisina até a “pars nervosa” da hipófise → veia hipofisária posterior → veias jugulares → coração direito → pequena circulação (via artérias pulmonares) → retorno ao coração esquerdo (via veias pulmonares) → ar- téria aorta (torácica e abdominal) → artérias mamárias → alvéolos mamários → células mioepiteliais→ contração alveolar com expulsão do leite. Embora o processo seja rápido a concentração do hormônio vai decaindo e quanto maior o tempo até chegar ao destino sua eficácia vai diminuindo, até porque este hormônio ao entrar na circulação não apresenta transportador (proteína) o que acelera sua degradação e eliminação. O esquema mostrado na Figura 5 dá uma ideia do que acontece ao se ordenhar uma teta de cada vez ao invés de se ordenhar as quatro tetas ao mesmo tempo (alterna- 18 Capítulo 6. Inervação damente). Pode-se ainda dizer que uma glândula após o seu “esgotamento total” ainda guarda em seu interior uma quantidade de leite que é denominado de leite residual e cuja quantidade pode variar entre 10% e 15% da quantidade esgotada. Talvez este resíduo seja uma defesa natural para que após a ordenha sempre sobre uma quantidade para o bezerro, pois caso contrário não teria o que mamar. Dois problemas devem ser lembrados: quando a ordenha termina, e o bezerro é solto com a vaca, em alguns minutos é capaz de iniciar um início de transferência de leite para o alvéolo (diminuição da pressão). No caso de ordenha mecânica não há problema se houver esgotamento total (ausência de leite residual), pois nestes casos a cria é sempre alimentada, pelo leite retirado, por mamadeira de tipo variado. Figura 5: Esquema de uma teta de bovino. A roseta de Fürstemberg bloqueia a descida espontânea do leite contido. Porém, a sucção exercida pela "cria"promove a saída, muito embora por problemas emocionais a vaca deixa de gotejar leite na preparação da ordenha e presença do filhote. O problema parece ocorrer pela liberação emocional da ocitocina. As paredes da teta mostram componentes como vasos e nervos. 19 7 Estrutura interna da glândula (anatomia funcional) A parte estrutural das glândulas está composta de tecido conjuntivo de sustenta- ção, músculos lisos organizados ou dispersos. O equipamento secretor está composto de conjuntos de alvéolos em forma de cachos e cada alvéolo se apresenta de forma arredon- dada, oca, formando um lúmen. Cada alvéolo recebe vascularização nutritiva e funcional e está rodeado de células denominadas de mioepiteliais ou células em cesto. Cada alvéolo apresenta um conduto para drenagem do leite (conduto intercalar) e que vai se unindo a de outros alvéolos para formarem sistemas de drenagem maiores (condutos interlobulares) até desembocarem na cisterna da glândula. Cada conjunto unindo vários alvéolos pode conter até mais de 200 alvéolos, como cacho, e que fornecem seus produtos para ductos que vão se reunindo. Quando a cisterna da glândula se enche de leite atinge um determinado ponto e as pressões exercidas pelo interior dos alvéolos, contra as células secretoras dos mesmos, promovem uma parada da secreção das células formadoras de leite e tal secreção só volta a funcionar após uma ordenha o que faz baixar a pressão interna e as células alveolares voltam a secretar. Por tal razão se recomenda que as vacas sejam ordenhadas pelo menos duas vezes ao dia (manhã/tarde), pois assim a pressão diminui e nova quantidade de leite é formada. Caso contrário, as condições de pressão interna (nos alvéolos) impedem nova formação de leite, mesmo que os alvéolos estejam sendo irrigados. Estudos realizados em vacas de leite, em lactação, já demonstraram que a quan- tidade de sangue que deve circular pelas glândulas mamárias durante a lactação atinge volumes entre 400 e 500 litros para formar um litro de leite, desde que a vaca seja de alta qualidade genética leiteira, porém naquelas em que a raça não apresenta boa qualidade leiteira a quantidade de sangue necessária para formar um litro de leite pode atingir até 1000 litros de sangue. Isto se explica, provavelmente, pelo fato de que os animais geneti- camente piores não possuem células alveolares com uma bateria enzimática tão boa para realizar a conversão dos precursores em leite. Parte II Fisiologia e Bioquímica 21 8 Estrutura dos alvéolos e algumas funções Os alvéolos mamários são estruturas em forma de esferas ocas, constituídas de células secretoras e altamente vascularizadas. As células alveolares são do tipo epitelial e formam camada única e ao secretarem seus produtos perdem parte de seu citoplasma, sendo então consideradas merócrinas. Ao redor dos alvéolos existem células com caracte- rísticas de epitélio e músculos lisos e por isso foram denominadas células mioepiteliais e, portanto, contráteis. Os alvéolos são altamente vascularizados para que possam receber a matéria prima contida no sangue e convertê-la nos produtos contidos no leite. Assim, há precursores que atravessam para dentro das células, seja de forma ativa, ou de forma passiva. Tal afirmativa está baseada em estudos, bastando lembrar que no sangue não há lactose, mas ela “aparece” no leite. Assim, tal açúcar provém da glicose existente na corrente circulatória; outros componentes como minerais e vitaminas são transportados sem bio-transformação e podem passar do sangue para o leite, naturalmente, sem gasto energético. Assim, as células que compõem os alvéolos são ricas em enzimas que po- dem transformá-la em uma fábrica de produtos que vão compor o leite. A capacidade de transformação varia muito entre as espécies, pois a variedade animal existente realiza a formação de seu leite de acordo com a necessidade energética de suas crias, além de repas- sar anticorpos em quantidades e tipos diferentes, de acordo com a espécie. Como exemplo podemos relembrar o caso do teor de gordura do leite de baleias e ursos, e a riquezade anticorpos em animais que nascem em ambientes normalmente contaminados. Por outro lado, animais de placentas com muitas camadas (equinos, bovinos) não transferem anti- corpos para suas crias, o que faz com que estas sejam obrigadas a beber leite nas primeiras 24-48 horas (na realidade quanto mais cedo melhor, pois há autores que chegam a citar 12 a 36 horas) para adquirirem os anticorpos, além dos princípios nutritivos. Muitos desses animais são considerados como crias que nascem sem anticorpos. Como os alvéolos são ocos, à medida que o leite vai se formando em seu interior, a pressão interna vai aumentando e a transferência dos elementos do sangue vai dimi- Proteína Total Caseína Lactose Albumina + Globulina Lipídeos Após algumas horas 17,57 mg/dL 5,08 mg/dL 2,19 mg/dL 11,34 mg/dL 5,10 mg/dL Depois de 48h 3,74 mg/dL 2,63 mg/dL 3,97 mg/dL 0,99 mg/dL 2,80 mg/dL Tabela 3: Colostro bovino (após primeira ordenha). Harvey, D.G. Bioquímica para estudo de Veter. 22 Capítulo 8. Estrutura dos alvéolos e algumas funções nuindo. Esta é uma das razões para aconselhar a realização de duas ordenhas ao dia. Uma das funções dos alvéolos pode correlacionar suas ações transformadoras, e a glicose sanguínea ofertada, com a produção de leite. Imaginemos uma oferta alta e constante de glicose às células alveolares. Tal monossacarídeo é transformado dentro dos alvéolos em galactose que é transferida para o interior do alvéolo. Sua chegada a este ponto aumenta a osmolaridade no interior do alvéolo criando uma atração de mais água do sangue/células para o interior alveolar, ou seja, gera uma corrente positiva de líquido para dentro do alvéolo o que faz aumentar o volume de leite produzido. Poderíamos dizer que o volume de leite está relacionado com a oferta de glicose ao alvéolo que ao absorvê-la transforma a mesma em galactose gerando maior fluxo de água para dentro do alvéolo. O processo de transformação de glicose em galactose não é tão simples, porém do ponto de vista bioquímico poderia ser resumido, em última análise, como uma ação da enzima lactose- sintetase unindo uma molécula de galactose com uma de glicose (dois monossacarídeos) gerando uma de lactose (dissacarídeo). Da mesma forma que a glicose outros elementos do sangue são bio-transformados dentro das células alveolares como os ácidos graxos que são convertidos na gordura do leite. Para a formação da gordura do leite, em vacas, os elementos fundamentais são os triglicérides (compostos graxos formados por três ácidos graxos). Não se pode esquecer que tais processos são realizados com gasto de energia, sendo que tal gasto aumenta com a maior produção de leite. Assim o balanceamento da ração e seu equilíbrio são fundamentais para a boa produção de leite, seja em bovinos ou qualquer fêmea recém parida e lactando. Na composição das proteínas do leite, entre elas a mais importante, inclusive por sua concentração, é a caseína. Entretanto, não podemos menosprezar as de menores con- centrações, porém de grande valor biológico para o recém-nascido, como a lactoglobulina, a lactoalbumina e as imunoglobulinas (principalmente IgG). Para que se atinjam tais pro- dutos é de grande importância a disponibilidade sanguínea e alveolar dos aminoácidos que são os precursores. A qualidade dos mesmos, segundo sua classificação como essenciais e não-essenciais, varia entre as espécies, de modo que o que pode ser essencial para uma espécie pode não ser para outra. Os minerais encontrados no leite podem ser vistos em maior ou menor concentra- ção, pois há os que estão presentes em grandes quantidades e outros em concentrações menores. Os que apresentam maior valor nutritivo e normalmente em boas concentrações são o cálcio, o fósforo e o magnésio, mas não devemos esquecer o sódio, potássio, cloro e outros. Um dos problemas que muda as concentrações dos minerais no sangue é que eles podem se apresentar sob forma livre ou combinada, normalmente com proteínas. Outro elemento importante é o bicarbonato, pois suas variações alteram o pH do sangue o que pode ser mortal, dependendo da alteração de concentração. Um trabalho realizado por nós e outros colegas pesquisadores da Pesagro-Rio, no RJ, apontou para baixos níveis de cálcio com alto teor de magnésio no soro de bovinos (vacas de leite) quando comparados 23 com os valores dados como normais para a espécie. Ao procurarmos as causas foram realizadas análises das plantas usadas como alimentos e o solo de tais fontes alimentí- cias. Tivemos a surpresa de ver que tanto o solo como os alimentos usados pelos animais apresentavam baixos teores de cálcio e altos teores de magnésio. Dentre as vitaminas podemos dizer que as únicas não sintetizadas por ruminantes são as vitaminas A e E, que são exógenas, ou seja, não são fabricadas pelo organismo (pelo menos de bovinos) e, portanto devem fazer parte da dieta. As outras podem ser sintetizadas pela flora bacteriana ruminal e/ou intestinal e até mesmo envolvendo a pele e radiação da mesma, o que leva a transformação do 7-diidrocolesterol em vitamina D. Lembrar que as vitaminas A, D, E e K são lipossolúveis e as restantes são hidrossolúveis. Entre estas últimas devemos lembrar que alguns animais são capazes de sintetizá-las, entre eles os ruminantes, e disponibilizá-las no leite. Entretanto, a vitamina C é muito sensível e se degrada em pouco tempo. Desta forma para alimentação humana não se pode considerar o leite de vaca como boa fonte. Além disso, a vitamina C não é sintetizada pelos humanos, cobaias (Cavia porcelus) e outros animais que podem, inclusive, desenvolver o escorbuto por causa de sua deficiência. 9 O colostro e as imunoglobulinas Experiências já antigas mostraram através de eletroforese que as curvas de concen- tração das imunoglobulinas no soro de vacas antes do parto apresentavam picos caracte- rísticos embora um pouco mais elevados das mesmas. À época do parto a mesma análise apresentava modificações nas gama (γ) e beta (β) globulinas que se mostravam com níveis mais baixos, porém mantendo as outras curvas. Para efeito de comparação foram reali- zadas corridas eletroforéticas utilizando-se o soro do leite pós-parto (colostro) para efeito de comparação. Observou-se que o pico de albumina desaparecia, mas em compensação surgia uma presença de um pico altíssimo de imunoglobulinas (Tabela 2). Tal compara- ção entre as duas eletroforeses nos faz crer que o que havia na corrente circulatória era transferido para o colostro nas primeiras horas após o parto. Aparentemente a imunoglobulina do tipo IgA é sintetizada na própria glândula mamária, além da transferida do sangue para o leite, sendo assim um produto que acom- panha síntese deste último. O leite produzido nos primeiros 5 a 7 dias no período pós-parto é denominado colostro e como visto sua diferença fundamental é a riqueza de anticorpos com baixo teor de lactose. Este período é crucial para os recém-nascidos (já citado) pois necessitam ingerir tal produto para adquirir as defesas, que existiam no organismo ma- terno, e transferidas como se fosse uma “vacina” por via oral. Na realidade não se poderia chamar de vacina e sim de soro, pois não se desperta a formação de anticorpos e sim há uma transferência pronta dos mesmos (como uma aplicação de soro). Embora o período de aproveitamento seja curto (primeiras horas após nascimento), como já citado, o colostro como composição dura mais tempo do que a cria pode aproveitar. Tal aproveitamento tem prazo curto em função do que se denomina fechamento intestinal, que ocorre em função do término de permeabilidade intestinal para absorver os anticorpos. Normalmente nas Espécie Secreção IgG (mg/dL) IgA (mg/dL) IgM (mg/dL) IgG(T) (mg/dL) IgG(B) (mg/dL) Bovinos leitecolostro 76 3400 a 8000 8 100 a 700 20 300 a 1300 Suínos leitecolostro 200 3000 a 7000 500 950 a 1050 60 250 a 320 Ovinos leitecolostro 80 4000 a 6000 8,5100 a 700 3,5 400 a 1200 Equinos leitecolostro 35 1500 a 5000 75 500 a 1500 7,5 500 a 1500 5 a 20 500 a 2500 0 (zero) 50 a 150 Cadelas leitecolostro 2 120 a 300 365 500 a 2200 32 14 a 57 Gatas leitecolostro 270 3250 a 4400 430 150 a 340 0 (zero) 47 a 58 Tabela 4: Comparação entre níveis de imunoglobulinas contidas no leite (médias) e no colostro de animais domésticos. Os valores variam entre autores e com tempo decorrido pós-parto. Mostram ainda resistência das crias após o nascimento e a maior ou menor importância da obrigatoriedade da ingestão colostral. 25 granjas leiteiras o colostro não deve ser mandado para as cooperativas e deve-se aguardar seu término para iniciar o envio de leite. Uma prova interessante e popular é o emprego de fervura, de uma quantidade do leite retirado, em uma vasilha como uma simples caneca de alumínio. Ao ferver, se a amostra apresentar um aspecto de leite “talhado” ele ainda é colostro. Ao desaparecer este aspecto quando da fervura (mais ou menos 5 a 7 dias pós-parto) terminou a fase de colostro. Este é um forte laxativo para os bezerros o que ajuda na limpeza dos resíduos intestinais eliminando as primeiras fezes pós-nascimento e que se denomina mecônio. Nos seres humanos que ingerem colostro ocorre forte efeito laxativo em qualquer idade. Estudos em neonatos de bovinos demonstraram que a ingestão de colostro nas primeiras 24 horas e seguida da ingestão do leite ajudam aos recém-nascidos em várias ações fisiológicas do mesmo, tais como melhores processos metabólicos endócrinos, além de melhor formação fecal (melhor consistência), aumento da temperatura retal e melhor desempenho do sistema cardiovascular. As vacas em lactação mostraram que quantidades recolhidas do colostro nas pro- ximidades do parto costumam apresentar maior riqueza de anticorpos, principalmente o IgG. As amostras colhidas após duas horas pós-parto costumam ser mais ricas de anti- corpos e sofrem uma diminuição com o tempo, como se viu nas colheitas realizadas após 14 horas do início. Tal regra é valida para anticorpos que declinam à medida que o tempo passa e o colostro tende a se transformas em leite. Tal experimento demonstrou níveis de 113g/L na primeira colheita, ou seja, duas horas pós-parto, Porém após 12 a 14 horas os níveis declinam para 76g/L. Os níveis de IgG também sofrem alterações com o aumento do número de lactações e normalmente é menos rico em anticorpos na primeira do que na terceira. A quantidade de leite produzido também cresce com os partos e desta forma a terceira parição tem maior lactação do que a primeira. Também se tem observado que o terceiro mês também é auge da lactação. Outra observação importante é quanto à demora de ingestão do colostro, por parte das crias, o que leva ao retardo na absorção do colostro o que é prejudicial para a absor- ção dos anticorpos. O fenômeno que “barra” a absorção é conhecido como “fechamento intestinal” (dificulta ou impede a absorção) e se dá de modo progressivo, porém, relativa- mente rápido. Assim, os recém-nascidos ficam sem anticorpos passados pela mãe e levarão cerca de dois a três meses para formar seus próprios anticorpos (“self ”). As experiências mostraram que quando o animal ingere o colostro seu aproveitamento de globulinas chega a mais de 60% , porém se a ingestão for feita de modo retardado (após mais de 48 horas) as taxas de aproveitamento declinam para 6%. Experiências realizadas com uso de colostro de bovinos para alimentar bezerros recém-nascidos foram realizadas para avaliar o funcionamento do mesmo quando conser- vado através de congelamento. Ficou demonstrado que o produto não perde suas quali- 26 Capítulo 9. O colostro e as imunoglobulinas dades nem a capacidade de transferir anticorpos (IgG) para os recém-nascidos. Alguns testes foram realizados em vacas lactantes na tentativa de melhorar os teores de fosfato no leite para favorecer suas condições alimentares e da saúde dos recém- nascidos. Os experimentos realizados em bezerros com cerca de dois a três meses não apresentaram efeitos significativos nem na lactação, nem sobre as crias por não produzirem efeitos marcantes sobre o leite. Alguns estudos mostraram que o hormônio prolactina, tanto quanto a melatonina, podem apresentar algumas variações sazonais em pequenos ruminantes e foram verificadas diferenças entre os domésticos (Ovis aries) e os que são selvagens (Ovis gmelini musimon). No entanto, tais variações parecem ligadas aos horários das liberações de tais hormônios. A melatonina é liberada ao iniciar o horário noturno, enquanto a prolactina apresenta seus picos nos horários matinais, normalmente por volta das seis horas. Entretanto, para os animais não domésticos a prolactina pode seguir um ritmo (picos) como da melatonina, dependendo da estação do ano. Para que ocorra boa produção leiteira os animais mamíferos necessitam da presença de hormônios, já classicamente conhecidos, como a prolactina (PRL) e do hormônio do crescimento (GH), porém existem evidências da necessidade de outros hormônios que já foram detectados. Nos bovinos e nos pequenos ruminantes (ovinos, caprinos) tem sido citados os esteróides adrenais, bem como hormônios tireóideos, como sendo coadjuvantes importantes para lactação. Há ainda um hormônio, denominado de lactogênio placentário, (hPL) que tem sido citado e estudado em alguns mamíferos. Entre estes se encontram os primatas, roedores, lhamas, girafas, búfalos, antílopes e Cervus. Em felinos domésticos os níveis de anticorpos (IgG e IgA) não apresentam di- ferenças significativas. A meia-vida de anticorpos observados em cães recém-nascidos e obtidos pela amamentação apresenta taxas mais altas do que nos felinos neonatos. Como em outros animais o aleitamento, após o nascimento, não pode demorar, pois não haverá aproveitamento dos anticorpos. Em equídeos há citações de poder ocorrer certa hemólise nas amamentações realizadas logo após o nascimento. As glândulas mamárias são bem estudadas em mamíferos, porém sua origem, do ponto de vista evolutivo, sugere como originárias da pele. Tal demonstração tem sido realizada desde o período fetal o que demonstra a chamada “linha do leite”, a partir da qual as glândulas se desenvolvem. Como a pele apresenta capacidade de defesa orgânica pela migração de leucócitos, esta capacidade é capaz de se aperfeiçoar quando “cria”as glândulas mamárias” e isto poderia explicar o arraste de anticorpos pelo colostro em sua formação e alimentação dos recém-nascidos. Lembrar que a obrigação de ingerir o colostro varia com a espécie, pois há os que recebem quantidades variáveis de anticorpos via placenta, indo desde zero (nenhum Ab) até acima de 75%. Assim a ingestão de colostro tem efeito complementar em certos casos. 27 Citações em um mamífero africano, denominado de cabra de leque ou “spring- bok” (Antidorcas marsupialis) foi realizado um estudo em relação ao seu leite e o colostro. Estudos mostraram quantidades bem maiores do que no leite comum sendo mais rico em gordura (≈ 140 gramas), proteínas e lactose, muito embora as frações de açúcares (glicose, galactose e oligossacarídeos) sejam pequenas. Em alguns marsupiais (Trichosurus vulpecula), que são folhívoros, foi realizado es- tudo sobre as modificações lácteas no pós-parto. Inicialmente o leite é menos concentrado, apresentando cerca de só 13% de material sólido, entre os quais estão proteínas e açúcares. Estes chegam a representar até 40% do material sólido. Após um período de aproxima- damente cinco meses de lactação há certa tendência para se tornar mais concentrado, com um aumento dos lipídeos e queda dos açúcares. É importante destacar que tais mo- dificações também são citadas em outros marsupiais, mesmo quando se apresentam com diferentes tipos de alimentação (herbívoros, carnívoros e insetívoros). Marsupiais jovens, que nascem e são colocados na “bolsa materna”necessitam ma- mar para adquirir imediatamente os anticorpos maternos repassados pelo colostro dentro da bolsa. Este é rico em anticorpos do (IgG e IgA), além da substância denominada “transferrina”. Após o período mantido dentro da bolsa eles passam a se alimentar de colostro como qualquer outro mamífero, ou seja, recebem IgG, mas continuam a receber a transferrina. A imunidade de marsupiais (Monodelphis domestica) recém-nascidos também é transferida pela via colostral, pois os estudos demonstraram não terem sido detectados anticorpos em seu soro sangüíneo antes da amamentação. Um estudo realizado em “Bettongia gaimardi” (marsupial) existentes na Tasmâ- nia, apresentou modificações do leite, alterando suas concentrações ao longo do processo de lactação e ainda sofrem variações em relação ao modo de vida, ou seja, livre ou em cativeiro e dependente da dieta. (frutas, ração ou alimentos industrializados usado para cães). As modificações ocorrem basicamente com queda nos glicídios e variações dos com- ponentes sólidos do leite. Com rações para cães costuma ocorrer queda dos lipídeos e proteínas. Tais modificações podem ser as causas das diferenças nas taxas de crescimento e desenvolvimento de tais animais quando alimentados desta forma. Estudos realizados em gambás (Didelphis virginiana) demonstraram variações em suas concentrações dos sólidos, dependendo do tempo de lactação. Nos primeiros sete dias estes se apresentavam com cerca de 9%, porém alcançam valores bem mais altos atingindo até 34% ao chegar perto dos 80 dias de lactação. Os componentes como proteínas, açúcares e lipídeos variam com o tempo de lactação. Os minerais, tais como sódio, magnésio e potássio se apresentam mais ou menos estáveis durante o tempo da lactação. O cálcio apresenta uma exceção de concentração, podendo aumentar em até quase 10 vezes. 28 Capítulo 9. O colostro e as imunoglobulinas Em mamíferos mais inferiores, como os monotremas (Tachyglossus aculeatus e Ornitorrincus anatinus), são animais ovíparos e seus filhotes mamam em mamilos rudi- mentares, pois o leite é liberado pela região alveolar de uma mama rudimentar (o que representa o mamilo). A lactação também parece estimulada por hormônios hipotalâmicos como a ocitocina e neurofisina (neuro-hipofisária) o que facilita a excreção do leite. Há estudos que parecem demonstrar que a liberação do leite promove um gasto energético o que pode ser a causa da promoção de uma redução materna do mesmo. Lembrar que estes são os mamíferos mais rudimentares do ponto de vista evolutivo. Estudos realizados em lhamas e alpacas mostraram que ao nascerem se apresentam mal protegidas dos anticorpos o que nos faz lembrar os bovinos recém-nascidos antes de mamarem, nos quais faltam as IgG. Nas lhamas e alpacas a presença de globulinas só é vista após cerca de três dias quando começam a aumentar. Porém, costumam declinar por volta do terceiro dia. As pesquisas mostraram que as alpacas apresentam níveis ligeira- mente mais altos do que as lhamas (cerca de 1,6 mg/dL e declinam por volta do terceiro dia. As alpacas apresentam pouco mais de 2,0 mg/dL mas também declina por volta do terceiro dia. Embora os anticorpos declinem (por volta de 15 dias) ainda promovem boa defesa orgânica, mas os bovinos apresentam tempo de defesa por colostro que dura pelo menos 30 dias. Tal perda não representa um risco alto pois os citados animais vão substituindo tais anticorpos pelos produzidos por seus organismos. Em camelas (Camelus dromedarius) os estudos do leite mostraram uma variação que é sazonal, ao longo do ano, quando estão lactando. Os níveis de sólidos dosados se mostraram maiores à época da metade da estação do inverno. Seu leite mostrou maior riqueza de ácidos orgânicos se comparados ao leite dos bovinos. Da mesma forma tal leite demonstrou ser rico em lipídeos durante longo tempo e no caso do colostro, ainda na primeira semana de secreção os valores são semelhantes, porém há uma ligeira diferença para menos. Outro elemento que é menor no colostro do que no leite é o conteúdo de ácidos graxos, ao longo da lactação. Ainda em camelas (Camelus dromedarius), assim como em bovinos, não ha trans- ferência placentária de anticorpos. Desta forma a transferência de IgG, como em bezerros, se dá através do colostro. Os níveis de tal globulina no período pós-parto são altos che- gando a 100 ng/mL. A α-albumina também se apresenta alta, porém com variações, e em camelos tal transferência é muito mais alta do que em ruminantes domésticos, como bovinos e caprinos. Estudos realizados em leites de elefantas africanas (Loxodonta africana) mostra uma composição variável com o tempo. Há um aumento das proteínas (±35%), de lipídios, mas ocorre queda de açúcares como a lactose e oligossacarídeos. A porção proteica é basicamente representada pela caseína, e os lipídios estão mais representados por acido láurico e cáprico em concentrações de cerca de 70%. 29 Uma patologia bem conhecida pelos Veterinários é a denominada “febre do leite” ou “febre vitular”que se caracteriza por uma hipocalcemia que pode surgir pouco antes do parto ou logo após o mesmo. Nas cadelas a patologia se caracteriza por convulsões e espasmos. Nos bovinos tem sido relatada uma deficiência de PTH que aparentemente não “descalcifica” os ossos o que promove a queda do cálcio circulante. Há citações de que um pH alto (alcalose) possa interferir na sensibilidade óssea ao PTH. Em bovinos há citações que o Mg++ participa do processo por uma baixa na corrente circulatória. Outras citações fazem referência ao potássio, dizendo que seu excesso pode promover um grau de alcalose sanguínea e interfere na sensibilidade óssea ao PTH, levando a uma hipocalcemia e como consequência aos espasmos musculares. Pessoalmente já presenciamos alguns casos em cadelas e que foram tratadas e restabelecidas com sucesso com injeções de cálcio na veia e continuação do uso por via oral. 10 Problemas hormonais e controle da lacta- ção A lactação, como dito anteriormente, pode até ser iniciada como a secreção deno- minada leite de bruxas (leche de brujas), entretanto sua secreção normal só ocorre após a eliminação de hormônios antagônicos da ação da prolactina. Nas vacas e outras fêmeas leiteiras em que a lactação é anual e com grande produção, ultrapassando a necessidade das crias, e talvez por problemas de aperfeiçoamento e modificação da lactação e das suas inibições a mesma não é interrompida por nova gestação, enquanto lactantes, embora haja um pequeno declínio (variável com a raça) o que geralmente acontece em vacas prenhes após o terceiro mês de gestação. Em outras espécies a lactação impede novos ciclos estrais e menstruais e fertilizações (há citações de até três anos de falta de ciclos estrais humanos por amamentação continuada). Desta forma parece que só após a queda dos hormônios sexuais ocorre uma liberação de prolactina, capaz de desencadear a lactação. Neste caso não podemos esquecer que a própria sucção é capaz de liberar não só a ocitocina mas também a prolactina. Há experiências que mostram que a ordenha em dias alternados e espaçados diminuem e chegam a suspender o processo de lactação prematuramente, enquanto que a amamentação prolonga o efeito secretor do leite. Alguns dados já estudados em fisiologia da lactação dão conta de que, até onde se sabe, há entre os hormônios ligados à mesma, seja a favor ou contra sua produção, cerca de 19 fatores hormonais. Outra experiência muito antiga comprovou que a extirpação dos ovários (ovariectomia), em vacas em lactação, mostrou que a mesma se prolongava por tempo bastante longo, com citações de até três a quatro anos. A explicação seria que sem ovários não haveria efeitos contrários dos hormônios sexuais contra a prolactina. Este hormônio também parece ser o controlador do comportamento maternal e pode ser visto em cadelas com pseudo-prenhez em que a mesma produz leite sem ter paridoe é capaz de adotar crias abandonadas pela mãe, ou até mesmo na ocorrência da morte da mesma. Já presenciamos casos em que a mãe adotiva nem pertencia ao mesmo gênero e espécie da mãe que morreu ou abandonou as crias. Há ainda cadelas que adotam e criam gatos ou outros felinos (até selvagens). Mesmo não sendo em mamíferos já presenciamos galinhas (Gallus gallus) que adotam filhotes de patas (Anseriformes). O sentimento materno é tão intenso que já presenciamos galinhas ficarem inquietas ao verem seus “filhotes adotivos “ se jogarem na água para nadar. Parece óbvio, pois como elas (galinhas) não nadam se estressam ao imaginarem que os mergulhadores (patinhos) são seus filhotes e poderiam se afogar. 31 11 Fatores que afetam a lactação Entre os fatores que afetam a lactação podemos citar os fisiológicos e/ou ambi- entais, e muitas vezes uma interação entre os mesmos. É evidente que o número é ex- tremamente grande, porém discutiremos resumidamente os mais comuns. Podemos citar como exemplos: o centro da fome, o centro da sede, a raça, a idade, o balanço hormo- nal, o tempo de prenhez, o nível de glicemia, o número de parições, o clima, o manejo adotado, as variações sazonais, o uso de medicamentos, ritmo circadiano, o período entre parições/lactações e outros. 11.1 Centros da fome e da saciedade Localizados no hipotálamo controlam, em parte, a fome e a saciedade do animal (ou do homem). O da fome está localizado no hipotálamo lateral, e o da saciedade se localiza no hipotálamo ventromedial. Embora existam tais centros, a fome e a saciedade ainda recebem impulsos de outras áreas que informam sobre a vontade de se alimentar, ou não. É o caso dos receptores do estômago e do esôfago que podem indicar o estado de vacuidade gástrica, ou não, e o esôfago pela deglutição repetida durante algum tempo. Assim, se o animal não está em sua perfeita saúde pode haver algum tipo de influência para que haja procura por alimentos, ou não. É o caso do estresse pelo calor, infecções, parasitismo, pastagem ruim ou pobre e assim por diante. Se o animal não se alimenta não terá como apresentar boa formação de leite. No extremo oposto está a saciedade e as boas condições de saúde e ambientais, que favorecem boa alimentação e podem ajudar na produção não só de leite, mas também de carne. O centro da sede que funciona no hipotálamo é ajudado por outros perceptores fisiológicos e registram a hemoconcentração. A quantidade de líquido ingerido é importante para manter o equilíbrio hídrico e não se pode esquecer que eliminar diariamente 80 litros de leite (bovino) equivale a uma perda diária de quantidade quase igual em água. 11.2 Raça Como se sabe, há raças leiteiras, de corte e mistas. Dentre as leiteiras há as que apresentam a maior produção, mas há aquelas de baixa produção. É preciso avaliar ainda as raças mestiças e seus graus de sangue, pois quanto maior o grau de sangue leiteiro (7/8, 5/8, 3/8, 1/2) maior poderá ser sua produção. As raças leiteiras, de boa genética, apresentam seus alvéolos mais potentes, do ponto de vista fisiológico, para transformar os precursores em leite. 32 Capítulo 11. Fatores que afetam a lactação Mestiças Gir-Holanda Glicose (média) a 30m de altitude Glicose (média) a 400m de altitude 1/2 sangue 61,7 mg/dL 81,0 mg/dL 3/4 sangue 60,9 mg/dL 86,2 mg/dL 7/8 sangue 62,1 mg/dL 82,7 mg/dL Tabela 5: Teores de glicose em vacas de leite Gir-Holanda, em diferentes altitudes. ROCHA, N.C. e PAES RIBEIRO, A.G. Pesagro-Rio, 1989. 11.3 Idade Os bovinos apresentam seu pico de produção, normalmente, por volta da segunda ou terceira cria (desde que os intervalos entre gestações não sejam afetados e descontro- lados) ou ainda quando estão no terceiro mês de lactação. A partir daí costuma haver certa estabilização, e após o oitavo ano de vida pode iniciar um declínio fisiológico mais acentuado. 11.4 Balanço hormonal Como já foi dito, a lactação está sob domínio de 19 hormônios que jogam a favor ou contra a lactação. Destacaríamos o estimulante da prolactina (no hipotálamo) PRF com ajuda do TRH e que conta com a hipófise ao liberar o TSH, porém classicamente se considera o PRF (fator liberador de prolactina - PRL). Outros hormônios são T3 e o T4, insulina (para oferta de glicose que se converte em lactose), adrenalina (não em excesso) que libera glicogênio hepático, transformando-o em glicose, o GH que parece ser um potencializador da PRL. A idade, balanço hormonal, número de parições e nível de glicemia foram conside- rados nos parágrafos anteriores. 11.5 Clima Este é um fator decisivo, pois as raças de alta qualidade e quantidade leiteira geralmente provêm de países frios e em nosso país sofrem com o estresse imposto pelo calor o que promove muita sede e pouco apetite. Os animais preferem sombras e deixam de pastar, principalmente as de pelame escuro, em função da baixa radiação refletida, e da alta absorvida (Figura 6). As raças mestiças que apresentam boa produção leiteira são mais resistentes e menos afetadas. As raças leiteiras apresentam estresse elevado quando a temperatura ambiente (dependendo da umidade relativa do ar - URA) atinge níveis mais elevados. Em geral a raça Holstein-Frisian tem uma faixa de “zona de conforto” entre -10∘C e + 26∘C e na qual sua produção se mantém constante. Entretanto, temos 11.6. Manejo 33 que levar em conta a U.R.A., pois esta quanto mais alta maior será o desconforto no calor (mais detalhes em noções de bioclimatologia). Figura 6: Carneiro deslanado de modo natural e gradativo. Aparentemente houve perda de pêlo gradati- vamente em função de ser animal de ambiente frio e estava vivendo há muito tempo em ambiente muito quente e em altitude de menos de 30 metros. Observado pelo autor. 11.6 Manejo Este envolve praticamente tudo que já vimos acima, pois o manejo depende da raça e do grau de sangue (maior ou menor exigência), alimentação adequada à lactação, proteções naturais contra intempéries, acasalamento correto, tratamentos preventivos e outros. 11.7 Variações sazonais Tendo em vista que tais variações alteram a luminosidade, a extensão dos dias e das noites, as temperaturas e a URA também são alteradas, além das condições do solo, a pluviometria, as pastagens e outros fatores ligados ao meio ambiente. O próprio organismo tem que se adaptar a tais condições e por isso ao longo do ano vários fatores podem interferir na produção leiteira. O próprio ritmo circadiano também se altera e os próprios hormônios podem sofrer alterações com a intensidade e tempo de luminosidade, podendo afetar de alguma forma a produção láctea. 11.8 Uso de medicamentos Diversos medicamentos afetam a produção leiteira sendo que alguns ainda causam problemas para a comercialização do leite. Basta lembrar os que os antibióticos podem ser 34 Capítulo 11. Fatores que afetam a lactação eliminados no leite durante tratamento com os mesmos: Assim, o leite estaria impróprio para o consumo. Muitos medicamentos usados no passado eram transferidos ao leite e causavam não só sabores estranhos como elementos prejudiciais à saúde humana; entre eles podemos destacar um, que embora bom para tratamento, foi demonstrado ruim para a saúde humana: Foi o caso do sal anti-berne, à base de BHC (hexacloreto de benzeno), condenado já há alguns anos. Outro medicamento proibido durante muito tempo, e de- pois liberado como um adjuvante para a produção leiteira foi o caso do GH injetável, comercial, e que realmente eleva a produção leiteira. Outros medicamentos que podem promover lactação espontânea na espécie humana são o haloperidol a butirofenona e a clorpromazina (no Brasil – amplictil). Trata-se de neurolépticos e que ao serem usados em manicômios (problemas psiquiátricos) provocavam lactação espontânea em mulheres internadas, podendo promover inclusive ginecomastia. A partir daí as investigações mos- traram que um de seus efeitos eraa inibição da dopamina e por isso a lactação aparecia. Posteriormente se concluiu que a dopamina funciona como um hormônio (mediador quí- mico) capaz de inibir o fator liberador da prolactina no hipotálamo. Assim, a liberação da mesma se deve ao PRF e sua inibição se deve à dopamina. (PIF). Hoje se admite a dopamina (situada no hipotálamo) como fator inibidor da prolactina. Há muitos anos presenciamos novilhas holandesas, sem ter parido, e apresentando úbere desenvolvido e produção de leite. Na propriedade se usava injeção de anabolizantes (dietilestilbestrol) o que possivelmente promovia eventual lactação sem parto. 11.9 Intervalo entre partos Na verdade se trata apenas de um descanso da fêmea no espaço entre partos, pois se deve entender que gestações continuadas, sem intervalo necessário e ideal, leva ao esgotamento materno pelo excesso de consumo fisiológico-metabólico pelo grande desgaste físico da lactação. Parte III Aleitamento 12 Componentes do leite O leite é o alimento mais completo, só perdendo para os ovos porque este pre- cisa conter todos os elementos necessários à formação de uma nova vida. . Assim, em linhas gerais ali estão presentes proteínas, glicídios, lipídeos, vitaminas e minerais, todos diluídos ou suspensos em água, sendo que esta chega a constituir cerca de 87% do leite. Além deste funcionar como alimento ainda é de consumo obrigatório pelos recém-nascidos, principalmente aqueles que nascem com zero de anticorpos (como bezerros, potros, suí- nos). Mesmo para os que nascem com bom nível de anticorpos, (como humanos e cães) há necessidade de ingestão do leite como alimento (único) e como protetor por conter anticorpos que podem complementar a imunidade por um bom tempo, até que sejam vacinados. De modo geral os animais que nascem em ambientes hostis apresentam bom nível de anticorpos (como ratos e camundongos de rua); os que nascem em ambientes frios e até mesmo gelados apresentam altos teores de gordura e proteínas no leite (ursos). Por outro lado é importante perceber que os animais, no parto, deixam o interior do útero com temperaturas corporais maternas altas e ao nascerem em ambientes frios, ou mesmo temperados, há uma diferença térmica o que gera uma agressão ambiental. Assim, mamar um leite com bom teor de gordura é fundamental para manutenção de sua temperatura e metabolismo. A Tabela 6 mostra um esquema dos níveis de anticorpos do soro materno, em duas etapas, e do colostro. Outros fatores que alteram a composição percentual de componentes do leite são as raças e a variação ao longo do ano, em função das mudanças que estão ligadas tanto às variações climáticas como à alimentação que os animais irão receber ao longo do ano. Dentro de uma mesma espécie (bovinos) ocorrem alterações dos percentuais de gordura Espécie Secreção IgG (mg/dL) IgA (mg/dL) IgM (mg/dL) IgG(T) (mg/dL) IgG(B) (mg/dL) Bovinos leitecolostro 76 3400 a 8000 8 100 a 700 20 300 a 1300 Suínos leitecolostro 200 3000 a 7000 500 950 a 1050 60 250 a 320 Ovinos leitecolostro 80 4000 a 6000 8,5 100 a 700 3,5 400 a 1200 Equinos leitecolostro 35 1500 a 5000 75 500 a 1500 7,5 500 a 1500 5 a 20 500 a 2500 0 (zero) 50 a 150 Cadelas leitecolostro 2 120 a 300 365 500 a 2200 32 14 a 57 Gatas leitecolostro 270 3250 a 4400 430 150 a 340 0 (zero) 47 a 58 Tabela 6: Comparação entre níveis de imunoglobulinas contidas no leite (médias) e no colostro de animais domésticos. Os valores variam entre autores e com tempo decorrido pós-parto. Mostram ainda resistência das crias após o nascimento e a maior ou menor importância da obrigatoriedade da ingestão colostral. 37 por problemas raciais o que normalmente é governado pela genética racial. Seus compo- nentes podem variar entre 3,5% e 5,0% de gorduras, 4,7% a 5,1% de açúcar (lactose), 3,1% a 3,9% de proteínas e em torno de 0,7% no caso dos minerais. Dentre as proteínas estão as globulinas que variam de acordo com o tempo de produção do leite, sendo altas no colostro e vão diminuindo à medida em que o tempo de lactação avança. As proteí- nas do leite derivam de aminoácidos essenciais e não essenciais e são formadas através de processo ativo, portanto, com gasto de energia. Assim, não são transferidas passiva- mente através das células dos alvéolos. Da mesma forma, as gorduras do leite têm como base os triglicérides do sangue. Como em outras situações (intestino) uma associação de três moléculas de triglicérides forma uma molécula de glicerol. Entre os ácidos graxos há certa percentagem maior de saturados sobre os não-saturados, mas há uma variação, pois existem diferenças entre as espécies. Parte dos ácidos graxos pode ser sintetizada a partir de glicose (ruminantes). A lactose, pelo que se tem visto, deriva normalmente de uma reunião de glicose com galactose nas várias espécies estudadas, dentro das células dos alvéolos mamários e depois atravessam para dentro da luz alveolar. Entre os minerais são citados valores (em mg/ml) que apresentam uma média de 1,2 (cálcio), 1,0 (cloretos), 0,9 (fósforo total), 0,1 (magnésio). Entre as vitaminas podemos encontrar valores de 1,6 mg/100 ml, sendo que para vitamina C estão em torno de 0.07. Vitaminas lipossolúveis como as vitaminas A e K os valores estão em torno de 1,4 U.I/ml e 0,03 UI/ml , respectivamente. A vitamina E (lipossolúveis) apresenta baixos teores (0,06 mg/100 ml). As vitaminas hidrossolúveis apresentam os valores (em µg/ml) para biotina (0,04), vitamina B2 (1,6), vitamina B1 (0,4), vitamina B12 (0,06). Todos os valores são u’a média para o leite normal. Um fato interessante e corrente no nordeste é a informação que crianças afetadas por doenças, como a coqueluche, são tratadas, de modo familiar, através do uso do leite de jumenta (como curativo). Entretanto, as análises do leite de tais fêmeas mostram que seu leite é o mais pobre de todos em gordura (1,2%), em proteínas (1,7%), em minerais (0,4%) sendo rico apenas em lactose (6,9%) onde é maior do que outros animais. Em proteínas e minerais só ganha do leite materno e com pouca diferença. Em lactose os valores praticamente se equivalem (6,9%). Caso seu efeito benéfico se baseie apenas em princípios nutritivos não há como garantir sua função coadjuvante ou curativa em tal patologia indicada. 13 Composição do colostro Embora em bezerros possa haver uma imunização quando ainda na vida intra- uterina, alguns antígenos (contra enfermidades) não funcionam ou até podem causar abortos. Como exemplo se pode citar que os bezerros (fetos) apresentam resposta imuni- tária quando as vacas prenhas são inoculadas com Anaplasma, Leptospira e Parainfluenza (vírus) entre os 140 e 150 dias de gestação; contra diarreia bovina ocorre após os 200 dias de gestação; reagem bem contra Campilobacter, Escherichia coli e Clamídia por volta dos 240 e 250, mas contra Brucella abortus e “blue tongue” (vírus) só ao final da gestação (logo após o parto). Os fatos evidenciam uma evolução do sistema imune, quando o organismo começa a responder progressivamente contra determinados organismos. Muitas vezes as vacinas são adicionadas de substâncias como o hidróxido de alumínio ou outras substân- cias. Entretanto, a vacinação durante a gestação, pode por vezes acarretar um aborto. O processo de vacinação pode ajudar, mas existe uma transferência natural de imuno- globulinas através do colostro, como mencionado, e os anticorpos já formados podem ser absorvidos pelo intestino. Há uma grande diferença entre os níveis de anticorpos maternos e os que se veiculam pelo colostro. Os anticorpos no colostro bovino são das classes IgA, IgM, IgG, embora sejam citados outros em pequenas quantidades além do desdobramento de tais anticorpos como é o caso dos IgA-1 e IgA-2, dependendo de sua distribuição pelo corpo. Os de maior concentração no colostro são IgG (3400 a 8000 mg/dl), IgM (300 a 1300 mg/dl)e os IgA (100 a 700 mg/dl). Tais citações variam em diversos trabalhos científicos talvez pela metodologia usada ou com o tempo em que foram determinados. Nos exemplos citados está o caso de pesquisas que dão o IgG entre 3400 e 3900 mg/dl. Se compararmos os valores com os do leite, após a fase de colostro, veremos que o leite é muito mais pobre em tais anticorpos. Por exemplo, IgA de 5 a 50 mg/dl; IgM de 4 a 20 mg/dl; IgG de 33 a 750 mg/dl. As diferentes épocas podem levar a certas distorções, nas variações de valores, pelos métodos empregados, nas referidas ocasiões. Vale lembrar que também ocorre certa transferência de glóbulos brancos pelo colostro os quais também aju- dam na defesa da cria. Há descrições da existência de cinco tipos de imunoglobulinas em colostro e leite de equinos além das que são comuns aos outros animais domésticos como felinos, suínos, bovinos pequenos ruminantes e cães (ver tabelas). Neles há presença de IgA, IgM, IgG. Nos equinos são citados mais dois subtipos de IgG: as IgG(T) e a IgG(B). No leite suas concentrações em mg/dL são muito mais baixas do que no colostro e suas concentrações têm apresentado valores diferentes com o passar dos anos, provavelmente pelas diferentes técnicas para obtenção dos resultados. A diferença é grande entre eles no colostro e no leite e só como exemplo podemos dizer que dependendo do tipo de anticorpo as concentrações (na égua) são maiores do que no colostro. Vale a pena lembrar que os 39 anticorpos transferidos pelo colostro se comportam como se fossem corpos estranhos para o recém-nascido, pois com o passar dos dias o nível de anticorpos transferidos diminui gra- dativamente e os animais começam a produzir seus próprios anticorpos pelo contato com os germes na natureza, além de receberem vacinação que varia no prazo pós-nascimento, mas não é igual para todas as vacinas, pressupondo uma imunocompetência vinculada ao tempo decorrido entre o parto e a capacidade de gerar anticorpos específicos. Por tal razão muitas vezes as vacas prenhas são vacinadas uma ou duas vezes nas proximidades do parto, contra doenças frequentes nos recém-nascidos, mas após a ingestão de colostro (para ganhar tais anticorpos) eles mesmos ficam protegidos contra tais germes. Isto au- menta suas chances de defesa contra as enfermidades específicas. O fato é comum onde costumam ocorrer doenças muito frequentes. Uma doença endêmica em vacas de leite da raça Holandesa foi detectada e denominada síndrome de imunodeficiência lactogênica quando os níveis de imunoglobulinas eram normais no sangue, mas muito baixos no co- lostro, provavelmente por alguma alteração na transferência dos mesmos. O resultado é a baixa resistência dos recém-nascidos com mortalidade alta. Um dos recursos estudados por pesquisadores demonstraram efeito positivo na adi- ção de um concentrado de soro desidratado (da vaca recém-parida) ao colostro que é dado aos bezerros recém-nascidos. O efeito dessa prática é administrar anticorpos maternos existentes no sangue (soro) junto com o colostro para enriquecer o mesmo, principalmente com o IgG. Alguns autores admitem concentrações muito amplas e chegaram a concluir que a concentração do IgG com colostro era bem maior. Assim, os anticorpos repassados são mais amplos do que os do colostro puro, aumentando as imunoglobulinas que atra- vessam a mucosa intestinal do recém-nascido antes do fechamento intestinal. Um estudo comparativo entre raças de vacas leiteiras e vacas de corte mostrou maior concentração de anticorpos, principalmente IgG1 nas raças de corte, que apresentaram concentração de cerca de 8,5 mg/ml contra 5,7 mg/ml, em época equivalente a um mês antes da parição. O aumento na diferença se acentua nas proximidades do parto, atingindo valores quatro vezes maiores. No colostro as diferenças foram de cerca de 110 contra 40 mg/ml. Embora se acredite que possa ser um efeito real há indícios de que tais diferenças possam se dever a uma diluição dos anticorpos no mesmo volume de amostra, pela grande quantidade de leite produzido por vacas leiteiras se comparadas com vacas de raças de corte. As vacas leiteiras podem produzir 5 a 7 vezes mais leite do que as de corte e desta forma os anti- corpos, nestas últimas, poderiam estar mais concentrados. Outros fatores supostos como capazes de alterar o bom aproveitamento dos anticorpos por parte dos bezerros foram: A presença da fêmea específica da cria em questão, problemas respiratórios como a presença de acidose na cria, o volume de colostro administrado, o uso de mistura de colostros de diferentes fêmeas, administrados através de processo artificial (mamadeiras), em função do manejo e até mesmo a raça do animal. Alguns dados sobre as diferenças entre alguns componentes do colostro e leite 40 Capítulo 13. Composição do colostro de vacas Holandesas são grandes. Por exemplo, a quantidade total de proteínas é de cerca de 14% no colostro contra a do leite 3,2%, com a caseína apresentando o dobro da percentagem. As imunoglobulinas podem atingir 5,7% no colostro contra 0,09% no leite; o cloro é quase o dobro entre colostro e leite (0,12% contra 0,07%) e o ferro chega a ser 20 vezes maior no colostro do que no leite (0,20% contra 0,01%). Entre as vitaminas chama atenção a concentração da vitamina A, tendo no colostro (45 𝜇g/g) contra 8 𝜇g/g no leite. Os níveis de IgG, por exemplo, no leite de eqüinos pode ser 100 vezes menores do que no colostro; nos ovinos em torno de 12 vezes menores; nos suínos 20 a 30 vezes menores e da cadela cerca de 100 vezes menores. Um dos fatores que restringe a travessia de anticorpos pela placenta é a sua es- pessura que pode apresentar de uma a seis camadas. Desta forma, em suínos e eqüinos, a placenta possui seis camadas e assim transferência via placenta é igual a zero. Assim a transferência colostral, para compensar, é total. Os ruminantes apresentam o mesmo tipo de transferência, porém as camadas placentárias são em número de cinco. Os cães e gatos, os primatas e os roedores apresentam respectivamente quatro, três e uma camada placentária. Desta forma a transferência aumenta via placenta e diminui via colostro, pois quanto menor o número de camadas placentárias, maior a transferência de Ab. Parte IV Patologias do úbere 14 Patologias do úbere Várias são as patologias do úbere e não iremos descrever todas nem seus detalhes, porém vale recordar casos clínicos com os quais podemos nos deparar na prática. 14.1 Mamite Esta talvez seja a mais freqüente patologia do úbere, principalmente de ruminantes, com a qual nos deparamos. As primeiras citações datam entre 1776 e 1778. É um processo infeccioso largamente difundido, causado por vários germes (embora existam alguns mais comuns), causando alterações de graus variáveis que podem ir de inflamações tratáveis até casos graves, que afetam grandes extensões (os quatro quartos), podendo ocorrer in- clusive abcessos e inutilização da fêmea para novos acasalamentos porque as lactações não poderão mais apresentar o efeito desejado. Uma fêmea atingida por mamites, por mais leves que sejam sempre poderão reduzir novas lactações. (pessoalmente, presencia- mos em Itaboraí-RJ, fêmeas de boa produção leiteira (Holando-zebu) com mamites nos quatro quartos, vários abcessos expelindo pus e com diversos germes que foram isolados em nosso setor de microbiologia do Laboratório da PESAGRO-RIO, em Niterói/RJ. Os agentes infecciosos podem ser inúmeros, pois qualquer germe, por mais simples que seja, poderá desenvolver uma mamite rara e não-clássica. Entre os germes mais comuns estão os estreptococos e os estafilococos, sendo do primeiro grupo os Estreptococcus agalactiae, mas dependendo do país há variações da predominância do germe. Aqui no Estado do Rio de Janeiro, pudemos presenciar muitos casos de Corynebacterium pyogenes, inclusive com bastante dificuldade de tratamento e de obtenção de vacinas experimentais, à época,
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