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8.1 8 DEFESA DO RÉU DEFESA DO RÉU – CONSIDERAÇÕES GERAIS No Capítulo 4 desta obra, anotamos que, não obstante o CPC considere proposta a ação quando a petição inicial for protocolada, só podemos considerar aperfeiçoada a relação processual a partir da citação do réu, já que esse ato é pressuposto de constituição do processo, de modo que o seu aperfeiçoamento produz efeitos em relação ao réu, relacionados no art. 240 da lei processual (induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor). O exercício do direito de ação evidencia a formulação de uma pretensão contra pessoa determinada ou (no mínimo e excepcionalmente) determinável, como observamos em algumas ações possessórias, parte da doutrina admitindo que sejam propostas contra réus identificados de modo incompleto. Aperfeiçoada a citação do réu, ocorre a angularização do processo, estabelecendo uma relação entre o autor, o juiz (numa posição soberana) e o réu, autorizando a prolação da sentença, após a prática de vários atos, como a designação das audiências, a produção das provas etc. Pensamos que a citação é um dos atos mais importantes do processo, visto que antes do seu aperfeiçoamento não podemos afirmar a existência do processo, no seu sentido estrito, já que o magistrado não pode proferir sentença sem conceder ao réu o direito de apresentar a defesa, exceto quando indefere a petição inicial ou aplica o art. 332 da lei processual, julgando liminarmente improcedente o pedido. Excetuadas as situações indicadas em linhas anteriores, o encerramento do processo sem o aperfeiçoamento da citação do réu evidencia a inexistência da sentença, considerando que não há processo sem a citação, não podendo ser sustentada a existência de processo com uma pessoa só. Atuando desse modo, o magistrado infringe os princípios do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal, da isonomia 8.2 processual, dentre outros. O assunto é tão importante que a lei processual prevê a possibilidade de a matéria ser suscitada na fase de cumprimento da sentença (leia-se: depois de a sentença ser proferida), através da oposição da impugnação, conforme verificamos através da simples leitura do inciso I do § 1º do art. 525. A preocupação em torno da regularidade da citação do réu justifica-se pelo desassossego – ainda maior – de garantir o direito de defesa, como primado constitucional; como suporte da própria existência da relação processual. O réu não está obrigado a se defender. A apresentação da defesa representa uma faculdade, de modo que a omissão do réu faz presumir que não tem interesse pelo processo. A imperfeição processual decorre não da ausência de resposta, mas de não ter sido assegurada ao réu a oportunidade para a apresentação da defesa. Quando falamos a respeito da defesa do réu, imediatamente a associamos à contestação, como a principal modalidade de resposta. Esta não é, contudo, a única possível, permitindo ainda a lei que o réu apresente a reconvenção (que tem natureza jurídica controvertida, conforme verificamos em passagem seguinte). A contestação é a modalidade principal pelo só fato de ser a única que tem o condão de acarretar a revelia, se não for apresentada, que é extremamente desfavorável ao réu. Com as atenções voltadas para o novo CPC, percebemos que a impugnação ao valor da causa e a alegação de incompetência relativa passam a ser preliminares da contestação, e que a reconvenção deve ser proposta na contestação, técnica que evita a proliferação de defesas, contribuindo para o encerramento do processo em espaço de tempo menor, assuntos que estudamos em outras seções deste capítulo. DEFESAS DIRETAS E DEFESAS INDIRETAS A defesa do réu é abrangente, incluindo alegações de mérito e outras de natureza meramente processual, as primeiras denominadas defesa direta, sendo as demais consideradas defesas indiretas. O acolhimento de uma alegação de mérito (como a alegação de que o réu teria sido culpado pelo acidente de trânsito; de que teria descumprido deveres matrimoniais, por exemplo) acarreta a extinção do processo com a resolução do mérito, através de sentença, que produz coisa julgada material (efeitos endo/extraprocessuais), ou seja, se a sentença em exame não for reformada ou modificada, torna-se imutável, retirando a possibilidade de propositura de qualquer ação fundada nos mesmos elementos (partes, causa de pedir e pedido).1 No que toca à defesa indireta, ou de natureza processual (ou formal), o acolhimento da alegação suscitada pelo réu pode acarretar a extinção do processo sem a resolução do mérito, o que não impede o ajuizamento de outra ação fundada nos mesmos elementos (partes, causa de pedir e pedido), desde que seja possível eliminar o problema que acarretou a extinção do processo em que a preliminar foi acolhida. Em outras situações, a defesa indireta pode acarretar consequência diferente da extinção do processo, como na situação em que o magistrado acolhe a preliminar de incompetência relativa ou absoluta do juízo, em decorrência da qual determina o encaminhamento do processo ao juízo competente. Em seções seguintes, estudamos cada uma das defesas indiretas alinhadas no art. 337, facilitando a compreensão da diferença entre a defesa indireta que acarreta a extinção do processo sem a resolução do mérito da defesa indireta que acarreta consequência diferente da extinção. Na dinâmica processual, intitulamos cada uma das defesas indiretas de preliminares, por serem examinadas antes do mérito, em vista da sua prejudicialidade (prejudicialidade interna), já que, por conta do seu acolhimento, o magistrado pode não avançar na análise da questão de fundo, vale dizer, de mérito (para examinar quem foi o culpado pela colisão de trânsito, pelo desfazimento do vínculo matrimonial, pela rescisão do contrato etc.). O fato de o processo ter sido extinto sem a resolução do mérito por conta do acolhimento de uma preliminar causa frustração ao autor, que pretendia obter uma resposta de mérito à sua pretensão. Contudo, devemos compreender que essa resposta apenas não foi dada em decorrência da inobservância, pelo próprio autor, de uma formalidade essencial, que não pode ser desprestigiada nem com a aplicação do princípio da finalidade, por ser nodal em relação à validade da ação e/ou do processo, maculando a sua existência ou o seu desenvolvimento válido e regular. Num exemplo ilustrativo, que estabelece a distinção entre a defesa direta e a de natureza processual (defesa indireta), perceba a situação de atropelamento ocorrido na via pública, e que origina a propositura de ação de indenização por perdas e danos, na qual o réu contesta o pedido, afirmando que não teria sido o culpado pelo acidente (defesa direta), e que o autor não poderia ter proposto a ação por ser menor de idade, praticando atos sem estar representado pelos seus genitores (defesa indireta), suscitando 8.3 a incapacidade processual, que é de exercício. Com essa alegação, o réu não tratou de qualquer assunto relacionado com o acidente, suscitando defesa de natureza meramente processual, perseguindo a extinção do processo sem a resolução do mérito, o que impede o magistrado de se aprofundar na análise da culpa pela ocorrência do acidente; dos danos supostamente suportados pelo autor, da sua extensão e de várias outras questões de fato e de direito conjugadas em torno dos aspectos de mérito da controvérsia. PRAZO PARA O OFERECIMENTO DA DEFESA Antes de examinarmos as questões relacionadas ao prazo para a apresentação da defesa, é necessário revisarmos alguns conceitos relativos aos prazos de modo geral, que são aproveitados nesta seção. Nesse particular, sobreleva a importância do domínio da regra de que ao juiz é vedado reduzir prazos peremptórios sem anuência das partes. Embora o assunto tenha sido estudado no Capítulo 5 (Atos processuais), lembramos que o prazo para o oferecimentoda contestação é peremptório, com a ressalva de que, versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo (art. 190, caput), e de que, de comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso (art. 191). Conforme é do conhecimento geral, o CPC/73 estabelecia a regra de que, nas ações de rito comum ordinário, o prazo para a apresentação da defesa começava a fluir a partir da juntada do aviso de recebimento ou da carta de citação aos autos, ressalvada a situação em que a citação fosse aperfeiçoada mediante a publicação de edital, quando então o prazo para prática do mesmo ato começava a ser contado a partir da primeira publicação. O novo CPC modificou essas regras, o que se explica pela nova dinâmica do processo, que não se inicia mediante a apresentação da petição inicial, o aperfeiçoamento da citação e a apresentação da defesa, mas com a distribuição da petição inicial, a designação de dia e hora para realização da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação e a apresentação da contestação, como modalidade única de defesa. Vejamos a nova norma processual: “Art. 335. O réu poderá oferecer contestação, por petição, no prazo de 15 (quinze) dias, cujo termo inicial será a data: I – da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição; II – do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4.º, inciso I; III – prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais casos. § 1.º No caso de litisconsórcio passivo, ocorrendo a hipótese do art. 334, § 6.º, o termo inicial previsto no inciso II será, para cada um dos réus, a data de apresentação de seu respectivo pedido de cancelamento da audiência. § 2.º Quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4.º, inciso II, havendo litisconsórcio passivo e o autor desistir da ação em relação a réu ainda não citado, o prazo para resposta correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência.” O legislador infraconstitucional optou por modificar a primeira fase do processo, apostando na conciliação e na mediação como técnicas que podem permitir o seu encerramento no início da relação processual, o que faz evidenciar a importância da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação, no espaço de tempo que medeia o recebimento da petição inicial (quando for considerada apta) e a apresentação da contestação. Essa inovação processual impacta na fixação do início do prazo para o oferecimento da contestação pelo réu, que (como regra) não é mais contado a partir da juntada do mandado de citação ou do aviso de recebimento aos autos, tendo como parâmetro a realização ou não da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação, repita-se, no início do processo. O prazo só é contado a partir da juntada do mandado ou do aviso de recebimento aos autos se a audiência de conciliação ou a sessão de mediação não for realizada, ou seja, se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual ou quando não se admitir a autocomposição (incisos I e II do § 4º do art. 334 do novo CPC). O prazo para apresentação da defesa é de 15 dias úteis, mantida a regra de exclusão do dia de início e da inclusão do dia do término da contagem do citado prazo (art. 224). Se a ação for proposta contra o Ministério Público, a União, Estado, Distrito Federal, município, autarquia ou fundação de direito público, ou o intitulado pobre na forma da lei, desde que representado pela defensoria pública, o prazo para a apresentação da contestação é contado em dobro (arts. 180, 183 e 186 da nova lei processual). 8.4 Se a ação é proposta contra mais de um réu (litisconsórcio passivo), desde que estejam representados por procuradores distintos, e desde que esses procuradores não integrem o mesmo escritório de advocacia, o prazo para apresentação da contestação é igualmente contado em dobro, prevendo a nova lei que cessa a contagem do prazo em dobro se, havendo apenas 2 (dois) réus é oferecida defesa por apenas um deles (§ 1.º do art. 229). Essa regra de contagem do prazo em dobro não se aplica se o processo tramitar em autos eletrônicos. Essas são as regras gerais. Contudo, se o réu protocolar petição até dez dias antes da data designada para a realização da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação, afirmando que não tem interesse na autocomposição, o prazo para a apresentação da contestação começa a ser contado a partir do protocolo dessa petição. Assim, o prazo para apresentação da defesa é contado a partir da data do encerramento da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação ou a partir do protocolo da petição através da qual o réu manifesta desinteresse na autocomposição, regras que privilegiam os princípios da razoável duração do processo e da celeridade. Se a audiência não for designada, o prazo para a apresentação da contestação é contado de acordo com as regras dispostas nos arts. 230 e 231. Na ação de curso pelo procedimento sumário, orientada pelos princípios da concentração e da celeridade, a defesa deve ser apresentada na audiência de tentativa de conciliação (art. 278 do CPC/73), exigindo a lei que o mandado de intimação/citação seja juntado aos autos no mínimo 10 dias antes da audiência, para que o réu disponha de prazo razoável para a elaboração da sua defesa, com a ressalva de que o § 1º do art. 1.046 da nova lei processual estabelece a regra de que as disposições da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código. No procedimento sumaríssimo, a defesa deve ser apresentada na audiência una ou na audiência de instrução e julgamento,2 na sua forma escrita ou oral, não se aplicando as regras gerais do CPC no que atine, por exemplo, à contagem do prazo em dobro, em respeito ao princípio da especialidade (lei especial afastando a aplicação da lei geral, como ressaltado inúmeras vezes no curso desta obra). FORMA DA APRESENTAÇÃO DA DEFESA a) b) A forma da defesa do réu depende do procedimento, lembrando que o CPC prevê dois procedimentos: comum; e especial. A regra é a de que a defesa do réu seja apresentada por escrito, apenas admitindo-se a defesa oral em situações excepcionais, exclusivamente em procedimentos diferentes do comum ordinário. Nesse rito, a defesa só pode ser apresentada por escrito, sendo procedimento marcado pela formalidade dos atos processuais, acarretando o (natural) retardo na entrega da prestação jurisdicional. No procedimento sumário, subespécie do comum, é admitida a apresentação da defesa escrita e/ou da defesa oral. A utilização associada das conjunções aditiva (e) e alternativa (ou) é proposital, para demonstrar que a defesa pode ser mista, parte escrita e parte oral. Nada obsta, no nosso entendimento, que o réu apresente a defesa por escrito na audiência de tentativa de conciliação da ação de rito (ou procedimento) sumário, solicitando autorização ao magistrado para complementá-la oralmente, no curso da audiência em análise. Embora o novo CPC tenha suprimido o rito sumário, o que significa dizer que o autor não pode mais ajuizar ações por esse rito a partir da vigência da nova lei processual, o § 1º do seu art. 1.046 ressalva que as disposições da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, relativas ao procedimento sumárioe aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar- se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código, o que justifica a manutenção de comentários sobre o citado rito, pois é possível que vários e vários réus não tenham ainda apresentado defesa no início da vigência do novo CPC, em ações de rito sumário propostas antes desse momento, submetendo-se às regras que o disciplinavam no CPC/73. No procedimento sumaríssimo, orientado pela preocupação com o formalismo exagerado, a defesa também pode ser apresentada sob a forma escrita e/ou oral. O novo CPC estabelece que incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir (art. 336), optando pela apresentação de uma única modalidade de defesa (contestação), na qual o réu pode suscitar as 8.5 a) preliminares relacionadas no art. 337 (incluindo a incompetência relativa, a incorreção do valor da causa e a indevida concessão dos benefícios da justiça gratuita) e oferecer reconvenção, na própria contestação, o que valoriza os princípios da concentração dos atos processuais e da razoável duração do processo. Essa técnica de concentração da defesa em torno de uma única modalidade (contestação), adotada pelo legislador responsável pela elaboração do novo CPC, parece ter se inspirado na Lei nº 9.099/95, aplicável no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, prevendo o art. 30 da citada lei que as espécies de defesa devem estar contidas numa só peça processual, como tal na contestação, sendo as exceções e os incidentes processuais meras preliminares. A adoção dessa regra evita a prática de atos dispersos e a formação de incidentes processuais e de várias decisões. A simplificação da defesa e a sua concentração nas ações que têm curso pelos Juizados Especiais Cíveis obrigam o magistrado a conhecer das alegações igualmente de forma concentrada, gerando a interposição de apenas um recurso, como tal o inominado, previsto na lei, que corresponde ao recurso de apelação, no qual o recorrente deve impugnar o pronunciamento que julgou não apenas a relação principal, como também as questões acessórias (impugnação ao valor da causa e arguição de incompetência relativa, de impedimento ou de suspeição). ESPÉCIES DE DEFESA A expressão defesa do réu é utilizada no gênero, com as espécies da contestação e da reconvenção, com a ressalva de que o novo CPC estabelece a regra de que a incompetência relativa, a impugnação ao valor da causa (denominada incorreção do valor da causa, pela nova lei processual) e a indevida concessão dos benefícios da justiça gratuita passam a ser preliminares da contestação, não mais incidentes processuais. As espécies de defesa são autônomas, de modo que a não apresentação da contestação pelo réu não lhe retira o direito de opor reconvenção (§ 6º do art. 343 do novo CPC). Embora a apresentação da defesa seja facultativa, a sua não apresentação acarreta consequências, que são: no caso da contestação, a decretação da revelia do réu, que pode resultar na b) 8.5.1 presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor, na fluência de prazos independentemente de intimações cartorárias e na autorização para o julgamento antecipado do mérito; no caso da reconvenção, a perda do direito do réu de contra-atacar o autor no mesmo processo, sem prejudicar o direito material de que se afirma titular (de ser indenizado em decorrência de uma colisão de trânsito, por exemplo), que pode ter o seu reconhecimento solicitado através da propositura de ação judicial autônoma. Se o réu oferece a reconvenção, por exemplo, deixando de oferecer a contestação, não pode requerer que o magistrado receba a manifestação como se contestação fosse, não se admitindo a possibilidade de substituição das espécies, por não serem bivalentes.3 Como destacamos em passagem anterior, embora o CPC/73 previsse que a defesa do réu era ampla, sendo representada por até quatro espécies, cada qual representada por petições autônomas (contestação, reconvenção, impugnação ao valor da causa e exceção, principalmente a de incompetência relativa), o novo CPC revolucionou a matéria, estabelecendo que a defesa é única, sendo representada pela contestação, admitindo que o réu suscite a incompetência relativa e a incorreção do valor da causa como preliminares, além de propor a reconvenção na própria contestação, técnica que privilegia o princípio da razoável duração do processo. Contestação Assim como a petição inicial é o principal ato praticado pelo autor no processo, fixando os seus elementos objetivos (o que se pede e a razão de pedir) e subjetivos (quem pede e em face de quem o pedido é formulado, limitando os efeitos da coisa julgada), a contestação é a principal manifestação processual do réu, na qual impugna os termos constantes da petição oferecida pelo seu adversário processual. O processo é orientado pelo princípio da isonomia, de modo que aquilo que foi conferido a uma das partes também deve ser conferido à parte contrária, desde que esteja inserida na mesma situação fática do seu opositor. Queremos demonstrar que o só fato de ao autor ter sido conferido o direito de interpor o recurso de apelação contra a sentença não atribui, necessariamente, o mesmo direito ao réu, já que o conhecimento do recurso é condicionado à demonstração de que a parte foi vencida. Se apenas o autor sofreu prejuízo com a prolação da sentença, somente a ele é conferido o direito de interpor o recurso. Eventual interposição da espécie pelo réu obsta a sua tramitação (o que chamamos não conhecimento do recurso), em decorrência da ausência do interesse recursal, que é um dos requisitos de admissibilidade dos recursos, não se podendo afirmar, no exemplo apresentado, que o tratamento desigualmente conferido às partes infringe o princípio da isonomia processual. Transpondo as premissas para a contestação, não poderíamos admitir a validade de uma sentença sem que tenha sido oportunizado ao réu o direito de se defender (exceto no que toca à sentença através da qual o magistrado indefere a petição inicial ou que julga liminarmente improcedente o pedido – arts. 330 e 332), o que apenas o faz, em termos de mérito, através da contestação. A reconvenção não tem força suficiente para evitar a procedência da ação (ou do pedido, como preferem alguns), sendo manifestação de contra-ataque, não de defesa. Contudo, diferentemente da petição inicial, a contestação é de elaboração livre, não estando sujeita ao preenchimento de requisitos, a ponto de determinar a sua rejeição quando não tenham sido observados pelo réu. A petição inicial que não apresenta pedido ou causa de pedir, por exemplo, pode – e deve – ser indeferida, com fundamento no inciso I do § 1º do art. 330. Diferentemente, a contestação que apresenta pretensões absurdas e manifestamente despropositadas não segue o mesmo destino processual, sendo apenas desconsiderada, nesse particular, quando da prolação da sentença. A aparente flexibilidade da contestação cede diante da constatação de que a ela se aplicam dois primados básicos. Não sendo respeitados, incidem consequências desconfortáveis sobre o réu, inclusive determinando a procedência da ação, com consequente julgamento do processo em favor do autor. Os primados referem-se à obrigação do réu de se defender de forma detalhada e específica, reputando-se como verdadeiros os fatos que não tenham sido especificamente impugnados, e à obrigação de suscitar toda a matéria de defesa, não se admitindo a contestação por etapas, em respeito ao princípio da eventualidade, assuntos estudados no decorrer deste capítulo. Por último, destacamos – como afirmado anteriormente – que a defesa do réu pode ser de mérito (e tão somente de mérito) e/ou formal, a última intitulada defesa indireta, apontando umvício processual de grande importância, que impede o seguimento do processo, autorizando a sua extinção sem a resolução do mérito, ou que acarreta outra consequência diferente da extinção. 8.5.1.1 Contudo, por mais robusto que seja o argumento que subsidia a defesa indireta, como a demonstração ilustrativa de o autor estar pleiteando a condenação do réu ao pagamento de dívida de jogo (art. 814 do CC),4 o réu não pode descuidar da apresentação da defesa por completo, deixando de incluir os argumentos de mérito, já que, em regra, não pode aditar a defesa depois de apresentada, salvo nas hipóteses elencadas no art. 342, tema estudado em linhas seguintes. Princípio da eventualidade Diferentemente da petição inicial, cuja redação submete-se ao preenchimento dos requisitos do art. 319, a contestação é de redação livre, o que significa dizer que a lei não estipulou requisitos que deveriam ser preenchidos pelo réu quando da sua elaboração, conferindo-lhe liberdade em termos de forma. Não obstante o fato, a contestação é orientada pelo princípio da eventualidade,5 obrigando o réu a suscitar todas as alegações de defesa quando a apresenta, tanto a direta quanto a indireta. Por conta desse princípio, o réu é obrigado a tratar de todos os temas relacionados à causa de pedir, refutando parcial ou integralmente os pedidos, considerando a possibilidade de a sua principal tese de defesa não ser acolhida, como a ausência de culpa em acidente automobilístico, apenas para exemplificar. Poder-se-ia afirmar que a adoção dessa técnica enfraqueceria a defesa, e que representaria reconhecimento do direito do autor, o que não é verdadeiro, em decorrência do princípio da eventualidade. Apenas para exemplificar, pensemos em acidente automobilístico que gera a propositura de ação de indenização por perdas e danos, na qual o autor solicita a condenação do réu ao pagamento de indenização pelos danos identificados na petição inicial, com valores predeterminados. O principal argumento do réu é o da ausência de culpa no acidente. Contudo, em respeito ao princípio indicado, terá de solicitar que, na remota possibilidade de ser condenado, que o seja em quantia inferior à solicitada pelo autor, em face do abuso da postulação, demonstrando que o valor do prejuízo é inferior ao pedido indenizatório. Após a apresentação da contestação, só se admite que o réu complemente a defesa, suscitando novos argumentos que lhe beneficiam, quando relativos a direito ou a fato superveniente;6 quando o juiz puder conhecê-los de ofício (questões de ordem pública); ou quando evidenciarem matérias cujo conhecimento possa ocorrer a qualquer 8.5.1.2 tempo e grau de jurisdição, não se sujeitando à preclusão consumativa. Apresentamos como exemplos de questões de ordem pública, que podem ser conhecidas de ofício pelo magistrado, independentemente de terem ou não sido incluídas na contestação, as dispostas no art. 337, com exceção da incompetência relativa e da convenção de arbitragem (§ 5º do art. 337). A justificativa que permite que as matérias sejam conhecidas de ofício pelo magistrado fundamenta-se na constatação de que são do interesse do Estado, representado pelo Poder Judiciário, versando sobre as condições mínimas para que a sentença de mérito seja proferida. Exemplificativamente, constatada a ausência de legitimidade, conclui-se pela ausência de um requisito mínimo relacionado ao próprio exercício do direito de ação, impedindo o Estado de prestar a jurisdição no caso concreto, pelo menos em termos de mérito. Não houvesse essa preocupação, o Estado estaria obrigado a realizar a Justiça sem qualquer preocupação e cuidado com as regras formais, os pressupostos de constituição e de validade da relação jurídico-processual. Em complemento, para que se reforce a importância de uma matéria de ordem pública, pensemos na situação que envolve a inexistência da citação. Se o magistrado fosse proibido de reconhecer esse problema de ofício, teríamos de admitir a validade de uma sentença proferida nos autos de processo nem sequer existente, considerando que a citação é um dos pressupostos de constituição da relação processual, segundo pensamos, embora o art. 239 do novo CPC preveja que é pressuposto de validade do processo em relação ao réu. Em relação às matérias que podem ser conhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição, excetuando a regra de que todas as alegações devem ser suscitadas na contestação, referimo-nos ao exemplo da prescrição, que pode ser declarada pelo magistrado mesmo não tendo sido suscitada pelo réu na defesa. Ônus da impugnação especificada Complementando as reflexões feitas até esta passagem, anotamos que o réu não pode apresentar a denominada contestação genérica, limitando-se a afirmar que as pretensões do autor não merecem amparo, requerendo a improcedência dos pedidos formulados na petição inicial, sem pormenorizar as razões que subsidiam essa conclusão. Num exemplo ilustrativo, pensemos em autor que propõe ação de indenização por 8.5.1.3 perdas e danos contra o réu, alegando que teria sido atropelado na via pública por automóvel dirigido pelo demandado. Este, sendo citado, não pode (simplesmente) requerer que a ação seja julgada improcedente, afirmando que os argumentos aduzidos pelo autor não seriam verdadeiros.7 Diferentemente, terá de atacar cada alegação, enfrentando as questões relacionadas à dinâmica do acidente, aos valores indenizatórios pleiteados etc. Não realizada a impugnação especificada, como determinado pelo CPC, há presunção de veracidade dos fatos não rebatidos, autorizando o magistrado a julgar a lide de forma antecipada, em vista da desídia do réu, apegando-se – para a formação do seu convencimento – na constatação de que os argumentos expostos pelo autor tornaram-se incontroversos pela desídia do demandado.8 O ônus da impugnação especificada não se aplica ao Ministério Público, ao advogado dativo, ao defensor público e ao curador especial (parágrafo único do art. 341 do novo CPC), em decorrência do interesse público evidenciado nas ações que envolvem essas pessoas e instituições. Defesa indireta do réu A defesa indireta do réu, sem incluir as questões de mérito (a culpa das partes em relação a acidente automobilístico, as razões do desfazimento do vínculo matrimonial, o comportamento das partes após a celebração de contrato etc.), apoiando-se em aspectos meramente processuais, é intitulada na dinâmica forense de preliminares, no gênero, apresentando as preliminares peremptórias e as preliminares dilatórias como espécies. A doutrina, de forma esclarecedora, aponta a diferença existente entre elas: “Essas defesas processuais dizem-se peremptórias, quando, uma vez acolhidas, põem fim ao processo, e dilatórias, quando apenas suspendem ou dilatam o curso do processo, porém não o extinguem, de modo que, saneado o vício ou satisfeito o requisito que faltava, a relação processual seguirá seu curso normal.”9 Na defesa indireta, o mérito da causa não é examinado, mas questões processuais, algum vício verificado na petição inicial, no exercício do direito de ação ou na própria existência ou no desenvolvimento válido e regular do processo. O ideal é que a matéria seja suscitada quando da apresentação da contestação, pelo réu, sendo tratada como questão prejudicial ao conhecimento do mérito. Contudo, mesmo 8.5.1.3.1 que o réu não tenha agido dessa forma, a lei permite que a matéria seja suscitada posteriormente, a qualquer tempo e grau de jurisdição, com exceção das preliminares de incompetência relativa e de convenção de arbitragem, não se submetendo, assim, à preclusão processual, por ser de ordem pública, do interesse do Estado, não apenas das partes. Mas quando afirmamos que a matéria pode ser arguida e conhecida a qualquer tempo e grau de jurisdição, cabe-nos limitar essa possibilidade. Ela perdura até o último recurso de competênciado 2º grau de jurisdição, já que a matéria não pode ser suscitada pela primeira vez em recurso especial e/ou em recurso extraordinário, por lhe faltar o requisito do prequestionamento,10 próprio dos recursos extremos, como requisito específico de admissibilidade desses recursos. Exemplificando, observe o caso de uma ação de divórcio (de competência da Vara de Família) que foi distribuída para uma Vara Cível (incompetência absoluta em razão da matéria, que acarreta, como consequência, a remessa do processo ao juízo competente). Ao contestar, o réu não suscita a questão, impugnando o pedido apenas nos seus aspectos de mérito, sem arguir defesa indireta. Poderá fazê-lo durante a instrução do processo, e mesmo quando interpõe o recurso de apelação. Não poderá fazê-lo pela primeira vez em recurso especial e/ou em recurso extraordinário, porque nesses recursos verifica-se (em juízo de admissibilidade) se a matéria (no caso, a incompetência absoluta) foi discutida e decidida na instância ordinária, vale dizer, perante o juízo do 1º grau e/ou pelo tribunal que lhe é imediatamente superior em termos hierárquicos. Além de não se submeterem à preclusão processual, por serem do interesse do Estado, as preliminares podem (e devem) ser conhecidas de ofício pelo magistrado, segundo observamos da simples leitura do § 5º do art. 337. Nesse caso, posicionando-se sobre a questão, o magistrado não estará prolatando decisão de mérito. Como a matéria é de ordem pública, do interesse do Estado, confere-se ao magistrado a prerrogativa de se posicionar no processo, com ou sem requerimento da parte que deveria ter suscitado a questão como preliminar da contestação. Inexistência ou nulidade da citação A inexistência da citação representa a ausência de pressuposto de constituição da relação processual, como estudamos no Capítulo 4 (Do processo), em cujo 8.5.1.3.2 compartimento demonstramos que não existe processo com um só protagonista (o autor), exigindo-se a citação do réu para que a relação seja angularizada, com as ressalvas de que o art. 239 da nova lei processual considera a citação pressuposto de validade do processo em relação ao réu ou ao executado. A nulidade da citação, contudo, denota a ausência de pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo, sendo que nas duas situações o magistrado pode reconhecer os vícios de ofício, acarretando, como consequência, a invalidação de todos os atos processuais (decisões interlocutórias, como a que concede a tutela provisória em favor do autor, por exemplo, e a própria sentença, se proferida), permitindo que a relação possa progredir. A preliminar em análise é, portanto, dilatória, não acarretando a extinção do processo sem a resolução do mérito, quando acolhida. Ao réu é conferida a prerrogativa de apresentar a contestação, suscitando a inexistência ou a nulidade da citação como matéria preliminar. Sendo reconhecida, a contestação é aproveitada, passando o magistrado a administrar as questões de mérito. Diferentemente, se o magistrado mantém a decretação da revelia do réu, este pode suscitar a matéria como preliminar da apelação ou nas contrarrazões desse mesmo recurso (§ 1º do art. 1.009 do CPC), já que a nova lei processual suprimiu o recurso de agravo retido, reservando o de instrumento para o ataque aos pronunciamentos que versam sobre as questões relacionadas no seu art. 1.015, dentre as quais não encontramos a que estudamos nesta seção. Incompetência relativa e incompetência absoluta A incompetência relativa decorre do território ou do valor da causa, enquanto a absoluta decorre da matéria ou da hierarquia, naquele compartimento tendo sido detalhadas as situações, restando-nos anotar que a questão também é de ordem pública, do interesse do Estado, justificando a possibilidade de ser conhecida de ofício pelo juiz, independentemente de requerimento do réu, ressalva exclusiva para a incompetência absoluta, já que a relativa deve ser suscitada como preliminar da contestação, sob pena de prorrogação da competência (art. 65 do novo CPC). As partes não podem modificar a competência absoluta através da estipulação do foro de eleição em contratos particulares, considerando que não há disponibilidade sobre o assunto, a permitir a adoção do procedimento em análise. Além disso, para que se a) b) ressalte a importância da matéria, registramos que a incompetência absoluta do juízo pode fundamentar a propositura da ação rescisória, como percebemos através da leitura do inciso II do art. 966 do novo CPC. A preliminar em análise é dilatória. O seu acolhimento acarreta a remessa do processo ao juízo competente, nos termos do § 3º do art. 64, com a ressalva de que o § 4º do mesmo dispositivo legal estabelece que, salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos da decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente. Embora a nova lei processual tenha equiparado a incompetência relativa à absoluta, no aspecto de prever que deve ser suscitada como preliminar da contestação, manteve a mesma regra do CPC/73, no que se refere à ressalva de que a incompetência relativa só pode ser suscitada no prazo preclusivo da defesa (na contestação), e de que não pode ser reconhecida de ofício pelo magistrado, regras que não são extensivas para a incompetência absoluta. Quando o réu suscitar a incompetência relativa ou absoluta, pode protocolar a sua contestação no foro do seu domicílio, com fundamento no art. 340 da nova lei processual, com a seguinte redação: “Art. 340. Havendo alegação de incompetência relativa ou absoluta, a contestação poderá ser protocolada no foro de domicílio do réu, fato que será imediatamente comunicado ao juiz da causa, preferencialmente por meio eletrônico. § 1.º A contestação será submetida a livre distribuição ou, se o réu houver sido citado por meio de carta precatória, juntada aos autos dessa carta, seguindo-se a sua imediata remessa para o juízo da causa. § 2.º Reconhecida a competência do foro indicado pelo réu, o juízo para o qual for distribuída a contestação ou a carta precatória será considerado prevento. § 3.º Alegada a incompetência nos termos do caput, será suspensa a realização da audiência de conciliação ou de mediação, se tiver sido designada. § 4.º Definida a competência, o juízo competente designará nova data para a audiência de conciliação ou de mediação.” O novo CPC confere um conforto ao réu, que pode protocolar a contestação no foro do seu domicílio, quando suscitar a incompetência relativa ou absoluta. Duas situações podem ocorrer: se o réu foi citado através de carta precatória, a contestação é juntada aos autos da carta; se o réu foi citado de outra forma, a contestação é distribuída no foro do seu 8.5.1.3.3 8.5.1.3.4 domicílio, o que não acarreta a formação de um novo processo, e que, segundo pensamos, não depende do recolhimento de custas (embora a lei tenha usado a palavra distribuição), pois não estamos diante de uma nova ação, mas de mero protocolo de petição. Em qualquer dos casos, a preliminar de incompetência relativa ou absoluta não é enfrentada pelo juízo do foro de domicílio do réu, mas pelo juízo perante o qual a ação foi distribuída. Aquele deve encaminhar a carta precatória (com a contestação no seu interior) ou a contestação a este, para que enfrente a matéria. Incorreção do valor da causa Em respeito ao princípio da concentração dos atos processuais, e para evitar a proliferação de incidentes no início do processo, o novo CPC prevê que a incorreção do valor da causa pode ser suscitada como preliminar da contestação, técnica que substitui a oposição da impugnação ao valor da causa, no prazo da defesa, como previsto no art. 261 do CPC/73. A não arguição da matéria como preliminar da contestação acarreta a sua preclusão, com a consequente manutenção do valor da causaatribuído pelo autor na petição inicial, com a ressalva de que o § 3.º do art. 292 estabelece que o juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes. Inépcia da petição inicial Essa preliminar, de natureza peremptória, remete-nos à análise do § 1º do art. 330 da nova lei processual,11 disciplinando as hipóteses de inépcia da petição inicial, que é uma irregularidade substancial. Como podemos verificar com facilidade, a inépcia quase sempre decorre de algum problema relacionado com o pedido formulado na petição inicial. A consequência do acolhimento da preliminar é a extinção do processo sem a resolução do mérito. Embora o autor possa interpor o recurso de apelação contra a decisão terminativa, pode também (opção sua) propor nova ação fundada nos mesmos elementos do processo extinto (partes, causa de pedir e pedido), corrigindo a 8.5.1.3.5 8.5.1.3.6 imperfeição que gerou a extinção. Sendo alterado o pedido, como a primeira sentença não produziu coisa julgada material, a petição inicial da segunda ação será processada, seguindo o processo até a prolação da sentença de mérito, desde que coexistam as condições da ação e os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. A jurisprudência consolidada na vigência do CPC/73, na situação específica do inciso III do § 1º do art. 330, que prevê a inépcia da petição inicial quando “da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão”, de tudo tem feito para aceitar o prosseguimento do processo, não obstante o vício, desde que haja condição para avaliar o pedido formulado, valorizando a aplicação do princípio da finalidade. A confusão na redação da petição inicial, por si só, não é causa para o reconhecimento da sua inépcia.12 Perempção O § 3.º do art. 486 estabelece que, se o autor der causa, por 3 (três) vezes, a sentença fundada em abandono da causa, não poderá propor nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe reservada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito. Como percebemos, a perempção consiste na arguição de que o autor propôs três ações idênticas (com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido), sucessivamente, sendo as três extintas pela mesma razão, qual seja, o abandono processual. A perempção é suscitada na última das ações propostas pelo autor, sendo preliminar peremptória, cujo acolhimento acarreta a extinção do processo sem a resolução do mérito, com uma agravante: o autor não mais poderá ajuizar ação fundada no mesmo objeto, nem reconvenção. Em outras palavras, o autor não poderá solicitar o reconhecimento do direito material nessa condição (de autor) ou de reconvinte. A extinção dos processos anteriores, por abandono, deve ser antecedida da intimação pessoal do autor, não sendo suficiente a intimação do seu advogado, para dar andamento ao processo no prazo de cinco dias (§ 1º do art. 485 do novo CPC), sendo de logo advertido da possibilidade de extinção caso não adote a providência, configurando- se a preliminar como peremptória. Litispendência 8.5.1.3.7 A litispendência decorre da coexistência de duas ações idênticas, vale dizer, fundadas nos mesmos elementos (partes, causa de pedir e pedido), segundo o § 1º do art. 337.13 Apresentamos como exemplo, embora não seja pacífico na jurisprudência,14 um desentendimento estabelecido entre um casal, com ambos os cônjuges propondo ações de divórcio, um imputando ao outro a culpa pelo desfazimento do vínculo matrimonial. A divergência da jurisprudência, no exemplo oferecido, refere-se à eventual existência de causas de pedir distintas, como, por exemplo, quando o marido propõe a ação de divórcio alegando que teria sido traído pela esposa, enquanto esta formula o mesmo pedido em outra ação, fundada em causa de pedir distinta, como a falta de assistência material da esposa e dos filhos. Porque não se pode permitir a manutenção de duas ações idênticas em curso, um dos processos deve ser extinto sem a resolução do mérito. Quando falamos na extinção de um dos processos, não nos referimos, necessariamente, ao segundo. A questão é resolvida com a aplicação do art. 59, acarretando a extinção da ação em que mais tardiamente ocorreu o registro ou a distribuição da petição inicial. A consequência do acolhimento da preliminar é a extinção do processo sem a resolução do mérito (o mérito não pode ser apreciado porque será enfrentado no outro processo, que permanece em curso), sendo preliminar peremptória. Não obstante a extinção ocorra sem a resolução do mérito, a propositura de nova ação depende da eliminação do vício que acarretou essa extinção (§ 1º do art. 486). Coisa julgada Semelhante à situação abordada na seção anterior, a coisa julgada ocorre quando o autor reproduz ação idêntica (fundada nos mesmos elementos), tendo sido a primeira encerrada por sentença, contra a qual não cabe mais recurso, seja porque o pronunciamento não foi combatido ou porque o recurso interposto foi julgado pelas instâncias superiores, não havendo mais oportunidade para novo combate. São estendidas à coisa julgada as mesmas considerações feitas em relação à litispendência, no que toca à identidade das ações, marcadas pela coincidência das partes, das causas de pedir e dos pedidos. Sobreleva ressaltar que não há mais possibilidade de interposição de qualquer recurso contra a sentença proferida no primeiro processo, tendo o pronunciamento resolvido o conflito de interesses com a apreciação do meritum causae. Se essa possibilidade existir, tendo sido exercitada, não há 8.5.1.3.8 a) b) a) b) c) d) coisa julgada, mas litispendência entre os processos. A consequência do acolhimento da preliminar é a extinção do segundo processo sem a resolução do mérito (do processo em que a sentença eventualmente proferida não acobertada pela coisa julgada), sendo preliminar peremptória. Conexão Reputam-se conexas duas ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir (art. 55 do novo CPC). Apenas ilustrativamente (e, em alguns casos, eliminando divergências jurisprudenciais), o novo CPC considera conexas (§ 2º do art. 55): a ação de execução de título extrajudicial e a ação de conhecimento relativa ao mesmo negócio jurídico; as execuções fundadas no mesmo título. São ações que se originam de um tronco em comum, de um mesmo fato ou ato jurídico. Constatada a conexão, a reunião dos processos é recomendada, para evitar a prolação de decisões contraditórias. Na conexão, ambos os juízos são competentes para a apreciação dos processos (competência relativa),15 um deles resolvendo “abrir mão” da sua competência em favor do outro (prevento), para evitar a contradição. Para ilustração da matéria, listamos outros exemplos de ações conexas: ação de usucapião – proposta pelo possuidor – e ação reivindicatória – proposta pelo proprietário –, tendo por objeto o mesmo imóvel disputado pelas partes nas duas ações; ação de manutenção de posse – proposta pelo possuidor – e ação reivindicatória – proposta pelo proprietário da coisa –, tendo por objeto o mesmo imóvel disputado pelas partes; ação de consignação em pagamento – proposta pelo locatário – e ação de despejo por falta de pagamento – proposta pelo locador, na primeira ofertando-se os aluguéis, na segunda pleiteando-se a rescisão do contrato pela suposta falta de pagamento dos mesmos aluguéis;16 ação revisional de alimentos proposta pelo filho, pretendendo a majoração do e) f) 8.5.1.3.9 valor da pensão, e ação de exoneração de alimentos proposta pelo pai, com pedido de afastamento do dever de prestar a verba alimentar; ação anulatória de débito fiscal e ação de execução fiscal; ação de rescisão de compromissode compra e venda e ação consignatória das prestações correspondentes.17 Sendo citado, o réu pleiteará que o processo seja reunido ao outro processo conexo. A definição do juízo prevento é feita com base no art. 59, textual em estabelecer que o registro ou a distribuição da petição inicial torna prevento o juízo. A regra é aplicável tanto no caso de as ações conexas terem curso pela mesma comarca como no caso em que tramitam por comarcas distintas. Não se determina a reunião dos processos se um deles já houver sido sentenciado, conforme a orientação da Súmula 235 do STJ18 e o § 1º do art. 55 do novo CPC, não se justificando, nessa hipótese, a arguição da preliminar por parte do réu. A consequência do acolhimento da preliminar é a reunião dos processos em torno de um só juízo, evitando a prolação de sentenças contraditórias, geradas pelo fato de cada uma das ações terem curso por juízos distintos, qualificando-se a preliminar como dilatória. Inovando na matéria, o § 3º do art. 55 da nova lei processual civil estabelece a seguinte regra: “§ 3 .º S erão reunidos para julgam ento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões confl itantes ou contraditórias caso decididas separadam ente, m esm o sem conexão entre eles.” Incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização As matérias em análise evidenciam pressupostos de desenvolvimento válido e regular do processo, que autorizam, quando não sanados, a extinção do processo sem a resolução do mérito, produzindo coisa julgada formal (efeito endoprocessual). A preliminar é peremptória. A extinção em referência, contudo, não é automática, devendo ser antes oportunizada à parte a prerrogativa de sanar o defeito processual, no prazo fixado pelo magistrado, geralmente de cinco a 10 dias, durante o qual o processo fica suspenso. 8.5.1.3.10 Não sendo o vício processual eliminado no prazo fixado pelo magistrado, o processo deve ser extinto sem a resolução do mérito (inciso I do § 1º do art. 76 do novo CPC). Entendemos que o magistrado deve reconhecer a nulidade dos atos processuais anteriormente praticados, como uma tutela provisória, por exemplo, como consequência da extinção do processo sem a resolução do mérito, em decorrência do acolhimento da preliminar, que é peremptória. Convenção de arbitragem A arbitragem é forma alternativa de prestação jurisdicional, criada pelo direito estrangeiro como forma de solucionar mais rapidamente determinados conflitos de interesses,19 sem que a questão seja levada ao conhecimento do Poder Judiciário, reduzindo a função quase monopolista que o Estado assumiu, como tal a de pacificar os conflitos de interesses. As partes de um contrato particular, sendo capazes e desde que o instrumento verse sobre direitos disponíveis ou patrimoniais,20 têm a prerrogativa de estabelecer que problemas decorrentes da interpretação ou do descumprimento de cláusulas serão levados ao conhecimento de um árbitro, que pode ser de logo designado pelos contratantes ou escolhido posteriormente. Essa previsão é incluída em cláusula específica, que recebe a denominação cláusula compromissória, inserida em contrato ou em documento apartado, não sendo exigido que o árbitro seja escolhido no ato da contratação. Havendo conflito de interesses, de acordo com as previsões da Lei nº 9.307/96, modificada pela Lei nº 13.129, de 2015, a arbitragem é instituída, permitindo a prolação da chamada sentença arbitral, sendo espécie de título executivo judicial (inciso VII do art. 515). Pois bem. Se o conflito de interesses for instalado, e a parte que se considera inocente ingressar com a ação judicial, desrespeitando a estipulação contratual que previa a competência do árbitro para a solução do litígio, o réu pode arguir a matéria como preliminar da contestação. Se a preliminar for acolhida, o processo é extinto sem a resolução do mérito, sendo preliminar peremptória, forçando a parte que se julga prejudicada a recorrer a um árbitro. O Poder Judiciário, no caso em análise, não tem competência para dirimir o conflito de interesses, sendo a competência atribuída ao árbitro. A incompetência relativa e a existência de convenção de arbitragem não podem ser 8.5.1.3.11 reconhecidas de ofício pelo magistrado, acarretando a preclusão se não forem alegadas no prazo de defesa, porque são matérias do interesse exclusivo das partes. Se estas aceitam que o conflito de interesses seja eliminado pelo Poder Judiciário, desprezando o que haviam deliberado anteriormente (o autor por ter proposto a ação na Justiça; o réu por não ter alegado a matéria como preliminar), ao Estado-juiz não cabe interferir na decisão. Ausência de legitimidade ou de interesse processual O CPC/73 se referia à carência de ação como matéria preliminar, decorrente da ilegitimidade das partes, da ausência do interesse de agir e/ou da impossibilidade jurídica do pedido. Considerando que o novo CPC suprimiu a impossibilidade jurídica do rol das condições da ação (segundo alguns pensam), rebatizou a preliminar, que agora é nominada ausência de legitimidade ou de interesse processual. Ao mesmo tempo em que encaminhamos o leitor para o Capítulo 3, no qual estudamos as condições da ação, registramos que a consequência do acolhimento da preliminar é a extinção do processo sem a resolução do mérito, qualificando-se como peremptória. Mais uma vez atentos ao novo CPC, reproduzimos os seus arts. 338 e 339, que apresentam a seguinte redação: “Art. 338. Alegando o réu, na contestação, ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição inicial para substituição do réu. Parágrafo único. Realizada a substituição, o autor reembolsará as despesas e pagará os honorários ao procurador do réu excluído, que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, § 8.º.” “Art. 339. Quando alegar sua ilegitimidade, incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação. § 1.º O autor, ao aceitar a indicação, procederá, no prazo de 15 (quinze) dias, à alteração da petição inicial para a substituição do réu, observando-se, ainda, o parágrafo único do art. 338. § 2.º No prazo de 15 (quinze) dias, o autor pode optar por alterar a petição inicial para incluir, como litisconsorte passivo, o sujeito indicado pelo réu.” Como é do conhecimento geral, no regime do CPC/73, a tentativa de correção da postulação era feita por meio da nomeação à autoria, como modalidade interventiva, a) b) disciplinada pelos arts. 62 ss daquele Código, através da qual, no prazo da defesa, o réu requeria a nomeação de terceiro (proprietário ou possuidor), demonstrando que detinha a posse de determinada coisa em nome alheio, tendo sido demandado em nome próprio. A nomeação à autoria representava modalidade interventiva burocrática, marcada pela necessidade de apresentação de outra petição, além da contestação, acarretando a suspensão do processo, permitindo que o autor fosse ouvido no prazo de cinco dias, admitida a recusa à nomeação, o que a tornava sem efeito. Simplificando a técnica, e privilegiando o princípio da concentração dos atos processuais, o novo CPC estabelece que a tentativa de correção da postulação se dá através da simples arguição da preliminar de ausência de legitimidade, preferencialmente acompanhada da indicação da pessoa que o réu entende deter legitimidade (rectius: que, segundo entende, deveria ter integrado o polo passivo desde o momento da formação do processo). Preferencialmente, pois o réu pode se limitar a arguir a ausência de legitimidade, sem indicar o terceiro, facultando-se ao autor, da mesma forma,corrigir o erro de postulação no prazo preclusivo de 15 dias (leia-se: quando apresentar a réplica). Se o autor aditar a petição inicial e aceitar a nomeação, o processo é extinto sem a resolução do mérito em relação ao réu primitivo, prosseguindo em relação ao novo réu. Complementando o art. 339, o seguinte estabelece a dinâmica resultante da aceitação ou não da indicação, pelo réu primitivo, da pessoa que entende deva ocupar o polo passivo da relação processual. Quatro situações podem ocorrer: o réu suscita a preliminar de ausência de legitimidade e indica a pessoa que entende deva atuar como réu, ato seguido da ouvida do autor, que aceita a indicação, permitindo a extinção do processo em relação ao réu primitivo, a condenação do autor ao reembolso das despesas e ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do advogado daquele, além da determinação do aperfeiçoamento da citação do novo réu e da designação de data para a realização da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação; o réu suscita a preliminar de ausência de legitimidade e não indica o sujeito passivo da relação jurídica discutida, ato seguido da ouvida do autor, que altera a petição inicial e requer a substituição do réu, permitindo a extinção do processo em relação ao réu primitivo, a condenação do autor ao reembolso das despesas e c) d) 8.5.1.3.12 ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do advogado daquele, além da determinação do aperfeiçoamento da citação do novo réu e da designação de data para a realização da audiência de tentativa de conciliação ou da sessão de mediação; o réu suscita a preliminar de ausência de legitimidade, indicando ou não o sujeito passivo da relação jurídica discutida, ato seguido da ouvida do autor, que não concorda com a preliminar, o que acarreta o prosseguimento do processo em relação ao réu primitivo, sem prejuízo do posterior acolhimento da preliminar e da consequente extinção do processo sem a resolução do mérito, em face do reconhecimento da ausência de legitimidade do réu; o réu suscita a preliminar de ausência de legitimidade e indica o sujeito passivo da relação jurídica discutida, ato seguido da ouvida do autor, que concorda parcialmente com a preliminar, solicitando a permanência do réu primitivo no processo e o aperfeiçoamento da citação do sujeito indicado por este, acarretando a formação do litisconsórcio passivo. Falta de caução ou de outra prestação exigida pela lei Quando se fala da prestação de caução, a lei não pretendeu referir-se àquelas situações em que se exige do autor a prestação de garantia (real ou fidejussória) como condição para a concessão da tutela provisória, como prevê o § 1º do art. 300 da nova lei processual. A caução, que envolve a possibilidade de arguição de preliminar na contestação, não é exigida para garantir a concessão da tutela de urgência, mas condição para a própria sobrevivência do processo. Na tutela provisória, quando a liminar é concedida de forma condicionada, a não prestação da caução não acarreta a extinção do processo como consequência, mas tão somente a revogação da liminar, prosseguindo-se o feito com a citação do réu. Como preliminar, não sendo a caução prestada, o processo é extinto sem a resolução do mérito. A matéria é disciplinada pelo art. 83 da nova lei processual, que tem a seguinte redação: “Art. 83. O autor, brasileiro ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou deixar de residir no país ao longo da tramitação de processo prestará caução suficiente ao pagamento das custas e dos honorários de advogado da parte contrária nas ações que propuser, se não tiver no Brasil bens a) b) 8.5.1.3.13 imóveis que lhes assegurem o pagamento. § 1.º Não se exigirá a caução de que trata o caput: I – quando houver dispensa prevista em acordo ou tratado internacional de que o Brasil faz parte; II – na execução fundada em título extrajudicial e no cumprimento de sentença; III – na reconvenção. § 2.º Verificando-se no trâmite do processo que se desfalcou a garantia, poderá o interessado exigir reforço da caução, justificando seu pedido com a indicação da depreciação do bem dado em garantia e a importância do reforço que pretende obter.” A caução deve coincidir com o valor das custas e dos honorários advocatícios, não se vinculando ao valor do bem disputado pelas partes.21 Isso porque seria muito fácil para o autor estrangeiro evadir-se do nosso território, após tomar ciência dos termos de sentença que lhe foi desfavorável, com elevada condenação ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, no mínimo dificultando a execução da verba em questão, que teria de ser exigida através da expedição de carta rogatória, com todos os entraves burocráticos e financeiros envolvidos. As consequências do acolhimento da preliminar são: a intimação do autor para que preste a caução; a extinção do processo sem a resolução do mérito, caso a determinação judicial não seja observada, qualificando-se como preliminar peremptória. Indevida concessão do benefício de gratuidade de justiça Inspirado no princípio da concentração dos atos processuais, evitando a formação de diversos incidentes no início da relação processual, o legislador infraconstitucional acresceu o inciso XIII ao rol das preliminares, modificando a sistemática da Lei n.º 1.060/50, que previa a necessidade de arguição da indevida concessão do benefício da gratuidade de justiça pela oposição de incidente processual (outra petição, além da contestação). A arguição da matéria, como preliminar da contestação, só ocorre quando a concessão do benefício é solicitada pelo autor na petição inicial. Quando requerida supervenientemente, o réu poderá oferecer impugnação por petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso (art. 101). O acolhimento da preliminar acarreta a revogação do benefício, além do 8.5.2 8.5.2.1 cancelamento da distribuição do feito, se a parte, intimada na pessoa de seu advogado, não realizar o pagamento das custas e despesas de ingresso no prazo de 15 dias (art. 290). Exceções processuais Ao lado da espécie clássica de defesa (contestação) e da de ataque (reconvenção), a lei disciplina incidente processual que possibilita a resolução de determinada questão pendente, sem acarretar a extinção da fase de conhecimento com ou sem a resolução do mérito. As exceções processuais foram pensadas exatamente com esse propósito, qual seja, evitar a atuação de magistrado impedido ou suspeito, preservando a imparcialidade que deve nortear a prática dos atos pelo representante do Estado. Em qualquer das espécies (impedimento ou suspeição), apresenta a natureza jurídica de incidente processual, dando ensejo à formação de procedimento em apartado aos autos da ação principal, não sendo ação judicial, razão pela qual, não obstante se exija a fundamentação da arguição feita pela parte e a formulação de pedido, não se submete ao preenchimento dos requisitos da petição inicial, alocados no art. 319. É que as exceções não acarretam a formação de outro processo, a ponto de estabelecer o surgimento de relação processual paralela. Menos do que isso, apenas têm a intenção de que os autos da ação principal sejam retirados da esfera de poder do magistrado que conduz o processo, e de que sejam remetidos ao juiz substituto. Não sendo ação judicial, a parte vencida no julgamento do incidente não é condenada ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono do seu adversário processual, o que não afasta a sua responsabilidade pelo pagamento das custas e das despesas processuais. Como incidente, a exceção de impedimento ou de suspeição é julgada por decisão monocrática do relator, contra a qual é cabível a interposição do recurso de agravo interno (art. 1.021), ou por decisão colegiada, que pode ser atacada pela interposiçãodo recurso especial e/ou do recurso extraordinário. Exceções de impedimento e de suspeição As duas modalidades de exceção são marcadas não pela incompetência do magistrado, mas pela sua parcialidade, porque ligado à causa em decorrência de uma pessoa próxima, por ter atuado numa outra condição processual etc. Não se está nesses casos duvidando da competência processual e/ou intelectual do magistrado. A pretensão de que seja afastado do processo decorre, repita-se, da sua maior ou menor parcialidade, não tendo como conduzir e sentenciar o processo com a esperada isenção de ânimo. A inexistência de impedimento ou de suspeição do magistrado representa pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo, fixando-se essa premissa como um dos pilares do princípio do juiz natural.22 As hipóteses de impedimento, elencadas no art. 144 do CPC,23 são de ordem absoluta, não se sujeitando à preclusão. Desprezando a maioria das situações, porque óbvias, pensamos que os incisos II, VI e VII do artigo comentado merecem interpretação extensiva, para marcar o impedimento do magistrado. No que se refere ao inciso II, a lei textualiza a regra de que o magistrado não pode atuar no processo, em outra instância, quando proferiu decisão, sob pena de nulidade do pronunciamento, como entende a jurisprudência.24 O novo CPC ampliou o inciso III do art. 134 do CPC/73, para estabelecer a regra de que o magistrado está impedido para exercer suas funções no processo de que conheceu em outro grau de jurisdição, não apenas no que conheceu em primeiro grau de jurisdição. A novidade processual é digna de aplausos, impedindo a atuação de ministros que tenham conhecido da causa enquanto desembargadores, de ministros que tenham conhecido da causa enquanto ministros de outro tribunal, logicamente, desde que tenham proferido decisão. Por decisão, devemos entender a concessão ou o indeferimento de tutelas provisórias, a prolação de sentenças, pronunciamentos que causam prejuízo a uma das partes, nas quais o magistrado realizou juízo de valor sobre questões importantes do processo, não incluindo na previsão da lei a situação que envolve a atuação do magistrado na condução de audiências e a prolação de despacho. Parte da jurisprudência consolidada na vigência do CPC/73, à qual não anuímos, entende que há impedimento do juiz que atua na segunda instância, por ter proferido decisão de saneamento do processo quando atuava no 1º grau de jurisdição.25 Entendemos que essa decisão, por si só, não pode fundamentar a arguição de impedimento, já que o magistrado não prolata decisão que verse sobre o mérito, nem antecipa o seu convencimento, dependendo da produção das provas, que nem sequer foram ainda colhidas por ocasião da decisão de saneamento. Quanto à situação identificada no inciso VI, que prevê a possibilidade de arguição do impedimento do magistrado quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes, registramos que, na vigência do CPC/73, essa hipótese era causa de arguição de suspeição, passando a ser de impedimento, com a nova lei processual. No que toca à situação prevista no inciso VII, que legitima o réu (como também o autor) a arguir o impedimento do magistrado quando figurar como parte instituição de ensino com a qual aquele tenha relação de emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços, a inclusão do inciso em exame no rol das situações que permitem a arguição do impedimento é digna de aplausos. Com as atenções voltadas para a dinâmica das relações profissionais dos operadores do direito, percebemos ser comum a atuação do magistrado como professor ou como ocupante de cargo congênere em instituições de ensino, o que torna nebulosa a sua atuação profissional quando a ação envolver a pessoa jurídica para a qual labora. Inaugurando a análise das situações que dão margem à arguição da suspeição do juiz, verificamos que estas são de natureza relativa, de modo que, se a exceção não for suscitada pela parte interessada, no prazo de 15 dias, a contar da ciência do fato, ocorre a preclusão temporal, retirando-lhe o direito de arguir a questão posteriormente. Diferentemente dos casos de impedimento, que podem ser ratificados através de prova objetiva (o fato de o magistrado ser cônjuge de uma das partes, por exemplo), as hipóteses de suspeição não são de apuração tão singela, visto que fundadas em fatos subjetivos (amizade íntima do magistrado com uma das partes do processo, por exemplo). Quando estudamos as hipóteses de suspeição das testemunhas, no Capítulo 11, Das provas, referimo-nos a algumas situações que se aproximam de causas de parcialidade do magistrado, com destaque para a amizade íntima ou inimizade da testemunha com uma das partes do processo, bem como o seu interesse no litígio. A simples amizade ou animosidade do magistrado com uma das partes ou com o seu advogado não representa suspeição, pelo fato de a norma se referir à amizade íntima e à inimizade, provadas, por exemplo, pelo fato de o magistrado ser padrinho de batismo do filho da parte ou do seu advogado, ou padrinho de casamento da parte; de frequentar a residência desta com assiduidade, bem assim de ser inimigo processual da parte ou do seu advogado em determinado processo; de ter se divorciado da parte ou do seu advogado através de processo litigioso, com imputações de adultério, de agressões físicas; de ter integrado sociedade comercial com a parte ou com o seu advogado, na condição de sócio, desfeita através de processo litigioso etc. O novo CPC incluiu o advogado da parte na previsão legal, acompanhando orientação doutrinária e jurisprudencial sobre a matéria. Continuando a analisar o art. 145 da nova lei processual, percebemos que a arguição da suspeição do magistrado também pode se fundamentar na tese de que este recebeu presentes de pessoas que tenham interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhou alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrou meios para atender às despesas do litígio. Por aconselhamento, devemos entender o contato de qualquer natureza havido entre o magistrado e a parte (de forma direta ou indireta), no qual aquele fez referências à possibilidade do ajuizamento da ação judicial, estimulando a parte nesse aspecto, comentando as probabilidades de êxito. O aconselhamento não ocorre quando o magistrado estimula o encerramento do processo na audiência de tentativa de conciliação, demonstrando às partes como o caso vem sendo julgado pelas instâncias superiores. Quanto à arguição de suspeição fundada na alegação de que qualquer das partes é sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive, é importante destacar que a relação de crédito e de débito retira a necessária isenção que se espera na atuação do magistrado, resultando na possibilidade de que penda em favor da parte com a qual mantém a relação, a fim de que esta, beneficiada pelos termos da sentença, possa solver a obrigação, ou contemporizar o débito. Não há necessidade do ajuizamento da ação de cobrança por ou contra o magistrado, para comprovar a suspeição, sendo suficiente a demonstração da existência da dívida, e da condição de credor ou de devedor assumida pelo magistrado. Finalmente, o inciso IV da nova lei processual prevê que a parte pode suscitar a suspeição do magistrado sob a alegação de que este é interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes. Ilustrativamente, pensemos que o magistrado seja vizinho do autor da ação, que pretende reaver a posse de bem imóvel (pedido acessório, resultante do acolhimento do pleito principal), suscitando a nulidade da escritura pública que transferiu o domínio da 8.5.2.1.1 coisa ao réu, a fim de que possa permutar o imóvel por área construída, em projeto de construção que envolveo imóvel de propriedade do magistrado, por si só insuficiente em termos de área para permitir a edificação projetada. Como o réu pretende se manter no imóvel para instalar empreendimento comercial, frustrando as pretensões imobiliárias do magistrado, a suspeição pode ser suscitada nesse caso. Dinâmica das exceções de impedimento e de suspeição Ocorrido o fato que marca a hipótese de impedimento ou de suspeição do juiz, no prazo de 15 dias úteis, a parte pode alegá-lo através de petição encaminhada ao próprio magistrado, indicando o fundamento da recusa, em companhia de documentos e do rol de testemunhas. A razão de a lei determinar que a exceção seja dirigida ao próprio magistrado decorre da regra de que este pode reconhecer o impedimento ou a suspeição, anuindo ao que foi afirmado pela parte, com a consequente remessa dos autos ao seu substituto legal, resolvendo o incidente sem os traumas relacionados à remessa ao tribunal, sobressaindo a suspensão do processo, com evidente retardo na entrega da prestação jurisdicional. Se o fundamento do incidente não for acolhido pelo magistrado, resistindo à pretensão de que seja afastado do processo, o excepto (magistrado) remete os autos ao tribunal competente para conhecer do recurso a ser eventualmente interposto contra a sentença (Tribunal de Justiça, quando o magistrado exercer as suas funções no âmbito da Justiça Comum Estadual; TRF, se atuar na Justiça Federal etc.), acompanhados das suas razões, de documentos e/ou do rol de testemunhas. Distribuída no tribunal, a exceção de impedimento ou de suspeição pode ser rejeitada liminarmente pelo relator, quando constatar que é intempestiva, através de decisão monocrática, que pode ser combatida pela interposição do recurso de agravo interno, no prazo geral de 15 dias e com fundamento no art. 1.021 da nova lei processual. Não sendo o caso, e recebido o incidente, o relator deve declarar os efeitos em que é recebido, sendo que, se recebido sem efeito suspensivo, o processo voltará a tramitar, enquanto, recebido com efeito suspensivo, o processo permanece suspenso até o julgamento do incidente (§ 2º do art. 146 do CPC). Em decorrência da previsão legal, podemos afirmar que a oposição da exceção de suspeição ou de impedimento suspende o processo num primeiro momento, até que seja 8.5.3 distribuída junto ao tribunal, que, por meio do seu relator (e desde que o incidente seja recebido), ratifica ou não a atribuição do efeito suspensivo. Posteriormente, a exceção de suspeição ou de impedimento é julgada por órgão colegiado do tribunal, que pode rejeitá-la ou acolhê-la, nesse caso, tratando-se de impedimento ou de manifesta suspeição, o tribunal condena o juiz nas custas e remete os autos ao substituto legal do juiz contra o qual a exceção foi oposta, que é legitimado para recorrer da decisão, através da interposição do recurso especial e/ou do recurso extraordinário. Além da adoção das providências referidas em linhas anteriores, o tribunal fixa o momento a partir do qual o juiz não poderia ter atuado e decreta a nulidade dos seus atos, se praticados quando já presente o motivo de impedimento ou de suspeição. Reconvenção Compreendido que a contestação é manifestação tipicamente de defesa, que confere ao réu a prerrogativa de negar de forma especificada a dinâmica dos fatos expostos pelo autor, aquele, objetivando contra-atacar, necessita de outro instrumento processual que conduza essa pretensão em acréscimo. Queremos demonstrar, de forma preparatória, que a contestação não é em princípio adequada ao ataque, limitando-se a apresentar a defesa do réu, de modo que não possibilita a este receber, em termos de prestação jurisdicional, nada além do que a improcedência da ação ou dos pedidos, além da condenação do autor ao pagamento das custas, das despesas processuais e dos honorários advocatícios. Em alguns casos, contudo, o réu pode ter pretensão de ataque contra o autor, o que justifica o uso de instrumento processual diferente da contestação, que, como já visto, é manifestação de defesa. O contra-ataque do réu em face do autor pode ocorrer no âmbito da própria ação principal (proposta pelo autor contra o réu), na modalidade da reconvenção, sendo discutível a sua natureza jurídica, parte dos autores entendendo que teria a natureza jurídica de defesa, outros a qualificando como verdadeira ação judicial, proposta contra a parte contrária, no interior do mesmo processo. Pensamos que a reconvenção apresenta a natureza jurídica de ação autônoma, tanto assim que a petição que a inaugura deve preencher os requisitos do art. 319, próprios da petição inicial, independentemente do seu rito procedimental, com a ressalva mínima de 8.5.3.1 que a convocação do autor para que apresente a resposta não se dá através do aperfeiçoamento da citação, mas da intimação (§ 1º do art. 343 do novo CPC),26 o que não é suficiente para entendê-la como espécie de defesa, devendo ser ainda destacado, para que se prove a sua autonomia, que a desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta ao prosseguimento da reconvenção (§ 2º do art. 343). Compreendida a sua natureza jurídica – de ação autônoma – e a sua finalidade – a de permitir o contra-ataque do réu no mesmo processo formado por iniciativa do autor –, devemos anotar que a sua apresentação é facultativa, razão pela qual, não sendo oposta, o réu não perde o direito de perseguir o reconhecimento do direito material de que se afirma titular através do ajuizamento de outra ação. Sua admissibilidade está atrelada à ideia da economia processual, permitindo a resolução de dois conflitos de interesses no mesmo processo, que passa a ter duas ações: uma instaurada por iniciativa do autor em face do réu (ação principal), outra pelo réu em face do autor (reconvenção). Se o réu não opuser a reconvenção na contestação, pode contra-atacar o autor através do ajuizamento de outra ação judicial, distribuída por dependência à ação principal ou após o seu término. Podemos assim afirmar que a reconvenção foi idealizada com o propósito de racionalizar a distribuição da prestação jurisdicional em menor espaço de tempo, conjugando num só processo duas ações distintas, embora conexas, podendo o magistrado acolher uma e rejeitar a outra, o que imporia a completa derrota do réu, ou acolher a ambas as pretensões, numa delas reconhecendo a vitória do autor e na outra a do réu. Por entendimento sumulado, “é admissível reconvenção em ação declaratória” (Súmula 258 do STF), bem como “a reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário” (Súmula 292 do STJ). Prazo para o oferecimento da reconvenção Não obstante a autonomia existente entre as duas ações (ação principal e reconvenção), percebemos que esta desvinculação não é plena, já que a reconvenção deve ser proposta na contestação, ou seja, no prazo preclusivo da defesa, geralmente 15 dias úteis, na realidade das ações de conhecimento. Nesse passo, enquanto o CPC/73 estabelecia que a reconvenção devia ser oposta 8.5.3.2 simultaneamente à contestação (art. 299 daquele Código), o que, em termos enciclopédicos, significa ao mesmo tempo, o novo CPC prevê que a reconvenção deve ser proposta na contestação (art. 343, caput), ou seja, na mesma petição pela qual o réu se defende, o que valoriza os princípios da concentração e da razoável duração do processo. Como a lei predefiniu o prazo e a forma de oposição da reconvenção, pensamos que esta deve ser rejeitada, quando oposta através da apresentação de petição avulsa, protocolada antes ou após a apresentação da contestação, desde que a contestação seja apresentada, já que o § 6º do art. 343 prevê que o réu pode propor reconvenção independentemente de oferecer contestação. Assim, se o réu apenas apresenta reconvenção, é evidente que pode fazê-lo por petição avulsa.
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