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1 A Historiografia Africana Selma Pantoja Universidade de Brasília A historiografia da África tem até hoje marcas dos primeiros contatos com os europeus a começar pelas divisões cronológicas da sua historia, como é o caso dos termos África Pré- Colonial, Colonial e Pós-Colonial. Assim, um convencionalismo de aspecto colonial tem demarcado a divisão da história africana. No entanto, numa visão mais aproximada, a historiografia do continente apresenta-se como uma das mais dinâmicas desde a década de 1960 e tem passado por fortes transformações, adaptando novas abordagens, rejeitando antigas e inadequadas explicações históricas e inovando o seu fazer histórico num processo profundamente interdisciplinar. O termo África Pré-Colonial foi cunhado por uma historiografia colonialista significando um tempo a-histórico, de curta temporalidade. A chegada dos europeus no litoral, partir do século XVI, passou a ser classificado como o tempo do período colonial. Aqueles que assim fazem a demarcação consideram que a chegada em alguns pontos do litoral africano representou dominação e conhecimento do continente. O desembarque em partes do litoral, com intenções comerciais, mesmo com a intensificação das trocas, não levou a derrocada das hegemonias das instituições africanas. Para a historiografia colonial a história do continente começa com o desembarque dos primeiros marinheiros europeus nas praias africanas. No entanto, pode-se afirmar que a época de apropriação e de invasão do solo africana só vai acontecer ao longo do século XIX, consolidando-se no final desse mesmo período. Portanto, até o inicio do século XIX, na chamada África Pré-Colonial, os europeus não possuíam conhecimento e o poder era restrito a algumas partes do litoral no continente . 2 A historiografia da África teve que desenvolver uma série de novos instrumentos e técnicas para abordar as novas questões que os historiadores começaram a se defrontar. A história africana pulou da situação de a mais atrasada do estudo historiográfico para se tornar a pioneira nos novos métodos. Dessa caminhada inicial, em que as décadas de 70/80 foram fundamentais, o fazer a história do continente inclui nomes de grandes historiadores africanos como Ki-Zerbor, A . Ajauy, B. Ogot, T. Obenga, Tamsir Niane, Cheick Anta Diop que com suas historias regionais, parciais, ufanistas, afro-centristas, totais, eles sedimentaram a historiografia africana. Hoje é possível, graças a eles, falarmos em uma história revisada. O historiador africano teve e tem grandes tarefas a sua frente, novos olhares para os métodos e técnicas apropriados a cada caso e mesmo assim manter os princípios históricos da causalidade. O continente africano, com sua diversidade, nos apresenta em cada parte uma entidade histórica, mas apesar dessas diferenças não se perde de vista a noção de totalidade histórica africana. As atuais perspectivas do estudo histórico do continente pretendem tornar conhecido o passado da África tal como é visto pelos africanos, sem com isso perder o seu caráter universal de especifico campo de saber. A década de 90 apresentou uma verdadeira revolução historiográfica mesclando as correntes historiográficas internacionais com as transformações e necessidades do continente africano. A introdução de temas emergentes como a experiência rural da grande maioria da população, estudos da organização social e política dos sindicatos, a vida das mulheres dos mineiros e trabalhadores das plantações, abriu novo campo para o estudo da História principalmente na África Austral. A história das enfermidades (as novas doenças pela indústria da mineração na África do Sul; a epidemia da Aids nos abrigos masculinos dos mineiros e a tuberculose que retorna como grande causa de mortalidade; a epidemia de catapora em Angola, a seca e fome, o stress e as privações contribuíram para a construção da historia da saúde mental; os registros de atitude colonial frente à psiquiatria passaram a ser pesquisados. A história da saúde pública, do saneamento e do saber médica (tradicional e moderno) na África tornaram-se os novos objetos de 3 estudos. A história das mulheres e das relações de gêneros, nos nacionalismos africanos, na luta armada, na história urbana são temas recorrentes nos centros acadêmicos africanos. Globalmente, a emergência da história das mulheres coincide com o crescimento da história do trabalho e, no caso da África, com o que tem sido chamado de revolução historiográfica africana. A duração da escravidão e o domínio colonial nos últimos séculos refletiram na escolha desses temas como emergentes objetos a inquirir na historiografia africana. A escravidão atlântica representa um tempo relativamente curto se considerarmos a história milenar do continente. O tema da escravidão no continente africano abriu o debate nas décadas de 70/80. O estudo da escravidão permitiu desenvolver temáticas renovadoras dentro da historiografia africana. O debate das décadas de 70/80 apontou para a questão da centralidade do controle social da produção e reprodução, induzindo a um campo mais abrangente como: escravidão, classe, estado e as mulheres1. Ao examinar com mais cuidado o impacto da escravidão para o caso das mulheres, abriu-se a questão do lugar das mulheres na escravidão, criando um suporte da teoria feminista de reprodução. Diferente do chamado período pré-colonial, a história das mulheres durante o período do sistema colonial é relativamente bem documentada. A historiografia africana tem hoje diferente postura frente às complexidades do período da duração do sistema colonial na África. Nos mais recentes escritos sobre mulheres focalizados na época do sistema colonial, as teorias feministas e as complexas problemáticas, em artigos, livros e conferências têm traçado as mudanças na divisão de trabalho por sexo e subseqüentes transformação das relações de gênero que resultaram da dominação colonial. 1 “Breaking the Silence and Broadening the Frontiers of History Recent Studies on African Women”, de Zenebewoke Tadesse, Recent Studies on African Women, Thor, 1988, pp . 359; 4 O número de estudo sobre vários aspectos da dominação colonial tem quebrado o silêncio na historiografia africana, desafiando o mais convencional conceito e apontado para as fontes e recursos para a história das mulheres e gênero no continente. Recentes trabalhos apontam para questões tais como a desorganização da economia doméstica como um resultado da política colonial do trabalho e da apropriação da terra. Um dos fundamentos e visíveis mudanças têm sido o afastamento, por parte das mulheres, do trabalho na terra. A maciça migração dos homens que foi reforçada pela política de trabalho, a introdução da cultura rápida de consumo de mercadorias aumentaram o trabalho das mulheres africanas. (A partir dos textos de D. Birmingham Historiografia na África e Pantoja, S. O Atlântico no Feminino) Historiografia Africana (Bibliografia básica em português) BIRMINGHAM, David. História na África. Atas do Colóquio: Construção e Ensino da Historia de África. Lisboa, CCDP, 1995. CURTIS, P. Tendências recentes das pesquisas históricas africanas e contribuições à história em geral. História Geral da África. São Paulo, Ática/UNESCO, 1982, vol.I, pp.43-51. FAGE, J.D. A Evolução da historiografia da África. História Geral da África. 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