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2017 - 07 - 18 Curso Avançado de Processo Civil - Volume 2 - Edição 2016 OITAVA PARTE - PRECEDENTES JUDICIAIS E OUTROS MECANISMOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS REITERADOS CAPÍTULO 39. RECLAMAÇÃO Capítulo 39. RECLAMAÇÃO 39.1. Força vinculante e reclamação O instituto da reclamação está intimamente ligado ao fenômeno da força vinculante (n. 34.2, acima). Uma das duas funções essenciais da reclamação (e precisamente aquela que levou o legislador a discipliná-la no CPC/2015) é a de fazer valer a autoridade, a força vinculante em sentido estrito das decisões de tribunais. Quando uma decisão der a determinada questão jurídica solução diversa daquela que lhe havia sido conferida por um "precedente vinculante", caberá, em princípio, a reclamação. São dotados de força vinculante em sentido estrito as decisões liminares e os pronunciamentos finais de acolhimento ou improcedência do pedido na ação direta de inconstitucionalidade, na ação declaratória de constitucionalidade, na arguição de preceito fundamental e na súmula vinculante; e as decisões proferidas nos procedimentos de recursos especiais e de recursos extraordinários repetitivos e nos incidentes de resolução de demandas repetitivas e de assunção de competência (v. n. 34.3, acima). 39.2. Fundamentos, objeto e função da reclamação Na Constituição, a reclamação foi expressamente prevista no rol de competências originárias do Supremo Tribunal Federal (arts. 102, I, l, e 103-A, § 3.º) e do Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, f). Nos demais tribunais, independentemente de qualquer previsão normativa, a competência para a reclamação já se fundaria na "teoria dos poderes implícitos": ao se atribuir competência e autoridade para um tribunal, atribui-se-lhe também, implicitamente, o poder de fazer valer sua competência e autoridade. De todo modo, hoje qualquer dúvida está superada pela disciplina de caráter geral estabelecida pelo CPC/2015 para a reclamação, para todas as hipóteses de seu emprego, em todos os tribunais (art. 988, § 1.º). No Supremo Tribunal Federal, a reclamação está regulada também por seu Regimento Interno (arts. 156-162). Além disso, a Lei 11.417/2006, que disciplina infraconstitucionalmente a súmula vinculante, também traz regras sobre a reclamação contra a sua inobservância (arts. 7.º e 9.º). A reclamação não se destina apenas a assegurar a observância de pronunciamentos com força vinculante erga omnes (art. 988, III e IV, do CPC/2015; art. 7.º da Lei 11.417/2006). Serve também para preservar a autoridade de decisões inter partes (art. 988, II, do CPC/2015) - conforme o exemplo já dado no n. 39.1, acima. Além disso, a reclamação presta-se igualmente a resguardar a própria competência do tribunal ao qual se reclama (art. 988, I): p. ex., se um Tribunal de Justiça estadual pretender promover o controle direto e abstrato de constitucionalidade de uma lei local em face da Constituição Federal, caberá a reclamação ao Supremo Tribunal Federal, para a preservação de sua competência privativa para a fiscalização abstrata de constitucionalidade federal. A reclamação para a preservação da autoridade das decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade cabe tanto contra pronunciamentos judiciais quanto contra atos administrativos. Mais ainda, a reclamação contra a violação de súmula vinculante cabe inclusive em face de omissões administrativas (art. 7.º, § 1.º, da Lei 11.417/2006). Já a reclamação contra a violação de decisões de procedimento de recursos especiais ou extraordinários repetitivos, incidente de resolução de demandas repetitivas e incidente de assunção de competência cabe apenas em relação a decisões judiciais. Em qualquer caso, reclamação tem sempre finalidade repressiva. Ataca uma conduta já ocorrida. Ela não se presta a impedir a futura prática de atos administrativos ou decisões judiciais. 39.3. Natureza jurídica Já houve quem afirmasse que a reclamação seria mera medida administrativa - noção hoje superada. Trata-se de instrumento manejado pelos órgãos judiciais no exercício típico de atividade jurisdicional: atuam como terceiros imparciais na solução de um conflito. Como instrumento jurisdicional, a reclamação não é recurso. Primeiro, porque é inclusive diretamente utilizável contra atos administrativos, em determinadas hipóteses. Depois, mesmo quando empregada contra decisões judiciais, a reclamação não é exercida dentro do processo em curso - característica essencial dos recursos no direito brasileiro. Ademais, a lei, ao prevê-la, ressalva o cabimento paralelo dos recursos (art. 988, § 6.º, do CPC/2015; art. 7.º, parte final da Lei 11.417/2006) - o que também indica que sua natureza é outra. Qualificar a reclamação como um "incidente processual" também não parece satisfatório diante da disciplina hoje vigente. Por um lado - e ainda que se pudesse considerá-la um mero incidente - essa definição diria respeito apenas à sua forma, nada indicando acerca de sua essência funcional. De resto, no regime jurídico ora em vigor, nem mesmo é possível qualificar a reclamação como simples incidente processual. Seu emprego não guarda necessariamente relação com um processo judicial em curso. A reclamação pode ter emprego autônomo, nos casos em que pode ser diretamente utilizada contra uma conduta administrativa. Tampouco é medida meramente acautelatória (ainda que uma medida urgente nela possa ser concedida, como se vê adiante). A reclamação não se presta a apenas suspender ou neutralizar o ato atacado, na pendência de outra medida. Ela é por si só apta a removê- lo. Enfim, não é providência instrumental a outra; não resguarda o resultado útil de outro instrumento. Cogita-se ainda tratar-se de garantia sui generis: um "remédio ou medida de direito processual constitucional" ou uma "garantia especial" enquadrável na noção amplíssima de direito de petição. Mas essa explicação não exclui o seu enquadramento, em termos gerais, em uma das categorias gerais dos instrumentos jurisdicionais - tal como se dá com o habeas corpus e o mandado de segurança, que são garantias constitucionais e nem por isso deixam de ter natureza jurídica de ação. Semelhantes considerações aplicam-se à reclamação. Ela é instrumento pelo qual se pede uma específica tutela jurisdicional; mecanismo por meio do qual se provoca a atuação de um órgão da Jurisdição. Portanto, é uma ação. O fato de a reclamação destinar- se a atacar inclusive decisões judiciais não prejudica essa qualificação. O mesmo se dá, por exemplo, com a ação rescisória e com os já mencionados habeas corpus e mandado de segurança, quando utilizados contra ato judicial. A disciplina legal da reclamação corrobora essa tese. O CPC/2015, ainda que sem qualificar a reclamação propriamente como ação: (1.º) não a inclui entre os recursos; (2.º) prevê a "citação" (como réu, portanto) do beneficiário do ato impugnado, para apresentar "contestação". 39.4. Autonomia da reclamação em face dos recursos judiciais e de outras medidas impugnativas O exercício da reclamação não afeta nem fica subordinado ao emprego de recursos ou outras medidas de impugnação contra a mesma decisão judicial (contra o ato administrativo, no caso da súmula vinculante, há um regime próprio, examinado no cap. 37. Já era esse o sentido da parte final do art. 7.º da Lei 11.417/2006 ("sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação"). O art. 988, § 6.º, apenas confirma essa diretriz ("A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação"). Isso significa que há independência e autonomia da reclamação em face do recurso ou outra medida impugnativa cabível (p. ex., pedido de suspensão de decisões contra o Poder Público). A circunstância de ele haver antes recorrido da decisão, sem êxito - seja porque lá não obteve liminar que a suspendesseintegralmente, seja porque seu recurso já foi até inadmitido ou desprovido, no todo ou em parte - não lhe obsta o exercício da reclamação e as possibilidades de êxito nessa via. E a recíproca é verdadeira. O insucesso na reclamação não obsta a insurgência por meio de recurso, desde que, obviamente, ainda não se tenha encerrado o prazo para tanto. No entanto, há exceções. Podem ser identificadas ao menos três hipóteses de interferência entre a faculdade recursal (ou impugnativa autônoma) e o direito à reclamação: (1.ª) quando já se obteve êxito integral em uma das duas vias: nessa hipótese, faltará interesse processual para o manejo da outra (p. ex., se em agravo de instrumento foi integralmente suspensa, cassada ou reformada a decisão, não cabe reclamação contra ela); (2.ª) se contra a sentença final não se interpuser recurso, ela transita em julgado e faz coisa julgada - tornando-se definitiva a sua eficácia. Desse momento em diante, não caberá mais reclamação (Súmula 734 do STF: "Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal"); (3.ª) na reclamação contra omissão ou ato administrativo violador de súmula vinculante, apenas cabe a reclamação ao Supremo Tribunal Federal depois de exauridas as possibilidades de recurso administrativo (Lei 11.417/2006, art. 7.º, § 1.º); (4.ª) do mesmo modo, contra a decisão que viola a força vinculante de decisão-quadro proferida no procedimento de recursos especiais ou extraordinários repetitivos, a reclamação apenas será cabível depois de exauridos os recursos ordinários (art. 988, § 5.º, II - na redação dada pela Lei 13.256/2016). 39.5. Legitimação ativa e passiva - Participação do Ministério Público A legitimidade ativa é atribuída à "parte interessada" e ao Ministério Público (CPC/2015, art. 988, caput). "Parte interessada" é aquela que sofre os efeitos jurídicos da decisão judicial ou do ato ou omissão administrativa objeto de que se pretende reclamar. Na esfera judicial, tal condição é detida não apenas pela parte no processo que sofre a decisão desfavorável. Também os terceiros prejudicados, que poderiam recorrer da decisão (CPC/2015, art. 996), estão legitimados para a reclamação. A legitimidade ativa do Ministério Público não é ilimitada. No que tange à reclamação contra decisões judiciais, cinge-se aos casos em que figura ou deveria ter figurado como parte ou fiscal da lei no processo em que o pronunciamento atacado foi proferido. Na reclamação contra ações e omissões administrativas, o parquet está ativamente legitimado nas mesmas hipóteses em que deteria legitimidade para promover outras ações judiciais (ação civil pública, ação de improbidade etc.). A autoridade administrativa ou judicial que praticou o ato (ou adotou a conduta omissiva) objeto da reclamação assume uma posição similar àquela detida pela autoridade coatora no mandado de segurança, especialmente quando esse volta-se contra ato judicial. A autoridade, nessa hipótese, é mero órgão do ente público em nome do qual ela atua. A ação não se volta pessoalmente contra ele (tanto é assim que, se o agente que praticou o ato for transferido, a ação não o acompanha: permanece formalmente vinculada ao cargo ou posto, independentemente de quem ora o ocupe). Cabe-lhe prestar informações acerca do ato praticado, defendendo-lhe a regularidade, se for o caso - no prazo de dez dias (art. 989, I). A pessoa que sofre a direta repercussão jurídica favorável do ato atacado deve necessariamente figurar no polo passivo da reclamação. Afinal, se a reclamação receber julgamento de procedência, será desfeito o ato que o beneficiou juridicamente. Vale dizer, sua esfera jurídica poderá ser diretamente afrontada. Por isso, ele é réu da ação de reclamação: é citado e recebe prazo de quinze dias para contestar (art. 989, III). Além disso, a lei confere ainda a qualquer outro "interessado" o direito de impugnar o requerimento do reclamante (CPC/2015, art. 990). Essa previsão abrange outros sujeitos com interesse jurídico meramente reflexo, que não deterão, portanto, a condição de litisconsortes necessários, mas poderão intervir como assistentes. Quando não for o próprio autor da reclamação, o Ministério Público deverá ser ouvido como fiscal da lei, em cinco dias (CPC/2015, art. 991). 39.6. Competência A reclamação por ofensa ou má-aplicação da súmula vinculante é sempre de competência do tribunal que teve a autoridade afrontada ou a competência usurpada. Será dirigida ao presidente do tribunal, distribuída a um relator e julgada pelo "órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir" (CPC/2015, art. 988, § 1.º). O Regimento Interno do STF permite que a reclamação seja decidida monocraticamente pelo relator sempre que a matéria for objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal (RISTF, art. 161, parágrafo único). No Supremo, essa regra é perfeitamente aplicável aos casos de reclamação por violação aos "precedentes" vinculantes arrolados nos inc. III e IV do art. 988, que sempre retratam uma consolidação jurisprudencial. Idêntica diretriz pode vir a ser aplicada aos demais tribunais, a depender da previsão nos respectivos regimentos internos. A previsão do art. 932, III a V, do CPC/2015 concerne especificamente a recursos. 39.7. Cabimento de medida urgente Presentes os requisitos da plausibilidade dos argumentos do reclamante e do perigo de danos irreparáveis ou de difícil reparação, cabe a concessão de medida urgente, destinada a suspender o ato objeto da reclamação. Há referência expressa a tal providência na disciplina específica da reclamação (CPC/2015, art. 989, II). A medida urgente pode ter outro objeto, que não o de apenas suspender o ato impugnado. Eventualmente, outras providências, ativas, são necessárias. Vigora o poder geral de concessão de medidas urgentes, detido por todos os juízes e tribunais (art. 300 e ss.). Em qualquer caso, vale a regra geral que subordina a concessão da tutela de urgência ao pedido da parte interessada. 39.8. Limites à cognição jurisdicional Há um duplo limite à cognição jurisdicional na reclamação. O primeiro é estabelecido pela exigência de prova pré-constituída. A reclamação deve ser desde logo instruída com prova documental (CPC/2015, art. 988, § 2.º). Em seu procedimento, concentrado e sumário, não há espaço para instrução probatória. Então, se não houver prova documental suficiente, não poderá haver cognição exauriente do objeto da reclamação. A segunda limitação põe-se no sentido horizontal. Mediante a reclamação, leva-se ao conhecimento do tribunal apenas a específica questão atinente à violação ou aplicação indevida do "precedente" vinculante. A causa como um todo - esteja ela já posta no Judiciário ou trate-se de conflito apenas ainda na esfera administrativa - não é objeto de exame no processo de reclamação. 39.9. A decisão da reclamação: efeitos e autoridade A reclamação será decidida por acórdão do órgão colegiado competente ou decisão monocrática do relator (v. n. 39.7, acima). O julgamento de procedência da reclamação implicará a anulação do ato administrativo ou a cassação da decisão judicial que contrarie o pronunciamento vinculante, negue-lhe vigência ou, no caso da súmula vinculante e da decisão quadro dos recursos ou causas repetitivas, aplique-as indevidamente. Quando o ato atacado implicar contrariedade ou negativa de vigência ao pronunciamento vinculante, a anulação ou cassação será acompanhada da determinação de que outro ato seja praticado aplicando-se corretamente a súmula. Caso o erro do ato anterior tenha residido na indevida aplicação da súmula a um caso em que ela era inaplicável, a decisão de procedência limitar-se-á à sua cassação ou anulação (Lei 11.417/2006, art. 7.º, § 2.º; CPC/2015, art. 992). Já quando a reclamação voltar-seapenas contra omissão administrativa violadora de súmula vinculante (Lei 11.417/2006, art. 7.º, § 1.º), seu julgamento de procedência não conterá obviamente nenhum comando anulatório. Veiculará apenas a determinação para a prática dos atos devidos em conformidade com a súmula. O ato que decide a reclamação tem conteúdo de sentença (ainda que veiculado em acórdão do colegiado ou decisão monocrática do relator). Trata-se de pronunciamento que resolve o mérito da demanda proposta (CPC/2015, art. 487). A exemplo do que ocorre no mandado de segurança, o julgamento do mérito fica condicionado à existência de prova pré-constituída dos fatos relevantes para o seu objeto - de modo que, faltando essa prova documental, extingue-se a reclamação nos termos do art. 485, IV. Havendo prova pré-constituída, a cognição desenvolvida no processo da reclamação é exauriente, nos limites específicos do seu objeto, i.e., limitadamente à aferição de existência de violação ou indevida aplicação da súmula vinculante. Em suma, há cognição aprofundada, porém parcial. Por isso, dentro desses limites, o ato que decide o mérito da reclamação é apto a revestir-se de coisa julgada material (art. 502 - v. cap. 40, adiante). O julgamento de procedência da reclamação tem eficácia imediata. O Presidente do Tribunal determinará o pronto cumprimento da decisão, antes mesmo da lavratura do acórdão (CPC/2015, art. 993). A decisão de procedência da reclamação tem eficácia declaratória, no ponto em que reconhece que a conduta atacada viola ou aplica indevidamente a súmula vinculante. Tem ainda eficácia desconstitutiva, quando anula ou cassa o ato impugnado, e mandamental, quando determina a prática de outro ato em conformidade com a súmula. 39.10. Recursos Contra as decisões do relator, na hipótese de concessão de medida urgente ou de decisão final, cabe agravo interno (CPC/2015, arts. 1.021 e 1070). Cabem também embargos declaratórios, pois esses são aplicáveis a toda e qualquer decisão judicial. Contra o acórdão proferido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal cabem apenas embargos declaratórios. Contra os acórdãos proferidos pelos demais tribunais, em reclamação, caberá recurso especial e (ou) recurso extraordinário, a depender dos específicos pressupostos recursais. Força vinculante (em sentido estrito) e reclamação: medida urgente e acórdão final de acolhimento ou improcedência do pedido na ADI, ADC, ADPF e na súmula vinculante; decisão-quadro no procedimento de recursos especiais ou extraordinários repetitivos; decisão-quadro no incidente de resolução de demandas repetitivas; decisão do incidente de assunção de competência. Objeto e função Assegurar a observância de pronunciamentos com força vinculante erga omnes Preservar a autoridade de decisões inter partes Resguardar a competência do tribunal Finalidade repressiva Natureza jurídica Ação Autonomia Recursos Outras medidas impugnativas Legitimidade Ativa → parte interessada e Ministério Público Passiva Autoridade administrativa ou judicial que praticou o ato (ou adotou a conduta omissiva) → vinculação ao cargo ou posto Quem se beneficiou com a decisão objeto da reclamação Impugnação ao requerimento do reclamante Qualquer interessado Intervenção do Ministério Público Competência Tribunal que teve a autoridade afrontada ou acompetência usurpada Medida urgente Fumus boni iuris e periculum in mora Limites à cognição jurisdicional Exigência de prova pré-constituída Limitação no sentido horizontal Decisão da reclamação Acórdão do órgão colegiado competente ou decisão monocrática do relator Anulação do ato administrativo ou a cassação da decisão judicial Determinação de que outro ato seja praticado - aplicando- se corretamente a súmula Conteúdo de sentença Eficácia imediata Recursos Doutrina Complementar · Alexandre Freitas Câmara (O Novo Processo..., p. 485; 486) narra situações peculiares de cabimento da reclamação: "Caso interessante de cabimento da reclamação é aquele em que o juízo de primeiro grau profere decisão de inadmissão de apelação. É que, por força do disposto no art. 1.010, § 3.º, não é de competência do juízo de primeira instância exercer juízo de inadmissibilidade de apelação. Tal exame cabe, originariamente, ao tribunal de segundo grau. Assim, decisão do juízo de primeira instância que declare inadmissível a apelação é ato de usurpação de competência do tribunal de segundo grau. Ocorre que tal decisão, de natureza interlocutória, não é impugnável por agravo de instrumento (art. 1.015), motivo pelo qual a reclamação será, na hipótese, a única via processual adequada para impugnar-se aquele ato jurisdicional praticado por órgão desprovido de competência para praticá-lo (em sentido equivalente, FPPC, enunciado 208: 'Cabe reclamação, por usurpação de competência do Superior Tribunal de Justiça, contra a decisão de juiz de 1.º grau que inadmitir recurso de apelação'). (...) Outro caso pode ser figurado: juízo de primeira instância indefere inversão do ônus da prova requerida pelo autor. Desta decisão se interpõe agravo de instrumento (art. 1.015, XI), que vem a ser provido, determinando o tribunal uma nova distribuição de ônus probatórios. O juízo de primeiro grau, então, emite, pronunciamento em que comunica às partes que julgará a causa sem inversão do ônus da proa, por entender não ser o caso de invertê-lo. Este pronunciamento, como parece claro, desrespeita a autoridade da decisão do tribunal, e pode ser impugnado por via de reclamação". · Eduardo José da Fonseca Costa (Breves..., p. 2.201) diferencia os institutos da reclamação e da correição parcial: "Reclamação e correição parcial não se confundem. Correição parcial é um remédio que regimentos internos de tribunais soem prever para atacarem-se omissões judiciais ilegais (por exemplo, recusa obstinada à apreciação do pedido de liminar) ou (b) inversões tumultuárias da ordem legal do processo (por exemplo, exigência dos memoriais escritos antes do saneamento do processo), das quais não caiba recurso de agravo. Hoje, a maior funcionalidade do instituto está no combate às omissões, já que não cabe agravo de instrumento de omissão, que é uma não decisão, um nada. Não tem natureza recursal (pois sem previsão em lei), administrativa (pois repercute em processo jurisdicional) ou disciplinar (pois não apura infração funcional de magistrado). (...) A reclamação também não se limita a um mero incidente (...). O incidente destina-se a evitar tumulto processual: i) nele se resolvem questões prévias (preliminares ou prejudiciais); ii) os debates e a decisão são autuados em apartado; iii) o procedimento principal pode ou não ser suspenso ou interrompido em função da simples instauração do incidente; iv) o procedimento principal pode findar-se ou não em função do que se decidir no incidente; v) o incidente é resolvido pelo próprio juiz da causa ou por tribunal; vi) o incidente deve ser decidido antes da questão principal ou do mérito da causa; vii) o procedimento incidental é acessório ao procedimento principal. Mais uma vez se nota que esses traços não descrevem a reclamação: formalmente, não se resume a um pedaço procedimental processado em paralelo; objetivamente, não se debruça sobre questão prévia (a menos que o juiz reclamado, ao decidi-la, afronte decisão de tribunal, precedente ou súmula vinculante); teleologicamente, não é antitumultuária. Ademais, o processo reclamatório não é acessório, mas autônomo; nem sempre se refere a processo preexistente (ex.: reclamação para a garantia da observância de súmula vinculante). Por fim, reclamação não é recurso (...)". · Humberto Theodoro Júnior (Curso..., 47. ed., vol. 2, p. 931) descreve os aspectos históricos do surgimento do instituto da reclamação: "De início o Supremo Tribunal Federal entendeu que os Estados não poderiam adotar igual expediente por meio desuas Constituições, leis locais ou regimentos internos, uma vez que somente à União cabe legislar sobre processo civil. Posteriormente, no entanto, houve uma guinada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que qualificou a reclamação não entre os recursos e tampouco entre as ações e incidentes processuais, e a situou 'no âmbito do direito constitucional de petição previsto no art. 5.º, XXXIV, da Constituição Federal'. E, assim entendendo, concluiu que sua adoção pelos Estados, por meio de lei local, 'não implica invasão da competência privativa da União para legislar sobre direito processual (art. 22, I, CF/1988)'. Fundamentou-se o novo entendimento do Supremo Tribunal Federal no argumento de que a 'reclamação constitui instrumento que, aplicado no âmbito dos Estados-membros, tem como objetivo evitar, no caso de ofensa à autoridade de um julgado, o caminho tortuoso e demorado dos recursos previstos na legislação processual, inegavelmente inconvenientes quando já tem a parte uma decisão definitiva. Visa, também, à preservação da competência dos Tribunais de Justiça estaduais, diante de eventual usurpação por parte de juízo ou outro Tribunal local'. Concluiu o aresto do Supremo Tribunal Federal por reconhecer que 'a adoção desse instrumento pelos Estados- membros, além de estar em sintonia o princípio da simetria, está em consonância com o princípio da efetividade das decisões judiciais'. (...) Embora admitindo a possibilidade de adoção da reclamação no âmbito de outros tribunais, além do STF e do STJ, o entendimento assentado pelo STF é no sentido de ser imprescindível lei para introduzir o mecanismo processual, ainda que seja lei local. Inadmissível fazê-lo por simples norma de regimento interno. O novo CPC, na esteira do entendimento do STJ e do STF, ampliou, adora por lei processual federal, a possibilidade de interposição da reclamação para 'qualquer tribunal', atribuindo o seu julgamento 'ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir' (art. 988, § 1.º)". · Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery (Comentários..., p. 1.979) comentam que a reclamação se presta a preservar a competência do tribunal e garantir a autoridade da decisão do tribunal: "Quando há efetiva invasão na competência do tribunal, o sistema coloca à disposição da parte, do interessado e do MP a reclamação, cuja procedência fará garantir a preservação da competência do tribunal. Pode ocorrer essa invasão quando deduzido pedido de declaração de inconstitucionalidade de lei perante juízo que não seja o STF. A competência para tanto é do Pretório Excelso, segundo expressa disposição da art. 102, I, a, da CF/1988. Pode haver ajuizamento de ação cujo pedido seja, v.g., o cancelamento de lançamento tributário, fundado em inconstitucionalidade de lei. A inconstitucionalidade, se declarada pelo juízo singular, será por decisão incidenter tantum, mas não principaliter. Não fará coisa julgada (art. 504 do CPC/2015) e a ela não se aplica a extensão prevista no art. 503, § 1.º, do CPC/2015 porque o juízo competente para conhecer desse pedido não é o competente para julgar a causa principal. (...) As decisões do tribunal, nos limites de sua competência, tem de ser cumpridas e respeitadas. Quando ocorre o não cumprimento à determinação jurisdicional do tribunal, cabe a reclamação para que a parte, o interessado e o MP possam fazer valer essa autoridade. O juiz não está adstrito à fundamentação da decisão do tribunal, pois fundamento de decisão não faz coisa julgada (art. 504 do CPC/2015), isto é, não obriga, não vincula, não se reveste da imperatividade e da inevitabilidade da jurisdição. Não é ofensa à autoridade das decisões de determinado Tribunal a decisão de juiz que adotar uma tese jurídica diferente, sem infirmar ou questionar o preceito contido no decisório da decisão superior (...)". · Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello (Primeiros..., p. 1.421), a respeito da legitimidade para impugnação do pedido do reclamante (art. 990, CPC/2015), afirmam: "Este dispositivo também traz a expressão interessado, mencionando 'qualquer' interessado, e lhe atribui legitimidade para impugnar o pedido do reclamante. Mas, como se viu, este interessado não é réu. Trata-se de terceiro que de alguma forma será atingido pela decisão. O raciocínio aqui é análogo àquele que se faz quando se concebe a necessidade de que haja alguma relação entre um sujeito e um tema: pertinência temática. A esfera ou a atividade deste terceiro, que pode impugnar a reclamação, tem que apresentar alguma ligação com a questão sobre a qual se discute". Enunciados do FPPC N.º 207. (Art. 988, I; art. 1,010, § 3.º; art. 1.027, II, "b", CPC/2015) Cabe reclamação, por usurpação da competência do tribunal de justiça ou tribunal regional federal, contra a decisão de juiz de 1.º grau que inadmitir recurso de apelação. N.º 208. (Art. 988, I; art. 1.010, § 3.º; art. 1.027, II, "b", CPC/2015) Cabe reclamação, por usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça, contra a decisão de juiz de 1.º grau que inadmitir recurso ordinário, no caso do art. 1.027, II, 'b'. N.º 209. (Art. 988, I; art. 1.027, II; art. 1.028, § 2.º, CPC/2015) Cabe reclamação, por usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça, contra a decisão de presidente ou vice-presidente do tribunal de 2º grau que inadmitir recurso ordinário interposto com fundamento no art. 1.027, II, "a". N.º 210. (Art. 988, I; art. 1.027, I; art. 1.028, § 2.º, CPC/2015) Cabe reclamação, por usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, contra a decisão de presidente ou vice-presidente de tribunal superior que inadmitir recurso ordinário interposto com fundamento no art. 1.027, I. N.º 349. (Art. 982, § 5.º; art. 988, CPC/2015) Cabe reclamação para o tribunal que julgou o incidente de resolução de demandas repetitivas caso afrontada a autoridade dessa decisão. N.º 350. (Art. 988; art. 15, CPC/2015) Cabe reclamação, na Justiça do Trabalho, da parte interessada ou do Ministério Público, nas hipóteses previstas no art. 988, visando a preservar a competência do tribunal e garantir a autoridade das suas decisões e do precedente firmado em julgamento de casos repetitivos. N.º 363. (Art. 1.036 a 1.040, CPC/2015) O procedimento dos recursos extraordinários e especiais repetitivos aplica-se por analogia às causas repetitivas de competência originária dos tribunais superiores, como a reclamação e o conflito de competência. N.º 483. (Art. 1.065, CPC/2015; art. 50 da Lei 9.099/1995; Res. 12/2009 do STJ) Os © desta edição [2016] embargos de declaração no sistema dos juizados especiais interrompem o prazo para a interposição de recursos e propositura de reclamação constitucional para o Superior Tribunal de Justiça. N.º 558. (Art. 988, IV, § 1.º; art. 927, III; art. 947, § 3.º, CPC/2015) Caberá reclamação contra decisão que contrarie acórdão proferido no julgamento dos incidentes de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência para o tribunal cujo precedente foi desrespeitado, ainda que este não possua competência para julgar o recurso contra a decisão impugnada. Bibliografia Fundamental Alexandre Freitas Câmara, Onovo processo civil brasileiro, São Paulo, Atlas, 2015; Humberto Theodoro Júnior, Curso de direito processual civil, 47. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2016, vol. 2; Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo, Ed. RT, 2015; Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini e Bruno Dantas (coord.), Breves comentários ao novo Código de Processo Civil, São Paulo, Ed. RT, 2015; _____, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello, Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo, SãoPaulo, Ed. RT, 2015. Complementar Ada Pellegrini Grinover, Da reclamação, Doutrinas Essenciais de Processo Civil 6/1.135; Alexandre Moreira Tavares dos Santos, Da reclamação, Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional 10/1.873; Breno Baía Magalhães, Considerações acerca da natureza jurídica da reclamação constitucional, RePro 219/399; Cláudia Helena Poggio Cortez, O cabimento de reclamação constitucional no âmbito dos juizados especiais estaduais, RePro 188/253; Daniel Brajal Veiga, O caráter pedagógico da reclamação constitucional e a valorização do precedente, RePro 229/40; Eduardo Cambi e Vinícius Secafen Mingati, Nova hipótese de cabimento da reclamação, protagonismo judiciário e segurança jurídica, Doutrinas Essenciais de Processo Civil 6/1.251; Glauco Gumerato Ramos, Reclamação no Superior Tribunal de Justiça, RePro 192/369; José da Silva Pacheco, A "reclamação" no STF e no STJ de acordo com a nova constituição, Doutrinas Essenciais de Processo Civil 6/1.045; Leonardo Lins Morato, A reclamação prevista na Constituição Federal. In: Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos, 3ª série, São Paulo, Ed. RT, 2000; Lucas Buril De Macêdo, Reclamação constitucional e precedentes obrigatórios, RePro 238/413; Osmar Mendes Paixão Côrtes, A reclamação no novo CPC - fim das limitações impostas pelos tribunais superiores ao cabimento?, RePro 244/347; Pedro Miranda de Oliveira, Aspectos destacados da reclamação no novo Código de Processo Civil, RePro 247/299; Renato de Oliveira Alves, A reclamação constitucional no STF, RDCI 80/67.
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