Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Literatura Infantil AFINAL, O QUE É LITERATURA INFANTIL? A designação infantil faz com que esta modalidade literária seja considerada "menor" por alguns, infelizmente. Principalmente os educadores vivenciam de perto a evolução do maravilhoso ser que é a criança. O contato com textos recheados de encantamento faz-nos perceber quão importante e cheia de responsabilidade é toda forma de literatura. A palavra literatura é intransitiva e, independente do adjetivo que receba, é arte e deleite. Sendo assim, o termo infantil associado à literatura não significa que ela tenha sido feita necessariamente para crianças. Na verdade, a literatura infantil acaba sendo aquela que corresponde, de alguma forma, aos anseios do leitor e que se identifique com ele. A autêntica literatura infantil não deve ser feita essencialmente com intenção pedagógica, didática ou para incentivar hábito de leitura. Este tipo de texto deve ser produzido pela criança que há em cada um de nós. Assim o poder de cativar esse público tão exigente e importante aparece. O grande segredo é trabalhar o imaginário e a fantasia. E como foi que tudo começou? Origens da Literatura Infantil O impulso de contar histórias deve ter nascido no homem, no momento em que ele sentiu necessidade de comunicar aos outros alguma experiência sua, que poderia ter significação para todos. Não há povo que não se orgulhe de suas histórias, tradições e lendas, pois são a expressão de sua cultura e devem ser preservadas. Concentra-se aqui a íntima relação entre a literatura e a oralidade. A célula máter da Literatura Infantil, hoje conhecida como "clássica", encontra-se na Novelística Popular Medieval que tem suas origens na Índia. Descobriu-se que, desde essa época, a palavra impôs-se ao homem como algo mágico, como um poder misterioso, que tanto poderia proteger, como ameaçar, construir ou destruir. São também de caráter mágico ou fantasioso as narrativas conhecidas hoje como literatura primordial. Nela foi descoberto o fundo fabuloso das narrativas orientais, que se forjaram durante séculos a.C., e se difundiram por todo o mundo, através da tradição oral. A Literatura Infantil constitui-se como gênero durante o século XVII, época em que as mudanças na estrutura da sociedade desencadearam repercussões no âmbito artístico. O aparecimento da Literatura Infantil tem características próprias, pois decorre da ascensão da família burguesa, do novo "status" concedido à infância na sociedade e da reorganização da escola. Sua emergência deveu-se, antes de tudo, à sua associação com a Pedagogia, já que as histórias eram elaboradas para se converterem em instrumento dela. É a partir do século XVIII que a criança passa a ser considerada um ser diferente do adulto, com necessidades e características próprias, pelo que deveria distanciar-se da vida dos mais velhos e receber uma educação especial, que a preparasse para a vida adulta. As Mil e Uma Noites Coleção de contos árabes (Alf Lailah Oua Lailah) compilados provavelmente entre os séculos XIII e XVI. São estruturados como histórias em cadeia, em que cada conto termina com uma deixa que o liga ao seguinte. Essa estruturação força o ouvinte curioso a retornar para continuar a história, interrompida com suspense no ar. Foi o orientalista francês Antoine Galland o responsável por tornar o livro de As mil e uma Noites conhecido no ocidente (1704). Não existe texto fixo para a obra, variando seu conteúdo de manuscrito a manuscrito. Os árabes foram reunindo e adaptando esses contos maravilhosos de várias tradições. Assim, os contos mais antigos são provavelmente do Egito do séc. XII. A eles foram sendo agregados contos hindus, persas, siríacos e judaicos. O uso do número 1001 sugere que podem aparecer mais histórias, ligadas por um fio condutor infinito. Usar 1000 talvez desse a idéia de fechamento, inteiro, que não caracteriza a proposta da obra. Os mais famosos contos são: O Mercador e o Gênio Aladim ou a Lâmpada Maravilhosa Ali-Babá e os Quarenta Ladrões Exterminados por uma Escrava As Sete Viagens de Simbá, o Marinheiro O rei persa Shariar, vitimado pela infidelidade de sua mulher, mandou matá-la e resolveu passar cada noite com uma esposa diferente, que mandava degolar na manhã seguinte. Recebendo como mulher a Sherazade, esta iniciou um conto que despertou o interesse do rei em ouvir-lhe a continuação na noite seguinte. Sherazade, por artificiosa ligação dos seus contos, conseguiu encantar o monarca por mil e uma noites e foi poupada da morte. A história conta que, durante três anos, moças eram sacrificadas pelo rei, até que já não havia mais virgens no reino, e o vizir não sabia mais o que fazer para atender o desejo do rei. Foi quando uma de suas filhas, Sherazade, pediu-lhe que a levasse como noiva do rei, pois sabia um estratagema para escapar ao triste fim que a esperava. A princesa, após ser possuída pelo rei, começa a contar a extraordinária "História do Mercador e do Efrit", mas, antes que a manhã rompesse, ela parava seu relato, deixando um clima de suspense, só dando continuidade à narrativa na manhã seguinte. Assim, Sherazade conseguiu sobreviver, graças à sua palavra sábia e à curiosidade do rei. Ao fim desse tempo, ela já havia tido três filhos e, na milésima primeira noite, pede ao rei que a poupe, por amor às crianças. O rei finalmente responde que lhe perdoaria, sobretudo pela dignidade de Sherazade. Fica então a metáfora traduzida por Sherazade: a liberdade se conquista com o exercício da criatividade. RESUMO O livro de CADERMATORI, Lígia. O que é Literatura Infantil. São Paulo: Brasiliense, 2006 (Coleção Primeiros Passos.) responde! O livro O que é Literatura Infantil, de Lígia Cademartori, desvenda de fato o universo da Literatura Infantil. Com uma abordagem simples e direta, o livro é estruturado em cinco pontos: a importância da Literatura Infantil no Brasil de hoje; O adjetivo como definição do gênero; O momento em que surgiu a Literatura Infantil; autores e obras no Brasil; e a Literatura Infantil nos primeiros anos de vida do ser humano. Pode-se pensar a Literatura (Infantil) tendo como prisma o postulado de Hans Robert Jauss, teórico da literatura: “O leitor é uma força pode ser apreciada a partir do papel ativo que ela possibilita o seu destinatário”. Citação essa presente no livro. Com base nela, compreende-se a Literatura Infantil, como elo obra/autor e destinatário, um recém-alfabetizado, um leitor infantil que precisa ter suas condições de recepção atendidas e respeitadas, assegura Cademartori. O adjetivo que acompanha o substantivo objetiva o destinatário: o receptor. A Literatura Infantil virou vedete: livros, encontros até a Academia em torno dessa literatura. No Brasil ‘analfabeto’, a preocupação com o ensino básico veio aliada à “ação pedagógica junto à criança voltou a privilegiar o livro como elemento imprescindível ao crescimento intelectual e à afirmação cultural” para não (se) perpetuarem o quadro de subdesenvolvimento cultural e adultos “iletrados”. Um adulto analfabeto ou milhões de adultos não alfabetizados são crianças que não tiveram oportunidades nem acesso ao mundo da leitura, dos livros, dos sonhos e de desenvolvimento. Por isso a opção (inteligente) de trabalhar com elas, e também com a Literatura. Nesse cenário, aconteceu um verdadeiro boom da Literatura Infantil, afirma Cademartori. Também vieram as Histórias em Quadrinhos (HQ’s) sem, contudo, um viés cultural e pedagógico. O denominador comum entre os dois gêneros é “o leitor mirim e a condição de não desfrutar de status de obra de arte”, revela a autora. Relegada por muito tempo à classe de um subgênero, uma subliteratura, a Literatura Infantil foi reconhecida, entretanto não por razões literárias, mas por outras que “envolvem questão da educação,além de mercado” (2006, p.15), nas palavras de Cademartori. Apesar da inquestionável importância da Leitura (e) da Literatura Infantil (que dialogam) e a formação de leitores e seus múltiplos aspectos (literários, sociológicos e psicanalistas), o livro, mesmo para criança, é (como) uma mercadoria. A sociedade é capitalista com sua indústria cultural, daí nem tudo que se diz que é é, ou seja, nem tudo que é ditoLiteratura Infantil é Literatura Infantil o que implica o não compromisso com os traços desse gênero literário. Com efeito, não é surpresa, como declara Cademartori, que “nem tudo que circula como livro destinado à criança é, de fato, Literatura Infantil”. Literatura Infantil por mais que dialogue com a Educação ou seja indissociável a ela, não é reduzível aos objetivos e ditames pedagógicos, como coloca a autora: “a sua natureza literária já a coloca além” (2006,p.18). A escola é um aparelho ideológico do Estado (como coloca Althusser ao tratar de algumas instituições reprodutivistas) e sua (se) conflita com o da Literatura: a literatura liberta e a escola aprisiona. Interesses antagônicos. Como alerta Cademartori: “Foi a preocupação pedagógica que, por muito tempo, silenciou no texto questões relativas às sexualidade, ao racismo, à segregação, das mulheres e outras mazelas da sociedade e de seus jogos de poder” (2006, p.24) . Então essa escola e essa pedagogia são nocivas, por isso não atrelar à Literatura a educação posta por elas (escola e pedagogia). A escola é pautada pela preocupação conteudista, nem o ensino da língua escapa, o que á paradoxal, visto que não se alarga o domínio lingüístico com uma tirania de conteúdo. A Literatura Infantil nesse contexto é crucial para o domínio da língua ocorra e as necessidades intelectuais negligenciadas pela escola se desenvolvam. Assim se chega à principal função da Literatura (infantil), como aponta Cademartori, ela “cumpre junto ao seu leitor é apresentação de novas possibilidades existenciais, sociais e políticas educacionais” (2006, p.19-20) Quanto ao adjetivo, pois o substantivo não causa estranhamento (literatura), ele define a Literatura, pois define o público: a criança. No geral, “é escrito para criança e lido pela criança”(…) entretanto “é escrito, empresariado, divulgado e comprado pelo adulto” (2006.p 21), esclarece Cademartori . Nessa relação desproporcional de força “a criança é dependente, em termos físico, intelectuais, afetivos e financeiros” como declara a autora. Pode-se incluir o aspecto comunicacional, a criança é apenas o receptor ‘passivo’. De modo geral, a Literatura pedagógica se liga à cultura erudita e a literatura oral à cultura popular. Elas se mesclam quando se adapta os contos folclóricos (antes para adultos) às crianças, visto que o viés pedagógico é permeado por princípios moralizantes. Ou seja, nas palavras de Cademartori uma “preocupação de fazer uma literatura moralizante através de uma literatura pedagógica” (2006, p.36). O precursor da literatura infantil foi o francês Charles Perrault que ficou conhecido pelas histórias da Cinderela e Chapeuzinho Vermelho. Nomes também como dos irmãos Grimm (João e Maria, Rapunzel), C. Andersen (patinho Feio). Destaque para Lewis Carrol que foge da moralidade cânone e segue a polifonia que permite diversas leituras de sua obra. Já no Brasil, o grande expoente da literatura para crianças é Monteiro Lobato, criador de uma estética para a literatura infantil. Ele abre espaço para a interlocução e amoral não absoluta a exemplo da Emilia, do Sítio do Pica Pau Amarelo: “Aprender o grande segredo da vida dos homens: a esperteza. Ser esperto e tudo”, observa Cademartori. Nasce no Brasil a Literatura Infantil, o pai já estava presente e a família por vir. Nessa tendência, o mercado do livro nacional evolui(u), o livro pode ser até uma mercadoria (no capitalismo, tudo vira mercadoria), todavia de boa qualidade para diversas faixas etárias. Livros para crianças que ainda não sabem ler, contraditório?! Não, o hábito de leitura deve ser (precisa) cultivado desde muito cedo, inclusive com livros com imagens, cheiros e formas ainda sem as palavras. A linguagem e a percepção visuais já são trabalhadas. Eva Furnati escreve livros sem textos (palavra escrita) como “Todo dia” e “De vez em quando”. A criança começa a lê assim, depois vem os livros com imagens aliada a inserção das palavras. Nomes não faltam. Destaque para Ruth Rocha como obras “Enquanto o mundo pega fogo”, “O Reizinho Mandão” e “Dois idiotas sentados cada qual no seu barril” que não subestimam o público leitor e inclusive já trabalha questões de poder e Ziraldo, o criador de “O menino maluquinho” e também “O menino mais bonito do mundo”. E não é só prosa, existe espaço para a poesia: Cecília Meireles e Vinícius de Moraes. Para as crianças que crescem e tornam-se pré- adolescentes e leitores, Sérgio Caparelli e Lygia Bojunga fazem companhia, escrevem para esse público. A leitura infantil namora com a educação, em especial para crianças e a educação infantil. Ela é fundamental para o desenvolvimento pleno, lingüístico, intelectual e social. A Literatura (infantil) é importante para a expressão verbal, o lúdico, imaginação e abstração. Cademartori explicita que “O papel da literatura nos primeiros anos é fundamental para que se processe uma relação ativa entre falante e língua”. Isso se deve a vários fatores, a começar pelo próprio sistema alfabético (2006, p.74). Enfim, a Literatura Infantil é o reconhecimento da criança, não mais como um adulto em miniatura.
Compartilhar