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REFORMA TRABALHISTA INTERPRETADA E COMENTADA Gustavo Cisneiros Juiz do Trabalho Professor de Direito do Trabalho e de Direito Processual do Trabalho Palestrante Autor do livro Direito do Trabalho Sintetizado Autor do livro Processo do Trabalho Sintetizado Autor do livro Manual de Prática Trabalhista Autor do livro Manual de Audiência e Prática Trabalhista – 3ª Edição Coautor do livro Série Método de Estudo OAB - Doutrina - Volume Único Coautor do livro Série Método de Estudo OAB - Questões Comentadas - Volume Único (Todas as obras foram publicadas pela Ed. Método) www.gustavocisneiros.com.br ☞ Os dispositivos afetados pela Reforma Trabalhista estão em negrito. ☞ Os dispositivos que não sofreram alteração estão em itálico. ☞ Abaixo de cada alteração, consta o pertinente comentário. GRUPO ECONÔMICO Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. § 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. § 2 o Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego. Comentário A definição de grupo econômico, esculpida, antes das alterações impostas pela Lei 13.467/2017, no § 2º do art. 2º da CLT, contemplava apenas o “grupo vertical”, também chamado de “grupo por subordinação”, que tem como premissa a existência de uma empresa que dirige e fiscaliza as demais, como uma espécie de holding (empresa que detém a posse majoritária de ações de outras empresas, denominadas subsidiárias, centralizando o controle sobre elas). A velha CLT, portanto, quanto à definição de grupo econômico, nunca foi capaz de fixar um mínimo de segurança jurídica, algo imprescindível, afinal a norma prevê a responsabilização solidária de todas as empresas. Essa nebulosa timidez legislativa fez aflorar na doutrina uma infindável discussão sobre a sua abrangência, regurgitando em decisões judiciais disformes e, algumas vezes, iníquas. Trinta anos depois da publicação da CLT, veio à tona a fragilidade da antiga definição de grupo econômico, mediante a impactante redação do § 2º do art. 3º da Lei 5.889/1973 (Estatuto do Trabalho Rural), que passou a consagrar, no universo legiferante, o “grupo horizontal”, também chamado de “grupo por coordenação”, que já contava com respaldo doutrinário e jurisprudencial (grupo econômico sem a presença de uma empresa líder, ou seja, preservando a autonomia de cada uma de suas empresas). 1 A Reforma Trabalhista, instituída pela Lei 13.467/2017, nada mais fez do que “atualizar” a já ultrapassada redação do § 2º do art. 2º da CLT, reconhecendo a existência tanto do “grupo vertical”, como do “grupo horizontal”, ou seja, não é indispensável, para a configuração do grupo econômico, a existência de uma empresa “mãe” (holding). Assim sendo, sempre que uma ou mais empresas estiverem sob a direção, controle ou administração de outra (grupo vertical), ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia (grupo horizontal), integrarem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego. A solidariedade, por sua vez, continua sendo dual (ativa e passiva), à luz de consagrada corrente doutrinária e jurisprudencial, permanecendo ativa e eficaz a previsão contida na Súmula 129 do TST. Passiva pelo fato de todas as empresas responderem solidariamente. Ativa pelo fato de o empregado poder trabalhar para mais de uma empresa do grupo, sem que isso caracterize a existência de mais de um contrato de trabalho, mantendo a tese de que o empregador é o grupo (grupo como empregador único), possibilitando a inclusão de empresas no polo passivo da execução trabalhista, mesmo que elas não tenham participado do processo de conhecimento (entendimento perpetuado pelo cancelamento da Súmula 205 do TST no dia 21/11/2003). No § 3º do art. 2º da CLT, que será analisado a seguir, o legislador fixou os pressupostos do grupo econômico. § 3 o Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes. Comentário Há grupos econômicos verticais de notória existência, desaguando, com naturalidade, a responsabilidade solidária que une as respectivas empresas que o integram (fatos notórios prescindem de provas, como bem dispõe o art. 374, I, do CPC). Essa notoriedade continua, pois, no grupo econômico vertical, marcado pela presença de uma empresa que lidera as demais, a presunção quanto ao “interesse comum” e à “atuação conjunta” é absoluta (juris et de jure). Eis a nossa primeira conclusão. Sempre defendemos que a marca de um grupo econômico está na presença daquilo que une os “sócios de um empreendimento”: a affectio societatis (a colaboração dos sócios na realização do objeto da sociedade, buscando um fim comum, à procura de um resultado a partilhar). Nossos alunos sempre ouviram isso. Pois bem. A Lei 13.467/2017 incluiu o § 3º no art. 2º da CLT, restringindo, corretamente, norma de exceção, dispondo, inicialmente, que um grupo econômico não se caracteriza, por si só, pela “mera identidade de sócios”. Entendam. A identidade de sócios entre determinadas empresas não representa, por si só, uma prova cabal da presença de grupo econômico (será apenas um indício, capaz de gerar presunção relativa de veracidade), porém, de outra banda, a identidade de sócios não é um requisito sine qua non para a caracterização de um grupo econômico, o qual pode existir mesmo que os sócios das empresas sejam diferentes. Eis uma conclusão importante. Exemplificando. José pode ser sócio de Manoel em determinado empreendimento que vem rendendo lucros razoáveis. Daí José resolve investir parte do seu capital (não é o capital da empresa, mas dinheiro seu) em outra empresa. Para muitos, o fato de José ser sócio na empresa A e sócio na empresa B já caracterizaria grupo econômico entre as empresas A e B, independentemente da atuação das empresas. Com a Reforma Trabalhista, cai por terra esse único fundamento. Significa dizer que o juiz do trabalho não mais poderá fundamentar a sua decisão, quanto à existência de um grupo econômico, apenas no fato de as empresaspossuírem sócios em comum. A reação do legislador foi natural, contra certos “exageros” hermenêuticos. O novo § 3º do art. 2º da CLT, além disso, impõe, para a configuração do grupo, a “demonstração do interesse integrado”, a “efetiva comunhão de interesses” e “a atuação conjunta das empresas dele 2 integrantes”. São três pressupostos cumulativos. Enxergamos, nos dois primeiros, um só. Já estamos acostumados com essa carência de objetividade do nosso legislador, viciado em obscuridades, fruto do seu despreparo, data maxima venia. “Interesse integrado” nada mais é do que “interesse comum”. E “comunhão de interesses” nada mais é do que “interesse comum”. Haja paciência para decifrar tanta besteira. “Interesse comum entre as empresas”, consequentemente, é o primeiro pressuposto do grupo econômico (reunindo os dois primeiros que constam do § 3º), desaguando na já comentada affectio societatis. Grupo econômico, conforme dito, nada mais é do que uma “sociedade entre empresas”, com a natural presença de comunhão de interesses, integrados por atuação conjunta, na busca de um fim comum. Essa cautela do legislador, ao estipular pressupostos, mostra-se compreensível, principalmente pelo arroubo de muitos juízes do trabalho que, na fase de execução, sem garantia do contraditório e da ampla defesa, simplesmente exaram decisões “reconhecendo” a existência de grupos econômicos por indícios e/ou suspeitas, sem qualquer critério técnico-jurídico. O terceiro pressuposto (atuação conjunta) é o mais importante e provocará acirradas discussões, pois exige “atuação conjunta das empresas”. Importante lembrar que nos grupos verticais de notória existência haverá uma natural presunção (absoluta) da presença de todos os pressupostos, pois a liderança/direção/fiscalização de uma delas e a subordinação das demais tornarão a responsabilidade solidária inafastável, inclusive pela aplicação supletiva do art. 942 do CCB. Nos grupos horizontais, contudo, diante da autonomia das empresas, os pressupostos terão que ser comprovados. A depender do caso e, principalmente, dos indícios, o ônus da prova poderá pesar sobre os ombros do reclamante ou do reclamado. Existindo um indício (como, por exemplo, a identidade de sócios), entendemos que a existência de grupo horizontal já gozará de presunção relativa de veracidade (juris tantum), que poderá ser elidida por prova em contrário (ônus probante do réu, que estará levantando um fato impeditivo do direito do autor – art. 818, II, da CLT e art. 373, II, do CPC). Não existindo qualquer indício, o fardo probante ficará sobre os ombros do reclamante. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR Art. 4º Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. § 1 o Computar-se-ão, na contagem de tempo de serviço, para efeito de indenização e estabilidade, os períodos em que o empregado estiver afastado do trabalho prestando serviço militar e por motivo de acidente do trabalho. Comentário Nada mudou com a “nova” redação do § 1º do art. 4º da CLT (mantendo a previsão do antigo parágrafo único do art. 4º da CLT), perdendo, o legislador, a oportunidade de esclarecer que o serviço militar refere-se ao “serviço militar obrigatório”, no qual a pessoa passa à condição de conscrito (§ 2º do art. 14 da CF). O legislador também “pisou na bola” ao manter a velha redação que fala de “indenização e estabilidade”, fruto da época em que não existia FGTS e havia a estabilidade decenal (art. 492 da CLT). O que o § 1º do art. 4º da CLT quer dizer, já está dito no § 5º do art. 15 da Lei 8.036/1990. Durante os períodos de serviço militar obrigatório e de benefício previdenciário por acidente do trabalho (percepção de auxílio-doença acidentário – Código B-91), apesar de o contrato de trabalho se encontrar suspenso, o empregador terá que recolher mensalmente o FGTS do obreiro. Só isso. Apenas isso. Nada mais do que isso. Sempre é bom lembrar que, no caso de acidente do trabalho, a obrigação fundiária cessa quando o benefício for 3 convertido pelo INSS em aposentadoria por invalidez, à luz de posição pacífica do TST, sob o fundamento de que as normas de exceção devem ser interpretadas restritivamente. § 2o Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1 o do art. 58 desta Consolidação, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras: I - práticas religiosas; II - descanso; III - lazer; IV - estudo; V - alimentação; VI - atividades de relacionamento social; VII - higiene pessoal; VIII - troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa. Comentário O caput art. 4º da CLT, mantido pela Reforma Trabalhista, sempre representou um tormento para o empregador, podendo ser apontado como fato gerador do horário in itinere (extinto pela Lei 13.467/2017, mediante a expressa revogação dos §§ 2º e 3º do art. 58 da CLT), da aplicação por analogia do horário de sobreaviso (§ 2º do art. 244 da CLT e Súmula 428 do TST), do limite de 10 minutos diários no percurso entre a portaria da empresa e o efetivo local de trabalho (Súmula 429 do TST – previsão fulminada pela nova redação do § 2º do art. 58 da CLT), entre outros desdobramentos legais, doutrinários e jurisprudenciais. De fato, a redação do caput do art. 4º da CLT é contundente, e, uma vez desprovida de ressalvas, mostra-se capaz de nocautear o empregador negligente quanto ao exercício do seu poder de fiscalização. A norma simplesmente diz que será considerado como tempo efetivo de serviço (remunerado, portanto) o período em que o empregado “esteja à disposição do empregador”. E o que é “estar à disposição”? Essa expressão sempre contou com interpretações extensivas, pois o legislador nunca se preocupou em cravar qualquer ressalva. No final do caput do art. 4º da CLT, o legislador consolidado já fixava a natural liberdade para a restrição legal à norma (salvo disposição especial expressamente consignada). Essas “ressalvas” nasceram com a Reforma Trabalhista, mediante o novo § 2º do art. 4º da CLT, o qual esclarece que não será considerado “tempo à disposição do empregador” aquele no qual o empregado, por “escolha própria”, adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para “buscar proteção pessoal”, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, ou para “exercer atividades particulares”. Sabemosque existe um limite de tolerância para “atraso” e “permanência” (início da jornada e término da jornada), fixado em 10 minutos diários, pelo § 1º do art. 58 da CLT, rigidamente fracionados em até 5 minutos na entrada e até 5 minutos na saída, como dispõe a Súmula 366 do TST. As ressalvas do § 2º do art. 4º da CLT, naturalmente, dizem respeito ao empregado que extrapola o limite, quer chegando antes de 5 minutos, quer largando depois da referida tolerância. Para que o tempo de permanência nas dependências da empresa não seja computado na jornada laboral, é preciso que a presença do empregado naquele local tenha decorrido de vontade própria, ou seja, ele ali está “esperando a chuva passar”, “revisando a matéria da prova que fará na faculdade”, “protegendo-se de uma manifestação que está ocorrendo na rua” 4 etc. Se o empregado permanecer no trabalho, além do limite de tolerância (05min), por imposição patronal, mesmo que não seja para trabalhar, esse tempo será considerado “à disposição do empregador”, e, naturalmente, computado na jornada laboral. Como fica a questão na distribuição do ônus da prova? O reclamante vai dizer que laborava além do horário, especificando a sobrejornada, e, caso a empresa junte cartões de ponto válidos (Súmula 338 do TST), afirmando que o obreiro largava no horário ali consignado, o advogado do reclamante impugnará os documentos, dizendo que o seu cliente era obrigado a “bater o ponto” e a “continuar trabalhando”. Nesse caso, o ônus da prova será do empregado, pois o empregador simplesmente negou o labor extraordinário e produziu prova documental apropriada. Mas se o reclamante disser que laborava além do horário, especificando a sobrejornada, e a empresa alegar que de fato o obreiro permanecia no estabelecimento patronal fora da jornada, mas “por vontade própria”, o ônus da prova será do empregador, o qual estará admitindo o fato (permanência além do horário), mas, em contrapartida, levantando um fato impeditivo do direito do autor (vontade própria por determinado motivo) – art. 818, II, da CLT e art. 337, II, do CPC. Importante destacar que o “tempo à disposição” continua sendo regra, ou seja, haverá sempre uma presunção de que a permanência do empregado fora do horário de labor ocorreu por exigência patronal. Em primeiro lugar, pela própria construção legal, que deixa claro, ao impor requisitos, que a “escolha própria” é uma exceção, e, como tal, deve ser cabalmente provada. Em segundo lugar, pela condição de chefia patronal, poder diretivo que é indeclinável. Logo, excepcionalmente, quando o empregado, “por escolha própria”, permanecer nas dependências da empresa, seja para “buscar proteção pessoal”, no caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, seja para “exercer atividades particulares”, o tempo de permanência não será computado em sua jornada, cabendo ao empregador comprovar o fato. Desnecessariamente, data maxima venia, o legislador, no § 2º do art. 4º da CLT, lançou mão de um rol meramente exemplificativo, listando o que seriam “atividades particulares”, opção sempre reprovável, pois legislador tagarela é legislador frágil. Eis as atividades particulares elencadas nos incisos I a VIII do § 2º do art. 4º da CLT: práticas religiosas; descanso; lazer; estudo; alimentação; atividades de relacionamento social; higiene pessoal; troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa. Esse tempo não será considerado “à disposição do empregador” apenas quando o empregador permanecer nas dependências patronais “por escolha própria”. Logo, se “as atividades de relacionamento social” decorrem de um programa desenvolvido pela empresa, o tempo será computado na jornada. O mesmo raciocínio serve para a “higiene pessoal”, pois o empregado pode exercer uma função que o deixe sujo, fedido, manchado etc., exigindo sempre um banho e a higienização, tempo este gerado pelo trabalho, devendo ser computado na jornada. Na “troca de roupa”, o legislador foi mais preciso, citando a obrigatoriedade de realizar ou não a troca nas dependências da empresa. É o que ocorre com um empregado que precisa usar equipamentos de proteção individual, guardados na empresa, ou a vendedora de uma loja de grife que precisa vestir, no início do expediente, determinada roupa da própria loja, trocando-a, no final do dia. FONTES DO DIREITO DO TRABALHO Art. 8º As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. § 1o O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho. 5 Comentário O § 1º do art. 8º substituiu o antigo parágrafo único, e, neste particular, a Reforma Trabalhista apresentou o seu cartão de visita. A antiga redação dizia que o direito comum era fonte subsidiária do direito do trabalho, “ desde que não fosse incompatível com os princípios fundamentais do direito laboral”. Assim sendo, no caso de lacuna na legislação trabalhista, o aplicador do direito do trabalho não estava autorizado a aplicar subsidiariamente toda e qualquer norma do direito comum, sendo necessária a análise da compatibilidade (harmonia) da norma com os princípios do direito do trabalho. Essa exigência foi extirpada do art. 8º da CLT, demonstrando a intenção da Lei 13.467/2017 de tornar o direito comum fonte subsidiária do direito do trabalho, independentemente da compatibilidade da previsão normativa com os seus princípios fundamentais. Na era pós-positivista em que vivemos, os princípios possuem importância ímpar na elaboração, na interpretação e na aplicação do direito, pois os princípios representam valores, protegidos, portanto, contra o tempo. O princípio maior do direito do trabalho é o da proteção ao hipossuficiente e não há Reforma Trabalhista que seja capaz de derrubá-lo, pois ele deriva do princípio maior do nosso sistema jurídico: o princípio da dignidade da pessoa humana. Proteger o empregado é proteger a pessoa humana, exatamente porque não há como separá-los. Quem protege o ser humano (trabalhador) não é o juiz, já que ele tem o dever de ser imparcial em sua atuação jurisdicional, mas a legislação trabalhista. A intenção do legislador, por conseguinte, de elevar o grau de incidência do direito comum, principalmente do direito civil e do direito empresarial, sobre o direito do trabalho, não surtirá os efeitos almejados, pois os valores (princípios) estão encravados no nosso sistema jurídico, independentemente de previsão legal. O CPC/2015 retrata bem o pós-positivismo e aimportância dos princípios, quando, no seu art. 1º, diz que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição Federal. Observem a modernidade do CPC/2015, submetendo o direito instrumental ao crivo dos valores, ou seja, dos princípios. Frágil, por conseguinte, a dolosa tentativa de irradiar, sem limites, no caso de lacuna na legislação trabalhista, o direito comum sobre as relações de emprego, porquanto a “autonomia da vontade individual”, presente no direito civil e no direito empresarial, não guarda consonância com a “subordinação jurídica” e o “poder patronal”, que são as marca da relação empregatícia, mantidas nos arts. 2º e 3º da CLT. § 2 o Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei. Comentário O dispositivo nasceu como uma ordem, um comando normativo, dizendo que “o TST não é legislador, mas apenas intérprete e aplicador do direito”. A Reforma Trabalhista foi feliz, neste ponto. De fato, ao longo dos anos presenciamos o TST, sem qualquer pudor, legislar sobre direito e processo do trabalho, restringindo direitos legalmente previstos, como no caso da qualidade de preposto, e criando obrigações não previstas em lei, como no caso da ultratividade de acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho. O novo § 2º do art. 8º da CLT, por si só, soterrará súmulas, orientações jurisprudenciais, precedentes normativos e instruções normativas do TST que apresentem esse tipo de vício. Ao longo da obra, vamos aproveitar para especificar as previsões jurisprudenciais que foram fulminadas. 6 § 3 o No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva. Comentário O objetivo da Reforma foi o de fortalecer a negociação coletiva, ou, como se propagou, estabelecer, dentro de certos limites, a prevalência do negociado sobre o legislado. Antes, o operador do Direito do Trabalho, quando se deparava com mais de uma norma aplicável ao caso concreto (fonte formal heterônoma ou autônoma), optava automaticamente pela mais favorável ao obreiro. Isso acabou! O aplicador do direito, agora, terá que analisar a situação de cada categoria profissional, ou seja, caso a caso. Estudaremos esse tema quando da análise dos artigos 611- A e 611-B da CLT. Pois bem. O novo § 3º do art. 8º da CLT pretende restringir a atuação dos juízes do trabalho na análise da validade de cláusula prevista em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, dispondo que a Justiça do Trabalho analisará “exclusivamente” a conformidade do pacto coletivo com os elementos essenciais do negócio jurídico, listados no art. 104 do CCB, que estipulam os requisitos para a validade do ato: (I) agente capaz; (II) objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e (III) forma prescrita ou não defesa em lei. Quanto à capacidade dos sujeitos coletivos, o inciso VI do art. 8º da CF, com a sua consagrada interpretação restritiva, continua soberano, dispondo que é obrigatória a participação da entidade sindical nas negociações coletivas (obrigatoriedade aplicável apenas ao sindicato da categoria profissional, pois o empregador continua podendo negociar individualmente, sem a representatividade sindical, permanecendo vivo o acordo coletivo de trabalho). A forma também não sofre qualquer mudança, já que a CLT sempre exigiu que os acordos coletivos e as convenções coletivas fossem firmados por escrito, sem emendas ou rasuras (parágrafo único do art. 613 da CLT). O imbróglio está na “licitude do objeto”. A priori, como sempre aconteceu, as previsões constantes nos acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho serão prestigiadas, à luz do art. 7º, XXVI, da CF, hoje com abrangência maior, por conta do art. 611-A da CLT. Porém, a cláusula negocial coletiva que estiver maculada pelo vício da renúncia obreira (concessão unilateral injustificada/concessão sem contrapartida) constituirá, indubitavelmente, objeto ilícito, passível, portanto, de anulação. Expliquemos. Os pactos normativos frutificam de negociações marcadas por concessões recíprocas (transação – art. 840 do CCB). Logo, se a norma coletiva traduzir renúncia (concessão unilateral sem qualquer justificativa plausível/aceitável/razoável) da categoria profissional, representada pela entidade sindical, a cláusula infringente poderá ser anulada pelo juiz do trabalho, a requerimento da parte lesada ou até mesmo de ofício, já que a Reforma Trabalhista manteve intacto o poderoso art. 9º da CLT. O mesmo destino terá o instrumento coletivo sombreado por vício de consentimento (fraude, simulação, dolo, coação etc.). O § 3º do art. 8º da CLT, ratificado pelo § 1º do art. 611-A da CLT, nasceu com a nefasta intenção de restringir a atuação dos juízes do trabalho na apreciação do pedido de nulidade de cláusula de acordo coletivo ou convenção coletiva, como se a lesão frutificada pela renúncia ou pela fraude estivesse blindada contra decisões judiciais. O legislador, data maxima venia, ou foi ingênuo, ou foi infantilmente bisonho. A frustração do desejo do legislador ordinário torna-se latente pelo fato de o inciso XXXV do art. 5º da CF consagrar que a lei não poderá excluir, da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito. Ademais, o § 2º do art. 611-A da CLT, ao dizer que a “inexistência de expressa indicação de contrapartidas recíprocas” (espírito da transação – art. 840 do CCB), em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, “não ensejará sua nulidade”, termina por admitir, a contrario sensu, que as concessões mútuas são necessárias, não expressamente, mas no objetivo de cada cláusula negocial, pois o vício da renúncia não nascerá 7 da ausência de expressa indicação de contrapartidas, mas poderá brotar da inexistência da reciprocidade como fonte material de validade da norma. Para finalizar, registramos que a parte final do § 3º do art. 8º da CLT demonstra que a Reforma Trabalhista não pretendeu impor a liberdade contratual, típica do direito comum, ao direito do trabalho, mas a necessidade de a Justiça do Trabalho respeitar o princípio da “intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva”. Não se trata, por conseguinte, da intervenção mínima na autonomia da “vontade individual”, que está presente, por exemplo, na relação doméstica, pelo rol de acordos individuais que podem ser firmados (LC 150/2015). Existe, entretanto,uma exceção à regra. Estamos falando o parágrafo único do art. 444 da CLT, também inserido pela Reforma Trabalhista. Ele permite que o empregado, portador de diploma de nível superior e que receber R$ 10.379,64 ou mais por mês (o valor corresponde ao dobro do teto dos benefícios previdenciários, que atualmente é de R$ 5.189,82, mas já há previsão para que seja de R$ 5.578,00 em 2018), possa individualmente aquilo que em regra só pode ser objeto de acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho (rol do art. 611-A da CLT). Mais informações podem ser obtidas no comentário ao parágrafo único do art. 444 da CLT. SUCESSÃO TRABALHISTA E RESPONSABILIDADE DO EX-SÓCIO Art. 10 Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados. Art. 10-A O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a seguinte ordem de preferência: I - a empresa devedora; II - os sócios atuais; III - os sócios retirantes. Parágrafo único. O sócio retirante responderá solidariamente com os demais quando ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do contrato. Comentário O art. 10 da CLT trata da sucessão de empregadores, também chamada de sucessão trabalhista, sendo complementado pelo art. 448 da CLT. A sucessão tem como pressuposto a transferência da unidade econômica, por qualquer meio, restando ao sucessor a assunção do passivo e do ativo trabalhistas deixados pelo sucedido, traduzindo, com maestria, os princípios da despersonalização do empregador, da continuidade da relação empregatícia e da intangibilidade objetiva do contrato de trabalho. Pois bem. A sucessão trabalhista pode ser reconhecida em qualquer fase processual, ocasionando, inclusive, o direcionamento da execução contra empresa que não fez parte do processo de conhecimento. A sucessão, em seu espírito, protegida que é por norma cogente (de ordem pública), não sofreu qualquer arranhão com a Reforma Trabalhista, pelo contrário, saiu fortalecida, em face do surgimento do novo art. 448-A da CLT. Esta norma agora dispõe expressamente que a sucessão de empregadores transfere as obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida, para o sucessor, destacando que a empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada fraude na transferência da unidade econômica. Pois bem. Quanto ao art. 10-A da CLT, objeto do nosso comentário, ele nada mais fez do que aplicar o limite temporal já previsto no Código Civil (parágrafo único do art. 1.003 e art. 1032) para fins de responsabilização de ex-sócio, no caso de 8 desconsideração da personalidade jurídica. Assim sendo, o sócio retirante responderá subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade, relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato. Os juízes do trabalham tendiam a ignorar a previsão civilista, levando ao extremo o princípio da proteção ao hipossuficiente e, com isso, provocando insegurança jurídica. Além do limite temporal, a norma em comento também fixou a natureza subsidiária da responsabilidade do ex-sócio, cravando que a cobrança deve ser feita contra a pessoa jurídica (empresa) e, mediante desconsideração da personalidade jurídica, contra os sócios atuais. Só depois disso é que o sócio retirante poderá ser cobrado, gozando, portanto, de um duplo benefício de ordem. Por fim, se a alteração subjetiva do contrato social da empresa foi fraudulenta, todos os sócios, atuais e retirantes, responderão solidariamente. O parágrafo único do art. 10-A da CLT encontra-se amparado pelo art. 9º da CLT e pelo art. 942 do CCB. PRESCRIÇÃO Art. 11. A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. I - (revogado); II - (revogado). § 1º O disposto neste artigo não se aplica às ações que tenham por objeto anotações para fins de prova junto à Previdência Social. Comentário Com a Reforma Trabalhista, as previsões contidas nos incisos I e II passaram a compor o caput do art. 11 da CLT, mantendo a prescrição em cinco anos (prescrição propriamente dita) e o limite prescricional para o ajuizamento de ação, a partir do fim do contrato de trabalho, em dois anos. A OJ 83 da SDI-1 continua eficaz, estipulando que os dois anos serão contados a partir do final do aviso prévio, trabalhado ou indenizado. O art. 43 da LC 150/2015 prevê os mesmos prazos para o vínculo doméstico. O legislador poderia ter tratado da prescrição do FGTS, que foi reduzida para cinco anos por decisão do STF, com modulação quanto à sua incidência, já esculpida na Súmula 362 do TST (a prescrição quinquenal fundiária apenas será aplicada a partir de 13/11/2019). O § 1º do art. 11 da CLT foi mantido, dizendo o óbvio: as ações meramente declaratórias são imprescritíveis. É o caso da pretensão que visa tão somente obter a declaração da existência de vínculo empregatício e o registro da CTPS (as anotações poderão ser feitas pela Justiça do Trabalho – § 1º do art. 39 da CLT). § 2 o Tratando-se de pretensão que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente de alteração ou descumprimento do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei. Comentário O § 2º do art. 11 da CLT é a mera reprodução da Súmula 294 do TST, que desde 1989 trata da chamada “prescrição do ato único” ou “prescrição total”. Para não dizer que inexiste diferença, a Reforma Trabalhista acrescentou a palavra “descumprimento” ao texto da Súmula 294 do TST. Sendo assim, a prescrição total incidirá tanto no caso de alteração do contrato de trabalho, como no 9 caso de descumprimento daquilo que foi acertado entre empregado e empregador. Interessante observar a contradição do legislador, que, num primeiro momento, proibiu o TST de legislar (§ 2º do art. 8º da CLT), porém, quando lhe foi conveniente, aproveitou-se de uma espécie de prescrição não prevista em lei, mas em Súmula do TST, consagrando-a no corpo da CLT. Não somos defensores, nem tampouco inimigos da Reforma Trabalhista. Estamos aqui apenas analisando as alterações por ela inseridas. Mas, no presente caso, a incongruência é tão latente que respinga como verdadeira confissão quanto ao implícito desejo do legislador, neste particular, de restringir direitos dos trabalhadores. Pois bem. Essa prescrição, no nosso entendimento, sempre estevemaculada por total inconstitucionalidade, por violar o princípio da isonomia, distinguindo, sem razão, direitos previstos em lei, de direitos previstos no contrato ou em fonte formal autônoma (acordo coletivo, convenção coletiva de trabalho, regulamento empresarial e costume), como se a Lei Maior permitisse tal distinção. A prescrição total incide na alteração ou no descumprimento do contrato de trabalho, desde que a parcela atingida não esteja assegurada por preceito de lei. É o caso das comissões ajustadas entre empregado e empregador ou previstas em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho – vide OJ 175 da SDI-1. Caso as comissões ajustadas não sejam pagas (descumprimento) ou venham a ser suprimidas ou reduzidas (alteração do pacto), o obreiro, no curso do vínculo empregatício, terá cinco anos para ajuizar reclamação trabalhista, sob pena de nada mais recuperar. Diferente seria o caso de um adicional de insalubridade jamais ter sido pago ou ter sido suprimido ou reduzido ilicitamente. A prescrição, quanto ao referido adicional, seria meramente parcial, pois se trata de parcela assegurada por preceito de lei (art. 189 da CLT). Sendo assim, mesmo que o empregado ajuizasse reclamação depois de cinco anos do ato lesivo, recuperaria o adicional de insalubridade do período imprescrito (últimos cinco anos a contar da data do ajuizamento da ação). § 3 o A interrupção da prescrição somente ocorrerá pelo ajuizamento de reclamação trabalhista, mesmo que em juízo incompetente, ainda que venha a ser extinta sem resolução do mérito, produzindo efeitos apenas em relação aos pedidos idênticos. Comentário O que incomoda na redação do § 3º do art. 11 da CLT é a palavra “somente”, já que o art. 202 do CCB prevê outros atos, judiciais e extrajudiciais, capazes de interromper (zerar) a prescrição. Numa leitura crua, poderíamos dizer que na seara trabalhista só há um meio capaz de interromper a prescrição: o ajuizamento de reclamação (ação) trabalhista. A conclusão sai fortalecida pela previsão do § 1º do art. 8º da CLT, que permite a aplicação apenas subsidiária do direito comum, ou seja, o Código Civil não encontra espaço para incidir, já que o nosso legislador restringiu a uma única hipótese a interrupção prescricional. Acreditamos, entretanto, que o uso da palavra “somente” foi mais um equívoco da Lei 13.467/2017, gerado pelo açodamento com que o projeto de lei tramitou no Congresso Nacional. Expliquemos. O Código Civil, no caput do art. 202, também usa a palavra “somente”, mas não para fixar os casos interruptivos, mas para consagrar que a “interrupção da prescrição somente poderá ocorrer uma vez”. Observem que o Código Civil foi previdente, atuando com a prudência que a matéria exige, evitando interrupções sem fim, que seriam capazes de eternizar pretensões (o objetivo maior da prescrição é limitar no tempo a pretensão, como reza o art. 189 do CCB, prestigiando a segurança jurídica em detrimento ao fator justiça). Esse mesmo cuidado não teve o legislador da Reforma Trabalhista, “jogando” a palavra “somente” para restringir a interrupção a apenas um fato gerador (ajuizamento de ação trabalhista) e deixando em aberto a quantidade de vezes em que a interrupção prescricional poderá ocorrer. O tiro pode ter saído pela culatra. O feitiço poderá se virar contra o feiticeiro. Ora, se a interrupção da prescrição está agora 10 insculpida na CLT, não há porque aplicar subsidiariamente o Código Civil. Em assim sendo, apenas o inciso I do art. 202 do CCB se mostra compatível com o direito do trabalho (esclarecendo que a nossa interrupção já ocorre na data do ajuizamento da ação, sendo irrelevante a expedição ou a realização da citação), restando fulminada a OJ 392 da SDI-1 (inspirada no inciso II do art. 202 do CCB). De outra banda, o caput do art. 202 do CCB também não se aplica ao direito do trabalho, logo, a interrupção da prescrição poderá ocorrer mais de uma vez. Para finalizar, cumpre registrar que o § 3º do art. 11 da CLT torna inócua a Súmula 268 do TST, já que praticamente a copia, mas não prejudica ou afeta a OJ 359 da SDI-1, que consagra a interrupção da prescrição quando a ação for ajuizada pelo sindicato, na qualidade de substituto processual. Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos. § 1o A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução. § 2 o A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição. Comentário Muitos derrotistas de plantão alardearam que a Lei 13.467/2017 fragilizaria as garantias dos trabalhadores ao inaugurar, na legislação trabalhista, a aplicação da prescrição intercorrente, sempre rechaçada pelo TST (Súmula 114), mas admitida pelo STF (Súmula 327). Se essa era a intenção do legislador, ela não foi alcançada, pois a prescrição intercorrente tão temida é aquela prevista no art. 40 da Lei das Execuções Fiscais (LEF) – Lei 6.830/1980. Esta norma diz que o juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição, devendo ser intimado o exequente. Decorrido o prazo máximo de um ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o juiz então ordenará o arquivamento dos autos (arquivo provisório). Caso sejam encontrados, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. Entretanto, se da decisão que ordenar o arquivamento (provisório) tiver decorrido o prazo prescricional (dois anos), o juiz, depois de ouvido o exequente, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato, extinguindo, em definitivo, a execução. Pois bem. A atemorizante prescrição intercorrente da LEF não foi incluída na CLT pela Reforma Trabalhista. Essa “omissão” foi surpreendente, porque agora a CLT trata de uma prescrição intercorrente, mas silencia sobre aquela entalhada na LEF, tornando, com isso, inaplicável, quer subsidiariamente, quer supletivamente, o art. 40 da referida Lei ao processo trabalhista. Pois bem. Deixando a prescrição intercorrente para trás, vale o registro de que a Reforma Trabalhista acabou com a execução ex officio nos processos em que o exequente possuir advogado, alterando a redação do art. 878 da CLT. Isso quer dizer que a execução só será iniciada se for requerida pelo advogado do exequente (no caso de exequente que não possui advogado, a execução continuará sendo ex officio). A mudança atrai a aplicação da chamada “prescrição da execução”, que já era aplicada aos títulos executivos extrajudiciais. A prescrição da execução nadamais é do que o prazo para a propositura da ação de execução, que é de dois anos. Raramente falávamos sobre isso, exatamente pelo fato de a execução das sentenças e dos termos de conciliação judicial se processar de ofício. Com a necessidade agora de “requerimento” do advogado do exequente, nasce a “ação de execução” também para títulos executivos judiciais. Assim sendo, se a ação de execução (requerimento de início da execução) não for manejada pelo advogado dentro de dois anos, a partir do trânsito em julgado da sentença ou da inadimplência do reclamado no termo de conciliação judicial, incidirá a prescrição da execução, e, consequentemente, a sua extinção. 11 Depois de iniciada a execução, os atos executórios serão praticados de ofício pelo juiz, sem a necessidade de provocação do interessado. Logo, como dissemos, pouco espaço sobra para a “prescrição intercorrente trabalhista”, prevista no § 1º do art. 11-A da CLT, já que ela incidirá a partir do momento em que “o exequente deixar de cumprir determinação judicial no curso da execução”. Essa determinação judicial, no curso da execução, só se justifica quando o ato “não puder ser praticado pelo próprio juiz do trabalho”. Exemplo clássico diz respeito à liquidação por artigos, que exige do exequente a produção probatória para investigar fatos que não foram devidamente averiguados no processo de conhecimento. Nesse tipo de situação, o juiz precisará intimar o exequente para que este pratique o ato. A partir da intimação, começará a fluir o prazo prescricional de dois anos. Permanecendo inerte o exequente, por mais de dois anos, a execução será extinta em definitivo, de ofício ou a requerimento do executado, pela incidência da prescrição intercorrente prevista no § 1º do art. 11-A da CLT. A intimação do exequente, para praticar um ato que deve ser exercido pelo juiz, não gerará a prescrição intercorrente, devendo o advogado do credor, por cautela, se insurgir contra a determinação judicial. Aquele tipo de intimação que determina que o exequente aponte meios para que a execução prossiga é um bom exemplo de ato processual vazio, porque a execução deve ser processada pela Justiça do Trabalho, já que o descumprimento da sentença ou do acordo judicial, pelo executado, afronta a autoridade do Poder Judiciário. MULTAS ADMINISTRATIVAS Art. 47. O empregador que mantiver empregado não registrado nos termos do art. 41 desta Consolidação ficará sujeito a multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por empregado não registrado, acrescido de igual valor em cada reincidência. § 1 o Especificamente quanto à infração a que se refere o caput deste artigo, o valor final da multa aplicada será de R$ 800,00 (oitocentos reais) por empregado não registrado, quando se tratar de microempresa ou empresa de pequeno porte. Comentário Muitos juristas têm alardeado que a multa do novo artigo 47 da CLT se refere a empregados contratados “sem carteira assinada”, vinculando a sua aplicação à ausência de registro em CTPS. Interpretação equivocada, data maxima venia. O art. 47 da CLT não se reporta à carteira de trabalho, mas aos Livros de Registro de Empregados (art. 41 da CLT). A sanção, por conseguinte, diz respeito ao empregador que não possuir empregado devidamente registrado nos seus arquivos. A pena, portanto, não se aplica no caso de falta de anotação em CTPS, cujas punições estão previstas nos arts. 49 a 56 da CLT, inclusive com repercussão criminal (sempre é bom lembrar que a Justiça do Trabalho não tem competência criminal, nem mesmo para crimes contra a organização do trabalho, à luz de uniforme entendimento do STF). Infelizmente, a multa prevista no art. 47 da CLT não constitui um direito do trabalhador, ou seja, não será revertida em favor do obreiro, tendo natureza de multa administrativa, recolhida em favor da União Federal (o mesmo acontece com as multas relacionadas ao registro em CTPS – arts. 52 a 55 da CLT). Lamentável, pois, sendo uma mera infração administrativa, a multa não poderá ser aplicada pelo juiz do trabalho, já que a competência da Justiça do Trabalho, quanto a esse tipo de penalidade, se restringe ao julgamento das ações ajuizadas depois da aplicação da sanção – vide art. 114, VII, da CF. A penalidade, por conseguinte, só poderá ser infligida pelos órgãos do Ministério do Trabalho. O valor da multa será menor no caso de empregador enquadrado como micro ou pequena empresa (§ 1º do art. 47 da CLT). 12 § 2o A infração de que trata o caput deste artigo constitui exceção ao critério da dupla visita. Comentário O critério da dupla visita está previsto no art. 627 da CLT, constituindo um direito líquido e certo do empregador fiscalizado pelo Ministério do Trabalho, seja quando ocorrer promulgação ou expedição de novas leis, regulamentos ou instruções ministeriais, seja no caso de primeira inspeção nos estabelecimentos ou locais de trabalho recentemente inaugurados ou empreendidos. Esse critério transforma a primeira visita num ato administrativo pedagógico e não punitivo. Pois bem. O critério da dupla visita não se aplica ao empregador que deixar de registrar internamente os seus empregados (o registro pode ser em livros, fichas ou sistema eletrônico). Estamos falando do Registro de Empregados que deve ficar arquivado na empresa, no qual constarão os dados previstos no parágrafo único do art. 41 da CLT. Conforme já dissemos no comentário anterior, não se trata de falta de anotação em carteira de trabalho. Previsão similar pode ser encontrada no Estatuto do Empregado Doméstico (LC 150/2015), especificamente no § 2º do art. 44, onde o legislador diz que será observado o critério de dupla visita para lavratura de auto de infração contra o empregador doméstico, “salvo quando for constatada infração por falta de anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social ou, ainda, na ocorrência de reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização”. Logo, no caso do empregador doméstico, ao contrário da CLT, o critério da dupla visita não será observado quando for constatada a ausência de anotação em CTPS. Art. 47-A. Na hipótese de não serem informados os dados a que se refere o parágrafo único do art. 41 desta Consolidação, o empregador ficará sujeito à multa de R$ 600,00 (seiscentos reais) por empregado prejudicado. Comentário Nos Livros de Registro de Empregados, além da qualificação civil ou profissional de cada trabalhador, deverão ser anotados todos os dados relativos à sua admissão no emprego, duração e efetividade do trabalho, a férias, acidentes e demais circunstâncias que interessem à proteção do trabalhador, sob pena de aplicação da multa prevista no artigo em comento. A penalidade também tem mera natureza de multa administrativa. DURAÇÃO DO TRABALHO E HORÁRIO IN ITINEREArt. 58. A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite. § 1º Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário no registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. § 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. § 3o (Revogado). Comentário 13 A Lei 13.467/2017 poderia ter atualizado o caput do art. 58 da CLT, adequando a sua redação ao inciso XIII do art. 7º da CF, já que existem, desde a promulgação da Lei Maior, dois limites de duração do trabalho: o diário, de até oito horas, e o semanal, de até quarenta e quatro horas. São limites cumulativos, pois o citado inciso XIII usa a preposição “e” e não a conjunção alternativa “ou” (8 horas por dia e 44 horas por semana). Extrapolado um dos limites, mesmo que o outro seja respeitado, o obreiro terá realizado horas extras (Exemplo 01 – o empregado laborou 8 horas por dia, de segunda a sábado, folgando no domingo; esse empregado realizou 4 horas extras na semana, mesmo não ultrapassando o limite diário. Exemplo 02 – o empregado laborou 9 horas por dia, de segunda a quinta, e 8 horas na sexta, folgando sábado e domingo; esse empregado realizou 4 horas extras na semana, mesmo não ultrapassando o limite semanal). Pois bem. O § 1º do art. 58 da CLT foi mantido. Ele trata da tolerância para atraso ou permanência do empregado. O limite é de até cinco minutos na entrada e de até cinco minutos na saída, como bem esclarece a Súmula 366 do TST. O limite diário de dez minutos foi usado pelo TST para fins de tolerância quanto ao trajeto portaria/posto de trabalho/portaria, mas a Súmula 429 do TST foi soterrada pela nova redação do § 2º do art. 58 da CLT, que agora diz que o tempo despendido pelo empregado desde a sua residência “até a efetiva ocupação do posto de trabalho” não será computado na jornada de trabalho. Sendo assim, podemos dizer que o novo § 2º do art. 58 da CLT acabou com o horário in itinere propriamente dito e também com a possibilidade de o tempo gasto pelo empregado para percorrer o trajeto portaria/posto de trabalho ser lançado em sua jornada laboral. O horário in itinere propriamente dito ocorria quando a empresa estava situada em local de difícil acessou “ou” o trajeto não possuísse serviço público de transporte, “e” o empregador fornecesse a condução. Sempre enxergamos o horário in itinere como um exagero, principalmente no que dizia respeito ao “trajeto não servido por transporte público”, transferindo ao empregador o ônus da ineficiência estatal. A Reforma Trabalhista, neste ponto, destruiu o § 3º do art. 58 da CLT, devidamente revogado, e as Súmulas 90, 320 e 429 do TST. TRABALHO EM REGIME DE TEMPO PARCIAL Art. 58-A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais. Comentário O trabalho em regime de tempo parcial era marcado pela limitação semanal de vinte e cinco horas. Passa agora para trinta horas. A alteração foi boa, levando em conta a média de cinco horas por dia. Essa média abrangia, por conseguinte, apenas cinco dias de labor por semana. Com a Reforma, a média passa a abranger seis dias por semana. A proibição de horas extras continua, mas agora temos uma exceção (antes não havia qualquer possibilidade de labor extraordinário em regime de tempo parcial, em face da absoluta vedação do § 4º do art. 59 da CLT, que foi revogado expressamente pela Lei 13.467/2017). A realização de horas extras, até o limite semanal de seis horas, poderá ocorrer nos contratos cuja duração não ultrapasse vinte e seis horas por semana. Isso nos leva à conclusão que o regime de tempo parcial passa a suportar uma carga semanal de até trinta e duas horas (vinte e seis horas normas + seis horas extras). Não deixa de ser incongruente a ressalva, data maxima venia. Observem que o limite de seis horas extras é inflexível. Expliquemos. Se um empregado for contratado em regime de tempo parcial para trabalhar três horas por dia, de segunda 14 a sábado, a duração semanal do labor será de dezoito horas e ele só poderá realizar no máximo seis horas extras por semana, conduzindo a duração máxima a vinte e quatro horas (18h + 6h). O § 4º do art. 58-A da CLT confirma a conclusão (próximo comentário). § 1º O salário a ser pago aos empregados sob o regime de tempo parcial será proporcional à sua jornada, em relação aos empregados que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral. § 2º Para os atuais empregados, a adoção do regime de tempo parcial será feita mediante opção manifestada perante a empresa, na forma prevista em instrumento decorrente de negociação coletiva. § 3 o As horas suplementares à duração do trabalho semanal normal serão pagas com o acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o salário-hora normal. § 4 o Na hipótese de o contrato de trabalho em regime de tempo parcial ser estabelecido em número inferior a vinte e seis horas semanais, as horas suplementares a este quantitativo serão consideradas horas extras para fins do pagamento estipulado no § 3o, estando também limitadas a seis horas suplementares semanais. § 5o As horas suplementares da jornada de trabalho normal poderão ser compensadas diretamente até a semana imediatamente posterior à da sua execução, devendo ser feita a sua quitação na folha de pagamento do mês subsequente, caso não sejam compensadas. § 6o É facultado ao empregado contratado sob regime de tempo parcial converter um terço do período de férias a que tiver direito em abono pecuniário. § 7o As férias do regime de tempo parcial são regidas pelo disposto no art. 130 desta Consolidação. Comentário A proporcionalidade salarial continua. Ela consagra o pagamento do salário-hora, prestigiando o princípio da isonomia (os empregados A e B exercem a mesma função, sendo que o primeiro trabalha 44h por semana, enquanto o segundo trabalha 22h por semana; é lícito que o empregado B receba apenas metade do salário pago ao empregado A; ambos estarão recebendo o mesmo salário-hora). O entendimento já se encontrava consagrado no item I da OJ 358 da SDI-1, nãoficando restrito ao regime de tempo parcial. Para a contratação de empregado em regime de tempo parcial, não há necessidade de previsão em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho. A contratação, portanto, é livre. Diferente é o caso de “alteração de regime”. Para um empregado, que labora em regime comum, passar a trabalhar em regime de tempo parcial, além da sua anuência, é preciso que haja autorização prevista em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, em face não só do § 2º do art. 58-A da CLT, mas principalmente por conta do inciso XIII do art. 7º da CF. No § 4º do art. 58-A da CLT encontramos aquele detalhe das horas extras que foi enfrentado no comentário imediatamente anterior. O regime de tempo parcial teve o seu limite de vinte cinco horas aumentado para trinta horas semanais, passando a permitir a realização de horas extras para o contrato cuja duração semanal não ultrapasse vinte e seis horas. O empregado, entretanto, só poderá realizar até seis horas extras por semana, mesmo que trabalhe menos de vinte e seis horas semanais. Pois bem. Não se aplicam ao regime de tempo parcial o “banco de horas” e o “regime 12h por 36h”, que são espécies de compensação incompatíveis com a previsão do § 5º do art. 58-A da CLT, norma que permite a compensação das horas extras, desde que ela ocorra “até a semana imediatamente subsequente”. Assim sendo, ao regime de tempo parcial aplicam-se a “semana inglesa” (a compensação ocorre na própria semana da realização das horas extras) e a “semana espanhola” (a compensação ocorre na semana imediatamente subsequente). Por falta de previsão específica, incidirá o § 6º do art. 59 da CLT, que não exige qualquer formalidade para a compensação de 15 jornada (pode ser ajustada de forma tácita, verbal ou escrita). A duração das férias em regime de tempo parcial passou a ser a mesma do regime comum, diante da revogação expressa do art. 130-A da CLT e da previsão do § 7º do art. 58-A da CLT, razão pela qual a conversão de 1/3 das férias em abono pecuniário (venda de parte das férias) tornou-se aplicável, conforme prevê o § 6º do art. 58-A da CLT (era proibida pelo § 3º do art. 143 da CLT, que foi revogado expressamente pela Lei 13.467/2017). TRABALHO EXTRAORDINÁRIO E COMPENSAÇÃO DE JORNADA Art. 59. A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. § 1o A remuneração da hora extra será, pelo menos, 50% (cinquenta por cento) superior à da hora normal. Comentário O caput e o § 1º do art. 59 da CLT foram alterados, em consonância com o art. 7º da CF. Mas um detalhe não pode passar despercebido. A antiga redação exigia, para a realização de horas extras, “acordo escrito entre empregado e empregador” ou “contrato coletivo de trabalho”. Contrato coletivo nada mais é do que o instrumento normativo que nasce de uma negociação coletiva de trabalho (acordo coletivo ou convenção coletiva). Até aí tudo bem. E o acordo individual? Antes da Reforma, tinha que ser firmado “por escrito”. A nova redação do caput do art. 59 da CLT “retirou” a forma escrita como condição de validade do acordo individual para prorrogação de horário de trabalho, falando apenas de “acordo individual”. Diante disso, podemos concluir que o dito acordo pode ser tácito, verbal ou escrito, pois onde o legislador não restringe, não cabe ao intérprete fazê-lo. Esse ponto mais interessa à fiscalização trabalhista do que propriamente ao advogado. § 2º Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias. § 3 o Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma dos §§ 2 o e 5o deste artigo, o trabalhador terá direito ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão. § 4o (Revogado). § 5 o O banco de horas de que trata o § 2o deste artigo poderá ser pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses. Comentário Os §§ 2º, 3º e 5º do art. 59 da CLT regulam o regime de compensação intitulado “banco de horas” (o epíteto finalmente foi inserido na lei). É considerado um regime nefasto, porque é notoriamente prejudicial à saúde do obreiro, postergando a compensação das horas extras a uma periodicidade maior do que a mensal (pode chegar a um ano). Sempre criticamos a “monetização da saúde do trabalhador”, caracterizada pela criação de adicionais (plus salarial) para “contrapesar” os riscos oriundos do labor extraordinário, do trabalho noturno, do contato com agentes insalubres e do exercício de atividades perigosas. No caso da sobrejornada, a compensação (folga) é melhor do que 16 a remuneração (adicional), desde que aquela ocorra “dentro do mês da realização das horas extras”. Basta observar o § 6º do art. 59 da CLT, que não exige qualquer formalidade para a compensação dentro do mês (inaplicável ao regime 12h por 36h, em face da previsão específica do art. 59-A da CLT). O legislador consagrou esse entendimento na LC 150/2015 (Estatuto do Empregado Doméstico), apenas permitindo o lançamento no banco de horas a partir da 41ª hora extraordinária mensal (art. 2º, § 5º, III, da LC 150/2015), ou seja, as 40 primeiras horas extras do empregado doméstico devem ser compensadas dentro do próprio mês ou devidamente remuneradas. A Reforma Trabalhista bem que poderia ter se inspirado na LC 150/2015. Isso não aconteceu, infelizmente. Pois bem. O banco de horas continua sendo de até um ano. Significa dizer que as horas extras realizadas poderão ser compensadas dentro de um ano. A novidade está na possibilidade de se pactuar o banco de horas por mero acordo individual escrito, ficando, nesse caso, limitado ao lapso de seis meses (§ 5º do art. 59 da CLT). Simplificando: (a) O banco de horas de até seis meses pode ser implantado mediante acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho; (b) O banco de horas com duração maior do que seis meses, limitado ao período de um ano, só pode ser implantado mediante acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho. Para finalizar, destacamos que o § 3º do art. 59 da CLT não alterou o direito de o empregado receber o pagamento das horas extras, que deverão ser calculadas sobre o salário da época da rescisão (e não da época da realizaçãodo labor extraordinário), com o devido adicional, no caso de rescisão contratual por qualquer motivo (essa verba rescisória chama-se “saldo do banco de horas”). O mesmo entendimento se aplica às horas extras não compensadas no período ajustado. § 6 o É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês. Comentário O legislador finalmente compreendeu que a compensação das horas extras é melhor do que a remuneração (monetização da saúde do obreiro), desde que aquela ocorra dentro do próprio mês da realização da sobrejornada. O § 6º do art. 59 da CLT serve de “incentivo” à concessão de folgas compensatórias mensais, passando a consagrar que o regime de compensação semanal, quinzenal ou mensal pode ser pactuado de qualquer forma (tacitamente, verbalmente ou por escrito). O regime 12h por 36h, apesar de contemplar a compensação mensal (no regime 12h por 36h o obreiro trabalha menos de 220 horas por mês, ou seja, menos do que aquele enquadrado nos limites do art. XIII da CF – 8h por dia e 44h por semana), não pode ser ajustado “de qualquer forma”, pois o art. 59-A da CLT exige acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho. Art. 59-A. Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação. Parágrafo único. A remuneração mensal pactuada pelo horário previsto no caput deste artigo abrange os pagamentos devidos pelo descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados, e serão considerados compensados os feriados e as prorrogações de trabalho noturno, quando houver, de que tratam o art. 70 e o § 5º do art. 73 desta Consolidação. Comentário 17 O art. 59-A da CLT soterra a Súmula 444 do TST, já que esta exigia acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, como formalidade essencial para a implantação do regime 12h por 36h, e não estendia a compensação aos feriados, dizendo que, se a escala de trabalho coincidisse com um feriado, o dia de labor deveria ser pago em dobro. Com a Reforma Trabalhista, o regime 12h por 36h pode ser ajustado por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho (inaplicável, para ele, o § 6º do art. 59 da CLT), abarcando a compensação de horas extras, o repouso semanal remunerado e os feriados. Dois aspectos do art. 59-A da CLT merecem atenção especial. O primeiro diz respeito ao intervalo para refeição e descanso. O art. 611-A da CLT, no seu inciso III, permite a redução do intervalo até o limite de trinta minutos, mediante acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, ou seja, não admite a “supressão do intervalo”. No caput do art. 59-A da CLT, entretanto, o legislador diz que o referido intervalo pode ser “observado” (concedido) ou “indenizado” (não concedido). Essa indenização é aquela prevista na nova redação do § 4º do art. 71 da CLT (que tinha natura de horas extras antes da Reforma). Percebam que o legislador deixa a entender que no regime 12h por 36h o empregado poderá trabalhar doze horas seguidas “sem intervalo para refeição e descanso”, o qual será “indenizado”, bastando, para tanto, acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho (a previsão nada mais é do que a cópia do caput do art. 10 da LC 150/2015 – Lei do Doméstico). Impressionante. Inacreditável. Surreal. Fica o registro. O segundo aspecto se refere ao que chamamos de “irradiação do labor noturno sobre o diurno”, efeito previsto no § 5º do art. 73 da CLT e consagrado no item II da Súmula 60 do TST. Sabemos que o empregado, quando cumpre integralmente o horário noturno e estende o seu labor, terá direito às vantagens do trabalho noturno também sobre a extensão. Vamos exemplificar. O empregado trabalhou das 22h às 7h, ou seja, cumpriu integralmente o horário noturno (22h às 5h) e o estendeu sobre o diurno (5h às 7h). Essa extensão também será considerada como trabalho noturno, seja para o cômputo da hora noturna reduzida, seja para a incidência do adicional noturno de 20%. Esse empregado, por conseguinte, terá trabalhado em horário noturno durante toda a jornada (22h às 7h). Essa “irradiação” passa a não ser aplicada ao empregado que cumpre regime 12h por 36h, em face da parte final do parágrafo único do art. 59-A da CLT. Exemplificando. O trabalhador labora 12h por 36h, sendo certo que a sua jornada vai das 19h às 7h. Seu horário noturno, antes da Reforma, era das 22h às 7h (a irradiação é só “para frente”, ou seja, o horário antes das 22h é considerado diurno). Com a Reforma, seu horário noturno será das 22h às 5h, pois a extensão não será mais considerada como labor noturno. Em assim sendo, podemos dizer que a “irradiação do horário noturno sobre o diurno” não mais se aplica ao regime 12h por 36h (o legislador simplesmente copiou o que já estava previsto no parágrafo único do art. 10 da LC 150/2015 – Lei do Doméstico). Art. 59-B. O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada, inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional. Parágrafo único. A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas. Comentário O caput do art. 59-B da CLT traduz aquilo que já estava esculpido no item III da Súmula 85 do TST e que evitava o enriquecimento sem causa do obreiro no caso de compensação de horas extras realizada sem a formalidade exigida. A disposição se torna inócua quanto à “semana inglesa” e à “semana espanhola”, pois são regimes de compensação que podem ser ajustados tacitamente, 18 verbalmente ou por escrito (de qualquer forma), nos termos do § 6º do art. 59 da CLT. Quanto ao regime 12h por 36h, a previsão tem grande relevância, pois se o empregado laborar nesse sistema, sem previsão em acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, não terá direito a receber o pagamento das quatro horas extras “cheias” por jornada, mas apenas o adicional de horas extras, exatamente pelo fato de as horas extraordinárias terem sido de fato compensadas (exemplo: digamos que o valor do salário-hora de um empregado seja de R$ 10,00; o valor do adicional de horas extras será de R$ 5,00; o valor de cada hora extra, portanto, será de R$ 15,00; tendo direito apenas ao pagamento do adicional, o
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