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CETOACIDOSE DIABÉTICA E ESTADO HIPEROSMOLAR HIPERGLICÊMICO Hiperglicemias Cetoacidose e estado hiperosmolar hiperglicêmico são duas graves complicações relacionadas ao diabetes melito. A CAD é definida pela presença de: Glicemia maior que 250 mg/dL. pH arterial ≤ 7,3. Cetonúria fortemente positiva (se disponível, a dosagem arterial de cetoácidos é um melhor critério). O EHH é definido pela presença de: Glicemia maior que 600 mg/dL. pH arterial maior que 7,3. Osmolalidade sérica efetiva estimada > 320 mOsm/kg. Em pacientes com diabetes melito do tipo 1, a cetoacidose é o sintoma de apresentação em 20 a 30% das crianças e adolescentes e cerca de 17% dos adultos. Por outro lado, em pacientes com EHH, a faixa etária costuma ser muito maior, em geral acima dos 50 anos. A mortalidade da CAD é muito pequena e depende fundamentalmente da causa precipitante (em geral, menor que 1%). Em idosos, a mortalidade é maior que 5%. No EHH, a mortalidade é maior, variando entre 5 e 20%, e se deve principalmente à idade avançada dos pacientes e à alta frequência de comorbidades. Em ambos, o risco de morte é maior: Nos extremos de idade. Na presença de coma. Nos pacientes com hipotensão ou choque. De acordo com a gravidade do fator precipitante. ETIOLOGIA Na cetoacidose, há duas causas comuns: o uso inadequado de insulina e a primo-descompensação. No estado hiperosmolar, quase sempre, o paciente tem uma dificuldade de acesso a líquidos (acamado, demência prévia, sequela neurológica). FISIOPATOLOGIA A patogênese da cetoacidose é mais bem conhecida que a do estado hiperosmolar. Em ambas ocorreuma redução da secreção de insulina como mecanismo central; Na CAD, além da diminuição de insulina, ocorre um aumento dos hormônios contrarreguladores (glucagon [principal representante], cortisol, catecolaminas e hormônio de crescimento), alterando o equilíbrio de vários órgãos e sistemas, entre eles: Fígado: a depleção de insulina e a presença de hormônios contrarreguladores fazem com que ocorra um aumento da produção hepática de glicose (gliconeogênese) e, consequentemente, uma hiperglicemia. Além disso, a presença do glucagon leva à produção de corpos cetônicos (acetoacetato e β-hidroxibutirato) e aumenta a oxidação de ácidos graxos livres (AGL). Tecido adiposo: a ausência de insulina promove uma maior atividade da lipase tecidual, que catalisa a conversão de triglicérides (TG) em AGL e glicerol. Músculos: o aumento dos hormônios contrarreguladores leva a diminuição da entrada de glicose no músculo. Além disso, a associação com o déficit de insulina provoca um aumento de proteólise com consequente gliconeogênese. Rins: quando a glicemia excede a taxa máxima de reabsorção tubular de glicose (Tm renal), ocorre glicosúria (em geral, quando a glicemia excede 180 mg/dL). A glicosúria acarreta uma diurese osmótica, ocasionando hipovolemia, diminuição do ritmo de filtração glomerular e aumento da glicemia. A diurese osmótica também ocasiona perda de água livre, sódio, potássio, magnésio e fósforo. No EHH há uma produção suficiente de insulina para suprimir a produção de glucagon. Dessa forma, nesse distúrbio não ocorre produção de corpos cetônicos. ACHADOS CLÍNICOS A cetoacidose ocorre principalmente num subgrupo de população mais jovem com média etária entre 20 e 29 anos, embora possa ocorrer nos dois extremos de idade. Muitas vezes o início é abrupto, mas os pacientes podem apresentar pródromos com duração de dias com poliúria, polidipsia, polifagia e mal-estar indefinido. O paciente irá apresentar-se, na grande maioria das vezes, desidratado, podendo estar hipotenso e taquicárdico, embora possa eventualmente estar com extremidades quentes e bem perfundidas, devido ao efeito de prostaglandinas. Os sinais e sintomas da acidose podem aparecer com taquipneia, respiração de Kusmaull (pH menor que 7,2) e hálito cetônico. O paciente normalmente se encontra alerta, embora 20% dos casos de cetoacidose ocorram quando há alteração do nível de consciência. O achado de febre não é frequente nos pacientes com cetoacidose, embora mesmo com sua ausência não se possa descartar que o fator precipitante seja infeccioso. Mas, caso esteja presente, a febre tem um alto valor preditivo de que a descompensação deve-se à infecção. Dor abdominal é um achado muito característico de cetoacidose, ocorrendo em cerca de 30% dos casos, e provavelmente tem correlação com alteração de prostaglandinas na parede muscular intestinal; entretanto, é rara nos pacientes com estado hiperosmolar e é um achado que tende a melhorar muito com a hidratação inicial do paciente. Náuseas, vômitos ou dor abdominal ocorrem em mais de 50% dos casos. No EHH, a faixa etária é bem maior (> 40 anos). O quadro clínico é mais arrastado: os sintomas relacionados à poliúria, polidipsia, astenia e desidratação costumam ocorrer durante semanas. Há dificuldade de acesso à água: limitações físicas para busca de água, idade avançada, pacientes acamados ou com doenças neurológicas são fatores que se associam ao EHH. A desidratação é bem mais acentuada. Presença de rebaixamento do nível de consciênciadevido à hiperosmolaridade. Sintomas localizatórios do SNC (convulsões, déficits focais) podem ocorrer em até 25% dos casos, embora nesse caso haja a necessidade de investigação com exames de imagem do SNC. EXAMES LABORATORIAIS Gasometria arterial. Eletrólitos: potássio, sódio, cloro, magnésio e fósforo. Hemograma: pode haver leucocitose com desvio à esquerda sem que signifique infecção. Valores acima de 20.000 céls/mm3 sugerem infecção. Urina tipo 1. Cetonúria (se disponível, dosagem sérica de cetoácidos). Eletrocardiograma: busca de achados de hipercalemia e isquemia (mais útil no EHH). Radiografia de tórax. Outros exames: podem ser necessários, de acordo com a suspeita clínica. Exemplos: hemoculturas, urocultura, tomografia de crânio, punção liquórica, teste de gravidez, enzimas hepáticas, amilase, lipase etc. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL: diferenciação de outras causas de acidose, dor abdominal e rebaixamento do nível de consciência. TRATAMENTO: Em geral, o tratamento da CAD é muito parecido com o do EHH, com pequenas diferenças. Hidratação Objetivo: Expansão extracelular, restauração do volume intravascular, melhora da perfusão tecidual com consequente diminuição dos níveis de hormônios contrarreguladores e da glicemia (pode diminuir em até 25% a glicemia). Insulinoterapia Exceto nos casos de hipocalemia, a insulinoterapia é realizada concomitantemente à hidratação. Antes de iniciar a infusão no paciente, deve-se desprezar cerca de 50 mL da solução no equipo para saturar a ligação da insulina ao sistema (a insulina é adsorvida ao plástico). Insulina regular ou de ultracurta ação (lispro, asparg) endovenosa contínua é a melhor terapêutica. Na cetoacidose leve, pode-se usar de forma intermitente e por via intramuscular. Reposição de potássio Habitualmente, o potássio sérico inicial é normal ou aumentado (raramente ele estará baixo). Entretanto, o déficit corporal de potássio é grande, em torno de 3 a 6 mEq/kg de peso. Com hidratação, reposição de insulina, correção da acidose e da hipovolemia, haverá diminuição drástica do potássio sérico. Por isso, deve ser dosado com frequência (2/2 a 4/4 horas) e reposto de forma agressiva. A primeira dosagem do potássio deve ser feita na gasometria arterial, imediatamente após a chegada do paciente. Bicarbonato de sódio Raramente é necessário repor bicarbonato. Está indicado quando o pH < 7,0. Outros eletrólitos Geralmente a reposição não é necessária. Está indicada a reposição quando a concentração medida estiver muito baixa. Em particular, a reposição de fosfato deve ser feita com cautela nas seguintes condições: Dosagem sérica menor que 1,0 mg/dL. Dosagem baixa e presença de: Disfunção de ventrículo esquerdo. Arritmias cardíacas. Achados de hemólise ou rabdomiólise. COMPLICAÇÕES Hipoglicemia: principal complicação do tratamento. Hipocalemia: pode aparecer após a instituição do tratamento com insulina. Edema cerebral (raro). Síndrome do desconforto respiratório agudo (ARDS). Embolia pulmonar: complicação relativamente frequente em pacientes com estado hiperosmolar, mas rara em pacientes com cetoacidose diabética. Congestão pulmonar por sobrecarga hídrica. Dilatação gástrica aguda: consequência de uma neuropatia autonômica, sendo grave. O tratamento é com descompressão gástrica obtida através da passagem de sonda nasogástrica. Mucormicose: infecção fúngica que atinge principalmente os seios da face e ocorre pela alteração do metabolismo de ferro que atinge esses pacientes, durante o episódio de cetoacidose. Condição muito grave, rara, mas com grande letalidade. Alcalose metabólica paradoxal pode ainda ocorrer durante o tratamento.
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