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A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL Objetivos de aprendizagem • Compreender as raízes históricas de problemas do sistema educacional brasileiro, alguns dos quais prevalecem até os dias de hoje. • Entender a forma como as transformações políticas, económicas e sociais atravessadas pelo país, desde os tempos coloniais até a atualidade, influenciaram a educação. • Conhecer as permanências e as mudanças de objetivos, estruturas, métodos pedagógicos e conteúdos didáticos operadas na educação brasileira ao longo de sua evolução histórica. • Adquirir condições para participar do debate nacional em torno de propostas para a melhoria do ensino no pais. Temas 1 — A educação no Brasil Colonial Neste primeiro tema, vamos acompanhar o trabalho de catequese dos índios, as escolas de primeiras letras e os conflitos de interesses entre os jesuítas e os colonos em torno da exploração da mão de obra escrava, lembrando que a Companhia de Jesus foi responsável pela educação brasileira nos tempos coloniais. Em seguida veremos a expulsão dos jesuítas e as consequências para a educação brasileira e mais tarde as mudanças provocadas pela instalação da Corte Portuguesa no Brasil. 2— A educação no Império Esta segunda parte começa com a declaração da independência do Brasil. O país deixa de ser uma colónia para se tornar um império sob o comando da dinastia portuguesa dos Bragança. Após o reinado de D. Pedro l, temos o Período Regencial e, na sequência, o II Reinado, com D. Pedro II, que era um homem culto, patrono das ciências e das artes. Apesar da erudição do imperador, a educação continuou estagnada, principalmente o ensino básico. 3 —O Brasil Republicano A era republicana é caracterizada por períodos democráticos, golpes de Estado e regimes autoritários. Nesta terceira parte, vamos ver como essas marchas e contramarchas politicas influenciaram a educação brasileira, enquanto acompanhamos a disputa relacionada à educação entre intelectuais católicos e segmentos laicos da sociedade. Com a redemocratização, ocorrem mudanças políticas e sociais e uma nova estrutura educacional se inicia no país. 4— Educação a distância no Brasil Concluindo nossos estudos desta unidade, vamos acompanhar a evolução tecnológica dos meios de comunicação e a forma como essa evolução influenciou os métodos de ensino em nosso país. Desde o ensino por correspondência e da rádio escola, na primeira metade do século passado, passando pela TV educativa via satélite, nos anos 1 970, chegaremos à revolução das Tecnologias de Informação (TI). Introdução É claro que não poderíamos completar nossa viagem pelo passado da educação sem aportar em terras brasileiras. Afinal, os problemas educacionais de Pindorama nos interessam diretamente. E, se querermos ter uma compreensão melhor dos problemas que. ainda hoje afligem os profissionais do ensino e estudantes, precisamos de uma visão retrospectiva que nos permita acompanhar os percalços enfrentados pelo sistema educacional brasileiro ao longo da história. Nas unidades anteriores, fizemos uma jornada tempo e no espaço, partindo desde as milenares civilizações Orientais da Antiguidade até os dias atuais. Agora vamos conhecer sobre a história da educação no Brasil. Neste meio século de história, as marchas e contramarchas da política - que sempre exercem influência sobre a educação - foram se sucedendo com rapidez. Um bom exemplo disso é o século XIX, quando o Brasil passou de colónia para Reino Unido, em seguida para Império, e daí para República Federativa, sem falar na abolição da escravatura, outra importante transformação social. Vamos iniciar pelos tempos coloniais, com a chegada do jesuíta Manuel da Nóbrega ao Brasil, em 1549. A partir daí, vamos observar a atuação da Companhia de Jesus e as consequências de sua expulsão das terras brasileiras. Lembrar que as ações educacionais dos jesuítas foram substituídas pelas precárias aulas régias do período Pombalino. A vinda da corte de D. João VI para o Brasil, em 1808, trouxe importantes contribuições para nossa infraestrutura e cenário cultural, favorecendo o movimento da independência. Por outro lado, o ciclo imperial criou condições de melhorias para o setor educacional. No século XIX chegamos à República A fragilidade de nossas instituições fez com que o país ficasse alternando períodos de abertura democrática com regimes autoritários. À mercê das frequentes mudanças, a educação brasileira atravessava esses sobressaltos enquanto se repetiam os antigos embates: educação autoritária versus educação democrática, e educação elitista versus educação popular. E chegamos ao século XX. Em 1985, o Brasil reencontra o caminho da democracia, pondo fim a 21 anos de ditadura militar. A Constituição Cidadã e uma nova Lei de Diretrizes e Bases para a Educação (LDBN) é aprovada. No plano tecnológico, o advento dos computadores, da Internet e da comunicação móvel promove uma verdadeira revolução em diversos segmentos, que reflete também na educação. Educação no Brasil Colonial Durante o período colonial, a educação brasileira esteve nas mãos dos jesuítas, a quem coube o papel de converter à fé católica os gentios (povos nativos) das regiões conquistadas pelo império colonial português. Para isso, Portugal utilizou-se da atuação da Companhia de Jesus, fundada em 1534 por Inácio de Loyola, no contexto da Contrarreforma. Oficializada por bula papal em 1540, a nova ordem religiosa enfatizava uma cega obediência à doutrina da Igreja — perindeac cadáver ("disciplinado como um cadáver"). O rigor dessa doutrina levava as pessoas a substituir o raciocínio pela obediência. Não é difícil avaliar as consequências que esse obscurantismo traria para o desenvolvimento cultural dos povos que viveram sob a sua influência. Veja a atuação da ordem dos jesuítas: em 1542, Simão Rodrigues criava em Portugal a primeira casa jesuíta — o Colégio de Santo Antão, o Velho, em Lisboa. Logo lhes foram entregues a Universidade de Évora e o Colégio das Artes em Coimbra. Era exclusividade da Ordem o ensino de latim e filosofia, curso preparatório obrigatório para o Ingresso nas faculdades da Universidade de Coimbra. Em pouco tempo, já controlavam o ensino primário e secundário de Portugal e disputavam com Coimbra a hegemonia do ensino superior. Foi nessa época que os jesuítas receberam do monarca português D. João III — O Piedoso — a incumbência de "converter à santa fé católica" os povos selvagens da colónia americana. Na verdade, como em tantas outras ocasiões, a "salvação de almas para o Reino de Deus" servia de pretexto para a busca de poder, glória e fortuna. Para satisfazer os interesses do colonizador, seria mais fácil subjugar o indígena e tomar suas terras apresentando-se como emissários de Deus, abençoados por Seus representantes terrenos. Para os jesuítas, seria mais fácil catequizar os índios contando com a "persuasão" das armas portuguesas. Assim. a realeza e a Igreja aliavam-se em tomo de seus objetivos convergentes na conquista e na dominação do Novo Mundo. A atuação dos jesuítas Os jesuítas desembarcaram no Brasil em 1549, junto com o primeiro governador-geral, Tomé de Souza. Liderados pelo padre Manuel da Nóbrega (1517-1570), logo se dedicaram à sua dupla tarefa — a pregação religiosa e a educação. Ao mesmo tempo em que salvava as almas, o trabalho missionário abria caminho para o jugo dos colonizadores. Ensinando as primeiras letras, o trabalho educativo facilitava a Imposição dos costumes europeus. Cientes de que a conversão dos índios só seria possível se eles tivessem noções básicas de leitura escrita, a ação educativa dos jesuítas foi intensa.Para se comunicarem com os indígenas, muitos jesuítas aprenderam os idiomas nativos. Em 1553, chegou ao Brasil José de Anchieta (1534-1597) (Figura 3.1) que viria a se destacar como o mais atuante entre os primeiros jesuítas nas terras brasileiras. Como educador, participou da fundação do Colégio Piraumnga, que deu origem à cidade de São Paulo. Dirigiu o Colégio do Rio de Janeiro e foi autor de uma importante obra literária, incluindo poemas, peças de teatro e uma gramática do idioma tupi. Em 1570, os jesuítas já haviam criado escolas de ensino básico em Porto Seguro, Ilhéus, Espirito Santo, São Vicente e São Paulo de Piratininga, além dos colégios no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco. Seguindo as incursões dos colonizadores pelo interior do território. fixaram-se também em Goiás e Minas Gerais. Mais tarde, já no século XVIII, seriam fundados colégios em Paranaguá e na Ilha de Santa Catarina. No extremo sul do pais, na fronteira com Argentina e Paraguai, os jesuítas estabeleceram os Sete povos das missões, mais tarde destruídos em meio a disputas territoriais entre Portugal e Espanha. Desde os primeiros tempos, a atividade económica colonial foi marcada pela competição entre o colonizador e os jesuítas, que disputavam a mão de Obra Indígena. Nos primeiros anos da colonização. os religiosos levavam certa vantagem, graças à eloquência oratória e à habilidade política do padre Antonio Vieira. Os colonos protestavam contra a "concorrência desleal" das congregações religiosas, que utilizavam a mão de obra gratuita do índio e não pagavam impostos à metrópole sobre sua produção agropecuária. Os padres defendiam os índios da escravização do colono, mas eram também acusados de aproveitar do trabalho indígena, como uma escravização disfarçada. Eram frequentes as incursões armadas organizadas pelos colonos para a captura de índios nas missões. Durante esse período, os índios — os verdadeiros donos da terra — permaneceram "como os mariscos, entre o mar e o rochedo", reduzidos ao papel de coadjuvantes imprensados entre a cruel exploração do colonizador e a não menos exploradora do jesuíta. Em meados do século XVII, com a introdução do escravo africano no Brasil, esse conflito de interesses estaria, em tese, resolvido. A mão de obra do negro substituiria o índio na economia escravocrata. Na verdade, as desavenças encerram em 1759, quando os jesuítas foram expulsos das terras brasileiras e de outras colónias portuguesas por decisão do Marquês de Pombal, primeiro- ministro de Portugal de 1750 a 1777. Vale lembrar que, por 210 anos, os jesuítas dominaram a cultura, a educação e a orientação religiosa da colônia. Ao final desse período, a Companhia de Jesus possuía 25 residências, 36 missões e 18 colégios e seminários, além de seminários menores e escolas de primeiras letras instaladas em diversas cidades. Percebe a importância e a extensão do trabalho dos jesuítas na colónia brasileira? Quanto ao modo de atuação da Companhia de Jesus, é bom que você reflita e se aprofunde para se posicionar sobre o assunto. As escolas de primeiras letras Junto com a catequese, jesuítas organizavam escolas nas aldeias, onde ensinavam os Indígenas a ler e escrever. Aos que abraçassem a fé cristã e fossem batizados, era prometida a vida eterna no paraíso celeste. Os que resistissem eram ameaçados com as chamas do inferno. Movimentando-se com desenvoltura entre todas as camadas sociais, adaptavam-se às condições peculiares de cada grupo e levavam a educação religiosa à casa-grande dos senhores de engenho, à senzala dos escravos e às aldeias indígenas. O ensino secundário e superior A Companhia de Jesus organizou um método padrão para educar e catequizar, que era utilizado em todos os lugares onde os jesuítas atuavam. A Ratio Studiorum era composta por um conjunto de regras que abrangia desde a organização escolar e os métodos de ensino até a rígida observância da doutrina católica. Além das aulas de alfabetização, eram oferecidos três cursos: Letras — abrangia estudos de gramática latina, humanidades e retórica. Terminada a gramática, os alunos passavam para as aulas de humanidades, que incluíam o estudo de história, poesia e retórica. Ao todo, o curso de letras durava cinco ou seis anos. Filosofia e ciências — depois do curso de letras, começavam as aulas de filosofia e ciências, abrangendo estudos de lógica, valores morais, metafisica, matemática, ciências físicas e naturais, durante mais três anos. Somados, os estudos do nível médio tinham duração de nove anos. Teologia e ciências sagradas — de nível superior, e voltado principalmente para a formação de sacerdotes. Uma vez concluídos os cursos de letras, filosofia e ciências, os jovens que desejassem continuar seus estudos deveriam fazê-lo na Europa. A Universidade de Montpellier (França) desfrutava de grande prestigio na área de medicina, enquanto a Universidade de Coimbra (Portugal) era a preferida no campo das ciências teológicas e jurídicas. O método de estudos da Ratio Jesuíta era baseado em três atividades: estudar. repetir e disputar. Os exercícios escolares incluíam a preleção, lição de cor, composição e desafio, práticas pedagógicas que remetiam diretamente à escolástica medieval. Em seu nível elementar, a educação jesuítica limitava-se à alfabetização para a catequese e a evangelização. Acima desse nível, a educação proposta pelos jesuítas tinha como meta a formação do homem perfeito, do bom cristão. Centrada em um currículo de educação literária e humanista, era voltada para a formação dos homens brancos de uma elite colonial. As mulheres, os índios e os africanos estavam excluídos do acesso a esse grau de instrução. Figura 3.1 O jesuíta espanhol José de Anchieta foi o mais importante missionário e ficou conhecido como O Apóstolo do Brasil, sendo beatificado pelo papa João Paulo II em 1980. Fonte rook76'Shutterstock A Era Pombalina No final do século XVIII, Portugal era uma das nações mais atrasadas da Europa. Não produzia bens que suprissem sua população, até o trigo para a fabricação de pão e tecidos para vestuário vinham da Inglaterra, por força de um tratado que garantia a proteção contra a ameaça de vizinhos hostis, como Espanha, França e Holanda. E o que acontecia no Brasil Colonial nessa época? Nessa ocasião, a colónia brasileira já havia substituído as índias como provedoras de riquezas para a metrópole. Os métodos de colonização adotados aqui pelos portugueses não foram diferentes dos utilizados no Oriente. Aqui, como lá, os colonizadores simplesmente se apoderavam de todas as riquezas que pudessem carregar, sem qualquer preocupação com o desenvolvimento das terras ocupadas. Mas a situação económica de Portugal não era nada boa. As riquezas do Brasil só passavam pelo país, sendo seu destino final a Inglaterra. Foi em meio a essa crise que, durante o reinado de D. José I, emergiu a figura de Sebastião José de Carvalho Neto, o Marquês de Pombal (1699-1782). Marquês de Pombal adquiriu poderes de um "superministro", tomando nas mãos a administração do pais. Típico representante do "despotismo esclarecido", associava a monarquia absolutista ao racionalismo iluminista. Veja algumas medidas tomadas pelo ministro para modernizar a economia da metrópole: • incrementou a implantação de manufaturas em Portugal'; • na colônia brasileira, centralizou a administração, criou impostos e companhias de comércio de escravos; • transferiu a capital de Salvador para o Rio de Janeiro para facilitar o escoamento das riquezas minerais. O objetivo da política colonial portuguesa passava a ser a geração do capital- financeiro e humano — necessário para que o país saltasse da economiamercantil para a industrial, seguindo o exemplo da Inglaterra. Não era tarefa fácil. A atuação da Companhia de Jesus — que originalmente seria a salvação de almas — estava envolvida em tudo que pudesse gerar poder e riquezas: educação, política e comércio. Os religiosos se valiam de privilégios como a isenção fiscal e o monopólio da mão de obra Indígena. Em 1759, os jesuítas foram expulsos sob a acusação de praticarem comércio ilegal e incitarem as populações contra o governo. Com a libertação dos índios da tutela religiosa, esperava-se que sua miscigenação contribuísse para um "povoamento estratégico" das ameaçadas fronteiras da América Portuguesa. Os bens dos jesuítas foram confiscados, e Pombal estendeu sua campanha a Roma. Em 1773, o papa Clemente XIV suprimiu a Companhia de Jesus na Europa. Na ocasião, a Ordem mantinha 578 colégios e 150 seminários em todo o mundo. As aulas régias Com a expulsão dos jesuítas e a desorganização do ensino, a educação ficou voltada aos interesses locais ou à formação de poucos, como os membros da elite, que iniciavam seus estudos na colônia e concluíam na Europa, pincipalmente na Universidade de Coimbra, Portugal. Mas como foi organizada a educação após a expulsão dos jesuítas? O mesmo alvará de 1759 que eliminou a sólida estrutura educacional construída pelos jesuítas instituiu as aulas régias de latim, grego e retórica, em substituição às disciplinas até então oferecidas. As aulas régias eram avulsas e isoladas entre si. Em menor escala, prosseguiam os estudos nos colégios e seminários de outras ordens religiosas, como os franciscanos e os carmelitas. Em 28 de junho de 1759, foi criado o cargo de diretor-geral, para "controlar" a educação, para que esta se desenvolvesse de acordo com os interesses da metrópole Promovia inquéritos para fiscalizar o uso de livros proibidos e professores que lecionavam sem a autorização do Estado. Essas providências não foram suficientes para assegurar a continuidade das escolas na colónia. Somente em 1772 ocorreu a implantação do ensino público oficial no Brasil, com a instituição do subsidio literário, Imposto colonial para manutenção da educação primária e secundária. Apesar de e laico, o novo sistema manteve o ensino religioso nas escolas. Com a morte do monarca D. José I (1777) Marquês de Pombal, acusado de corrupção, perdeu o poder foi o fim da Era Pombalina. O Seminário de Olinda Criado em 1798, o Seminário de Olinda foi instalado em 1800 pelo Bispo D Azeredo Coutinho, governador interno de Pernambuco. Inspirado pelos conceitos que o bispo aprendera como aluno na Universidade de Coimbra, o seminário logo se tornou um centro de difusão de ideias liberais. Seus programas pedagógicos davam ênfase ao estudo das matemáticas e das ciências naturais. Na área política, seus alunos e padres participaram de vários movimentos revoltosos, como a Revolução Pemambucana de 1817 e a Confederação do Equador de 1824. O Reinado Joanino O que ocorreu na Europa que provocou a vinda do príncipe regente e da família real para a longínqua terra brasileira? Por que "fugir" para a colónia brasileira? Com fim da Revolução Francesa e a ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder, as rivalidades entre França e nações europeias se acentuaram. Em 1805, Inglaterra, Prússia, Áustria e Rússia uniram-se contra a França. Com suas poderosas forças terrestres, Napoleão derrotou a coligação com certa facilidade, mas a Inglaterra manteve-se inexpugnável, graças a sua situação de ilha e sua Imbatível marinha de guerra, vitoriosa na Batalha de Trafalgar. Em 1806, Napoleão decretou o bloqueio continental, determinando que nenhum país poderia negociar com a Inglaterra, numa tentativa de asfixiar sua economia. Problema é que o bloqueio contrariava também poderosos interesses comerciais no continente, o que provocou fortes oposições. As manufaturas francesas não eram capazes de suprir o vazio causado pelo boicote às exportações britânicas. Portugal, aliado e dependente dos ingleses, hesitava em aderir ao bloqueio continental. O país era governado pelo príncipe regente D. João VI (1767-1826), pois sua mãe, D. Maria I, era oficialmente considerada louca. Pressionado por Napoleão, e sem condições de lhe oferecer resistência militar, mas por outo lado sem poder abrir mão da aliança com os britânicos, D. João VI vivia um terrível dilema. Apoiar a parceira Inglaterra ou ceder aos interesses da França? A fuga para o Brasil Impaciente com a protelação portuguesa, Napoleão ordenou a invasão do pais ibérico. Sem meios de resistir ao ataque, D. João VI transferiu-se às pressas para o Brasil, sob a proteção da frota inglesa. Junto com a família real veio toda a Corte portuguesa, num total de 15 mil pessoas, entre nobres e serviçais. Agora imagine: o Brasil colonial recebe de uma hora para outra um contingente populacional acostumado à vida e aos costumes europeus. O choque foi recíproco. Assim, a capital, Rio de Janeiro, teve que se adequar aos interesses da nobreza de Portugal. Em meio à apressada mudança, que Incluía carruagens, mobiliário e obras de arte, os maiores intelectuais de Portugal trouxeram consigo 60 mil livros. A transferência da Biblioteca Real para o Brasil foi um passo Importante para a melhoria do nosso ambiente cultural. Entre multas consequências, destacam-se a ruptura da economia colonial e o ingresso definitivo na esfera de domínio da Inglaterra. Uma semana após sua chegada, D. João VI decretou a abertura dos portos às nações amigas. Era o fim do monopólio metropolitano que até então restringia drasticamente o comércio e as relações culturais do Brasil com o mundo. Com a instalação do governo português no Rio de Janeiro, o Brasil não poderia permanecer na condição de simples colônia. Em 1815, foi então elevado à condição de Reino Unido, ao lado de Portugal e do Algarve. Observe as mudanças que D. João VI promoveu para adaptar o Brasil às necessidades da Corte portuguesa: • No Rio de Janeiro, foram criados o Banco do Brasil (o primeiro do país), o Museu Nacional, a Biblioteca Real, o Jardim Botânico, a Academia Real da Marinha e a Academia Real Militar, o Curso de Agricultura, a Escola Real de Ciências e Ofícios, o Observatório Astronómico e o Museu de Mineração. • Em Salvador (Bahia), foram criados os cursos de cirurgia, economia, agricultura, química e desenho técnico. • Foi fundado o Colégio das Fábricas, para ensinar ofícios aos órfãos que vieram na comitiva real. Em 1816, a França já havia sido derrotada pelos ingleses, e D. João organizou a vinda de uma Missão Cultural Francesa ao Brasil. Entre os intelectuais escolhidos para a missão, estavam alguns que haviam apoiado Napoleão e viram ali uma boa oportunidade para escapar de represálias do novo governo que estava sendo formado no pais. Entre os 46 participantes da missão, destacavam-se Joachim Lebreton, um dos organizadores do Museu do Louvre e chefe da missão, Auguste-Marie Taunay, Zéphyrin e Marc Ferrez, criadores da estampa da primeira moeda brasileira. Você já deve ter visto, principalmente em livros de história, muitas imagens dos pintores Jean Baptiste Debret e Charles Pradier, que retratavam o Brasil daquela época. A influência da missão francesa deixou uma marca Indelével no cenário cultural brasileiro, e suas sementes acabaram frutificando. Um bom exemplo foi a fundação em 1816 da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, no Rio de Janeiro (atual Escola de Belas Artes, ligada à UFRJ). Entre as benfeitorias do governo de D. João VI, o grande legado para a vida cultural foi a criação da Imprensa Régia, acompanhada do fim da proibição da imprensa no Brasil. O efeito dessa abertura foi imediato, coma fundação de tipografias privadas no Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. Os livros — até então um produto importado e caro — tornaram-se acessíveis. A informação e a cultura reprimidas começam a circular. Você sabe qual foi o primeiro livro editado pela Imprensa Régia? Foi A riqueza das nações, de Adam Smith, considerado o pai do liberalismo econômico moderno. Além dos livros, era publicado o jornal diário A Gazeta do Rio de Janeiro. Apesar de Importantes, convém lembrar que essas medidas tinham o estrito propósito de atender à elite, formando uma casta de homens públicos destinados a dirigir o pais. O sistema educacional continuava a ter uma importância secundária na política nacional. É importante que você pesquise e aprofunde seus conhecimentos sobre esse período histórico, já que outras medidas foram tomadas por D. João VI e que iriam modificar o cenário da cidade do Rio De Janeiro e da colónia brasileira. Em 1821, uma vez afastada em definitivo a ameaça francesa e com a Revolução Liberal (ou Revolução do Porto), D. João VI retorna a Portugal. Para seu lugar, nomeia seu filho, o príncipe herdeiro, que havia optado por permanecer no país. Um ano e meio mais tarde, D. Pedro proclama a Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, assumindo o título de imperador. Saiba mais D. João VI de Portugal “Põe a coroa sobre a tua cabeça, antes que algum aventureiro lance mão dela.” Com essa frase. D. João VI despediu-se do seu filho Pedro. ao retornar para Portugal em abril de 1821. No dia 7 de setembro do ano seguinte, seu filho seguiu o concelho, proclamando-se o primeiro imperador do Brasil. A educação no Império A Proclamação da Independência, em 7 de setembro de 1822, pouco alterou a precária situação da educação brasileira. Durante o curto reinado de D. Pedro I, merecem registro a fracassada experiência com o Método Lancaster de ensino e a promulgação, em 1827, da primeira Lei sobre o Ensino Elementar, cujos termos permaneceriam em vigor até 1889. No Segundo Reinado, não ocorre nenhuma mudança significativa na educação. Mesmo D. Pedro II sendo um intelectual respeitado, apaixonado pelos livros e pela cultura, isso não se refletiu em uma melhoria do sistema educacional, com exceção de esparsas inciativas no âmbito do ensino superior. O Primeiro Reinado Uma vez consolidada a independência, D. Pedro I (1798-1834) tratou de convocar uma Assembleia Constituinte, que foi dissolvida meses depois, em meio a disputas pelo poder entre o soberano e as casas legislativa e judiciária. Em 1824, foi outorgada a primeira Constituição do Brasil, influenciada pelas Constituições francesa de 1791 e espanhola de 1812. A forma de governo era monárquica, hereditária, constitucional e representativa, sendo o país dividido em províncias. A Assembleia Geral, órgão máximo do poder legislativo, era composta pelo Senado e pela Câmara dos Deputados. Estes últimos eram eleitos pelo voto dos cidadãos, enquanto os senadores eram Indicados pelo Imperador. Influenciada pelos ideais da Revolução Francesa, a Constituição de 1824 pregava o princípio da liberdade de ensino, sem restrições, e a intenção de "instrução primária gratuita a todos os cidadãos", mas seus termos eram vagos, sem propostas concretas para estruturar uma política nacional de educação capaz de melhorar o ensino. Apesar da retórica de boas intenções, de formar um sistema educacional popular e gratuito, na realidade o ensino continuava elitista. A questão sobre a educação foi mencionada na primeira Constituição do pais (1824), e resultou na elaboração do artigo nº 250: "Haverá no Império escolas primárias em cada termo, ginásios em cada comarca, e ginásios nos mais apropriados locais". A primeira proposta de criação de escolas primarias no Brasil foi o Projeto Januário da Cunha Barbosa (1826). Em 1827, foi aprovada a primeira lei sobre o ensino elementar, que Iria orientar a organização da educação brasileira até a proclamação da República, em 1889. Essa lei determinava a criação de "escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugarejos" e "escolas de meninas nas cidades e vilas mais populosas". A seguir, você conhecerá o método adotado para solucionar os problemas referentes à educação. Com o objetivo de estender a educação a toda a população, de ambos os sexos, pincipalmente das massas trabalhadoras, o governo adotou o Método Lancaster de ensino monitorial (ou mútuo). Criado pelo britânico Joseph Lancaster (1778-1838), o método parecia a solução indicada para enfrentar a escassez de professores e recursos. Os monitores eram alunos mais adiantados que recebiam, separadamente, as lições de um único professor e depois repassavam os conhecimentos para os mais jovens, em grupos de dez. O processo permitia que um único professor lecionasse para um número enorme de alunos. As práticas pedagógicas baseavam-se na repetição oral e na memorização, na crença de que essa dinâmica aumentasse a disciplina mental e tisica. O plano fracassou por razões técnicas, políticas e principalmente económicas, em virtude da pobreza do pais. Desde as reformas pombalinas, já era uma tradição entre os membros da elite enviar seus filhos para estudar na Europa. Por outro lado, em um país basicamente exportador de produtos naturais, as profissões que exigiam escolarização ofereciam poucas perspectivas de carreira. Ensino público versus privado Diante da falta de recursos do governo para fazer cumprir o que rezava a Constituição — instrução primária gratuita para todos os súditos do imperador —, novas leis ofereceram total liberdade para o estabelecimento de escolas particulares por todo o país. Na prática, o governo estimulava a iniciativa privada para preencher o vácuo deixado pelo Estado. Além de seu caráter elitista, a medida não resolveu o problema. Mais preocupadas com os seus lucros, as escolas particulares não garantiam um ensino de qualidade. Os salários mais altos da rede privada afugentavam de vez os professores das poucas escoIas públicas. Os únicos beneficiados foram os membros da elite, que podiam deixar de enviar seus filhos para estudar na Europa. Apesar dessa melhoria, as classes mais abastadas reivindicavam um maior número de instituições de nível superior. Em 1827, foram criados cursos de formação jurídica, no Convento de São Francisco, em São Paulo (a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco) e no Mosteiro de São Bento, em Olinda (Pernambuco). Além da graduação de advogados, esses cursos foram importantes centros de irradiação de ideias filosóficas, movimentos literários e debate; culturais, contribuindo para a formação das elites políticas brasileiras. Estamos salientando aspectos históricos e educacionais do século XIX — período do governo imperial —, e a formação superior no país reforçava uma característica marcante da sociedade que se refletia na educação brasileira: elitista e aristocrática. Caminhando pela história, vamos observar que essas características se tornarão perenes. Em 1831, D. Pedro I abdicou do trono brasileiro e assumiu o governo de Portugal, com a denominação de D. Pedro IV. Tem início o Período Regencial. Nesse período acontece o Ato Adicional, uma emenda à Constituição Brasileira. Fica determinada a descentralização do ensino. A Coroa fica responsável pelo ensino superior e as províncias administram as escolas elementar e secundária. Vale agora uma reflexão sobre as consequências dessa descentralização do ensino. Em 1835, foi fundada a Escola Normal de Niterói, voltada para a formação dos professores. Em 1837 foram então criados o Imperial Colégio de Pedro II e os primeiros liceus provinciais. Os problemas continuavam os mesmos. As escolas públicas elementaresse limitavam a ensinar a ler, escrever e contar, como no tempo dos jesuítas. Os professores licenciados preferiam lecionar nas escolas particulares, forçando o governo a empregar leigos como docentes, os únicos que se sujeitavam a receber os baixos salários. O desinteresse e a evasão eram grandes, em função da baixa qualidade do ensino. A Era de D. Pedro II Com a abdicação de D. Pedro I e o fim do Período Regencial, chega o momento de D. Pedro II assumir o poder. Assim, em 1840, o príncipe herdeiro assumiu o trono com 15 anos de idade. Tem início o Segundo Reinado (1840 a 1 889), um período de muitos acontecimentos históricos, como a Guerra do Paraguai, a abolição da escravidão, a Proclamação da República. Mas as questões educacionais continuavam estagnadas. Um patrono das artes e das ciências Pedro de Alcântara (1825-1891) passou a Infância e parte da adolescência sendo preparado para governar o país. Com poucos amigos da sua idade, logo encontrou nos livros um refúgio. Seu primeiro tutor foi José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838), o influente líder da Independência. Ao tomar-se adulto e imperador, D. Pedro II manteve por toda a vida a paixão pelos livros e estudos. Seus interesses incluíam ciências como filosofia, antropologia, geografia, geologia, medicina, direito, química e tecnologia. Nas artes, era um apreciador de música, poesia, pintura, escultura e teatro. D. Pedro II dizia: "Gosto dos livros com todos os órgãos dos sentidos: o tato para sentir suas páginas, o olfato para sentir o cheiro das páginas envelhecidas; gosto de ouvir o trepidar quando passo as folhas e o sabor quando molho as pontas dos dedos para virar-lhes as páginas" No final de seu reinado, havia três livrarias em São Cristóvão, com mais de 60 mil livros. Sua paixão pela linguística levou-o a estudar diversos idiomas. Tornou-se membro de diversas academias e sociedades internacionais de artes e ciências. Conheceu pessoalmente e correspondia-se frequentemente com cientistas, filósofos, músicos e outros intelectuais do seu tempo. O imperador D. Pedro II considerava a educação um assunto de suma importância nacional _. Na verdade, julgava a si próprio um exemplo do valor do aprendizado: "Nasci para consagrar-me às letras e às ciências. Ao ocupar posição política, preferiria a de presidente da República ou ministro à de Imperador". Ele via também na educação um meio para fortalecer o sentimento de identidade nacional brasileira. Durante seu reinado, criou organizações como o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, a Imperial Academia de Música e ópera Nacionale e o Instituto Pasteur. Apesar de seu empenho e amor pela cultura, não teve êxito em seus esforços para estender a educação gratuita a todos os seus súditos. O modelo educacional que caracterizou o seu reinado privilegiado a educação de elite — secundário e superior — em prejuízo da educação popular — primário e profissional. Confirmando essa situação, um estudo de 1867 apontou que apenas 10% da população em idade escolar estava matriculada no ensino elementar. A educação no Segundo Reinado Em 1859, D. Pedro II (Figura 3.2) empreendeu uma ampla reforma do ensino básico, modificando sua estrutura e os conteúdos pedagógicos. Sob 0 novo nome de ensino primário e com duração variável em torno de quatro anos, foi dividido em elementar e superior: • Nível elementar — são ministradas as disciplinas de instrução moral e religiosa, leitura e escrita, noções essenciais de gramática, princípios de aritmética e sistema de pesos e medidas. • Nível superior — as mesmas cinco disciplinas se desdobram, passando a totalizar dez. O Colégio Pedro II havia sido criado em 1837, quando o homenageado ainda tinha 12 anos de idade. Após alguns anos no poder, o novo monarca decidiu transformar o colégio em um modelo a ser seguido pelos governos provinciais. Após sete anos de estudos, os alunos recebiam o diploma de bacharel em letras, adquirindo o direito de lecionar para o primário. Em meio à disputa entre o ensino particular e público, a educação brasileira no Segundo Reinado continuava a se defrontar com problemas ligados à realidade socioeconómica do país. Proibidas pelo governo central de organizarem cursos de nível superior, as províncias passaram a estabelecer os liceus, cursos técnicos de nível médio que davam ênfase a disciplinas como química, física, botânica e agricultura. Em 1879, Leôncio de Carvalho elaborou leis para o ensino que propunham a liberdade de ensino de religião, a criação de cursos normais e a permissão para escravos se matricularem nas escolas. Essas leis não vigoraram por muito tempo e, contrariando a tendência mundial de educação laica, registrou-se no Brasil a criação de escolas religiosas. Os jesuítas voltaram ao Brasil em 1845, estabelecendo uma rede de escolas particulares_ logo foram seguidos por outras ordens religiosas masculinas e, mais tarde, femininas. Entre essas instituições, estão o Colégio São Luís (fundado em Itu em 1867 e transferido para São Paulo em 1919) o Colégio Caraça, em Minas Gerais (1820), o Colégio Mackenzie (São Paulo. 1870), o Colégio Americano (Porto Alegre, 1885) e o Colégio Internacional (Campinas, 1873), entre outros. Lembrando que vários colégios foram fundados por americanos que vieram para o Brasil, saindo dos Estados Unidos em consequência da Guerra de Secessão. Cabe ressaltar que, depois que foi assumido pelas províncias, o ensino médio gratuito foi vedado às mulheres. No setor privado, elas eram aceitas, mas mantidas em escolas ou salas separadas, onde recebiam ensinamentos compatíveis com sua função social — disciplinas ligadas à vida doméstica, à maternidade e à religião. A ideia era que elas não precisavam saber mais do que era ensinado no primário. Os conteúdos intelectuais e científicos eram um privilégio masculino, e essa situação perdurou até o final do Império.
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