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Farmacia e Sociedade- Ensino da Ciencia Farmaceutica no Brasil

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Faculdade de Farmácia/UFMG
Disciplina: Farmácia e Sociedade
A trajetória da profissão e do ensino de farmácia no Brasil
Texto didático - O Ensino farmacêutico no Brasil: revendo uma trajetória. 
Professora Maria de Lourdes Fernandes Valladão
(c/ adendo do Professor Edson Perini)
Instrução:
Leia individualmente com atenção o texto abaixo, atentando aos seus diferentes períodos. Relembre a aula sobre história da farmácia, e faça um paralelo com a parte final em que o professor destacou a industrialização do setor farmacêutico no século passado.
Na leitura, marque características que identificam esses períodos e procure perceber as mudanças que se foram processando.
EM GRUPOS DE 3 ou 4 ALUNOS, faça uma resenha (duas páginas, no máximo) sobre o tema abordado nesse texto destacando:
- as diferentes fases da constituição profissional do farmacêutico no Brasil;
- as principais características dessas fases em termos de atividades desenvolvidas por esse profissional;
- as principais características das estruturas curriculares dessas fases
- as mudanças ocorridas nessa trajetória.
- como essas mudanças favoreceram um certo afastamento do Farmacêutico da Farmácia Comunitária (comercial)
Destaque o entendimento do grupo sobre os dois últimos parágrafos do texto da Professora Valladão.
O Ensino Farmacêutico no Brasil: revendo uma trajetória
Profa. Maria de Lourdes Fernandes Valladão
Belo Horizonte, 2000
A criação, em 1832, dos cursos de farmácia vinculados às faculdades de medicina da Bahia e do Rio de Janeiro e a fundação, em 1839, da Escola de Farmácia de Ouro Preto, a primeira da América Latina a funcionar independente de cursos médicos, constituem os marcos da institucionalização do ensino farmacêutico no Brasil. Se tomarmos como referência o perfil do profissional formado ao longo de sua existência, é possível identificar, para efeito didático, fases distintas em sua trajetória.
Na primeira, que durou aproximadamente cem anos, o ensino cuidou da formação do farmacêutico ou pharmaceutico, sem qualquer adjetivo. Isto é, de um profissional que dentro da pharmácia exercia um conjunto de atividades compreendendo: a pesquisa de substancias ativas (principalmente de plantas): a manipulação e dispensação de fórmula magistrais e oficinais; a prestação de serviços de saúde á comunidade. Em suma, eram formados profissionais que dominavam a tecnologia de produção dos remédios utilizados na época, orientavam quanto ao seu uso e desempenhavam um papel complementar e, não raro, de substituição ao do médico no atendimento á população.
Os cursos nessa fase duravam de dois a três anos e estavam centrados no ensino de matérias, ou das chamadas cadeiras como farmácia galênica, farmacognosia, botânica, química, física e biologia que forneciam conhecimentos necessários para o desempenho de tais atribuições. Na Escola de Ouro Preto, por exemplo, no curso de três anos eram lecionadas em 1893 as “cadeiras”: física: química orgânica: química orgânica; química analítica: química biológica: mineralogia: botânica: zoologia: matéria médica: terapêutica: toxicologia, farmácia teórica e prática. [1: Correspondente ao conteúdo de farmacognosia.]
Na década de 1930, quando o curso de farmácia começa a cuidar também da formação de um farmacêutico adjetivado, inicia-se uma outra fase na trajetória do ensino.
A partir dos anos trinta começa a tomar vulto um processo de mudança na sua estrutura curricular, buscando adapta-lo á formação de um farmacêutico que, além de habilitado a desempenhar atividades na área dos exames clínico-laboratoriais e no campo industrial (medicamentos e alimentos). O conteúdo do ensino vai sendo diversificado, com a incorporação de matérias necessárias ao exercício das novas funções. Novamente, o curso de Ouro Preto pode nos servir de referencia. Em 1931, além das “cadeiras” tradicionais, eram também ministradas: parasitologia, microbiologia, química bromatológica, farmácia química, química industrial farmacêutica, higiene e legislação farmacêutica.[2: Correspondente atualmente a química farmacêutica.]
O processo de diversificação do conteúdo vai generalizando-se de tal modo que, na década de cinqüenta, várias escolas já haviam introduzido matérias relativas, predominantemente, ás análises clínicas e ampliado à duração do curso para quatro anos. Nessa mesma década é formada a primeira geração de farmacêuticos bioquímicos, terminologia oficializada em 1963, para designar á época, os profissionais habilitados tanto para as análises clínicas quanto para o campo industrial. O recurso à adjetivação serviu – como continuaria – para distinguir “o novo” profissional do “antigo”, para valorizá-lo em relação ao pharmaceutico e, sobretudo, para sinalizar uma mudança significativa nos rumos e no lazer da profissão.[3: Pelo primeiro currículo mínimo de farmácia.]
Com efeito, as atividades tradicionais do farmacêutico haviam perdido importância nos anos 50/60, com a intensificação do processo de industrialização, principalmente pelo modelo de industrialização adotado no Brasil após o término da segunda guerra mundial. A manipulação se tornara uma atividade residual, limitada a preparações de uso dermatológico, pois no receituário medico predominavam as especialidades farmacêuticas, isto é, medicamentos industrializados de base natural ou sintética, produzidos por grandes laboratórios multinacionais que dominavam a tecnologia de sua produção. Concentradas no eixo Rio-São Paulo, essas empresas não desenvolviam aqui a pesquisa e o desenvolvimento de novos fármacos. Limitava-se a transformar matéria prima, adquirida no exterior, a embalar e a comercializar seus produtos no nosso mercado.
A dispensação havia se transformado em um mero ato comercial, de “repasse” de medicamentos, destituída de seu caráter de orientação quanto ao uso de medicamentos na proteção ou recuperação da saúde. A farmácia assumira as feições de drogaria, estabelecimento de comércio de produtos industrializados. Ao farmacêutico, restara a “responsabilidade técnica”, função privativa da profissão, desempenhada como atividade meramente burocrática, para atender uma exigência legal.
Essa realidade “empurrava” os profissionais para a realização de atividades técnico-científicas em outros campos, embora continuassem legalmente vinculados à farmácia. No setor industrial as oportunidades de trabalho eram restritas, porém eram amplamente favoráveis no campo das análises clínicas. Exames clínico-laboratoriais já estavam incorporados à prática profissional, pois os farmacêuticos costumavam realizar, no interior da própria farmácia, a pesquisa de albumina e glicose em amostras de urina. De caráter complementar ao trabalho do farmacêutico, o exercício das análises clínicas foi progressivamente se tornando a atividade principal da profissão.
A mudança nos rumos da profissão, o deslocamento do seu eixo da atuação da farmácia para o laboratório de análises clínicas, teria repercussões na esfera acadêmica. Após um momento de “crise existencial”, em que até a extinção do curso de farmácia foi proposta, optou-se por um modelo de formação que até agora tem sido a referência para a estruturação de todos os cursos. Sua implantação em 1970 vai caracterizar a fase em que o ensino enfatiza a formação do farmacêutico adjetivado e se descuida da formação do farmacêutico, propriamente dito.[4: Encaminhada em 1967 pelo Ministro da Educação.]
Esse modelo prevê a formação do farmacêutico, isto é, do profissional da manipulação e dispensação de medicamentos, no prazo mínimo de dois anos e meio. A partir dele prevê a formação, no prazo mínimo de um ano, em uma das seguintes habilitações: farmacêutico industrial (indústria de medicamentos e cosméticos), farmacêutico bioquímico – ênfase análises clínicas (exames clínico-laboratoriais e toxicológicos) e farmacêutico bioquímico – ênfase alimentos (indústria e controle de qualidade). Estabelece, ainda, a organização dos cursos em três ciclos. O primeiro – ciclo básico – composto por matériasdas áreas exata e biológica. O segundo, ou ciclo profissional comum, integrado por matérias profissionalizantes e o terceiro, denominado ciclo profissional diferenciado, que reúne matérias específicas das habilitações. Em síntese, pelas normas vigentes todos os que concluem o ciclo profissional comum recebem o grau universitário e o título de farmacêutico, estando em condições de obter o registro profissional no Conselho Regional de Farmácia, para exercer legalmente a responsabilidade técnica de farmácia. O desempenho de atividades profissionais no campo industrial, do alimento e das análises clínicas requer a conclusão da respectiva habilitação.[5: Instituído pelo currículo mínimo fixado pela Resolução CFE n. 4 de 07/69.]
A partir de 1970, e dando continuidade ao movimento já evidenciado nas décadas anteriores, os cursos passam a enfatizar e a promover o desenvolvimento do ensino das análises clínicas e, em menor escala, o ensino das outras habilitações (industria e alimentos).
Por outro lado, tendem a tratar a temática da farmácia, mais precisamente a da utilização do medicamento na atenção á saúde, como uma área periférica, de interesse “menor”. Nesse sentido, concretizam a intenção dos formuladores do modelo de 1970 de dar ao farmacêutico uma formação “tout court”, isto é, rápida e, por conseqüência, superficial. Conteúdos essenciais que capacitam o farmacêutico para a prestação de uma efetiva assistência continuariam excluídos ou insuficientemente tratados na graduação em farmácia: farmacologia, planejamento e organização de serviços farmacêuticos, epidemiologia, política de saúde, procedimentos de seleção de fármacos e medicamentos, acompanhamento e aconselhamento de pacientes e usuários, dentre outros.
Nos anos oitenta e noventa, a insatisfação com esse modelo de formação passou a mobilizar os meios acadêmico e profissional. Em diferentes eventos nacionais e regionais, promovidos ora pela Executiva Nacional dos Estudantes de Farmácia ora pelo Conselho Federal de Farmácia – CFF ou Federação Nacional dos Farmacêuticos – FENAFAR foi enfatizada a necessidade de mudanças no ensino, visando qualificar o farmacêutico para a prestação de assistência farmacêutica. Algumas instituições já haviam começado a trabalhar nessa direção, com destaque para a Faculdade de Farmácia da UFMG que em 1988, numa ação pioneira, reformou o seu currículo, buscando uma melhor formação do farmacêutico, sobretudo na área de utilização de medicamentos. Em 1993, é aprovada no I Encontro Nacional de Reforma Curricular a proposta que previa a formação do farmacêutico pleno (isto e, em condições de atuar na pesquisa, produção e dispensação de medicamentos), preservando as habilitações em análises clínicas e alimentos.
Essa proposição serviu de base para os estudos realizados pelo Ministério da Educação, a partir de 1996 e finalizados em 1999, com o envio à Comissão Nacional de Educação – CNE da proposta de Diretrizes Gerais para a Educação Farmacêutica que, pela atual legislação, devem orientar a organização dos cursos no Brasil, em substituição ao extinto currículo mínimo.
As Diretrizes, ainda não aprovadas pelo CNE, propõem três “modalidades” de farmacêutico – o do medicamento, o das análises clínicas e toxicológicas e o do alimento – com perfil e competência profissionais distintos. Propõem, ainda, a formação em cada uma delas no prazo mínimo de quatro anos, compreendendo uma parte comum a todas e outra específica, cabendo às instituições de ensino definir o momento da opção pela modalidade.
A adoção de tal modelo repercutirá no mercado de trabalho da profissão. Ao mesmo tempo em que possibilitará uma melhor qualificação profissional, abrindo espaço para o desenvolvimento do ensino de cada área, restringirá o exercício da responsabilidade técnica em farmácia aos que concluírem a modalidade medicamento. Significa dizer, modificará radicalmente a situação que persiste há quase cinqüenta anos, em que todos estão habilitados a exercê-la.
Não se pode perder de vista, no entanto, que o contexto social e econômico para atuação do farmacêutico nesta virada de milênio mostra-se qualitativamente distinto daquele que prevalecia no pós-guerra. Neste momento, seu trabalho vem sendo requisitado tanto na esfera da tecnologia de produção quanto na da utilização de medicamentos o que reforça a necessidade de se repensar, de se buscar novos caminhos para a educação farmacêutica em nosso país.
A implementação da política dos “genéricos” que exige a realização de testes de bioequivalência e de biodisponibilidade, além das informações sobre suas características; a racionalização no uso de medicamentos com vistas à redução riscos e custos, por meio de procedimentos de seleção, armazenamento, distribuição e dispensação, a organização da assistência farmacêutica no Sistema Único de Saúde – SUS; a utilização de fitoterápicos e produtos homeopáticos, o registro e o estudo de reações adversas; o desenvolvimento de novas formas e formulações farmacêuticas são questões, dentre tantas outras, cujo equacionamento envolve a participação de farmacêuticos. Mas, de farmacêuticos efetivamente qualificados, e não apenas formal ou legalmente habilitados. Essa qualificação não se restringe a uma sólida formação técnico-científica. Vai mais além: incorpora uma visão crítica da realidade e uma conduta social e eticamente responsável.
Belo Horizonte, agosto de 2000.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. O ensino de Ciência Farmacêutica: análise e recomendações. Documento 1 São Paulo, 1974. 
2. CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Comissão de Ensino. Diagnóstico e Diretrizes do Ensino Farmacêutico no Brasil. Relatório. Brasília, jul. 1994.
3. DIAS, J.R. Apontamentos Históricos do Sesquicentenário da Escola de Farmácia de Ouro Preto. 3.ed. Ouro Preto. UFOP/Escola de Farmácia, 1989. 317p.
4. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Secretaria do Ensino Superior. Diretrizes para a Educação Farmacêutica no Brasil. Brasília. 1997.21p.
5. VALLADÃO, M.L.: CELSO, C.: NUNAN, E. et. Al. Os (des) caminhos do ensino farmácia no Brasil. Revista de Farmácia e Bioquímica da Universidade Federal de Minas Gerais. n. 7:63-74, 1986..
Adendo:
Professor Edson Perini
A Professora Maria de Lourdes escreveu este texto em 2000. Até então as diretrizes curriculares, discutidas amplamente pela categoria em nível nacional, propunham a separação, desde o vestibular, nas três modalidades (Farmacêutico, Bioquímico Análises Clínicas; Bioquímico Alimentos). No ano de 2002, após novas rodadas de negociações e assembleias, e de acordo com nova decisão tomada pela categoria, o Conselho Nacional de Educação / Câmara de Educação Superior baixou a Resolução nº CNE/CES 2, de 19/02/2002, instituindo as Novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Farmácia (http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/0202Farmacia.pdf). Em seu Art. 3º, a Portaria reza o seguinte: “O Curso de Graduação em Farmácia tem como perfil o formando egresso/profissional o Farmacêutico, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, para atuar em todos os níveis de atenção à saúde, com base no rigor científico e intelectual. Capacitado ao exercício de atividades referentes aos fármacos e aos medicamentos, às análises clínicas e toxicológicas e ao controle, produção e análise de alimentos, pautado em princípios éticos e na compreensão da realidade social, cultural e econômica do seu meio, dirigindo sua atuação para a transformação da realidade em benefício da sociedade.”
Em seu Art. 4º, estabelece que a formação do Farmacêutico tenha por objetivo dotá-lo da capacidade: de atuar na atenção à saúde, desenvolvendo ações de prevenção, promoção e reabilitação da saúde em nível coletivo e individual, dentro de seu âmbito; para a tomada de decisões, visando o uso apropriado, a eficácia e custo-efetividade, da força de trabalho, de medicamentos, de equipamentos, de procedimentos e práticas; de comunicação, sendo acessíveis e mantendo a confidencialidade das informações a ele confiada,com habilidades oral, escrita e de leitura, domínio de pelo menos uma língua estrangeira e de tecnologias de comunicação e informação; de liderança no trabalho multiprofissional; de administração e gerenciamento, estando aptos a tomar iniciativas e gerenciar força de trabalho e demais recursos produtivos e para a educação permanente, tanto de sua própria formação, que deve ser atualizada continuamente, quanto dos novos profissionais, assumindo sua parcela de responsabilidade na evolução técnica, científica e humanística das novas gerações.
	O currículo da Farmácia UFMG foi reformulado em 2008, baseado nessa DCN. Hoje novas reformulações estão sendo discutidas. Nas propostas em curso, algumas transformações podem ser identificadas reforçando a participação do Farmacêutico no Sistema Único de Saúde, no trabalho em equipes de saúde, em atividades clínicas que favoreçam o melhor uso do medicamento e o acompanhamento de seus resultados.

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