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CCJ0033-WL-B-PP-Unidade II-01 -Estupro - Renan Marques

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Dos crimes contra a dignidade sexual 
1. Considerações iniciais sobre a abrangência da expressão dignidade sexual. 
- O Título VI do Código Penal, com o surgimento da Lei 12.015/2009, passou a tutelar 
não mais os costumes, mas a dignidade sexual, expressão umbilicalmente ligada à 
liberdade e ao desenvolvimento sexual da pessoa humana. Ou seja, não é mais a 
moral sexual que clama proteção, e sim o direito individual de qualquer pessoa, sua 
liberdade de escolha do parceiro e o consentimento na prática do ato sexual. A 
violação a isso corresponde a um ilícito ligado a sua pessoa e não mais contra os 
costumes. Prevalece na ofensa sofrida, sua liberdade e não a moral. 
- Vale ressaltar que, no enfoque jurídico, conclui-se que, a violência dos crimes sexuais 
deve ser totalmente desvinculada de todo e qualquer aspecto moral, pois estes 
atingem a personalidade humana e não os costumes. 
 Dos crimes contra a liberdade sexual. 
1. Estupro 
1.1 Estupro Simples. 
A) Tipo Objetivo. 
- Ele está no Art. 213, caput, do Código Penal e ocorre na seguinte situação: 
“Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal 
ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, 
de 6 (seis) a 10 (dez) anos.” 
- As condutas do crime em estudo são as seguintes: 
1º) Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça. 
- Constranger está sendo utilizado no sentido de forçar, obrigar, subjugar a vítima ao 
ato sexual. 
- Além disso, deve haver o emprego de violência, entendida esta na utilização de 
força física contra a vítima no sentido de subjugá-la, emprega-se força física 
suficientemente capaz de impedir a mulher de reagir. Também é chamada de 
violência material. 
OBS: As vias de fato e as lesões corporais de natureza leve são absorvidas pelo 
delito de estupro simples, pois fazem parte da violência empregada pelo agente. 
- Ou deve haver o emprego de grave ameaça, esta também é chamada de violência 
moral, entendida como uma ameaça séria que causa na vítima um fundado temor 
de seu cumprimento. Vale ressaltar que a doutrina clássica ensina que a gravidade da 
ameaça deve ser extraída tendo em vista não a pessoa ameaçada, mas a 
generalidade, a normalidade dos homens, pois os valentes ou intrépidos e os 
pusilânimes ou poltrões são extremos, entre os quais se coloca o homem comum ou 
normal. 
OBS: É imprescindível para a configuração do crime a resistência séria, efetiva e 
sincera da mulher ou do homem, ou seja, a simples relutância não basta para 
configurar o crime de estupro. 
- Por fim, o crime prevê que as condutas devem ser dirigidas contra alguém, não mais 
se exige que o crime de estupro seja dirigido somente contra uma mulher, podendo 
uma mulher constranger um homem a praticar conjunção carnal com ela. 
2º) Ter conjunção carnal. 
- Conjunção carnal é a cópula do pênis com a vagina, podendo ser completa ou 
incompleta, sendo praticada, necessariamente, por indivíduos do sexo oposto, ou 
seja, foi adotado o sistema restritivo quanto à expressão conjunção carnal. 
3º) Praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. 
- Outro ato libidinoso são todos os atos de natureza sexual, que não a conjunção 
carnal, que tenham por finalidade satisfazer a libido do agente. Ex. Sexo oral; coito 
anal; masturbação; o coito inter femora; os toques ou apalpadelas com significação 
sexual no corpo ou diretamente na região pública (genitália, seios ou membros 
inferiores, etc.) da vítima; o contato voluptuoso, uso de objetos ou instrumentos 
corporais (dedo, mão), mecânicos ou artificiais, por via vaginal, anal ou bucal, entre 
outros. 
- Praticar ato libidinoso ocorre quando a vítima tem uma conduta ativa e ela mesma é 
que é obrigada a praticar atos libidinosos diversos da conjunção carnal, podendo 
atuar sobre o seu próprio corpo, com atos de masturbação, por exemplo; no corpo do 
agente que a constrange, ao praticar, por exemplo, o sexo oral; ou, ainda, em terceira 
pessoa, sendo assistida pelo agente. 
- Permitir a prática de ato libidinoso ocorre quando a vítima tem uma conduta passiva 
e permite que com ela seja praticado o ato libidinoso diverso da conjunção carnal, 
seja pelo próprio agente que a constrange, seja por um terceiro, a mando daquele. 
- Desta forma, o papel da vítima pode ser ativo, passivo, ou, ainda, simultaneamente, 
ativo e passivo. 
OBS: Segundo entendimento de parte da doutrina (Rogério Greco e Cezar 
Roberto Bitencourt), a prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal 
devem possuir alguma relevância, pois, caso contrário, estaríamos punindo o 
agente de forma desproporcional com o seu comportamento, uma vez que a 
pena mínima cominada ao delito de estupro é de 6 anos de reclusão. Neste 
sentido, afirma Cezar Roberto Bitencourt que passar as mãos nas coxas, nas 
nádegas ou nos seios da vítima, ou mesmo um abraço forçado, configuram a 
contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor do Art. 61 da Lei de 
Contravenções Penais (Decreto-Lei n. 3.688/1941), quando praticados em lugar 
público ou acessível ao público. 
B) Bem Jurídico e Objeto Material. 
- Em virtude da nova redação constante do Título VI do Código Penal, pode-se afirmar 
que os bens jurídicos protegidos são tanto a liberdade quanto a dignidade sexual. A 
lei, portanto, tutela o direito de liberdade que qualquer pessoa tem de dispor sobre o 
próprio corpo, no que diz respeito aos atos sexuais, ou seja, a liberdade sexual significa 
que: “o titular da mesma determina seu comportamento sexual conforme motivos que 
lhe são próprios, no sentido de que é ele quem decide sobre a sua sexualidade, sobre 
como, quando e com quem mantém relações sexuais”. O estupro, atingindo a 
liberdade sexual, agride, simultaneamente, a dignidade do ser humano, que se vê 
humilhado com o ato sexual, vindo a afetar também a dignidade sexual. 
- O objeto material do crime de estupro pode ser tanto a mulher quanto o homem, ou 
seja, a pessoa contra a qual é dirigida a conduta praticada pelo agente. 
C) Tipo Subjetivo. 
- Este crime SOMENTE pode ser praticado na forma DOLOSA. Ou seja, o tipo subjetivo é 
o dolo, consistente na vontade consciente de constranger alguém, mediante 
violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com 
ele se pratique outro ato libidinoso. Vale ressaltar que a maioria da doutrina entende 
que nenhuma finalidade específica é necessária para que se configure a prática do 
crime de estupro, ou seja, não há a necessidade de que o agente atue coma 
finalidade especial de saciar a lascívia, de satisfazer sua libido, não importando a sua 
motivação para a configuração do crime em análise. 
D) Consumação e Tentativa. 
- A consumação no crime de estupro, quando o agente atua visando à conjunção 
carnal, ocorre com a efetiva penetração do pênis do homem na vagina da mulher, 
não importando se total ou parcial, não havendo, inclusive, a necessidade de 
ejaculação, 
- No caso de prática de qualquer ato diverso da conjunção carnal quando a vítima 
pratica ou permite que seja praticada com ela qualquer ato diverso da conjunção 
carnal. Assim, no momento em que o agente, por exemplo, valendo-se do emprego 
de ameaça, faz com que a vítima toque em si mesma, com o fim de masturbar-se, ou 
no próprio agente ou em terceira pessoa, nesse instante estará consumado o delito. 
Na segunda hipótese, a consumação ocorrerá quando o agente ou terceira pessoa 
vier a atuar sobre o corpo da vítima, tocando-a em suas partes consideradas 
pudendas (seios, nádegas, pernas, vagina – desde que não haja penetração, que se 
configuraria na primeira parte do tipo penal -, pênis, etc.) 
- A tentativa é possível, pois se trata de crime plurissubsistente. Desta forma, se iniciada 
a execução, o ato sexual visado não se consumapor circunstâncias alheias a sua 
vontade, haverá a tentativa do crime de estupro, a exemplo de o agente ser 
interrompido, quando, logo depois de retirar as roupas da vítima, preparava-se para a 
penetração. Ou, por exemplo, a partir do momento em que o agente vier a praticar o 
constrangimento sem que consiga, nas situações de atividade e passividade passiva 
da vítima, determinar a prática do ato libidinoso. 
OBS 1: O autor Rogério Greco esclarece que: “Se os atos que antecederam ao 
início da penetração vagínica não consumada forem considerados normais à 
prática do ato final, a exemplo do agente que passa as mãos nos seios da vítima 
ao rasgar-lhe o vestido ou, mesmo, quando esfrega-lhe o pênis na coxa 
buscando a penetração, tais atos deverão ser considerados antecedentes 
naturais ao delito de estupro, cuja finalidade era a conjunção carnal.” 
OBS 2: Esclarece Rogério Sanches Cunha que: “A prática de conjunção carnal 
seguida de atos libidinosos (sexo anal, por exemplo) gerava o concurso material 
de crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Entendia-se que o agente, 
nesse caso, pratica duas condutas (impedindo reconhecer-se o concurso formal) 
gerando dois resultados de espécies diferentes (incompatível com a 
continuidade delitiva). Com o advento da Lei 12.015/2009 o crime de estupro 
passou a ser de conduta múltipla ou de conteúdo variado. Praticando o agente 
mais de um núcleo, dentro do mesmo contesto fático, não desnatura a unidade 
do crime (dinâmica que, no entanto, não pode passar imune na oportunidade 
da análise do Art. 59 do CP). A mudança é benéfica para o acusado, devendo 
retroagir para alcançar os fatos pretéritos (Art. 2º, parágrafo único, do CP).” Ou 
seja, se uma pessoa pratica conjunção carnal em uma vítima e, logo depois, 
pratica qualquer outro ato diverso da conjunção carnal, em um mesmo contexto 
fático, o agente responderá por um só crime de estupro. 
OBS 3: Ausente a unidade de contexto, pode ser aplicado o concurso de crimes, 
seja o concurso material ou continuidade delitiva, a depender do caso concreto. 
Vale ressaltar, inclusive, que inexiste qualquer óbice em se considerar a 
continuidade delitiva no crime de estupro, mesmo que praticada em face de 
vítimas diversas. 
E) Sujeito Ativo e Sujeito Passivo. 
- Quanto ao sujeito ativo no caso de prática de conjunção carnal pode ser tanto o 
homem quanto a mulher, mas o sujeito passivo necessariamente deve ser do sexo 
oposto. 
- Por sua vez, o sujeito ativo e passivo quando da prática de ato libidinoso diverso da 
conjunção carnal é comum, pondo ser homem ou mulher. 
- Ou seja, antes da Lei 12.015/2009, ensinava a doutrina que o crime de estupro era 
bipróprio, exigindo a condição especial de dois sujeitos, ativo(homem) e 
passivo(mulher). Agora, com a reforma, conclui-se que o delito é bicomum, onde 
qualquer pessoa pode praticar ou sofrer as consequências da infração penal. 
 
1.2 Figuras Típicas. 
A) Estupro Simples – Art. 213, caput, CP. 
B) Estupro Qualificado. 
- Ele está no Art. 213, § 1º e § 2º do Código Penal e ocorre nas seguintes situações: 
1ª) Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é 
menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) 
a 12 (doze) anos. 
- Trata-se de crime preterdoloso. 
- Entende-se por lesão corporal de natureza grave aquelas constantes do Art. 
129, § 1º e § 2º do Código Penal. 
- Além disso, será qualificado o crime, se for praticado contra vítima maior de 14 
anos, entendendo a doutrina que o Código abrange todos aqueles que tem 
idade igual ou superior a quatorze anos, ou se praticado contra vítima menor de 
18 anos, ou seja, até os 17 anos de idade. 
2ª) Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos 
(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009) 
- Trata-se de crime preterdoloso. 
1.3 Questões relevantes. 
1.3.1 A revogação do art. 214, do CP e a não-ocorrência de abolitio criminis (a junção 
do antigo crime de atentado ao pudor ao atual crime de estupro). 
- Pode haver a revogação formal de uma lei sem que ocorra a abolitio criminis em 
razão de ainda existir a continuidade normativo-típico. Ou seja, pode até ocorrer a 
revogação formal do crime, entretanto se a conduta revogada ainda continuar sendo 
considera criminosa por outra disposição legal, o sujeito permanecerá respondendo 
pelo crime. Nessa situação, NÃO haverá abolitio criminis, mas a permanência da 
conduta anteriormente incriminada, só que constante de outro tipo penal. 
- Foi exatamente isto que ocorreu com o antigo crime de atentado violento ao pudor. 
Este crime era previsto no Art. 214 do Código Penal, mas foi formalmente revogado 
pela Lei 12. 015/2009. Entretanto, esta mesma lei passou a prever que o crime de 
atentado violento ao puder agora integra o crime de estupro, estando inserido, 
atualmente, no Art. 213 do Código Penal. 
- Desta forma, NÃO houve a descriminalização do comportamento até então 
tipificado especificamente como atentado violento ao pudor. Na verdade, somente 
houve uma modificação do nomen juris da aludida infracao penal, passando a 
chamar-se de estupro a conduta de praticar ou permitir que se pratique outro ato 
libidinoso diverso da conjunção carnal. 
- Aplica-se, na hipótese, o chamado princípio da continuidade normativo-típica, 
havendo, tão somente, uma migração dos elementos anteriormente constantes da 
revogada figura prevista no Art. 214 do Código Penal para o Art. 213 do mesmo 
diploma repressivo. 
 
1.3.2 A classificação do estupro como tipo misto alternativo e a (im)possibilidade de 
concurso de crimes em casos de prática de mais de uma conduta no mesmo contexto 
fático. 
- Como já foi explicado, atualmente o crime de estupro do Art. 213 do CP é 
classificado como tipo misto alternativo ou de ação múltipla, e após a modificação da 
Lei 12.015/2009, que revogou o crime de atentado violento ao pudor, aquele que 
pratica a conjunção carnal e logo em seguida, no mesmo contexto fático, pratica 
outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal contra a mesma vítima, responderá 
por um crime único de estupro, tendo em vista que os comportamentos se encontram 
previstos na mesma figura típica, aplicando-se somente a pena cominada no Art. 213 
do CP, por uma única vez, afastando, dessa forma, o concurso de crimes, nesta 
hipótese. Este entendimento é defendido por Rogério Greco, e, também, já foi 
utilizado em julgamentos do STJ. 
- Neste sentido, posiciona-se, também, Guilherme de Souza Nucci: “Se o agente 
constranger a vítima a com ele manter conjunção carnal e cópula anal comete um 
único delito de estupro, pois a figura típica passa a ser mista alternativa. Somente se 
cuidará de crime continuado se o agente cometer, novamente, em outro cenário, 
ainda que contra a mesma vítima, outro estupro. Naturalmente, deve o juiz ponderar, 
na fixação da pena, o número de atos sexuais violentos cometidos pelo agente contra 
a vítima. No caso supramencionado merece pena superior ao mínimo aquele que 
obriga pessoa ofendida a manter conjunção carnal e cópula anal.” 
- Entretanto, se ausente a unidade de contexto, pode ser aplicado o concurso de 
crimes, seja o concurso material ou continuidade delitiva, a depender do caso 
concreto. Vale ressaltar, inclusive, que inexiste qualquer óbice em se considerar a 
continuidade delitiva no crime de estupro, mesmo que praticada em face de vítimas 
diversas. 
 
1.3.3 O conflito de leis no tempo - retroatividade da Lei 12.015/09 aos casos anteriores 
de concurso entre atentado violento ao pudor e estupro contra a mesma vítima em um 
mesmo contexto. 
- Antes da edição da Lei 12.015/09, que revogou o crime de atentado violento ao 
pudor, tipificado no antigo Art. 214 do CP, quando o agente, que tinha por finalidade 
levar a efeito a conjunção carnal comvítima, viesse, também, a praticar outros atos 
libidinosos, a exemplo do sexo anal, deveria responder por ambas as infrações penais, 
aplicando-se a regra do concurso de crimes. 
- Entretanto, como já foi explicado no tópico acima, o crime de estupro é classificado 
como tipo misto alternativo ou de ação múltipla, razão pela qual, atualmente, quem 
pratica as condutas acima responderá por um crime único de estupro. 
- Como se pode observar, a Lei 12.015/09 foi mais benéfica ao réu devendo retroagir 
para alcançar os fatos pretéritos, nos exatos termos do Art. 2º, parágrafo único, do CP, 
que prevê o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica. 
 
1.3.4 A hediondez do delito de estupro em qualquer de suas formas (art. 1°, inciso V, da 
Lei 8.072/90). 
- O estupro, seja na sua modalidade fundamental ou em suas formas qualificadas, 
consumado ou tentado, foi inserido no rol das infrações penais consideradas 
hediondas, nos exatos termos do Art. 1°, inciso V, da Lei 8.072/90, sendo aplicado ao 
crime de estupro do Art. 213, caput, § 1º e § 2º do Código Penal, o tratamento mais 
gravoso previsto na lei de crimes hediondos. 
 
1.3.5 A qualificadora relativa à idade da vítima - maior proteção ao indivíduo menor 
de 18 anos. 
- Ainda pode-se afirmar, nos tempos atuais, que os adolescentes de 14 (quatorze) e 
18(dezoito) anos de idade merecem especial proteção. A prática de um ato sexual 
violento, nessa idade, certamente trará distúrbios psicológicos incalculáveis, levando 
jovens, muitas vezes, ao cometimento, também, de atos violentos, e até mesmo 
similares aos que sofreram. 
- Desta forma, o juízo de censura, de reprovação, deverá ser maior sobre o agente 
que, conhecendo a idade da vítima, sabendo que se encontra na faixa etária prevista 
no § 1º do Art. 213 do Código Penal, ainda assim insista na prática de estupro, razão 
pela qual responderá pelo estupro na forma qualificada. 
 
1.3.6 As qualificadoras relativas ao resultado mais grave (lesão grave e morte) - 
ausência de dolo na configuração do resultado. 
- Conforma já explicado, os resultados mais graves (lesão corporal grave ou morte), 
que qualificam o crime de estupro, segundo parte da doutrina, somente podem ser 
atribuídos ao agente a título de culpa, existindo ausência de dolo para a sua 
configuração. 
- Entretanto, caso o sujeito pratique dolosamente lesões corporais graves ou morte 
contra a vítima de estupro, poderá haver o concurso de crimes de estupro e lesões 
corporais grave (Art. 129, § 1º e § 2º, do CP) ou estupro e homicídio (Art. 121 do CP). 
 
1.3.7 Distinção do crime de estupro (Art. 213, CP) e o crime de violação sexual 
mediante fraude (Art. 214, CP). 
- Caso o agente tenha conjunção carnal ou venha a praticar outro ato libidinoso com 
alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação 
de vontade da vítima, NÃO responderá pelo crime de estupro, mas sim pelo crime de 
violação sexual mediante fraude, nos termo do Art. 214 do Código Penal. 
- A grande diferença entre o crime de estupro e o de violação sexual mediante 
fraude, também chamado pela doutrina de estelionato sexual, é o de que neste 
crime NÃO há o emprego de violência ou grave ameaça para ter ou praticar ou 
permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal, mas 
sim o emprego de: 
1º) Fraude – é a utilização de meios que fazem com que a vítima seja induzida ou 
mantida em erro e tenha uma falsa percepção da realidade, vindo a ter uma 
manifestação de vontade viciada. Nelson Hungria explica que a fraude é a maliciosa 
provocação ou aproveitamento do erro ou engano de outrem, para a consecução 
de fim ilícito. Sempre esta fraude é utilizada com a intenção de ter conjunção carnal 
ou praticar outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal. 
Ex. Líderes espirituais enganam suas vítimas, abatidas emocionalmente e, mediante 
sugestão da conjunção carnal ou da prática de qualquer outro ato libidinoso, alegam 
que resolverão seus problemas. 
Ex. A troca de irmãos gêmeos idênticos, ou, ainda, o médico ginecologista, que, sem 
necessidade, realiza exame de toque na vítima, somente para satisfazer o seu instinto 
criminoso. 
OBS: Rogério Sanches Cunha adverte que: “A fraude utilizada na execução do 
crime NÃO pode anular a capacidade de resistência da vítima, caso em que 
estará configurado o delito de estupro de vulnerável (Art. 217-A do CP). Assim, 
não pratica o estelionato sexual (Art. 215 do CP), mas estupro de vulnerável (Art. 
217-A do CP), o agente que usa psicotrópicos para vencer a resistência da vítima 
e com ela manter conjunção carnal. 
2º) Outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima – é a 
chamada interpretação analógica, ou seja, trata-se da utilização de qualquer outro 
meio, de conotação fraudulenta, utilizado com o intuito de que o agente consiga 
praticar as condutas previstas no tipo penal. O verbo impedir é utilizado com a ideia 
de que foi impossibilitada a livre manifestação de vontade da vítima, que se 
encontrava completamente viciada em virtude da fraude ou outro meio utilizado pelo 
agente, a fim de praticar a conjunção carnal ou outro ato libidinoso. Por sua vez, o 
verbo dificultar dá a ideia de que a vontade da vítima, embora viciada, não estava 
completamente anulada pela fraude ou outro meio utilizado pelo agente, neste caso, 
embora ludibriada, a vítima poderia, nas circunstancias em que encontrava, ter 
descoberto o plano criminoso, mas, ainda assim, foi envolvida pelo agente. 
Ex. Agente que se faz passar por um famoso artista, para conseguir ter conjunção 
carnal com uma fã deste.

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