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A unificação do crime de Estupro e o Atentado Violento ao Pudor DA LEI 12.015/09 
(ARTIGOS 213,217-A e 218-B DO CÓDIGO PENAL)
A lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 alterou substancialmente o capítulo I e II do Código Penal, dentre as grandes novidades, o crime de Atentado Violento ao Pudor, descrito no antigo 214, do Estatuto Repressivo foi incorporado pelo o art. 213 do Código Penal, terminando com a distinção entre Estupro e Atentado Violento ao Pudor. Embora não seja objeto de nossos estudos a lei ainda alterou o capítulo dos Crimes de Lenocínio ou qualquer outra forma de exploração sexual e os crimes de tráfico de pessoas.
O intuito é apresentar as novidades introduzas ao Código Penal a partir da vigência da lei 12015/09.
 SUJEITOS ATIVO E PASSIVO
Antes da Lei 12.015/09, o sujeito ativo do crime de estupro era apenas o homem. Tratava-se, assim, de crime próprio, exigindo do agente uma especial qualidade de fato. A mulher podia figurar como sujeito ativo apenas excepcionalmente, quando, por exemplo, fosse autora mediata, ou quando agisse em concurso com um homem, nos moldes do art. 29 do Código Penal. Quando a vítima fosse do sexo masculino, sendo a mulher a autora, poderia se caracterizar o crime de constrangimento ilegal ou atentado violento ao pudor.
O sujeito passivo, por seu turno, era apenas a mulher, em razão de expressa previsão legal. Assim, se uma mulher obrigasse um homem a manter com ela conjunção carnal, não se aplicaria o art. 213, respondendo aquela, no mais das vezes, por constrangimento ilegal, que é delito subsidiário. 
Já o atentado violento ao pudor, contemplado no artigo 214 (hoje revogado), classificava-se como crime comum, podendo ser praticado por homem ou por mulher. O sujeito passivo, igualmente, podia ser o homem ou a mulher. 
A ideia vigente no passado era de que as consequências do crime para o homem seriam menos gravosas que para a mulher. É o que se depreende, por exemplo, das palavras de Nelson Hungria, discorrendo, à época, sobre o tema: “Pode-se criticar a lei porque limitou a noção de estupro (...), mas não pretender que seja aplicada ao arrepio do seu texto (...). Mesmo a crítica, porém, não procede. O valor social do homem é muito menos prejudicado pela violência carnal do que a mulher, de modo que, em princípio, não se justifica, para o tratamento penal, a equiparação dos dois casos. Quando tal violência contra mulher resulta na cópula vagínica, e ainda que não se trate de virgo intacta, pode acarretar o engravidamento consequência tão grave, no caso, que a lei autoriza a prática do aborto (...), embora este represente um sério perigo à saúde, quando não à vida da paciente”[footnoteRef:1]. [1: ] 
Em boa hora, a Lei 12.015/09 alterou sensivelmente o tema, permitindo que tanto o homem quanto a mulher possam ser sujeitos ativo ou passivo do crime de estupro. Logo, se uma mulher obrigar um homem a manter com ela conjunção carnal ou outro ato libidinoso, serão tais indivíduos, respectivamente, sujeito ativo e passivo de estupro. Atualmente, portanto, o estupro passa a ser classificado como crime comum, inexigindo qualquer qualidade do sujeito ativo ou passivo.
A possibilidade de uma mulher constranger um homem à conjunção carnal era algo provavelmente impensável na década de 40. De fato, mesmo nos dias de hoje, a ocorrência da hipótese é bastante rara. Cremos que isto se deve não apenas à baixa incidência desta forma de estupro, mas também porque o crime, quando ocorre, permanece na clandestinidade, já que dificilmente algum homem se exporia ao constrangimento de comunicar tal agressão às autoridades.
Note que ter conjunção carnal normal não é crime, o delito estará caracterizado quando alguém mediante o emprego violência ou grave ameaça obrigue a vítima a ter conjunção carnal ou praticar ou permita que com ele se pratique ato libidinoso.
Constranger significa compelir, obrigar, forçar ou subjugar a vítima a praticar o ato libidinoso ou a ter conjunção carnal. Não haverá o crime se a conjunção carnal for consentida, salvo quando o consentimento for viciado em razão da idade, enfermidade, doença mental ou qualquer forma de reduzir a capacidade de resistência da vítima (art. 217-A, do CP).
Ainda no tocante ao sujeito passivo, são irrelevantes, para a incidência do artigo 213, os aspectos envolvendo a moralidade da vítima, podendo esta ser uma prostituta ou, também, um garoto de programa. Destarte, “é irrelevante à existência do estupro o estado ou qualidade da vítima: solteira, casada, virgem ou não, honesta, devassa, porque em qualquer caso, tem a mulher direito à tutela da lei, visto que a proteção se dirige ao direito de livre disposição do próprio corpo”[footnoteRef:2]. “Não importa seja a vítima solteira, casada ou viúva, uma vez tal inatacável ou uma meretriz de baixa formação moral. Em qualquer hipótese é ela senhora de seu corpo e só se entregará livremente, como, quando, onde e a quem for de seu agrado”[footnoteRef:3]. [2: TJMT – AC – Rel. Elon Carvalho – RT 700/355.] [3: TJSP – AC – Rel. Gonçalves Sobrinho – RJTJSP 31/362 e RT 435/106.] 
Ainda sobre o tema, leciona Guilherme de Souza Nucci que, em relação ao sujeito passivo, deve-se considerar qualquer mulher – honesta ou desonesta, recatada ou promíscua, virgem ou não, casada ou solteira, velha ou moça, embora nem sempre tenha sido assim. O Código Penal de 1830 fazia distinção entre o estupro cometido contra “mulher honesta” e a violência sexual praticada contra prostituta. Enquanto no primeiro caso era aplicável pena de prisão de três a doze anos, no segundo era cominada sanção consideravelmente mais branda, de um mês a dois anos (artigo 222). No Código Penal de 1890, manteve o legislador a discriminação, mencionando que o estupro havia de ter como sujeito passivo a mulher honesta, ainda que não fosse virgem. A pena era de um a seis anos. Se fosse praticado contra mulher “pública” ou prostituta, a pena seria de seis meses a dois anos (artigo 268). Atualmente, conclui o autor, “tanto faz ser a mulher honesta ou não – aliás, o mínimo que se espera de uma lei justa”[footnoteRef:4]. [4: Código penal comentado. p. 876] 
Quando estudamos o crime de estupro é preciso tomarmos cuidado com a intervenção desmedida do direito de punir do Estado, pois dependendo do caso poderíamos aplicar uma pena de 6 anos para quem desejasse apenas brincar, humilhar ou sujeitar a vítima a um vexame qualquer. Nesse sentido, o beijo não é necessariamente crime de estupro, isto significa que nem sempre o ato libidinoso será um crime de relevância, podendo assim caracterizar uma contravenção penal (importunação ofensivo ao pudor), um crime de constrangimento ilegal ou até mesmo uma injúria real. 
Outro aspecto merecedor de nota, apontado por Rogério Sanches Cunha, refere-se ao fato de que, após a reforma, a gravidez resultante de atos libidinosos diversos da conjunção carnal passa a ser alcançada diretamente pela permissão do aborto sentimental, previsto no artigo 182, inciso II, do Código Penal, não se fazendo mais necessária a utilização de analogia[footnoteRef:5]. [5: Comentários à reforma criminal de 2009. p. 37.] 
 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
A consumação do estupro, quando praticado na modalidade conjunção carnal, ocorre com a introdução do pênis na vagina, ainda que parcial. Já as hipóteses envolvendo outros atos libidinosos se consumam com a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Assim, os toques lascivos que antecedem a cópula vaginal, por exemplo, já serão suficientes à consumação do delito do art. 213. Destarte, o estupro passa a ser um crime de forma livre, ao contrário do que ocorria anterior, em que se classificava delito de forma vinculada, pois só podia ser cometido por conjunção carnal.
O delito admite tentativa, que ocorrerá quando o indivíduo, por circunstâncias alheias à sua vontade, não conseguir praticar a conjunção carnal ou outro ato libidinoso. É preciso, todavia, que fique caracterizada a intenção do agente de praticar o referido delito. 
Antes da alteração promovida pela lei 12.015/09,o crime de estupro qualificado necessitava da combinação com o art. 223 do Código Penal. O dispositivo tornava qualificado o crime quando da violência resultasse lesão grave e quando do fato ocorresse a morte da vítima.
Agora contrariamente do que ocorria no revogado art. 223, o legislador previu expressamente que o crime será qualificado quando da conduta do agente resultar lesão corporal grave ou morte da vítima.
Assim, não importa se o agente atuou com emprego de violência ou grave ameaça, a fim de levar a efeito o estupro, se, dessa conduta resultar lesão corporal de natureza grave ou morte, deverá o agente responder pelo crime qualificado.
Tomemos como exemplo a sugestão de Rogério Greco: A título de raciocínio, imagine-se a hipótese em que o agente, querendo praticar o estupro, ameace gravemente a vítima, mesmo sabendo de sua condição de pessoa portadora de problemas cardíacos. Ao ouvir a ameaça e durante a prática do ato sexual, ou seja, após o início do coito vagínico, a vítima tem um infarto fulminante, vindo, consequentemente, a falecer. Nesse caso o agente deverá responder pelo estupro qualificado pelo resultado morte.
Apenas tome cuidado que o crime de estupro qualificado pela lesão grave ou morte é crime, essencialmente, preterdoloso, isto significa que o resultado agravador (morte ou lesão grave) deve ser produzido a título de culpa.
 
E mais, o resultado agravador deve ser no mínimo previsível, sob pena de responsabilidade objetiva, nos termos do art. 19 do CP. Para ilustrar, basta da violência ocorrer a lesão corporal grave que resulta o aborto, sem que o autor do crime nem a vítima soubessem da eventual gravidez. Embora a conduta do agente tenha produzido uma lesão corporal gravíssima, ele não responderá pela qualificadora, pois o resultado agravador não foi no mínimo previsto ou previsível.
Outra questão relevante é saber se o resultado agravador pode ser obtido a título de dolo ou tão somente a título de culpa.
Entendemos como a maioria dos doutrinadores, o crime de estupro qualificado pelo resultado lesão grave ou morte é por essência um crime preterdoloso, assim caso o agente pretenda produzir o resultado agravador dolosamente, ele responderá por crime de estupro simples em concurso material com crime de homicídio ou lesão corporal.
 
Assim, conforme salienta Noronha, o resultado que agrava especialmente a pena for proveniente de caso fortuito ou força maior, o agente não poderá ser responsabilizado pelas modalidades qualificadas, conforme preconiza o art. 19 do CP. 
Permanecendo no mundo das possibilidades, imaginemos agora que o agente tenha dado início a execução do crime de estupro, mas antes de manter conjunção carnal a vítima venha a falecer por alguma razão. Na sugestão de Rogério Greco, suponhamos que o agente derrube a vítima violentamente no chão, fazendo que esta bata a cabeça, por exemplo, em uma pedra, produzindo-lhe a morte antes que seja praticada a conjunção. Nesse caso, pergunta-se: Teríamos uma tentativa qualificada de estupro ou o estupro poderia ser considerado consumado havendo morte da vítima, mesmo sem a ocorrência da penetração? 
Há duas correntes para o caso. Alguns doutrinadores entendem que o agente responderia por crime de estupro qualificado pelo resultado morte, não obstante o crime sexual ter permanecido na forma tentada. Aplicando a questão a mesma interpretação do latrocínio consumado, ou seja, havendo morte da vítima o crime estará consumado, mesmo que a subtração permaneça na forma tentada.
Mesmo sendo esta posição a que goza da predileção da maioria da doutrina, entendemos que o crime de estupro é qualificado tentado.
Para que o crime seja consumado é necessária a reunião de todos os elementos que compõem o tipo penal. Assim será consumado, nos termos do art. 14, I, do Código Penal, aquele crime que reúne todos os elementos da definição legal.
Em matéria recentemente veiculada em jornal de grande circulação, apontou-se, com grande alarde, que interpretação diversa, reconhecendo a existência de tipo misto alternativo, beneficiaria estupradores. A deputada Maria do Rosário, relatora da lei, chegou a afirmar que a interpretação dos juízes está errada, e que a lei pode até ser alterada caso haja necessidade. "A intenção da legislação é proteger meninos e meninas de estupros. E estabelecer, para a sociedade, que existem várias formas pelas quais o estupro ocorre"[footnoteRef:6]. [6: Fonte: Folha de São Paulo. Estupradores usam nova lei para reduzir tempo na prisão. São Paulo. 15/06/10. Cotidiano, p. 1-2.] 
Uma semana após a referida publicação, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que o novo crime de estupro é um tipo misto cumulativo, ou seja, as condutas de constranger alguém a conjunção carnal e a outro ato libidinoso, mesmo que praticadas contra a mesma vítima e no mesmo contexto fático, devem ser punidas individualmente se o agente praticar ambas, somando-se as penas. O Ministro Felix Fischer aduziu que “se praticada uma penetração vaginal e outra anal, neste caso jamais será possível a caracterização da continuidade”, tendo em vista que “a execução de uma forma nunca será similar a da outra. São condutas distintas”. De acordo com o Ministro, o reconhecimento de tipo misto alternativo enfraquece a proteção da liberdade sexual, porque sua violação é crime hediondo que deixa marca permanente nas vítimas.
A Ministra Lauria Vaz acompanhou o referido voto, apontando que “antes da edição da Lei n. 12.015/2009, havia dois delitos autônomos, com penalidades igualmente independentes: o estupro e o atentado violento ao pudor. Com a vigência da referida lei, o art. 213 do Código Penal passa a ser um tipo misto cumulativo. (...) tendo as condutas um modo de execução distinto, com aumento qualitativo do tipo de injusto, não há a possibilidade de se reconhecer a continuidade delitiva entre a cópula vaginal e o ato libidinoso diverso da conjunção carnal, mesmo depois de o legislador tê-las inserido num só artigo de lei”[footnoteRef:7]. [7: STJ - HC 104724/MS - Rel. Min. Jorge Mussi - 5ª T - j. 22/06/2010; STJ - HC 78667/SP - 5ª T. - Rel. Min. Laurita Vaz - j. 22/06/2010.] 
Nota-se, portanto, que tal entendimento não acarretaria mudanças na jurisprudência relacionada à prática do estupro e do antigo atentado violento ao pudor, tendo em vista que continuaria a ser aplicado o antigo cúmulo material, porém agora se daria com fulcro no artigo 213, primeira parte, e artigo 213, segunda parte, em concurso material.
Parece-nos que esta posição é insustentável. Veja-se que, nos tipos mistos cumulativos, as condutas são separadas por “;” ou “e”, cujo exemplo é o delito previsto no artigo 244 do Código Penal (abandono material). Em tais casos, a prática de mais de uma conduta descrita no tipo dá ensejo ao cúmulo material de penas. 
No recém criado artigo 213, por outro lado, existe uma oração alternativa, pois as condutas de constranger alguém a “ter conjunção carnal” e a “praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” estão separadas pela expressão “ou”. A simples leitura do recém criado artigo 213 demonstra, à evidência, tratar-se de tipo misto alternativo.
Neste passo, decidiu a Des. Salete Silva Sommariva (2ª Câmara Criminal do TJSC) que, “a propósito do princípio da reserva absoluta de lei formal em matéria penal (CF/88, art. 5º,XXXIX), o atributo da tipicidade mista alternativa é de imperioso reconhecimento no caso da sucessão legislativa em foco, uma vez que houve uma patente instituição de fungibilidade entre as condutas justapostas no novo art. 213 do estatuto repressivo, vislumbrada a partir de sua disposição plurinuclear e pelo emprego do termo ‘ou’ – ‘[...] a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso’ –, encerrando, por isso mesmo, um conteúdo variado, mas com a restrição no sentido de que mesmo em havendo a prática de mais de uma das condutas descritas - numa mesma situação fática - o agente responde apenas por um delito. Assim, a Lei n. 12.015/2009,ao conferir nova redação ao artigo 213 do Código Penal, instituiu a tipicidade mista alternativa, cuja aplicação repele a possibilidade de concurso de crimes entre o estupro e o atentado violento ao pudor em suas redações pretéritas, de ordem a inviabilizar a dupla punição”[footnoteRef:8]. Este posicionamento já começa a ganhar força na jurisprudência, a qual, tudo indica, tende a se pacificar neste sentido[footnoteRef:9]. [8: TJSC – Ap. n. 2009.014002-6 – 2ª. Câmara Criminal - Des. Salete Silva Sommariva - j. 12.01.10.] [9: Com efeito, em decisão recentemente proferida pela 6ª. Turma do STJ, o Min. Og Fernandes assinalou que as condutas de estupro e do já revogado atentado violento ao pudor, quando realizadas contra a mesma vítima e no mesmo contexto fático, caracterizam crime único e não mais concurso material de infrações ou até mesmo crime continuado (STJ – HC 144870/DF - 6ª T. – Rel. Min. Og Fernandes – j. 09.02.10). Também neste sentido: TJSP - Ap. 990091932329 – 11ª Câmara de Direito Criminal - Rel. Des. Aben Athar – j. 03.02.10; TJMG – Ap. 1.0079.04.161999-4/001 – Rel. Des. Maria Celeste Porto – j. 15.12.09; TJCE - 2ª Câmara - AP 2006.0007.5162-6 - Rel. Maria Sirene Souza Sobreira. j. 28.09.09; TJSC – Ap. n. 2009.038539-0 – 3ª. Câmara Criminal – Rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho – j. 24.09.09; TJMS - ACr n 2009.026764-5 – 2ª T. Criminal - Rel. Des. Romero Osme Dias Lopes – j. 08/02/2010; TJGO - ACr n. 200902910412 - Rel. Des. Leandro Crispim - DJGO 06/04/2010 – p. 205.] 
Não merece guarida a alegação de que o reconhecimento de tipo misto alternativo enfraqueceria a proteção da liberdade sexual, porque sua violação é crime hediondo que deixa marca permanente nas vítimas. Tem-se, em verdade, uma construção sofista. De fato, alguns crimes ligados à violação da liberdade sexual estão elencados como hediondos, e não se duvida que, em muitos casos, deixem graves sequelas nas vítimas. Tais constatações, todavia, não guardam pertinência com a discussão em tela, pois o grau de proteção que a norma confere ao bem jurídico e o tipo de transtorno psicológico que a infração causa ao ofendido não são critérios válidos para classificação do tipo penal como misto cumulativo ou alternativo.
Também não nos impressiona a tese de que o reconhecimento da continuidade delitiva deve ser afastado porque a prática de conjunção carnal e de outros atos libidinosos apresentam maneira de execução diversa. Por certo, ao referir-se a maneira de execução semelhante, a lei está a exigir a presença do mesmo modus operandi. Consoante lição de Cezar Roberto Bitencourt, maneira de execução é o modo, a forma, o estilo de praticar o crime, não exigindo a lei identidade, mas apenas semelhança[footnoteRef:10]. A violência e a grave ameaça são o modo de execução do crime e não a forma final da prática do ato. Deve-se levar em conta que “conjunção carnal” e “outro ato libidinoso” são elementares do crime de estupro e que somente se chega ao verbo nuclear “constranger” através dos modos de execução violência ou grave ameaça[footnoteRef:11]. Pode-se citar como exemplo o médico que, em determinada clínica, aproveita-se do momento em que as pacientes estão sedadas para seviciá-las, não se exigindo que inclusive os abusos cometidos sejam idênticos entre si. [10: Tratado de direito penal : parte geral, volume 1. 10. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 724.] [11: Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, volume 4: parte especial. 3° edição. São Paulo: Saraiva, 2008. pág. 3.] 
Destarte, há grave equívoco ao se exigir, para reconhecimento de crime continuado, que todas as circunstâncias de cada delito se apresentem de modo idêntico. 
Vale anotar que a principal razão utilizada para inadmitir a prática de crimes em continuidade, antes do advento da Lei 12.015/09, não era o fato do modo de execução ser diverso, mas sim por ser tratarem de crimes de espécie diversa, já que o estupro estava previsto no artigo 213 e o atentado violento ao pudor no artigo 214. Com a junção das duas condutas no mesmo tipo, tal argumento deixou de existir[footnoteRef:12]. [12: Neste sentido, decidiu recentemente o Supremo Tribunal Federal que “se o impedimento para reconhecer a continuidade delitiva entre o estupro e o atentado violento ao pudor residia tão-somente no fato de não serem crimes da mesma espécie, entendidos, pela ilustrada maioria, como fatos descritos pelo mesmo tipo penal, tal óbice foi removido pela edição da nova lei (HC 86.110/SP – 2ª. T. – Rel. Min. Cezar Peluso - j. 02.03.10) .] 
Por derradeiro, vale consignar a lição de Guilherme de Souza Nucci, ao acentuar que “a dignidade da pessoa humana está acima da dignidade sexual, pois esta é apenas uma espécie da primeira, que constitui o bem maior (art. 1o, III, CF). Logo, pretender alavancar a dignidade sexual acima de todo e qualquer outro bem jurídico significa desprestigiar o valor autêntico da pessoa humana, que ficaria circunscrita à sua existência sexual. O agente do crime sexual, portanto, deve ter todos os direitos respeitados, tal como o autor de qualquer outro delito grave. Particularmente, não se pode olvidar princípios-garantia, constitucionalmente previstos, em nome de um subjetivismo individualista e, por vezes, conservador, para a interpretação do novo art. 213. Visualizar dois ou mais crimes, em concurso material, extraídos das condutas alternativas do crime de estupro, cometido contra a mesma vítima, na mesma hora, em idêntico cenário, significa afrontar o princípio da legalidade (a lei define o crime) e o princípio da proporcionalidade, vez que se permite dobrar, triplicar, quadruplicar etc, tantas vezes quantos atos libidinosos forem detectados na execução de um único estupro”[footnoteRef:13]. [13: O estupro como crime único e a dignidade da pessoa humana. Carta Forense, São Paulo, v.1, 02.010.09.] 
Assim, é possível, no máximo, discutir o acerto do legislador ao criar no art. 213 um tipo misto alternativo, mas jamais ignorar a nova redação do dispositivo. Aliás, a fórmula ora adotada é semelhante à que já existe em diversos outros países, como Portugal, Espanha e Venezuela[footnoteRef:14]. Em nosso entender, a resistência ao fato de o legislador ter criado um tipo misto alternativo é resultado de um sentimento natural de repulsa que existe em relação ao estupro e aos crimes sexuais em geral. Não duvidamos da hediondez destes crimes, mas há vários outros delitos igualmente – ou até mais – graves. Da mesma forma que o estupro pode traumatizar a vítima, a extorsão mediante seqüestro também pode fazê-lo. Aliás, o próprio tráfico de drogas – tipo misto alternativo – é um dos mais torpes, provocando desassossego social e relacionado a inúmeros outros crimes, fomentados pela venda de drogas. [14: O artigo 164 do Código Penal português assim estabelece: “Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa a sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos”. Já o Código espanhol, no artigo 179, reza que “Cuando la agresión sexual consista en acceso carnal por vía vaginal, anal o bucal, o introducción de miembros corporales u objetos por alguna de las dos primeras vías, el responsable será castigado como reo de violación con la pena de prisión de seis a 12 años”. O Código Penal da Venezuela, por seu turno, prevê no artigo 374: “Quien por medio de violencias o amenazas haya constreñido a alguna persona, de uno o de otro sexo, a un acto carnal por vía vaginal, anal u oral, o introducción de objetos por alguna de las dos primeras vías, o por vía oral se le introduzca un objeto que simulen objetos sexuales, el responsable será castigado, como imputado de violación, con la pena de prisión de diez años a quince años. Si el delito de violación aquí previsto se ha cometido contra una niña, niño o adolescente, la pena será de quince años a veinte años de prisión”. ] 
Assim, se o agente,no mesmo contexto fático e contra a mesma vítima, praticar sexo oral, conjunção carnal e coito anal, responderá por um só crime. Caberá ao magistrado, analisando o caso concreto, romper a “política da pena mínima” e elevar o montante da reprimenda. Sobre o tema, assevera Guilherme de Souza Nucci que o magistrado “não pode e não deve ficar restrito à aplicação compulsória da pena mínima (...). Afinal, o art. 59, mencionando oito elementos diversos, se fielmente cumprido, provoca a aplicação da pena em parâmetros diferenciados para os acusados submetidos a julgamento. A padronização é contrária à individualização da pena, princípio constitucional, de modo que é preciso alterar essa conduta ainda predominante”[footnoteRef:15] [15: Individualização da pena. p. 310.] 
2.4. SUCESSÃO DE LEIS PENAIS
Pode-se afirmar que, no tocante ao artigo 213 do Código Penal, a Lei 12.015/09 é benéfica ao acusado, e, portanto, passível de aplicação retroativa. Conforme visto, a prática de conjunção carnal e ato libidinoso diverso da conjunção carnal, no mesmo contexto fático e contra a mesma vítima, representa agora crime único, evidentemente mais favorável à defesa no que a solução do cúmulo material, antes aplicada. Ademais, abre-se a possibilidade de reconhecimento de crime continuado, uma vez que tais condutas, à toda evidência, tornaram-se crimes de mesma espécie.
Outra não é opinião de Rogério Greco: “Hoje, após a referida modificação, nessa hipótese, a lei veio a beneficiar o agente, razão pela qual se, durante a prática violenta do ato sexual, o agente, além da penetração vaginal, vier a também, fazer sexo anal com a vítima, os fatos deverão ser entendidos como crime único, haja vista que os comportamentos se encontram previstos na mesma figura típica, devendo ser entendida a infração penal como de ação múltipla, aplicando-se somente a pena cominada no art. 213 do Código Penal, por uma única vez, afastando, dessa forma, o concurso de crimes”[footnoteRef:16]. [16: Lei n. 12.015/2009 – Dos crimes contra a dignidade Sexual – adendo. Disponível em <http://www.scribd.com/doc/19590114/ADENDO12015emenda> ] 
Ainda no tocante ao conflito de leis no tempo, vale frisar que a supressão do artigo 214 não representou abolitio criminis, encontrando-se a conduta de constranger alguém à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal estampada no artigo 213. Com efeito, embora revogado o artigo 214, houve uma transferência de seu conteúdo para o artigo 213, operando-se a denominada continuidade normativo-típica. Consoante magistério de Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina:”não se pode nunca confundir a mera revogação formal de uma lei penal com a abolitio crimins. A revogação da lei anterior é necessária para o processo da abolitio criminis, porém, não suficiente. Além da revogação formal impõe-se verificar se o conteúdo normativo revogado não foi (ao mesmo tempo) preservado em (ou deslocado para) outro dispositivo legal. […] Logo, nessa hipótese, não se deu a abolitio criminis, porque houve uma continuidade normativo-típica (o tipo penal não desapareceu, apenas mudou de lugar). Para a abolitio criminis, como se vê, não basta a revogação da lei anterior, impõe-se sempre verificar se presente (ou não) a continuidade normativo-típica”[footnoteRef:17]. [17: Direito Penal. v. 2. p. 100.] 
Todavia, é de grande importância ressaltar a questão da mulher que constrange o homem à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Anteriormente à nova redação do artigo 213 do CP, o crime em questão não era previsto no capítulo “dos crimes contra a liberdade individual”, pois somente a mulher poderia ser sujeito passivo do crime do artigo 213. Todavia, na atualidade há previsão legal do delito de estupro para tal ato.
Com relação a esse fato houve uma novatio legis in pejus, não podendo ser aplicada aos fatos praticados anteriormente a vigência da lei 12015/09, ou seja, atualmente constranger homem, mediante violência ou grave ameaça caracteriza-se como estupro, e não mais como constrangimento ilegal, cuja a pena é inferior a atual pena de estupro.
2.5. FORMAS QUALIFICADAS
As qualificadoras do crime de estupro, antes previstas no artigo 223, estão agora contempladas no §s 1º e 2º do próprio artigo 213. O deslocamento topográfico mostra-se salutar, pois as formas qualificadas do delito encontram relação direta com o tipo principal, sendo desejável, portanto, que estejam previstas no mesmo artigo. 
Assim prevêem os §s do artigo 213: “§ 1º - Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2º - Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos”.
Uma mudança digna de nota refere-se ao fato de que a nova redação traz a expressão “se da conduta”. O primitivo artigo 223 previa: “Se da violência resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § único. Se do fato resulta morte. Pena - reclusão, de 12 (doze) a 25 (vinte e cinco) anos”. 
Muito se discutiu sobre a expressão “violência”, contida no caput do dispositivo, e fato, prevista no § único. A conclusão a que se chegou é que “violência” é expressão restrita, e não abrange as hipóteses em que a lesão corporal resultasse, por exemplo, da grave ameaça (ex.: vítima sofre um infarte diante da grave ameaça empreendida pelo agente). Já o termo “fato”, previsto no § único, seria mais abrangente, e contemplaria os casos em que a morte adviesse tanto de violência quanto de grave ameaça.
A nova redação do dispositivo pôs fim à discussão, prevendo, corretamente, que a qualificadora incidirá se “da conduta” advier as hipóteses previstas. Conduta é expressão abrangente e que não dá margem a dúvidas.
No tocante ao § 1º, nota-se que há duas hipóteses diversas. A primeira refere-se aos casos em que a conduta resultar em lesão corporal de natureza grave. Trata-se, portanto, de um crime qualificado pelo resultado. Outra hipótese trazida no § 1º refere-se a crime cometido contra vítima menor de 18 ou maior de 14 anos. 
O § 2º prevê que o estupro é qualificado nos casos em que ocorrer a morte da vítima.
A questão que se coloca refere-se aos casos em que o resultado qualificador for proveniente de dolo da conduta do agente. Há quem entenda que, se o resultado qualificador for proveniente de culpa, aplica-se a forma qualificada. Se, todavia, for proveniente de dolo, “desarma-se” a qualificadora e aplicam-se as regras do concurso material de infrações. Por exemplo: o agente estupra a vítima e, culposamente, provoca-lhe a morte. Aplicar-se-ia, em tal caso, o artigo 213, § 2º, apenando-se o indivíduo com 12 a 30 anos de reclusão. Se, por outro lado, a morte adviesse de dolo na conduta, o agente responderia por estupro na sua forma simples, com pena de 6 a 10 anos, em concurso com o homicídio doloso, cujas penas, na modalidade simples, oscilam de 6 a 20 anos.
É o entendimento de Delmanto, para quem “na hipótese (pouco comum) de a lesão grave ou morte não resultar de culpa do agente, mas de seu dolo (direto ou eventual) de matar ou lesar gravemente a vítima, por sadismo, não se aplica este art. (...); haverá o crime do art. 213 (...) em concurso material com homicídio (qualificado pela torpeza do motivo) ou com lesão corporal grave ou gravíssima”[footnoteRef:18]. [18: Código Penal Comentado. p. 602/603.] 
A mesma doutrina, todavia, não adota a mesma solução no caso do latrocínio, por exemplo, crime em que se aplica a qualificadora do roubo quer o resultado advenha de culpa, quer de dolo.
Em nosso sentir, não há sentido nesta distinção. O melhor seria que se aplicasse a forma qualificada sempre, independente de dolo ou culpa. O fato de o resultado morte ocorrer em virtude de dolo ou culpa pode ser utilizado na dosimetria da pena. 
A par das figuras qualificadas, não se pode olvidar que a pena do crime de estupro é aumentada de quarta parte, se o crime é cometido em concurso de duas ou mais pessoas,e de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela (art. 226, incisos I e II, do Código Penal).
2.6. LEI DOS CRIMES HEDIONDOS
Anteriormente à Lei 12.015/09, discutia-se se o estupro e o atentado violento ao pudor, quando praticados em sua forma simples, enquadravam-se ou não como crimes hediondos. A celeuma surgiu em razão da redação deficiente do artigo 1º da Lei 8.072/90, que dava margem às duas interpretações, ao prever serem hediondos o “estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e § único)” e o “atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e § único)”.
A Lei 12.015/09 mostra-se salutar também neste aspecto, estabelecendo, de forma clara, que são considerados hediondos o estupro (art. 213, caput e § primeiro e segundo) e o estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e § 1º, 2º, 3º e 4º). Pouco importa, assim, se forem ou não qualificados, serão enquadrados como crimes hediondos.
Para aqueles que já entendiam que tais crimes, mesmo em sua forma simples, eram hediondos - corrente à qual nos filiamos -, não houve qualquer alteração, servindo a nova Lei apenas para esclarecer uma situação que já existia. Por outro lado, aqueles que entendiam não serem o estupro e o atentado violento ao pudor hediondos quando praticados em sua forma simples, a Lei 12.015 é prejudicial, não podendo retroagir, pois, para prejudicar os réus.
3. ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A)
3.1. VULNERABILIDADE
Com o advento da Lei 12.015/09, optou corretamente o legislador por tutelar, em tipo penal autônomo, as pessoas cujo consentimento para a prática do ato sexual não se exterioriza de forma válida, afastando-se, assim, a tipificação por extensão dos artigos 213 e 214 combinados com o artigo 224 do Código Penal. 
A expressão presunção de violência deu lugar ao termo vulnerável, mantendo-se o rol taxativo daqueles que, em tese, não possuem condições de consentir de forma válida com a prática sexual, seja ela a conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso.
À luz do caput do artigo 217-A e seu §1° do Código Penal, vulneráveis são os menores de 14 anos, os enfermos ou deficientes mentais, e aqueles que, por outra causa, não puderem oferecer resistência.
Não obstante a lei ter elencado os sujeitos passivos do crime, é de suma importância conceituar adequadamente o termo vulnerabilidade, a fim de se compreender o real alcance da norma em questão. Caso contrário, estaríamos diante de situações em que a presunção de incidência da norma seria considerada absoluta, de modo que bastaria a vítima, por exemplo, juntar ao processo sua certidão de nascimento, atestando idade inferior a 14 anos, para se configurar a vulnerabilidade. Não cremos ser esse entendimento mais acertado, conforme será analisado mais adiante.
Nesse sentido, a antiga discussão acerca da presunção de violência, se absoluta ou relativa, travada especialmente no campo da idade, não foi de toda afastada. A interpretação literal do recém editado artigo 217-A tem levado a conclusões precipitadas no sentido de que a antiga discussão sobre a natureza da presunção, se absoluta ou relativa, desapareceu, dando lugar à presunção iuris et de iure de vulnerabilidade das pessoas ali elencadas. 
A fim de se desfazer tal equívoco, e, em respeito aos princípios constitucionais da intervenção mínima do direito penal, da ofensividade, do contraditório e da presunção de inocência, é que a vulnerabilidade, merecedora de tutela penal, deve ser compreendida de forma restrita e casuisticamente, tendo como essência a fragilidade e a incapacidade física ou mental da vítima, na situação concreta, para consentir com a prática do ato sexual.
Assim, com base nesse entendimento, analisaremos cada um dos sujeitos considerados vulneráveis à luz do novo dispositivo.
3.1.1. MENORES DE 14 ANOS
Agora diante do novo cenário, foi criado um crime autônomo para tutelar os menores de quatorze anos, pessoas que estão em enfermidade ou doentes mentais e ainda quando a vítima tiver sua capacidade de resistência reduzida.
Dessa forma, a lei 12.015/09 criou um novo capítulo que se trata dos crimes contra os vulneráveis, basicamente o capítulo II criou os crimes de estupro de vulnerável, corrupção de menores, satisfação da lascívia na presença de criança ou adolescente e o crime de favorecimento da prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual de vulneráveis.
Inicialmente, o crime de estupro de vulnerável estaria caracterizado quando o agente mantivesse conjunção carnal com vítima menor de quatorze anos, que esteja acometida de enfermidade ou doença mental, bem como tenha sua capacidade de resistência reduzida.
Percebe que o dispositivo penal descrito no art. 217-A não exige o emprego de violência ou grave ameaça para que exista o delito, e considerar viciado o consentimento.
Dessa forma, ocorrerá o crime de estupro de vulnerável mesmo que a vítima consinta que o agente tenha conjunção carnal com ela o pratique qualquer outro ato de libidinagem.
A polêmica quanto ao estupro de vulnerável concentra-se em saber se a presunção de violência é absoluta ou relativa, isto significa, que será possível ou não prova do consentimento por parte da vítima.
Segundo Rogério Greco, a questão perdeu razão de existir, pois quando o legislador criou um crime autônomo para tutelar os crimes contra vulneráveis, mormente os menores de quatorze anos, ele definiu o intuito de considerar o crime como sendo de presunção absoluta, ou seja, independe de prova do consentimento da vítima.
O STF e o STJ entendem que a presunção do crime é absoluta, portanto independe da prova do consentimento ou não da vítima, assim o crime existirá mesmo que vítima permita a prática da conjunção carnal.
Não obstante, de fato a presunção se absoluta, não podemos desprezar as singularidades que o caso concreto poderá apresentar, por exemplo, agente que de longa data já namorava a vítima. Assim, o fato de considerarmos o crime como de presunção absoluta, isto não impede o intérprete de flexibilizar a norma atendendo as características especiais do caso concreto.
Nota que a conclusão não permite considerarmos que o consentimento seja relativizado, pelo contrário, a presunção é absoluta, apenas haverá flexibilidade ante as peculiaridades do caso concreto. Logo, com a permissa venia dos que entendem de modo diverso, entendo que mesmo com a publicação da lei 12.015/09 haverá discussão a respeito da presunção absoluta ou relativa do consentimento no crime de estupro de vulnerável.
Note que antes de nos aprofundarmos no estudo de estupro de vulnerável, mencionamos que o delito não é cometido mediante violência ou grave, pois basta a conjunção carnal ou o ato de libidinagem, mesmo com o consentimento da vítima, é suficiente para existência do crime. Mas e se houver emprego de violência ou grave ameaça, como ficaria o caso?
Não seria possível admitirmos que neste caso o crime seria de estupro simples, pois a lei certamente veio tutelar mais rigorosamente aqueles que cometem crimes contra vulneráveis, por outro lado, estaríamos promovendo indiretamente que o agente, ao invés de praticar o crime sem violência, empregasse como forma de alcançar seu desejo sexual.
Desse modo, entendemos que aquele que empregar violência ou grave ameaça contra vulnerável para ter conjunção carnal ou qualquer outro ato de libidinagem deverá responder pelos crimes de estupro de vulnerável em concurso material com o crime de constrangimento ilegal.
Não podemos nos furtar que aquela discussão do crime de estupro presumido ser ou não hediondo acabou, pois a lei 12.015/09 inseriu expressamente o crime de estupro de vulnerável no art. 1°, da Lei 8.072/90.
Agora a polêmica se concentra na possibilidade de incidência ou não da causa de aumento de pena descrita no art. 9°, da lei 8.072/90. Alguns doutrinadores, entendiam que a causa de aumento de pena prevista na lei de crimes hediondosrepresentaria um bis in idem, pois serviria como elementar do tipo penal e posteriormente como causa de aumento de pena. Os tribunais, principalmente, o STF entendia no sentido de não haver a duplicidade, pois elementar do tipo penal e circunstância de causa de aumento de pena tem natureza jurídica distintas.
Atualmente, como a nova lei revogou o art. 224, do CP, não haverá mais necessidade de permanecer a discussão, não havendo incidência da causa de aumento de pena descrita no art. 9°, da lei 8.072/90. 
Recentemente, o STF determinou o juízo das Execuções Penais ajustar a condenação do réu ao novo entendimento que considera que a causa de aumento de pena da lei de crimes hediondos está revogada pela lei 12.015/90.
A esse respeito, bastante esclarecedor o voto proferido pelo Ministro Celso Limongi, tratando de hipótese em que um indivíduo com idade superior a trinta e dois anos havia mantido relações sexuais com adolescente de menos de catorze anos: “Em primeiro lugar, faz-se necessário relembrar que o Direito não deve ser estático, mas, por força das vertiginosas transformações sociais, nem sempre consegue acompanhá-las. Por isso, o Direito erige-se tantas vezes em óbice ao desenvolvimento da sociedade. (...) Parece claro que, quando se interpreta um Código Penal nascido em 1940, portanto, com 69 anos de idade, é preciso adequá-lo à realidade de hoje, levando em conta os valores da atualidade, para que as decisões sejam mais justas. O outro aspecto que merece destaque se prende a que, para a boa interpretação da lei, é necessário levar-se em consideração todo o arcabouço normativo, todo o ordenamento jurídico do País. A interpretação da lei não prescinde do conhecimento de todos os ramos do Direito. Uma visão abrangente desse arcabouço facilita - e muito - o entendimento e a interpretação da lei. Assim, em tal linha de raciocínio, o Estatuto da Criança e do Adolescente precisa ser analisado, para enfrentar a questão posta nestes autos, a de se saber se o estupro e o atentado violento ao pudor por violência presumida se qualificam como crimes e, mais, como crimes hediondos. É necessário levar em conta o Estatuto da Criança e do Adolescente, porque, pelo artigo 2° desse Estatuto, o menor é considerado adolescente dos 12 aos 18 anos de idade, podendo até sofrer medidas socioeducativas. (...) Imagine-se a hipótese de um jovem de 18 anos de idade que beije lascivamente sua namorada de 13 anos ou que com ela pratique alguns atos libidinosos não dos mais íntimos. Pela presunção de violência que o Código Penal de 1940 estabelece, pois a menor de 14 anos não dispõe de vontade válida, será esse jovem condenado a no mínimo 6 anos de reclusão! E o Código, ao presumir a violência por não dispor a vítima de vontade válida, está equiparando essa adolescente a uma pessoa portadora de alienação mental, o que, convenhamos, não é razoável. Isto, em pleno século XXI! A Constituição Federal importou do direito anglo-americano o princípio do devido processo legal na sua face substantiva, de modo que ela autoriza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a permitir que o juiz hoje se inquiete com a injustiça da lei, a proporcionalidade dos encargos, a razoabilidade da lei, quando antes não era senão a voz da lei, o cego cumpridor da lei, o escravo da lei, um ser como que inanimado, como preconizava Montesquieu, preocupado, naquele contexto histórico em que viveu, com poder o magistrado interpretar a lei. (...) E, efetivamente, não se pode admitir no ordenamento jurídico uma contradição tão manifesta, a de punir o adolescente de 12 anos de idade, por ato infracional, e aí válida sua vontade, e considerá-lo incapaz, tal como um alienado mental, quando pratique ato libidinoso ou conjunção carnal. Isto, quando já se sabe que o adolescente de hoje recebe muito mais informações sobre sexo do que o adolescente da década de 1940... A interpretação da lei exige, de tal arte, coerência, harmonização das disposições legais, evitando interpretações que se contraponham. (...) Aliás, fico com a sensação de que a menina de 14 anos de idade, à época do nascimento do Código Penal não era mais instruída sobre temas sexuais, do que a menina de 12 anos de hoje...”[footnoteRef:19]. [19: STJ - HC 88664/GO - 6ª T. - Rel. Min. Og Fernandes - j. 23/06/2009 - DJ 08/09/2009.] 
Discorrendo sobre o tema, Klelia Canabrava Aleixo acentua que, embora a Lei 12.015/09 tenha substituído a questão da moralidade pela tutela da dignidade e da liberdade sexual, o legislador continuou adotando uma postura proibitiva e moralista sobre a sexualidade infanto-juvenil, partindo da consideração de que o exercício da sexualidade pelos menores de 14 anos é irregular, desviante e deve ser objeto de proibição. A autora alude aos estudos de Matta e Correia, que, partindo do cotidiano da 12ª Promotoria Criminal de Fortaleza, verificaram que parte dos inquéritos lá existentes tinha como objetivo restringir a liberdade sexual de menores por escaparem ao modelo culturalmente aceito, por envolverem homossexualidade ou diferenças atinentes à classe, raça ou religião do parceiro. E conclui a autora: “pensar a Proteção Integral afirmada no Estatuto da Criança e do Adolescente implica no reconhecimento de que crianças e adolescentes estão em condição peculiar de desenvolvimento, o que não as reduz à condição de objeto de intervenção. Assinalar a questão da responsabilidade no seio do direito à sexualidade não significa adotar uma perspectiva repressiva, calcada em juízos de natureza moral ou na sua negação, contrario sensu, implica em disponibilizar o acompanhamento e a orientação”[footnoteRef:20]. [20: Problematizações sobre o estupro de vulnerável em face do princípio da proteção integral. In Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 17, n. 209, p. 08-09, abr., 2010.] 
Caso se aplique ao artigo 217-A uma interpretação meramente literal, poder-se-á chegar à absurda hipótese de se considerar como autor do crime de estupro um indivíduo de 18 anos que queira, por meio de casamento, constituir família com a menor de 14 anos que engravidou, ainda que haja o livre consentimento desta. Não se pode esquecer que o Código Civil, no artigo 1520, permite expressamente o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil, em caso de gravidez.
Nessa linha, em cumprimento aos princípios norteadores do direito penal, não basta a comprovação da idade para a tipificação do crime de estupro de vulnerável, uma vez que o critério etário não é absoluto. A melhor solução reside na aferição casuística do grau de maturidade sexual e desenvolvimento mental do suposto ofendido, para definir se é ou não vulnerável, aplicando-se a lei de maneira mais justa ao caso concreto. Em última análise, consoante a relativização da vulnerabilidade, expressamente conferida aos deficientes mentais e enfermos – conforme discorreremos a seguir – entendemos que, por interpretação extensiva, deve-se garantir igual tratamento aos menores de 14 anos, reputando-se como vulneráveis apenas aqueles que efetivamente não possuírem o necessário discernimento para a prática sexual.
3.1.2. ENFERMOS E DEFICIENTES MENTAIS
O artigo 224, alínea “b”, do Código Penal, estabelecia a presunção de violência quando a vítima fosse alienada ou débil mental, e o agente conhecesse tal circunstância. Atualmente, a hipótese encontra previsão no § 1º do artigo 217-A, que prevê como vulnerável a pessoa que “por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato”. 
Se, por um lado, mostra-se louvável a preocupação da lei em estender especial proteção a tais indivíduos, por outro, é preciso cuidado para que não haja indevida e prejudicial ingerência do Estado na intimidade de pessoas portadores de deficiência, cuja prática sexual é, muitas vezes, de suma importância para seu próprio desenvolvimento pessoal. 
Neste aspecto, foi bastante positiva a mudança legislativa. Isto porque, em se tratando de deficientes e enfermos mentais, a vulnerabilidade foi expressamente relativizada,na medida em que o dispositivo contempla apenas aqueles não tiverem o necessário discernimento para a prática do ato. Ou seja, ainda que possuam precária esfera cognitiva e volitiva, tais pessoas podem ostentar capacidade suficiente para compreensão do ato, e aquiescer com sua prática.
Em estudo sobre a sexualidade de deficientes mentais, Débora Gejer afirma que “o deficiente mental, como qualquer outro indivíduo, tem necessidade de expressar seus sentimentos de modo próprio e intransferível. A repressão da sexualidade, nestes indivíduos, pode alterar seu equilíbrio interno, diminuindo as possibilidades de se tornar um ser psiquicamente integral. Por outro lado, quando bem encaminhada, a sexualidade melhora o desenvolvimento afetivo, facilitando a capacidade de se relacionar, melhorando a auto-estima e a adequação à sociedade. (...) A melhora dos cuidados de saúde e o avanço social que as pessoas com deficiência mental vêm alcançando, nas últimas décadas, têm sido muito grande. Atualmente, por meio do processo de inclusão social, os deficientes mentais leves e moderados são capazes de viver integrados na comunidade e, portanto, expostos a riscos, liberdades e responsabilidades. Essas pessoas, durante a adolescência, devem conhecer as transformações físicas e sociais que ocorrem neste período particular de vida” [footnoteRef:21]. [21: Adolescente com deficiência mental e sua sexualidade. Fonte: Instituto Indianápolis. Disponível em <http://www.indianopolis.com.br/si/site/1103>. Acesso em 14/11/09.] 
No mesmo sentido, apontam Olga Maria Bastos e Suely Ferreira Deslandes que “a escassez dos trabalhos sobre a sexualidade das pessoas com deficiência mental, apesar da importância deste debate, nos permite questionar se este fato não se deve ao tema ser ainda revestido de preconceitos pela sociedade. (...) Desta forma, torna-se um desafio modificar a visão sobre os projetos do exercício da sexualidade dos que têm deficiência mental, geralmente abordados pela sociedade a partir de uma visão negativa e pessimista. É preciso valorizar os aspectos positivos e otimistas decorrentes da prática sexual destes adolescentes, em detrimento dos preconceitos relativos ao exercício de sua sexualidade, contribuindo para enriquecer sua existência”[footnoteRef:22]. O silêncio e a repressão são formas negativas de lidar com a sexualidade[footnoteRef:23]. [22: Sexualidade e o adolescente com deficiência mental : uma revisão bibliográfica. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 389-398, 2005] [23: MOREIRA, Lília MA; GUSMÃO, Fábio AF. Aspectos genéticos e sociais da sexualidade em pessoas com Síndrome de Down. Revista Brasileira de Psiquiatria (São Paulo), Brasil, v. 24, n. 2, p. 94-99, 2002.] 
Parece-nos, pois, que a depender da deficiência mental do indivíduo, é perfeitamente possível seu consentimento válido para a prática do ato sexual, sendo tal aspecto, inclusive, de grande importância para a sua integridade psíquica. Nessa linha, é ilógico considerar um deficiente mental como vítima certa do crime de estupro de vulnerável, eis que equivalente a negar a existência de seu desejo sexual, o que cientificamente não procede. Conclui-se, mais uma vez, ser a vulnerabilidade dos enfermos e deficientes mentais relativa, impondo-se ao julgador a análise do caso concreto.
 Favorecimento da Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual de Vulnerável. 
Por fim, chegamos ao estudo especial do crime de favorecimento da prostituição. O art. 218-B descreve o Favorecimento da Prostituição de Vulnerável. Quando a vítima não for considerada vulnerável o crime estará previsto no art. 228, do CP.
Pratica o crime o sujeito que submete, induz ou atrai à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de dezoito anos ou, que por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para prática do ato, ou ainda, facilita, impede ou dificulte que abandone.
Infere-se do núcleo do tipo penal que submeter consiste em sujeitar à vítima à prostituição. Induzir ou atrair acaba sendo faces de uma mesma moeda, pois convencer ou estimular à prostituição não deixa de ter sentido único. Ocorre a facilitação quando o agente proporciona meios eficazes de exercer a prostituição. Também configura o crime quando o sujeito impede ou dificulte que a vítima abandone a prostituição, neste caso os exemplos são farto e notoriamente conhecidos, como por exemplo, a atividade extorsão relativas as eventuais dívidas de hospedagem. 
 
Quando o tipo penal menciona qualquer outra forma de exploração sexual, significa que haverá crime quando a vítima trabalhasse em casa de streap-tease, disque sexo etc.
O crime é tipo penal alternativo ou crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, isto significa que a prática de um núcleo do verbo do tipo ou de vários resultará em crime único.
Note que o dispositivo penal menciona que haverá crime quando o agente, por exemplo, convença alguém menor de 18 anos à prostituição, mas existe um limite de idade no tipo penal. Desse forma, o sujeito somente poderá cometer o crime quando a vítima for menor de 18 anos e maior de 14 anos, do contrária estriamos diante de participação de estupro de vulnerável ou corrupção de menores dependendo do caso.
Não obstante o crime se consume com a simples entrega ao comércio carnal, entendemos que deverá ter uma habitualidade, isto significa que o crime é instantâneo, mas a atividade carnal deverá ser habitual, pois inexiste prostituição eventual.
Devemos tomar cuidado que majoritariamente, os doutrinadores entendem que a entrega a um único cliente seria suficiente para haver o crime.
O art. 218-B inseriu ainda em nosso ordenamento duas formas equiparadas de praticar o crime, quais sejam, quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 anos e maior de 14 anos na situação descrita no caput do artigo e quando o proprietário, o gerente ou o responsável do local permita que se verifiquem as práticas referidas no caput do art. 218-B.
O legislador visou punir também que não facilita mas mantém relacionamento com alguém maior de 14 anos e menor de 18 anos, na verdade é uma forma de inibir o incentivo à prostituição. Houve ainda a previsão do inciso II, do § 2°, do art. 218-B para coibir o turismo sexual.
Por fim, cabe mencionar que o proprietário, gerente ou responsável do local onde ocorrer à prática das atividades descritas no art. 218-B perderá a licença de localização e de funcionamento do estabelecimento, consoante o § 3°, do art. 218-B. Apenas tome cuidado que, embora o efeito seja obrigatório, o julgador deverá fazer menção a ele em sua sentença, apontando o estabelecimento onde eram levadas a efeito as condutas previstas pelo caput do art. 218-B. A sua omissão poderá ser suprida pela via dos embargos de declaração.
4. CONCLUSÃO
Com o advento da Lei 12.015/05, tanto o homem quanto a mulher podem ser sujeitos ativo e passivo do crime de estupro. Parece-nos ser a modificação benéfica, pois melhor atende à isonomia, tratando homens e mulheres de forma igualitária. Assim, após a supressão da expressão mulher honesta, pela Lei 11.106/05, o legislador dá mais um importante passo e elimina outro ranço de machismo da legislação pátria.
Outra modificação importante refere-se ao fato de que o art. 213 passou a se caracterizar como crime de ação múltipla ou tipo penal misto alternativo. Logo, a prática de uma ou mais condutas descritas no tipo, no mesmo contexto fático e contra a mesma vítima, caracteriza crime único. 
Não obstante a alteração tenha sido recebida com perplexidade, por alguns, o fato é que solução semelhante, afirmando-se o caráter misto alternativo do tipo penal, já é adotada em situações graves, envolvendo tráfico de drogas (Lei 11.343/06) e armas de fogo (Lei 10.826/03), sem qualquer resistência doutrinária. Isso evidencia que o cenário da sexualidade continua sendo um tabu na sociedade. 
Ademais, as objetividades jurídicas dos ilícitos, anteriormente tipificados nos artigos 213 (estupro) e 214(atentado violento ao pudor), são semelhantes, e, muitas vezes, as condutas previstas nesses dispositivos ocorriam contra a mesma vítima, no mesmo contexto fático. Portanto, mostra-se benéfica a junção das referidas condutas em um só dispositivo penal, permitindo o reconhecimento de crime único, cabendo ao magistrado levar em consideração as peculiaridades de cada caso na individualização da pena.
O constrangimento da vítima a conjunção carnal e também a atos libidinosos diversos da conjunção carnal, uma vez previstos no artigo 213, passam a ser crimes de mesma espécie, sendo possível o reconhecimento de crime continuado entre tais infrações. Não se pode utilizar um conceito restritivo de maneira de execução para afastar a continuidade delitiva, pois isto representa uma tentativa oblíqua de modificar o comando que se extrai do texto da nova Lei.
As formas qualificadas estão, agora, previstas nos §§ 1º e 2º do artigo 213, e incidem sempre que da conduta resultar as hipóteses previstas no dispositivo. A mudança, também neste ponto, é benéfica, pondo fim a antigas discussões.
Pela nova Lei, tanto o estupro (art. 213) quanto o estupro de vulnerável (art. 217-A) são crimes hediondos, na forma simples ou qualificada. Eliminou-se, assim, a discussão existente, pelo menos quanto aos crimes praticados sob a égide da nova Lei.
No tocante ao estupro de vulnerável, ao introduzir o artigo 217-A no ordenamento jurídico, o legislador teve o claro intuito de proteger aquelas pessoas que, em razão de pouca idade, deficiência física ou psíquica, ou por outra causa, não podem validamente consentir com a prática do ato sexual ou a ele resistir. No entanto, é preciso ter cuidado com as interpretações que serão dadas ao inédito tipo penal, pois sua redação pode levar à equivocada conclusão de que qualquer relação sexual praticada com as pessoas nele previstas, ainda que consentida, será criminosa, merecedora de tutela penal. Tal interpretação leva a graves e inevitáveis injustiças, sendo necessário, pois, relativizar a presunção de vulnerabilidade, a qual deve ser analisada concretamente. 
Conclui-se que, neste aspecto, o legislador deixou de observar várias das reivindicações dos operadores do Direito, mantendo lacunas e margens para novas discussões, o que, em se tratando de crimes contra a dignidade sexual, é acentuado pela repercussão social inerente a tais espécies de delito, polemizando ainda mais a aplicabilidade da lei penal.
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Publicado em:
Nucci, Guilherme de Souza ; Alves, Jamil Chaim ; BARONE, Rafael ; BURRI, Juliana ; CUNHA, Patrícia ; ZANON, Raphael . O crime de estupro sob o prisma da Lei 12.015/2009 (arts. 213 e 217-A do CP). Revista dos Tribunais (São Paulo. Impresso), v. 902, p. 395-422, 2010.

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