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18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 1/10 RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Aspectos do direito brasileiro positivo vigente: Art. 37, § 6.º, da CF/1988 e Art. 15, do CC/1916 RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ASPECTOS DO DIREITO BRASILEIRO POSITIVO VIGENTE: ART. 37, § 6.º, DA CF/1988 E ART. 15, DO CC/1916 Revista de Direito Privado | vol. 1 | p. 29 | Jan / 2000 Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 6 | p. 25 | Out / 2011DTR\2000\74 Nelson Nery Junior Área do Direito: Civil Sumário: - 1.Introdução. Responsabilidade subjetiva (art. 15, do CC/1916) versus responsabilidade objetiva (art. 37, § 6.º, da CF/1988) - 2.Regime jurídico da responsabilidade civil objetiva da administração pública. Conduta comissiva e omissiva do agente ou servidor. Responsabilidade sempre objetiva, pelo risco, com regime jurídico único, previsto pela art. 37, § 6.º, da CF/1988. Requisitos para que haja o dever de a administração indenizar Resumo: O autor faz breve apanhado histórico mostrando a evolução legislativa da responsabilidade civil da administração pública no direito brasileiro. Discorre sobre o regime jurídico dessa responsabilidade, no sistema do direito constitucional positivo brasileiro, sustentando haver sistema único, fundado no art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), não se aplicando mais o art. 15, do CC/1916 (LGL\1916\1), não recepcionado desde que o art. 194, da Constituição Federal de 1946 introduziu a responsabilidade objetiva pelo risco. Defende o entendimento de que qualquer que seja a conduta, lícita ou ilícita, comissiva ou omissiva, dos agentes ou servidores que, nessa qualidade, causarem danos aos administrados, desde que demonstrado o nexo de causalidade entre essa conduta e o dano, há o dever de a administração indenizar. Como há apenas o regime da responsabilidade objetiva pelo risco, é impertinente a discussão do dever de a administração indenizar, por responsabilidade subjetiva pela culpa administrativa, ou falta de serviço. O que a doutrina e jurisprudência dominantes denominam de "responsabilidade subjetiva da administração por conduta omissiva", é, na verdade, discussão sobre a existência ou não do nexo de causalidade entre a omissão e o dano. A tese que afirma existir a responsabilidade subjetiva, pela incidência do não recepcionado art. 15, do CC/1916 (LGL\1916\1) ou pela aplicação do princípio do estado de direito, é desnecessária e não encontra respaldo no sistema constitucional brasileiro. Entende que as impropriamente denominadas "causas de exclusão da responsabilidade civil da administração" (culpa exclusiva da vítima e força maior) são, na verdade, circunstâncias que excluem o nexo de causalidade entre conduta e dano. A propósito disso o autor discute duas recentes decisões divergentes do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Discorre sobre a responsabilidade subjetiva do agente ou servidor, com o conseqüente direito de regresso da administração. Entende que o direito de regresso deve ser exercido em ação autônoma, vedada a denunciação da lide (art. 70, do CPC (LGL\1973\5)) na ação em que o particular aciona a administração por responsabilidade objetiva. Trata, ainda, da sentença penal condenatória como título executivo judicial e da ação de improbidade administrativa, esta última como forma de a administração buscar do servidor ímprobo a recomposição do patrimônio público e social. Por derradeiro o autor trata do dano indenizável. Sustenta que tanto o dano patrimonial como o moral, cumulativamente, são indenizáveis pela administração. As condutas que causem dano, que ensejam indenização, podem advir de atos administrativos do Poder Executivo, atos legislativos e atos jurisdicionais. 1. Introdução. Responsabilidade subjetiva (art. 15, do CC/1916) versus responsabilidade objetiva (art. 37, § 6.º, da CF/1988) O art. 15, do CC/1916 (LGL\1916\1) estabelecia a responsabilidade civil da administração pública, sob o regime da responsabilidade subjetiva, nos casos em que enumerava. As Constituições 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 2/10 Federais de 1934 (art. 171) e de 1937 (art. 158) reafirmavam essa tese. Mesmo nessa fase, de configuração normativa expressa de responsabilidade subjetiva da administração, já havia doutrinadores que sustentavam a existência da responsabilidade objetiva da administração. Com o advento da Constituição Federal de 1946 (art. 194), foi instituída no direito constitucional positivo brasileiro a responsabilidade objetiva da administração pública, com base no risco administrativo. Como o art. 15, do CC/1916 (LGL\1916\1), que previa responsabilidade subjetiva do poder público, era incompatível com o novo sistema da responsabilidade objetiva, a norma do Código Civil (LGL\2002\400) não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1946. Deixou de ter eficácia. Nos textos constitucionais que se seguiram (Constituição Federal de 1967, art. 105 e Constituição Federal de 1969, art. 107), bem como no art. 37, 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3) , permaneceu íntegra a consagração da responsabilidade objetiva pelo risco, impondo à administração pública o dever de indenizar os danos causados por conduta comissiva ou omissiva de agente ou servidor, que aja nessa qualidade. Portanto, já não vigora entre nós, desde 1946, o art. 15, do CC/1916 (LGL\1916\1). Esse breve retrospecto histórico tem por objetivo situar o leitor dentro da sistemática normativa da responsabilidade civil da administração pública. 2. Regime jurídico da responsabilidade civil objetiva da administração pública. Conduta comissiva e omissiva do agente ou servidor. Responsabilidade sempre objetiva, pelo risco, com regime jurídico único, previsto pela art. 37, § 6.º, da CF/1988. Requisitos para que haja o dever de a administração indenizar O art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3) estabelece a responsabilidade da administração pública - pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos - por atos que seus agentes ou servidores, nessa qualidade, causarem a terceiros, ressalvado o direito de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa. Trata-se de responsabilidade civil pelo risco, sendo a administração pública responsável objetivamente pela indenização dos danos sofridos pelo administrado, por fato do serviço. 2A responsabilidade objetiva da administração pública, independentemente de dolo ou culpa, ocorre quando houver ato comissivo, vale dizer, de atitudes positivas de agentes ou servidores, lesivas de direitos dos administrados. 3Nesse caso basta a existência do dano e o nexo de causalidade entre o ato comissivo da administração pública e esse dano, para que haja o dever de indenizar. Quando tratar-se de conduta omissiva da administração pública, doutrina e jurisprudência majoritárias apregoam fundar-se o dever de indenizar na responsabilidade subjetiva da administração, pela falta de serviço, falha do serviço ou culpa do serviço (faute du service), razão pela qual o administrado, para ter direito à indenização, deverá provar a culpa da administração, ou seja, que o dano ocorreu pela omissão ilegal da administração pública. 4Os exemplos são vários: atos de depredação por multidões, 5danos decorrentes de enchentes ou vendavais extraordinários. 6 Invocando a teoria do risco, que fundamenta a responsabilidade objetiva do art. 37, § 6.º, da CF/ 1988 (LGL\1988\3) Hely Lopes Meirelles sustenta a incidência da responsabilidade objetiva, independentemente de conduta comissiva ou omissiva da administração, dizendo que, quando houver "falta anônima do serviço", responde a administração objetivamente. O exemplo que menciona é o da existência do dever da administração, de velar pela integridade física da pessoa (alunos da rede oficial de ensino, pessoas internadas em hospitaispúblicos, etc.), razão pela qual "caso sofram algum dano quando estejam sob a guarda imediata do Poder Público, têm direito à indenização, salvo se ficar comprovada a ocorrência de alguma causa excludente daquela responsabilidade estatal (STF, RT 733/130)". 7Na decisão do STF, mencionada pelo ilustre jurista, o relator, Min. Celso de Mello, afirmou a incidência da responsabilidade objetiva da administração, "independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público". 8O caso decidido pelo STF era de dano sofrido por um aluno (perda de olho), causado no recinto de escola pública por outro aluno, que portava agulha e seringa de injeção. Em caso recente, o STF, citando Celso Antônio e Hely, 9afirmou tese diferente, entendendo que, em se tratando de conduta omissiva da administração pública, por dano causado por ato de terceiro, a responsabilidade é subjetiva, exigindo-se a prova da culpa ou dolo da administração para caracterizar-se o dever de indenizar. 10A hipótese era de homicídio de preso, sob a custódia do Estado, perpetrado por outro presidiário, dentro da cadeia. O caso, portanto, é, em tudo e por tudo, assemelhado ao do aluno da escola pertencente à rede oficial de ensino, que tem o direito 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 3/10 de ver protegida sua integridade física e psíquica pelo Estado, enquanto estiver sob a guarda imediata da administração. O relator do acórdão, Min. Carlos Velloso, entendeu que o caso era de falta do serviço, ou seja, de fato praticado por terceiro e não por ato direto de agente ou servidor público. Como o art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3) fala da responsabilidade objetiva da administração por dano causado por seus agentes, envolveria apenas os casos de conduta comissiva. Havendo conduta omissiva da administração, impor-se-ia o sistema da responsabilidade subjetiva, exigindo-se a culpa da administração, vale dizer, a prova da falta do serviço. O fato de o estudante haver sofrido dano causado por colega, dentro do recinto da escola, por falta de vigilância da administração, caracteriza conduta omissiva do agente do poder público, porque a administração tinha o dever legal de preservar a incolumidade física e psíquica das pessoas que se encontrem sob sua guarda direta, como é o caso dos alunos de escola pública enquanto se encontrarem no recinto da escola. O dever de vigilância e de preservação da incolumidade foi desatendido. O STF, corretamente, determinou a responsabilidade objetiva e o dever de a administração indenizar (RT 733/130). O fato de o preso assassinar seu companheiro de cela, dentro do presídio, caracteriza igualmente conduta omissiva da administração, vale dizer, falha do serviço, infringindo-se o dever de vigilância e de preservação da incolumidade física e psíquica do preso. O STF, corretamente, determinou a responsabilidade da administração e o dever de indenizar, mas fundamentou sua decisão na responsabilidade subjetiva da administração, entendendo, portanto, haver ela agido com culpa (RT 753/156). Ambas as soluções dadas pela STF a casos idênticos de conduta omissiva da administração estão justas. A divergência está na fundamentação do dever de a administração indenizar. Com a devida venia, entendemos que o art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3) consagra, sim, a responsabilidade objetiva da administração pública, pela teoria do risco, quer se trate de conduta comissiva ou omissiva dos agentes ou servidores do poder público. Os requisitos constitucionais para que a administração pública tenha o dever de indenizar, bem como o administrado o direito de receber a indenização, são apenas dois: a) a existência do dano, patrimonial e/ou moral; b) o nexo de causalidade entre a conduta (omissiva ou comissiva) da administração e o dano. Como veremos em seguida, as denominadas impropriamente pela doutrina e jurisprudência de "causas de exclusão" da responsabilidade da administração pública (culpa exclusiva da vítima e força maior), são, na verdade, circunstâncias que excluem o nexo de causalidade entre o dano e a conduta da administração. O fundamento dessa responsabilidade objetiva é o risco administrativo, ou seja, o risco da atividade do Estado, que foi criado para servir a comunidade e não para causar-lhe problemas. Caso a atividade estatal crie problemas e cause danos ao particular, este tem direito de ver-se ressarcido pelos prejuízos que sofreu e de ser indenizado pelo dano moral quando isto verificar-se. Da mesma forma, outro ângulo do mesmo fenômeno, quer dizer, o dever de a administração indenizar é também fundado no princípio da boa fé objetiva, pois o administrado crê, com boa fé objetiva, que o Estado tem de exercer os seus misteres para o benefício da população, sendo certo que não foi idealizado para provocar e causar danos. Na verdade, há situações que exigem do autor da pretensão indenizatória deduzida contra a administração pública demonstração do nexo de causalidade entre a omissão administrativa e o dano por ele sofrido. O problema, portanto, não se encontra no sistema de responsabilização da administração, nem no fundamento da responsabilidade, que é sempre o risco. A questão é relativa ao nexo de causalidade entre omissão e dano. Dos dois casos resolvidos pelo STF, citados acima, depreende-se que a Suprema Corte entendeu que, enquanto o preso estiver sob a guarda do Estado e os alunos sob a guarda da escola pública, há o dever de a administração preservar sua integridade física e psíquica. Qualquer dano daí decorrente caracteriza o desatendimento daquele dever de vigilância e guarda. Não há o que discutir. É irrelevante perquirir-se da conduta dolosa ou culposa do agente ou servidor, que não cuidou de preservar a integridade do preso ou do aluno. O dano ocorreu dentro do estabelecimento público, sendo absolutamente correta a solução e o fundamento dado pelo relator do acórdão do STF inserto na RT 733/130, Min. Celso de Mello, no sentido de que mesmo a falta do serviço é ensejadora da responsabilidade objetiva. O esforço de raciocínio existente naqueloutro acórdão do STF, relatado pelo Min. Carlos Velloso, de que a administração deve responder porque foi negligente, não colocando o preso em cela segura, no intuito de demonstrar a incidência da teoria da culpa administrativa (faute de service), comprova a tese oposta e caracteriza, a nosso ver, a demonstração de que houve nexo de causalidade entre a omissão (não colocação do preso em cela segura) e o dano (morte do preso). Admitir-se que o sistema constitucional brasileiro tratou da responsabilidade da administração pública com duplo fundamento, é fazer tábua rasa do que dispõe o art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3). Tanto isso é verdade que Celso Antônio Bandeira de Mello fundamenta seu 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 4/10 entendimento no princípio do estado de direito, concitando o intérprete a abandonar o texto do direito constitucional positivo nessa matéria, 11bem como entende haver casos de conduta omissiva que caracterizariam culpa presumida da administração, 12o que equivale praticamente à responsabilização objetiva e, ainda, afirma que a responsabilidade objetiva da administração pública só é elidida pela ausência de nexo de causalidade, refutando a tese de que culpa exclusiva da vítima, força maior e caso fortuito seriam causas de exclusão dessa responsabilidade. 13Há, por conseguinte, evidente insegurança nesses raciocínios, de que existiria, em nosso sistema jurídico, responsabilidade subjetiva da administração pública. Ao contrário, o fenômeno é explicável à luz, mesma, do direito constitucional positivo. A teoria da culpa administrativa - falta do serviço, surgida no início do século na França, não mais atende à realidade hodierna do direito administrativo, de modo que tem deser abandonada. Mais coerente, portanto, é sustentar a incidência da teoria do risco, ensejando a responsabilidade objetiva da administração, com os temperamentos que a matéria merece, inclusive no que tange às denominadas causas excludentes dessa mesma responsabilidade. A responsabilidade da administração, no direito constitucional positivo brasileiro, é sempre objetiva, porque decorre do sistema do art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3). O art. 15, do CC/ 1916 (LGL\1916\1), que previa a responsabilidade apenas das "pessoas jurídicas de direito público", por atos de seus representantes que, nessa qualidade, procedessem de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, causassem danos a terceiros, não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1946 (art. 194), que institui no Brasil a responsabilidade objetiva da administração, fundada no risco. De sorte que não se pode ter um sistema híbrido de responsabilidade do Estado, ora regulado pela Constituição Federal (LGL\1988\3), ora pelo Código Civil (LGL\2002\400). O fundamento é um só e reside no texto constitucional. Daí a importância de afirmar-se que, ocorrendo conduta omissiva ensejadora de dano ao administrado, é preciso que se demonstre o nexo de causalidade entre a omissão e o dano para que haja o dever de indenizar. Não há necessidade de provar-se a culpa do agente, porque o sistema prescinde da culpa, pois é fundado na responsabilidade objetiva pelo risco onde a investigação da conduta do agente é irrelevante. De conseqüência, quando ocorre um assalto em via pública, o administrado pode ter direito de indenização contra a administração, desde que reste evidenciado o nexo de causalidade entre a omissão do poder público e o dano. O nexo de causalidade existiria, por exemplo, se ficasse caracterizado que havia policial presenciando o assalto e nada fez para impedir o evento danoso. Na Argentina, a responsabilidade da administração funda-se no risco, quer se trate de conduta comissiva ou omissiva. 14O direito positivo é expresso, pois o art. 1.112, do CC argentino diz que "os fatos e as omissões" dos funcionários públicos no exercício de suas funções, por não cumprirem - ou o fizerem irregularmente - obrigações legais que lhe são impostas, acarretam o dever de o Estado indenizar. 15 3. Responsabilidade por atos administrativos, legislativos e judiciais. Dever de indenizar, ainda que se trate de conduta lícita da administração. Responsabilidade subjetiva (dolo ou culpa) do agente ou servidor (art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3)). Direito-dever de regresso da administração contra o agente ou servidor. Ação autônoma. Inadmissibilidade de denunciação da lide pela administração ao servidor (art. 70, do CPC (LGL\1973\5)). Ação penal contra o causador do dano. Sentença penal condenatória transitada em julgado como título executivo judicial (art. 584, II, do CPC (LGL\1973\5)). Ação de improbidade administrativa (Lei 8.429/92). As condutas ensejadoras da responsabilidade civil da administração pública podem advir de quaisquer dos órgãos do Estado ou de seus agentes ou servidores. Atos administrativos, legislativos e judiciários, desde que causem dano ao administrado. O ato legistivo típico (lei em sentido lato) é geral e se dirige a toda a comunidade, de modo que se afigura difícil possa causar prejuízo concreto a alguém. Mas, em se tratando, por exemplo, de lei de efeito concreto, pode ser que cause dano a alguém, razão por que pode ensejar indenização. Não basta o prejuízo, sendo necessário que se reconheça a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa para que a administração responda pelos prejuízos que, concretamente, tenha causado ao administrado. Quanto aos atos judiciais típicos (sentenças), em tese podem causar prejuízo, devendo a administração pública por eles responder. É o caso, por exemplo, do erro judiciário e da prisão além do tempo fixado na sentença. Nesses dois casos o art. 5.º, LXXV, da CF/1988 (LGL\1988\3) estabelece o dever de o Estado indenizar o prejudicado. O art. 133, do CPC (LGL\1973\5) fixa caso de responsabilidade civil subjetiva do juiz, enquanto pessoa física, o que não inibe o prejudicado de acionar diretamente a administração pública, que responde objetivamente, enquanto o juiz responde subjetivamente. A responsabilidade da administração existirá, ainda que sua conduta tenha sido lícita: se dela 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 5/10 decorreu dano ao administrado, há o dever de indenizar. Qualquer que seja a responsabilidade imputável à administração, bem como à natureza da conduta comissiva ou omissiva (se de gestão ou império, se decorrente de ato administrativo ou não); qualquer que seja a natureza do dano, a responsabilidade civil da administração rege-se sempre pelo art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3). Dizemos isto porque há sistemas jurídicos que distinguem essas situações, prevendo indenização pelo direito público e pelo direito civil, conforme o caso. Assim ocorre, por exemplo, na Alemanha, 16na Argentina, 17na França. 18 Enquanto a responsabilidade civil da administração é sempre objetiva (art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3)), o direito de regresso que a administração tem contra o verdadeiro causador do dano (agente ou servidor -art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3)), de reaver dele aquilo que desembolsou para pagar o dano experimentado pelo administrado, é fundado na responsabilidade subjetiva. A administração tem de provar que o agente ou servidor agiu com dolo ou culpa. Inexistente o dolo ou a culpa do agente, não há o direito de regresso da administração. O direito de regresso só pode ser exercido em ação autônoma, vedada a denunciação da lide (art. 70, do CPC (LGL\1973\5)) pela administração ré, ao agente ou servidor, pois na ação principal discute-se a responsabilidade objetiva da administração e na ação de denunciação da lide se discutiria a mesma responsabilidade a título de culpa, introduzindo-se fundamento novo na demanda secundária, o que é vedado pelo sistema processual. O administrado tem direito de pronta e rápida indenização, não podendo ficar à mercê do retardamento do procedimento, com a discussão e a prova da culpa do agente ou servidor, elemento estranho ao seu direito de indenização pela responsabilidade objetiva. 19A administração, em verdade, tem o dever de promover a ação de regresso contra o causador do dano, pois a parte final do art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3) é comando imperativo e não mera faculdade do poder público. Caso tenha havido ação penal proposta contra o agente ou servidor, essa circunstância não impede que o administrado mova ação de indenização contra a administração pública. Tendo em vista que a responsabilidade civil é independente da criminal (art. 1.525, do CC/1916 (LGL\1916\1)), o servidor pode ser absolvido no crime e condenado no cível, mas a recíproca não é verdadeira, pois condenado no crime é certa sua obrigação de indenizar no cível (art. 91, I, do CP (LGL\1940\2)). O administrado pode acionar a administração pública, mesmo que o servidor tenha sido absolvido na ação penal, porque a administração responde objetivamente, sendo irrelevante a conduta dolosa ou culposa de seu servidor, para que tenha de indenizar o dano por ele causado. A absolvição do servidor na esfera criminal, entretanto, não o libera de indenizar o dano decorrente de sua conduta, diretamente ou mediante ação regressiva, salvo se comprovada a inexistência do fato ou a circunstância de que ele não tenha sido o autor do fato (art. 1.525, do CC/1916 (LGL\1916\1)). Condenado o agente ou servidor na esfera criminal, essa condenação torna certa a obrigação de indenizar no cível (art. 91, I, do CP (LGL\1940\2)). A sentença penal condenatória é título executivo judicial (art. 584, II, do CPC (LGL\1973\5)), ensejador do ajuizamento de ação de execução diretamente contra o servidor, condenadono crime. A execução da sentença penal condenatória transitada em julgado pode ser promovida tanto pelo administrado como pela administração pública, mas sempre e somente contra o servidor, condenado no crime. Essa execução só será possível se a sentença penal condenatória estipular o valor do prejuízo causado pelo agente ou servidor. Quando não houver essa circunstância na sentença, antes de executá-la é preciso ajuizar-se ação de liquidação de sentença, que deverá ser processada e julgada no juízo cível competente, na forma do art. 603, do CPC (LGL\1973\5). 20 Ao revés, se o administrado quiser responsabilizar diretamente a administração pública, por força do art. 7, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), não poderá mover a ação de execução com base na sentença condenatória, pois essa só vincula quem consta do título como obrigado, que é o servidor. Mesmo depois de sentença penal condenatória transitada em julgado, o administrado tem de mover ação de conhecimento contra a administração, para obter dela a indenização dos prejuízos que sofreu em decorrência de crime perpetrado por agente ou servidor. O agente ou servidor pode responder, ainda, por improbidade administrativa (Lei 8.429, de 02.06.1992). Não se trata de ação regressiva, mas de ação direta do poder público contra o servidor ímprobo que causou prejuízo ao patrimônio público e social. 4. Danos indenizáveis. Nexo de causalidade entre conduta e dano. Culpa exclusiva da vítima e força maior Os danos indenizáveis são os patrimoniais e os morais. O art. 5.º, V e X, da CF/1988 (LGL\1988\3) estipula a indenizabilidade do dano moral, na modalidade de responsabilidade objetiva, já que não 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 6/10 menciona a conduta do causador do dano como condição para que se caracterize o dever de indenizar. São bens jurídicos protegidos por essa norma constitucional a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas. Caso seja violado um desses bens jurídicos por alguém que, na qualidade de agente ou servidor, por conduta positiva ou omissiva, causando dano patrimonial ou moral, há o dever de a administração pública indenizar. 21Ocorrendo, pelo mesmo fato, dano patrimonial e moral, são ambos indenizáveis cumulativamente, consoante iterativa jurisprudência do STJ (Súm. 37). 22 Mesmo pela teoria do risco há situações que desobrigam a administração do dever de indenizar. A doutrina e jurisprudência denominam de causas de exclusão da responsabilidade civil determinadas circunstâncias que, se presentes e comprovadas, excluiriam o dever de o poder público indenizar. A administração pública não será responsável pela indenização quando houver culpa exclusiva da vítima. A doutrina e jurisprudência dominantes costumam incluir, além da culpa exclusiva da vítima, a força maior como causa de exclusão da responsabilidade civil da administração pública. 23 Força maior é o acontecimento invencível provocado por acidentes da natureza: enchentes, vendavais, furacões. O caso fortuito é o imprevisível, mas por ação ou omissão do homem, que ocorre mesmo havendo sido tomadas todas as cautelas para evitar-se o fato. É exemplo de caso fortuito a explosão de usina nuclear por ação do tempo (reação química, superaquecimento, etc.). Do ponto de vista técnico essas denominadas causas de exclusão da responsabilidade civil são acontecimentos que excluem, na verdade, o nexo de causalidade entre conduta e dano. 24Se a culpa pelo acidente foi exclusiva da vítima foi porque a conduta da administração, comissiva ou omissiva, não deu causa ao dano; se o dano se verificou pelo só acontecimento invencível da natureza (força maior), é porque não há relação entre a conduta da administração e o mesmo dano. As denominadas causas de exclusão (caso fortuito e força maior) na verdade excluem o nexo de causalidade quando se imputa culpa ao devedor: a) a mora, no caso de inadimplemento contratual; e b) a culpa em sentido estrito, no caso de responsabilidade extracontratual, como é o da responsabilidade da administração pública. Como essa responsabilidade é objetiva, prescindindo do elemento subjetivo (dolo ou culpa) para verificar-se o dever de indenizar, é irrelevante saber se houve força maior ou caso fortuito, porque essas causas não excluem a responsabilidade objetiva da administração pública. 25 Correto é falar-se, portanto, na existência de apenas responsabilidade objetiva da administração pública, pelo risco (art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3)), sendo impertinente argumentar-se com responsabilidade subjetiva com culpa administrativa pela falta do serviço, bem como é correto falar-se que são requisitos para haver o dever de a administração indenizar: a) dano; b) nexo de causalidade entre conduta (omissiva ou comissiva) da administração e o dano, sendo também impertinente falar-se em "culpa exclusiva da vítima" ou em "força maior" como causas excludentes da responsabilidade civil do poder público. Bibliografia ALCÂNTARA, Maria Emília Mendes. 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A denunciação da lide: sua obrigatoriedade e extensão. Justitia 94/9-17, 1976. HENTZ, Luiz Antonio Soares. Direito administrativo e judiciário. São Paulo : LEUD, 1998. LAUBADÈRE, André de. Traité de droit administratif. 3. ed. Paris, 1963, v. 2. LAZZARINI, Álvaro. Responsabilidade civil do Estado por atos omissivos de seus agentes. RJTJSP 117/8-26. MARIENHOFF, Miguel S. Tratado de derecho administrativo. 5. ed. Buenos Aires : Abeledo-Perrot, 1992, t. IV. MEDEIROS, Rui. Ensaio sobre a responsabilidade civil do Estado por actos legislativos. Coimbra : Almedina, 1992. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 24. ed. São Paulo : Malheiros, 1999, p. 585 (atualização de Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho). MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 10. ed. São Paulo : Malheiros, 1998. NERY Junior, Nelson & NERY, Rosa Maria Andrade. 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Direito administrativo brasileiro. 24. ed. São Paulo : Malheiros, 1999, p. 585 (atualização de Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho). (3) Nesse sentido, MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 10. ed. São Paulo : Malheiros, 1998, p. 621, cap. XVII, n. 45; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 11. ed. São Paulo : Atlas, 1999, p. 505 et seq., n. 15.3. (4) MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso, cit., p. 624 et seq., cap. XVII, n. 53 et seq.; FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 3. ed. São Paulo : Malheiros, 1998, p. 231; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, cit., p. 507-508, n. 15.4. Na jurisprudência: RTJ 70/704, 47/378; RDA 38/328. Contra, entendendo que o poder público responde também objetivamente quanto às condutas omissivas de seus agentes: LAZZARINI, Álvaro. Responsabilidade civil do Estado por atos omissivos de seus agentes. RJTJSP 117/8-26. (5) RDA 297/301, 259/148, 255/328. A doutrina dominante entende fundar-se essa responsabilidade da administração no art. 15 do CC c/c o art. 159 do mesmo diploma: DINIZ, Maria Helena. Código Civil (LGL\2002\400) anotado. 5. ed. São Paulo : Saraiva, 1999, comentário ao art. 15, p. 30-32; STERMAN, Sônia. Responsabilidade do Estado. São Paulo : RT, 1992, p. 91. n. 5.5. (6) RT 275/319. (7) MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, cit., p. 590. (8) STF- RT 733/130. Esse exemplo de dano por fato ocorrido no recinto de escola, provocado por aluno ou sofrido por aluno ou terceiro, típico de conduta omissiva, é dado pela doutrina como sendo caso de responsabilidade objetiva: CRETELLA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. Rio de Janeiro : Forense, 1999, p. 626-627, n. 475; LAUBADÈRE, André de. Traité de droit administratif. 3. ed. Paris, 1963, v. 2, p. 648; WALINE, Marcel. Droit administratif. 9. ed. Paris, 1963, p. 814. (9) Num primeiro momento o ilustre jurista pátrio diz, acertadamente, que havendo falta anônima do serviço a responsabilidade da administração é objetiva, "porque esta falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins" ( op. cit., p. 589). Para tanto cita o excelente e bem fundamentado acórdão do STF, inserto na RT 733/130, cuja hipótese era de perda do globo ocular por aluno que se encontrava no estabelecimento escolar, provocada por colega que portava agulha de injeção. Num segundo momento diz que, se o dano for causado por terceiro (que é exatamente o caso da RT 733/130), deve-se provar a culpa da administração, citando o acórdão do STF inserto na RT 753/156 ( op. cit., p. 590). Parece que há divergência entre uma e outra afirmação do nobre jurista, sendo que preferimos subscrever a primeira, de que a responsabilidade objetiva existe sempre, quer se trate de conduta comissiva, quer omissiva. O mais é discussão sobre o nexo de causalidade, nada tendo a ver com o fundamento da responsabilidade da administração pública. (10) STF- RT 753/156. (11) MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, cit., p. 621, cap. XVII, n. 45. (12) Idem, ibidem, p. 626, n. 60. (13) Idem, ibidem, p. 633-635, n. 77-82. A tese que defende, de que poderia existir responsabilidade subjetiva da administração, quando tratar-se de conduta omissiva, parece não estar de acordo com o conjunto de outros pensamentos do insígne jurista expostos na mesma obra. É correto o pensamento de Celso Antônio, quando afirma que culpa exclusiva da vítima e força maior, antes de serem causas de exclusão da responsabilidade civil da administração, excluem, isto sim, o nexo de causalidade entre conduta e dano. Da mesma forma, a administração só responderá pelos danos causados por conduta omissiva se comprovada a existência do nexo de causalidade entre a omissão e o dano, nada tendo a ver com culpa, concessa maxima venia. (14) Nesse sentido: GORDILLO, Augustín. Tratado de derecho administrativo ( La defensa del 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 9/10 usuario y del administrado). 3. ed. Buenos Aires : Fundación de Derecho Administrativo, 1998, t. 2, p. XVIII-15 et seq. (15) A doutrina admite, ainda, a responsabilidade da administração decorrente de atos e de fatos a ela imputáveis. Ver, por todos, MARIENHOFF, Miguel S. Tratado de derecho administrativo. 5. ed. Buenos Aires : Abeledo-Perrot, 1992, t. IV, p. 695, n. 1.652. (16) A Constituição Federal (LGL\1988\3) alemã ( Grundgesetz - GG) regula a responsabilidade da administração no art. 34, ao passo que o Código Civil (LGL\2002\400) alemão ( Bürgerliches Gesetzbuch - BGB) regula a mesma responsabilidade no § 839. A doutrina interpreta esse complexo sistema no sentido de que o BGB 839 estabelece a forma de concretização do direito de obter a indenização, ao passo que a GG 34 regula o próprio direito à indenização. Nesse sentido: WIELAND, Joachim. In: DREIER, Horst (coord.). Kommentar zum Grundgesetz. Tübingen : Mohr Siebeck, 1998, v. II, p. 741, comentário 25 à GG 34. Esse mesmo autor noticia evolução da doutrina quanto a entendimento anterior, mais conservador, de que no BGB 839 residiria a fonte do direito de indenização, enquanto que na GG 34 existiria apenas situação de imputação. Em outras palavras, a doutrina alemã anterior dizia que a GG 34 não seria norma criadora de direito de indenização para o administrado ( Anspruchsnorm), mas apenas estipularia regra de imputabilidade ( Zurechnungsnorm), ou seja, diria quem deve pagar a indenização. Para maior aprofundamento do tema, consultar: THOMAS, Heinz. In: PALANDT, Otto. Bürgerliches Gesetzbuch. 58. ed. München : Beck, 1999, p. 1.007-1.029, comentários 1 a 163 ao § 839 do BGB; PAPIER, Hans- Jürgen. Münchener Kommentar zum Bürgerlichen Gesetzbuch. Direito das Obrigações, Parte Especial. Coord. Kurt Rebmann, Franz Jürgen Säckere Roland Rixecker, redator Peter Ulmer. 3. ed. München : Beck, 1997, t. III, v. 5, p. 1.851-1.994, comentários 1 a 382 ao § 839 do BGB; BONK, Heinz Joachim. Grundgesetz Kommentar. Coord. Michael Sachs. 2. ed. München : Beck, 1999, p. 1.047-1.085, comentário ao Art. 34 GG; SCHÄFER, Alfred e BONK, Heinz Joachim. Kommentar zum Staatshaftungsgesetz (StHG). München : Beck, 1982; OSSENBÜHL, Fritz. Staatshaftungsrecht. 3. ed. München : Beck, 1983; JACOBS, Rainer. Staatshaftungsrecht. München : Beck, 1982. (17) Ver, por todos, MARIENHOFF, Miguel S. Tratado, cit., t. 5, p. 686-688, n. 1.648. (18) Ver, por todos, DEMOGUE, René. Traité des obligations en général. Paris : Librairie Arthur Rousseau, 1925, t. V, p. 603-604, n. 1.279. (19) Ver, nesse sentido: NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil (LGL\1973\5) . 4. ed. São Paulo : RT, 1999, p. 503, comentário 15 (casuística) ao CPC (LGL\1973\5) 70, verbete "responsabilidade do Estado"; GRECO FILHO, Vicente. A denunciação da lide: sua obrigatoriedade e extensão. Justitia 94/9-17; FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso, cit., p. 236; ZANCANER, Weida. Responsabilidade extracontratual da administração pública. São Paulo : RT, 1981, p. 65; RTJ 100/352; RT 576/265. Em sentido contrário, admitindo a denunciação da lide pela administração ao servidor: RT 667/172, 611/128; RJTJSP 101/333. (20) NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria Andrade. CPC (LGL\1973\5) comentado, cit., p. 1.093, comentário 4 ao CPC (LGL\1973\5) 584 II. (21) No mesmo sentido, entendendo ser indenizável, pela administração pública, também o dano moral: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso, cit., p. 632, cap. XVII, n. 72; FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso, cit., p. 237 et seq.; TÁCITO, Caio. Responsabilidade do Estado por dano moral. In: Temas de direito público: estudos e pareceres. Rio de Janeiro : Renovar, 1997, v. 1, p. 569-579, n. 42; MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, cit., p. 594. Na jurisprudência, admitindo a indenização do dano moral pela administração pública: STF- RT 753/156. (22) Súm. 37 do STJ: "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato". (23) Nesse sentido: STF- RT 733/130. (24) Correto, no particular, o entendimento de MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso, cit., p. 633-635, cap. XVII, n. 77-82. (25) BONVICINI, Eugenio. La responsabilità civile. Milano : Giuffrè, 1971, v. II, p. 691, § 303; NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria Andrade. CPC (LGL\1973\5) comentado, cit., p. 1.813-1.814, comentário 4 (casuística) ao CDC (LGL\1990\40) 14. No mesmo sentido: RTJ 122/1.181, acórdão relatado pelo Min. Moreira Alves, a propósito da responsabilidade das estradas de ferro (art. 17, I, do Dec. 2.681, de 1912); TJSP- RT 745/223; TJSP- BolAASP 2.051/539; GONÇALVES, Carlos 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 10/10 Roberto. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo : Saraiva, 1995, p. 224-228, n. 46.2; Maria DONATO, Antonieta Zanardo. Proteção ao consumidor: conceito e extensão. São Paulo : RT, 1994, p. 224. Página 1 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 1/8 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: alguns aspectos RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: ALGUNS ASPECTOS Revista de Direito Privado | vol. 17 | p. 123 | Jan / 2004 Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 6 | p. 43 | Out / 2011DTR\2004\65 Honildo Amaral de Mello Castro Área do Direito: Administrativo Sumário: 1.Breves considerações sobre a origem e evolução histórica - 2.O sistema jurídico brasileiro e a Constituição de 1988 - 3.Pressupostos ao exercício do direito de ação - 4.Cláusulas excludentes da responsabilidade do Estado - 5.O art. 37, § 6.º, da CF/1988 - 6.A prescrição qüinqüenal - 7.Alguns aspectos da vida forense 1. Breves considerações sobre a origem e evolução histórica Tratar desse tema complexo e amplo é tarefa impossível, razão pela qual apenas tecerei algumas considerações sobre seus aspectos fundamentais e alguns aspectos que se mostram mais comuns na vida diária de um advogado.* Deve-se compreender a responsabilidade civil do Estado como sendo o dever-obrigação legal de recompor prejuízos causados a terceiras pessoas, jurídicas ou privadas, por suas atividades. Nem sempre foi assim. A história registra que vigia até certa época a teoria da irresponsabilidade do Estado, estratificada na expressão "the king can do no wrong" (o rei nunca erra), ou "o que agradou ao príncipe tem força de lei" ("quod principi placuit haber legis vigorem"), ou, ainda, "l'État c'est moi" (o Estado sou eu), períodos esses de um absolutismo em que a cidadania não tinha conteúdo de validade. Pode-se situar, louvando-se em Bielsa e Duez, citados por Yussef Said Cahali,1a evolução da teoria da responsabilidade em três fases, sendo mais precisos os ensinamentos expostos por Duez de onde se extraem: "a) numa primeira fase, a questão inexistia. A irresponsabilidade aparece como axioma, e a existência de uma responsabilidade pecuniária da Administração é considerada como entrave perigoso à execução dos seus serviços; na ordem patrimonial, os administrados têm à sua disposição apenas uma ação de responsabilidade civil contra o funcionário; b) numa segunda fase, a questão se põe parcialmente no plano civilístico: para a dedução da responsabilidade pecuniária do Poder Público, faz-se apelo às teorias do Código Civil (LGL\2002\400), relativas aos atos dos prepostos e mandatários; c) numa terceira fase, a questão se desabrocha e se desenvolve no plano próprio do direito público; uma concepção original, desapegada do direito civil, forma-se progressivamente no quadro jurídico da faute e do risco administrativo". A teoria da irresponsabilidade,não mais acolhida, partira ou firmara-se em três postulados: a) na soberania do Estado, que negava sua igualdade ao súdito em qualquer nível de relação; b) representando o Estado soberano, o direito organizado não poderia aparecer como violador desse mesmo direito; c) daí, como corolário, os atos contrários à lei praticados por funcionários jamais poderiam ser considerados atos do Estado, devendo ser atribuídos pessoalmente àqueles, como praticados não em representação do ente público, mas nomine proprio. Considerando esses enunciados, nessa época inexistia a responsabilidade, mas aparece a irresponsabilidade como um axioma, contra ela se voltando os juristas, o que levou o Ministro do STF Pedro Lessa a afirmar "que a doutrina da irresponsabilidade do Poder Público é hoje repudiada pelos juristas e vai sendo pouco a pouco desprezada pelos legisladores".2 Essa teoria começou a ser combatida por sua evidente injustiça, segundo o entendimento de que se o Estado deve tutelar o direito, não pode deixar de responder quando, por sua ação ou omissão causar danos a terceiros, pois, como pessoa jurídica, é titular de direito, mas também de obrigações. 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 2/8 Os Estados Unidos da América do Norte e a Inglaterra, nos ensina Cahali, que defendiam esses postulados de irresponsabilidade, acabaram por abandoná-los por meio do Federal Tort Claims Act, de 1946, e Crown Proceeding Act, de 1947, respectivamente. No direito norte-americano, o terceiro pode acionar diretamente o funcionário, admitindo-se em alguns casos, a responsabilidade direta do Estado desde que haja culpa apurada tão amplamente como a dos particulares. Na Inglaterra, o Estado passou a responder pelos atos de seus funcionários ou agentes, desde que haja infração àqueles deveres de todo patrão em relação aos seus prepostos. Essa teoria da irresponsabilidade passou a ser negada pela teoria civilista da responsabilidade civil do Estadoa partir do século XIX, adotando inicialmente os princípiosdo direito civil, apoiado na idéia de culpa. Numa primeira fase, objetivava uma responsabilidade pecuniária do Poder Público, fazendo-se remissões aos princípios da responsabilidade por fato de terceiro (patrão, amo ou comitente/ preponente, representado, mandante), buscando distinguir ato de império e atos de gestão. Quanto ao ato de império, continuava a teoria da irresponsabilidade, porque agia o Estado no exercício da sua soberania, com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular, razão por que estaria incólume a qualquer julgamento. Todavia, na prática dos atos de gestão, equiparar-se-ia ao particular porque os praticava em igualdade de situação, podendo a sua responsabilidade ser reconhecida como qualquer empresa privada, pois que sua atividade não diferia da atividade do particular. Estaria em um mesmo plano. Aplicava-se à Administração e ao particular, nos atos de gestão, o direito comum. Esse posicionamento, embora viesse abrandar a teoria da irresponsabilidade do monarca por prejuízos causados a terceiros, passou a não ser acatado diante do pensamento de que era arbitrária a distinção entre ato de império (jure imperii) e ato de gestão (jure gestionis), porque praticando um ou outro o Estado era sempre o Estado. Inaceitável o entendimento, porque ao praticar o ato de uma ou outra espécie, age como Poder Público e a negativa de indenização consistiria em subtrair-se o Poder Público à sua função específica, qual seja a tutela de direitos, como na condição de guardião do Direito deixar indene o cidadão que sofreu prejuízo pelo próprio Estado. Ainda na evolução histórica, chegou-se à fase da publicização da culpa, ou seja, a era das chamadas teorias publicistas, também denominada teoria da culpa administrativa ou da faute du service (falta do serviço) dos franceses, não diferenciado atos de gestão e atos de império, mas da correta ou incorreta atuação do serviço público. A falta do serviço público não dependia da falta do agente, mas do funcionamento defeituoso, insatisfatório, ou como se admite hoje, de uma deficiência no funcionamento normal do serviço, mas não imputável ao servidor a título pessoal. A guisa de história, o primeiro passo nesse sentido surgiu na França no famoso Caso Blanco em 1873, em decorrência do atropelamento de uma menor, Agnés, por uma vagonete, o que levou o seu pai a ajuizar uma ação de indenização civil com base no princípio de que o Estado é responsável pelos prejuízos causados a terceiro por ação danosa de seus agentes. A partir de então, a evolução fez surgir a teoria da culpa do serviço ou da culpa administrativa e teoria do risco.É importante registrar que a culpa do serviço, ou culpa administrativa, procurou desvincular a responsabilidade do Estado da idéia de culpa do funcionário, passando a se falar em culpa do serviço público. Sem abandonar essa teoria, o Conselho de Estado Francêspassou a adotar, em algumas situações, a teoria do risco que veio de servir de fundamento à responsabilidade objetiva do Estado. Pela teoria da responsabilidade objetiva do Estado, o dano sofrido pelo indivíduo deve ser visualizado como conseqüência do funcionamento do serviço público, não importando se esse funcionamento foi bom ou mau. Para essa teoria, importa a relação de causalidade entre o dano e o ato do agente. É chamada teoria da responsabilidade objetiva, porque prescinde da apreciação dos elementos subjetivos culpa ou dolo, e também é chamada de teoria do risco, porque parte da idéia de que a atuação estatal envolve um risco de dano, inerente à sua atividade. Essas teorias sofreram mutações, como nos ensina Hely Lopes Meirelles: "Pela atual teoria da responsabilidade objetiva, não há mais fundamento para esta sibilina distinção. Todo ato ou omissão de agente administrativo, desde que lesivo e injusto, é reparável pela Fazenda Pública, sem se indagar se provém dos jus imperii ou do jus gestionis, uma vez que ambos são formas da atuação administrativa" (TFR, RDA 42/253; TJSP, RT 202/163, 203/299, 227/ 273). 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 3/8 Em síntese, podemos nos fixar nos ensinamentos da Profa. Maria Sylvia Zanella Di Pietro,3que esquematiza, com muitíssima propriedade, as diversas teorias, agrupando-as em três espécies, segundo a evolução sofrida: 1. teoria da irresponsabilidade; 2. teorias civilistas: teoria dos atos de império e de gestão e teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva; 3. teorias publicistas: teoria da culpa administrativa ou culpa do serviço público e teoria do risco integral ou administrativo ou teoria da responsabilidade objetiva. Assim, na delimitação do tema cuja teoria da responsabilidade objetiva é adotada pelo nosso Ordenamento Constitucional, é preciso que se distinga, também, que a responsabilidade civil é extracontratual, porque a responsabilidade contratual se rege por princípios próprios. Além do mais, enquanto a responsabilidade patrimonial pode decorrer de atos jurídicos, de atos ilícitos, de comportamentos materiais ou de omissão do Poder Público, no direito privado a responsabilidade exige, sempre, que haja um ato ilícito - contrário à lei -, certo, também, que no direito administrativo ela também decorre de atos ou comportamentos que, embora lícitos, causem a pessoas determinadas maior ônus do que o imposto aos demais membros da coletividade. 2. O sistema jurídico brasileiro e a Constituição de 1988 A nossa Constituição de 1891, elaborada com conceitos trazidos pela genialidade de Rui Barbosa, estabelecera no art. 82 que "os funcionários públicos são estritamente responsáveis pelas obras e omissões em que incorrerem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos". Posteriormente, a Lei 221, de 20.11.1984, estabeleceu que "os juízes e Tribunais Federais processarão e julgarão as causas que se fundarem na lesão de direitos individuais por atos ou decisões das autoridades administrativas da União",até que foi tornada explícita no art. 15, do CC/ 1916 (LGL\1916\1), no art. 171, da Constituição de 1934, no art. 194, da Constituição de 1946, no art. 105, da Constituição de 1967, até que se manteve os mesmos princípios no art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3). Pode-se assim afirmar, com Di Pietro, que a partir da Constituição de 1946 ficou consagrada a teoria da responsabilidade objetiva do Estado. Agora, o novo Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro a prevê, também, no art. 43, verbis: "As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado o direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo". Com efeito, a Constituição Federal de 1988 adotou a chamada teoria do risco administrativo, estendendo os seus efeitos às pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviços públicos, também consagrada pelo Excelso STF como se infere do julgamento relatado pelo eminente Min. Celso de Mello: "Essa concepção teórica que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público" (STF, 1.ª T., RE 109.615-2-RJ, DJ 02.08.1996, p. 25.785). 3. Pressupostos ao exercício do direito de ação Sãorequisitos ou pressupostos à configuração da responsabilidade civil do Estado, segundo a teoria do risco administrativo, a ocorrência de dano, ação ou omissão administrativa, existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissãoadministrativa e ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. É imprescindível o evento danoso e a lesão, pouco importando a sua natureza de dolo ou de culpa. Só a existência de uma ilegalidade ou irregularidade no ato, mas que se verifique sem gerar dano a terceiros, não pode produzir nenhuma responsabilidade, mas, apenas e quando for o caso, a sua invalidade. É fundamental que se registre que com relação às pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias ou concessionárias de serviços públicos, estarão submetidas à regra constitucional desde que prestem serviços públicos. Dessa forma, se as entidades da administração indireta executarem atividades econômicas de natureza 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 4/8 privada, a responsabilidade será disciplinada pelas normas de direito privado, de direito comum. Esse tema, requisitos ou pressupostos à configuração da responsabilidade civil do Estado, é muito vasto e complexo diante das inúmeras situações possíveis. Entretanto, vejo como imprescindível que se destaque as suas características para danos provenientes de atividades lícitas e os provenientes de atividades ilícitas. Danos provenientes de atividades ilícitas, segundo Weida Zancaner, por serem sempre antijurídicos, necessitam reunir apenas duas características: 1) ser certos e não eventuais, podendo ser atuais ou futuros; 2) atingir situação jurídica legítima, suscetível de configurar um direito, ou, quando menos, um interesse legítimo. Em se tratando de atividades lícitas, ensina a mestre que é necessário acrescentar àquelas duas relativas às atividades ilícitas, mais duas outras que explicitam o dano como anormal e especial, portanto injusto: 3) ser anormal, exceder os incômodos provenientes da vida societária; 4) ser especial, isto é, relativo a uma pessoa ou grupo de pessoas.4 Em outros termos, é preciso que haja um dano, pouco importa se por culpa ou dolo, de deficiência ou falha do serviço, de culpa anônima da Administração, da chamada faute de service - deficiência, negligência, má qualidade etc. - para que surja o direito à pretensão ressarcitória, que deve compreender os danos certos e não eventuais, atuais ou futuros, sendo a mais completa possível como assimilasse a responsabilidade civil do direito comum. Não se deve ignorar que a atividade pública, pelo seu interesse coletivo, sobrepõe-se ao interesse individual, ao interesse privado, razão pela qual para que o dano dê lugar ao direito indenizatório é necessário que o prejuízo seja especial ou singular, e não universal, isto é, somente ocorre quando certa ou certas pessoas forem prejudicadas pela atividade administrativa, enquanto a generalidade foi poupada. Assevera o Prof. Cahali que "(...) o dano deve ser anormal, excepcional, individualizado, que ultrapassa, por sua natureza e expressividade, os incômodos e sacrifícios toleráveis ou exigíveis em razão do interesse comum da vida em sociedade. Pois só assim qualifica-se como dano injusto, na medida em que 'rompe o princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais'". 5 Sem que o dano seja especial ou singular, plenamente identificável, não há que se falar em indenização, pois, na hipótese, a atividade do Estado seria juridicamente perfeita, significando forma regular de restrição administrativa ao direito do particular. Um exemplo clássico para demonstrar esse pressuposto especial ou singular, ou mesmo de um grupo de pessoas, pode ser extraído do remanejamento de uma via pública como, por exemplo, a construção de um elevado que possa prejudicar aos proprietários dos imóveis confinantes, sejam eles presentes ou que venham a construir futuramente. É célebre a situação da construção do Elevado Costa e Silva, conhecido como "minhocão", em São Paulo, que embora viesse melhorar o sistema viário da cidade, causou danos específicos a terceiros (TJSP, 4.ª Câm. Civ., maioria, RT 469-71 e RJTJSP 30/62). O Excelso STF reformou o entendimento do TJSP de que, em síntese, considerara a construção um bem social, quando assim se posicionou: "O viaduto, cuja construção se fez por exigência do interesse público, afetou o grupo de pessoas ou grupo de imóveis situados em frente ao mesmo viaduto. E, conforme sustentam, com propriedade, os recorrentes, mesmo que tivesse, a título de argumentação, afetado todo o bairro, não deixaria de ter afetado apenas um grupo de pessoas" (STF, 2.ª T., 18.02.1992, rel. Min. Carlos Velloso, RTJ 140/636. Ver Jurídica Mineira 95/64). Outra hipótese bastante comum, e inúmeros são os precedentes jurisprudenciais, ocorre quando haja o rebaixamento do nível de uma rua, deixando prédio construído em nível muito superior. O que é fundamental que se apreenda, é que o direito à indenização decorrerá de um nexo de causalidade material. Assim, o prejuízo que se queixa o particular tem de ser conseqüência da atividade ou omissão administrativa, ou como já decidiu o TJSP: "a responsabilidade da Administração Pública, desvinculada de qualquer fator subjetivo, pode, por isso, ser afirmada independentemente de demonstração de culpa, mas está sempre submetida, como é óbvio, à demonstração de que foi o serviço público que causou o dano sofrido pelo autor" (TJSP, 2.ª Câm. Cív., j. 09.09.1980, RJTJSP 68/145). Existem várias doutrinas a respeito da relação de causalidade tais como a "teoria da equivalência das condições", a "teoria da causa próxima e da causa direta", a "teoria da causalidade eficiente"; a "teoria negativa de Mayer"; a "teoria da causalidade típica"; a "teoria da causalidade adequada", todas exigindo uma reflexão bastante acentuada dos seus princípios. Para essas reflexões, penso ser suficiente demonstrar-lhes que o Excelso STF na vigência da 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 5/8 Constituição de 1967 manifestou-se no sentido de que a teoria adotada é a "teoria do dano direto e imediato", também denominada "teoria da interrupção do nexo causal", ao estabelecer o enunciado de que "a responsabilidade do Estado, embora objetiva por força do disposto no art. 107, da Emenda Constitucional 1/69 não dispensa, obviamente, requisito, também objetivo, do nexo de causalidade entre a ação ou omissão atribuída a seus agentes e o dano causado a terceiros". A vigente Constituição adota esse mesmo entendimento, embora mais abrangente, como afirmei, pois que ao adotar a teoria do risco administrativo estendeu os seus efeitos às pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviços públicos. 4. Cláusulas excludentes da responsabilidade do Estado A responsabilidade civil do Estado consagrada na Constituição brasileira, apesar de objetiva, permite abrandamentos em face da adoção da teoria do risco administrativo. A responsabilidade pode ser afastada no caso de força maior, caso fortuito, ou, ainda, se comprovada a culpa exclusiva da vítima, pois nessas hipóteses estará afastado um dos requisitos indispensáveis exigido pelo art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3): nexo causal entre a ação ou omissão do Poder Público e o dano causado. Caso fortuito ou de força maior, segundo dispõe o art. 1.058, par. ún., do CC/1916 (LGL\1916\1) " (...) verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir", princípio esse que é repetido no art. 393, do CC/2002 (LGL\2002\400). Pode também ser visto como aquele fato imprevisível e inevitável, estranho e independente da vontade das partes, como por exemplo, um terremoto, um raio, razão por que o C. STJ já decidiu pela exclusão da responsabilidade civil do Estado ao entender que "a força maior exclui a responsabilidade civil do Estado, quando descaracteriza o nexo de causalidade entre o evento danoso e o serviço público" (STJ, 2.ª T., REsp135.259-0-SP, rel. Min. Ari Pargendler, RSTJ 105/ 190). Falta ao caso fortuito e à força maior, ou culpabilidade exclusiva da vítima, nexo de causalidade entre o dano e o comportamento da Administração. Caso fortuito, ocorrerá quando o dano for causado por ato humano em conduta culposa ou dolosa de terceiro, de falha da Administração, igualmente independente da vontade das partes. Sem que haja nexo de causalidade entre o ato e o dano, não há que se falar em indenização, embora o rompimento de uma adutora por má conservação, as enchentes por entupimento de "bocas de lobo", por falta de drenagem de córregos, leva à falha omissiva da Administração, gerando a indenização. Por último, a culpa exclusiva da vítima afasta a responsabilidade do Estado, mesmo sendo essa objetiva. Casos muito freqüentes se manifestam nos acidentes automobilísticos. Na culpa exclusiva, o Estado não responde. Na culpa concorrente, atenua-se a sua responsabilidade, que se reparte com a vítima (RTJ 55/50; RT 447/82 e 518/99). 5. O art. 37, § 6.º, da CF/1988 Esse dispositivo Constitucional assegura às pessoas jurídicas de direito público e às de direito privado prestadoras de serviços públicos o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Surge na doutrina e na jurisprudência, discussão acerca da possibilidade da denunciação à lide pelo Poder Público, quando identificado o responsável pelo dano, nos termos do art. 70, III, do CPC (LGL\1973\5) que prevê a hipótese de ser obrigada a denunciação da lide na hipótese de o denunciado estar obrigado pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda. Divide-se a doutrina. Alexandre de Moraes entende não haver a obrigatoriedade, argumentando que a teoria do risco administrativo adotada pela nossa Constituição Federal (LGL\1988\3), não exige a demonstração de dolo ou de culpa por parte do agente, sendo incabível e processualmente inadequado, em face da celeridade processual, discutir-se sua responsabilidade subjetiva que, em verdade, não excluirá a do Estado. Sempre defendi também esse posicionamento, não apenas pelos ensinamentos do mestre, mas também pela incompatibilidade de ritos procedimentais da ação principal - dano objetivo - e da secundária nascida pela denunciação - dano subjetivo -, baseada na culpa. 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 6/8 Assim, a ausência de denunciação da lide, não excluirá a possibilidade de eventual discussão sobre dolo ou culpa do agente público a ser realizada em sede de ação de regresso, para fins de ressarcimento do Erário. O Prof. Humberto Theodoro Júnior, nos ensinamentos de Alexandre de Moraes, relativiza a denunciação da lide, sustentando a sua não obrigatoriedade para que o Estado possa agir regressivamente, e afirma que, se houver a denunciação, o juiz não poderá recusá-la. Pessoalmente não comungo com esse pensamento, na parte em que afirma que o juiz não poderá recusá-la, diante da diversidade de procedimento que nem sempre é o ordinário para todas as causas, bem como pela dificuldade de se estabelecer uma dualidade de provas: objetiva na ação principal e subjetiva na lide secundária. A Profa. Maria Sylvia Zanella Di Pietro divide o seu entendimento em duas vertentes: a primeira, se se trata de ação fundada em culpa anônima do serviço ou apenas na responsabilidade objetiva decorrente do risco, a denunciação não cabe, porque o denunciante estaria incluindo novo fundamento na ação: a culpa ou dolo do funcionário, não argüida pelo autor. A segunda, quando a ação fundar-se na responsabilidade objetiva do Estado, mas com argüição de culpa do agente público, a denunciação da lide é cabível como também é possível o litisconsórcio facultativo (com citação da pessoa jurídica e de seu agente), ou a propositura da ação diretamente contra o agente público. O Prof. Alexandre de Moraes informa que o STJ entende ser admissível e conveniente a denunciação da lide nessa hipótese (STJ, 1.ª T., REsp 37.215-1-SP, rel. Min. Demócrito Reinaldo, Ementário STJ 70/628). Ademais, aquele C. STJ decidiu ser recomendável que o agente público responsável pelos danos integre a ação (STJ, 1.ª T., REsp 594-RS, Min. Garcia Vieira, RSTJ 14/440. No mesmo sentido, 2.ª T., REsp 15.614-0-SP, rel. Min. José de Jesus Filho, RSTJ 62/216). No entanto, em outro julgado, afirmou o C. STJ que: a) se torna obrigatória a denunciação da lide na hipótese de perda do direito de regresso prevista no art. 70, I e II, do CPC (LGL\1973\5); b) não se faz presente na hipótese do inc. III do mesmo dispositivo, onde tal direito permanece íntegro (2.ª T., REsp 38.972-SP, rel. Min. Peçanha Martins, Ementário STJ 18/282). Assim, à guisa de ensinamentos, é preferível que se faça a denunciação da lide, sustentando-se a orientação jurisprudencial nesse sentido. 6. A prescrição qüinqüenal A responsabilidade civil do Estado sujeita-se à prescrição no prazo qüinqüenal em face do art. 178, § 10, VI, do CC/1916 (LGL\1916\1) e do Dec. 20.910/32 que estabelece no art. 1.º que "as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em 5 anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem", que se aplica, por força do Dec.-lei 4.597/42, às dívidas das autarquias e entidades ou órgãos paraestatais 7. Alguns aspectos da vida forense A incidência do instituto da responsabilidade civil do Estado se manifesta quase quotidianamente na vida do advogado, diante da multivariedade de hipóteses nascidas da vida em sociedade. Selecionei, para essa reflexão, breves considerações sobre três situações: a responsabilidade civil do Estado por erro judiciário e excesso de prisão; a responsabilidade do Estado por atos legislativos e a indenização em acidente de trânsito por pontes malconservadas e sem segurança. 7.1 Responsabilidade por erro judiciário Dispõe o art. 5.º, LXXV, da CF/1988 (LGL\1988\3), que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença". Traz o dispositivo duas hipóteses: a primeira de erro judiciário; a segunda, da prisão além do tempo fixado. Preleciona Alexandre de Moraes, que em sede de direito penal, o Estado só responde pelos erros dos órgãos do Poder Judiciário na hipótese prevista no art. 630, do CPP (LGL\1941\8), que a exclui, dizendo não devida a indenização, em duas situações: a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou ocultação de prova em seu poder; b) se a acusação houver sido meramente privada. A Loman, Lei Orgânica da Magistratura, por sua vez no art. 49, dispõe: "Responderá por perdas e danos o magistrado quando: I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude; II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento das partes. Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 7/8 inciso II, somente depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao magistrado que determine a providência, e este não lhe atender o pedido dentro de dez dias". Para as hipóteses de erro judiciário, a revisão criminal e a ação própria no juízo cível são os instrumentos cabíveis para o seu reconhecimento e conseqüente fixação da indenização, não sendo o habeas corpus meio idôneo para a sua apuração, porque demanda o exame de prova não admissível nesta ação constitucional, conforme já decidiu o Excelso STF (STF, 1.ª T., HC 70.766- RS, rel. Min. Moreira Alves, DJU 11.03.1994, p. 4.096). Por outro lado, o acórdão que em sede de revisão criminal ou a sentença civil que reconhecem o direito à indenização porerro judiciário consistem em um título judicial executório ilíquido, devendo ser liquidado no juízo cível. Na hipótese de o preso ficar retido além do tempo fixado na sentença, abrangendo todas as espécies de prisão, sejam processuais, penais, administrativas, civis ou disciplinares, deverá pleitear seu direito à indenização em ação própria no juízo cível, devendo a legitimação ativa ser exercida pelo interessado, ou na hipótese de seu falecimento, pelos seus beneficiários, mas cabendo-lhe o ônus da prova. É importante salientar que os juízes estão sujeitos à ação regressiva movida pelo Estado que indenizar o condenado ou o preso, somente quando houver dolo ou má-fé, como dispõe o art. 133, I, do CPC (LGL\1973\5), verbis: "(...) responderá por perdas e danos o juiz, quando: I - no exercício de suas funções proceder com dolo ou fraude: II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte". Esse dispositivo, bem como o seu parágrafo único, repetem a norma inserida no art. 49, da Loman. A indenização decorrente dessas violações importará em indenização por danos materiais - emergentes e lucros cessantes -, devendo recompor a situação anterior do prejudicado e também por danos morais, porque são óbvios seus efeitos em face do frontal ferimento do direito à liberdade e à honra. 7.2 Responsabilidade do Estado por atos legislativos A regra que prevalece em relação a atos legislativos é da irresponsabilidade, sustentando os seus defensores o dizer de Di Pietro6que: a) o Poder Legislativo atua no exercício da soberania, podendo alterar, revogar, criar ou extinguir situações sem qualquer limitação que não decorra da própria Constituição; b) o Poder Legislativo edita normas gerais e abstratas dirigidas a toda a coletividade, e os ônus são iguais para todos que se encontram em uma mesma situação, não quebrando o princípio da igualdade; c) os cidadãos não podem responsabilizar o Estado por atos de parlamentares por eles mesmos eleitos. Os que combatem esses pensamentos aduzem que: a) mesmo exercendo parcela de soberania, o Legislativo tem que se submeter à Constituição, de modo que acarreta responsabilidade do Estado quando edita leis inconstitucionais; b) nem sempre a lei produz efeitos gerais e abstratos, de modo que o Estado deve responder por danos causados por leis que atinjam pessoas determinadas, mesmo que se trate de normas constitucionais; c) no terceiro argumento, responde-se que a eleição do parlamentar implica delegação para fazer leis constitucionais. A Profa. Di Pietro informa que aceitam a tese da responsabilidade do Estado os professores Amaro Cavalcanti, Guimarães Menegale, Cretella Júnior, Diógenes Gasparini, Juary C. Silva, sustentando esse último ser aplicável aos três Poderes, com fundamento no princípio do Estado de Direito, ou seja, a submissão de toda a atividade estatal ao direito, concebendo esse como criado pelo Estado, senão como algo que se coloca acima do próprio Estado. É estudada, como uma dessas hipóteses, a lei estadual que criou a Reserva Florestal do Vale do Paraíba, afetando totalmente o direito de propriedade de um particular. Nesse julgamento, ficou precisa a diferença entre limitação administrativa e o sacrifício que decorre da lei para pessoas determinadas. Na limitação administrativa, o princípio da solidariedade determina que todos os componentes do grupo social têm o dever de suportar um sacrifício gratuito em benefício da coletividade. No direito do particular, o sacrifício passa a ser delimitado, surgindo, por conseqüência, o direito à indenização. 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 8/8 7.3 Acidente de trânsito, pontes malconservadas e sem segurança Os mesmos princípios que informam a responsabilidade civil da Administração pelos danos que resultam de acidentes de veículos nas ruas mal sinalizadas, com sinais deficientes, aplicam-se às pontes malconservadas. A responsabilidade será delimitada em face do responsável pela conservação, seja do Município, do Estado ou da União, dependendo da característica da estrada, ou que esteja no perímetro urbano, porque a uma dessas entidades compete o dever de sinalizar. (*) Palestra proferida no Centro de Ensino Superior do Amapá - Ceap, em outubro de 2002. (1) CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado. 2. ed. São Paulo: Malheiros, p. 16-17. (2) Do Poder Judiciário, 1915, p. 162. (3) Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, [s.d.]. p. 512. (4) Da responsabilidade extracontratual da administração pública. São Paulo: RT, 1981. p. 66-67. (5) CAHALI, Yussef Said. Op. cit., p. 78. (6) DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 519. Página 1 18/04/13 Envio | Revista dos Tribunais www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 1/4 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO Revista dos Tribunais | vol. 686 | p. 262 | Dez / 1992 Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 6 | p. 57 | Out / 2011DTR\1992\378 Luiz Fabião Guasque Promotor do Justiça-RJ Área do Direito: Geral Sumário: 1.Fontes e Natureza - 2.A responsabilidade concorrente - 3.A doutrina da faute de service - 4.A teoria do risco administrativo 1. Fontes e Natureza A responsabilidade civil decorre da lei; do contrato; do quase-contrato, (mandato e gestão de negócios); do delito, (crimes dolosos); e do quase-delito, (crimes culposos). (De Ruggiero, Instituições de Direito Civil, III/82 e ss.). Existe certo dissenso doutrinário sobre as fontes das obrigações, havendo autores que adotam apenas o contrato; o delito e a lei, e até mesmo os que consideram que a lei é pano de fundo de toda obrigação, e que apenas o contrato e o delito já seriam suficientes. Prefiro adotar o desdobramento referido pelo autor italiano, pois considero que há obrigações que decorrem apenas da lei. São as hipóteses de deveres jurídicos, ou seja, "a necessidade imposta por lei de fazer (ou omitir) alguma coisa". Hélio Tornaghi, ao referir-se aos tipos de relações jurídicas, na sua excelente Relação Processual Penal, ensina que "por vezes a lei exige a prestação independentemente da vontade de quem quer que seja; de outras vezes a obrigação de fazer corresponde ao direito de exigir de outrem. A todo direito corresponde um dever, mas a recíproca não é verdadeira: há deveres criados por lei independentemente de exigência de qualquer pessoa. Assim, p. ex.: o dever de pagar o aluguel corresponde ao direito do locador; mas o dever do médico de comunicar certas doenças (CP (LGL\1940\2), art. 269) é imposto por lei independentemente da vontade de quem quer que seja". Nesta hipótese é que vamos encontrar, a responsabilidade civil do Estado. Nela, a obrigação, ou melhor, o dever de não causar ou evitar o dano a terceiros decorre da própria CR: "Art. 37, § 6.º: as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". E a chamada responsabilidade objetiva do Estado, onde apenas a prova do nexo de causalidade entre o descumprimento do dever jurídico e o dano, determina a obrigação de reparar. Existe apenas a exigência da causalidade entre o dever de atuação positiva ou negativa do serviço público e a ocorrência do sinistro. Note-se, que neste campo de responsabilidade, não se fala em dolo ou culpa, ou melhor, não há vontade no ato que dá origem ao dever de indenizar. Nas hipóteses de direitos decorrentes do delito e quase-delito, a responsabilidade tem nexo subjetivo com o ato de vontade causador do dano. Em qualquer dos dois casos o poder de exigir é conseqüência do descumprimento, por parte do causador do dano, de um dever correspondente ao direito
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