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Sexualidade humana av2

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Sexualidade humana e
disfunções sexuais 564
17.1 Sexualidade normal 564
17.2 Disfunções sexuais 575
17.3 Transtornos parafílicos
17.1 Sexualidade normal
A sexualidade sempre foi uma área de interesse para a comunidade
médica. Na Era Clássica, Hipócrates se referiu ao clitóris como o
local da excitação sexual feminina, o primeiro médico, com registros
históricos, que fez essa avaliação. Na Idade Média, os médicos
islâmicos recomendavam o coito interrompido como uma forma de
controle da natalidade. No fim da Renascença e início da Reforma
Protestante, foi desenvolvido um envoltório de linho como preservativo,
não para o controle da natalidade, mas como proteção contra
a sífilis. Durante a Era Vitoriana, sexólogos como Havelock Ellis
(Fig. 17.1-1) e Richard von Krafft-Ebing (Fig. 17.1-2) apresentaram
perspectivas divergentes sobre o comportamento sexual. Durante
aquele mesmo período, Sigmund Freud desenvolveu suas teorias
inovadoras sobre a libido, a sexualidade infantil e os efeitos do impulso
sexual no comportamento humano. Na Era Moderna, as pesquisas
de Alfred Kinsey, o trabalho de William Masters e Virginia
Johnson e o desenvolvimento de drogas que previnem a concepção,
auxiliam a ereção e substituem os hormônios que diminuem com a
menopausa e com o envelhecimento contribuíram para o desenvolvimento
de uma era de liberalidade sexual. O sexo também sempre
foi foco constante de curiosidade e interesse da humanidade em
geral. Descrições do comportamento sexual existem desde a época
dos desenhos nas cavernas pré-históricas, passando pelas ilustrações
anatômicas do intercurso sexual feitas por Leonardo da Vinci até os
sites pornográficos atuais na internet.
A sexualidade é determinada pela anatomia, fisiologia, a cultura
em que uma pessoa vive, suas relações com as outras pessoas
e as experiências desenvolvimentais durante o ciclo de vida. Ela inclui
a percepção de ser homem ou mulher e pensamentos e fantasias
privados, além do comportamento. Para a pessoa comum, a atração
sexual por outra pessoa e a paixão e o amor que se seguem estão
profundamente associados a sentimentos de felicidade íntima.
O comportamento sexual normal traz prazer ao indivíduo e a
seu parceiro e envolve a estimulação de órgãos sexuais primários,
incluindo o coito; ele é desprovido de sentimentos inapropriados de
culpa ou ansiedade e não é compulsivo. O entendimento da sociedade
sobre o que define o comportamento sexual normal é inconstante
e varia de época para época, refletindo os costumes culturais
do momento.
TERMOS
A sexualidade e a personalidade estão tão entrelaçadas que falar da
sexualidade como uma entidade separada é praticamente impossível.
O termo psicossexual, portanto, é usado para descrever o desenvolvimento
e o funcionamento da personalidade na forma como
estes são afetados pela sexualidade. O termo psicossexual aplica-se
a mais do que sentimentos e comportamento sexual e não é um sinônimo
de libido no sentido freudiano mais amplo.
A generalização de Freud de que todos os impulsos e as atividades
prazerosas são originalmente sexuais provocou nas pessoas
leigas uma visão um tanto distorcida dos conceitos sexuais e
apresentou aos psiquiatras um quadro confuso da motivação. Por
exemplo, algumas atividades orais são direcionadas à obtenção de
comida, e outras são direcionadas à obtenção de gratificação sexual.
Ambas as atividades buscam o prazer e usam o mesmo órgão, mas
não são, como Freud defendeu, necessariamente sexuais. Rotular
todos os comportamentos de busca do prazer como sexuais torna
impossível especificar as motivações precisas. As pessoas também
podem usar as atividades sexuais para gratificação de necessidades
não sexuais, como dependência, agressão, poder e status. Embora
impulsos sexuais e não sexuais possam, em conjunto, motivar o
comportamento, a análise do comportamento depende do conhecimento
das motivações individuais subjacentes e suas interações.
SEXUALIDADE INFANTIL
Antes de Freud descrever os efeitos das experiências infantis na
personalidade dos adultos, a universalidade da atividade sexual e a
aprendizagem sexual das crianças não eram reconhecidas. A maior
parte das experiências de aprendizagem sexual na infância ocorre
sem o conhecimento dos pais, mas o reconhecimento do sexo do
filho influencia o comportamento parental. Os bebês do sexo masculino,
por exemplo, tendem a ser manuseados mais vigorosamente, e
os do sexo feminino, a ser mais acarinhados. O pai passa mais tempo
com seus filhos do que com suas filhas quando bebês e também é
propenso a estar mais atento às preocupações adolescentes dos filhos
do que às ansiedades das filhas. Os meninos têm maior probabilidade
de ser fisicamente castigados do que as meninas. O sexo do
filho afeta a tolerância parental à agressão e reforça ou tenta extinguir
atividades e interesses intelectuais, estéticos e esportivos.
A observação de crianças revela que o manuseio genital no
bebê faz parte do desenvolvimento normal. De acordo com Harry
Harlow, a interação com a mãe e com os pares é necessária para
o desenvolvimento do comportamento sexual efetivo nos macacos,
um achado que tem relevância para a socialização normal das crianças.
Durante um período crítico no desenvolvimento, os bebês têm
especial suscetibilidade a certos estímulos; posteriormente, poderão
ser imunes a eles. A relação detalhada entre os períodos críticos e o
desenvolvimento sexual ainda não foi estabelecida; os estágios psicossexuais
do desenvolvimento de Freud – oral, anal, fálico, latência
e genital – provavelmente ofereçam uma abordagem ampla
17.3 Transtornos parafílicos
Parafilias ou perversões são estímulos ou atos sexuais que apresentam desvios dos comportamentos sexuais normais, mas que são necessários para que algumas pessoas experimentem excitação e orgasmo. De acordo com o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, 5ª edição (DSM-5), o termo “transtorno parafílico” é reservado para aqueles casos em que uma fantasia ou um impulso sexualmente desviante foi expresso de modo comportamental. Indivíduos com interesses parafílicos podem experimentar prazer sexual, mas são inibidos na resposta a estímulos normalmente considerados eróticos. A sexualidade da pessoa parafílica está sobretudo restrita a estímulos ou atos desviantes específicos. As pessoas que experimentam ocasionalmente comportamento parafílico (p. ex., episódio infrequente de dominação ou vestir fantasias), mas são capazes de responder a estímulos eróticos mais típicos, não são vistas como tendo transtornos parafílicos.
Os transtornos parafílicos podem variar de um comportamento quase normal até um comportamento destrutivo ou doloroso para a pessoa, para a pessoa e o parceiro e até um comportamento considerado destrutivo ou ameaçador à comunidade em geral. O DSM-5 lista pedofilia, frotteurismo, voyeurismo, exibicionismo, sadismo sexual, masoquismo sexual, fetichismo e travestismo com critérios diagnósticos explícitos em razão de sua ameaça aos outros e/ou porque são parafilias bastante comuns. Existem muitas outras que podem ser diagnosticadas. Uma parafilia é clinicamente significativa se a pessoa atuou essas fantasias ou se essas fantasias causam sofrimento acentuado ou dificuldades interpessoais ou problemas relacionados ao trabalho. Entretanto, quando a fantasia não foi atuada, o termo “transtorno parafílico” não deve ser aplicado. Nas parafilias já listadas, com exceção da pedofilia, são acrescentados os especificadores “em ambiente protegido” (quando a fantasia não pode ser facilmente atuada devido a circunstâncias como estar em uma instituição) ou “em remissão completa” (quando o paciente não atuou as fantasias por cinco anos e não ocorreu prejuízo no funcionamento interpessoal ou profissional em um ambiente não protegido por cinco anos).
Uma fantasia especial, com seus componentes inconscientes e conscientes, é o elemento patognomônico da parafilia, sendo excitação sexual e orgasmo fenômenos associadosque reforçam a fantasia ou o impulso. A influência dessas fantasias e suas manifestações comportamentais frequentemente se estendem além da esfera sexual para invadir a vida das pessoas. As principais funções do comportamento sexual humano são auxiliar nos vínculos, criar prazer mútuo em cooperação com um parceiro, expressar e estimular o amor entre duas pessoas e procriar. Os transtornos parafílicos implicam comportamentos divergentes, uma vez que esses atos envolvam agressão, vitimização e unilateral lidade. Os comportamentos excluem ou prejudicam outras pessoas e perturbam as ligações potenciais entre as pessoas. Além do mais, os scripts sexuais parafílicos com frequência servem a outras funções psíquicas vitais. Eles podem aliviar a ansiedade, refrear agressão ou estabilizar a identidade.
EPIDEMIOLOGIA
As parafilias são praticadas por apenas uma pequena porcentagem da população, mas a natureza insistente e repetitiva do transtorno resulta em uma alta frequência desses atos. Dessa forma, uma grande proporção da população tem sido vitimizada por pessoas com transtornos parafílicos. Foi sugerido que a prevalência de parafilias seja significativamente mais alta do que o número de casos diagnosticados em instituições de clínica geral, com base no grande mercado comercial da parafernália pornográfica parafílica. Não se sabe como muitos dos consumidores desse material atuam as fantasias parafílicas ou não conseguem responder aos estímulos eróticos típicos. Entre os casos identificados legalmente de transtornos parafílicos, a pedofilia é o mais comum. De todas as crianças, 10 a 20% foram molestadas até os 18 anos de idade. Como uma criança é o objeto, o ato é levado mais a sério e é feito maior esforço para monitorar o criminoso do que em outros transtornos parafílicos. Pessoas com exibicionismo que se exibem publicamente para crianças pequenas também costumam ser presas. Aquelas com voyeurismo podem ser presas, mas seu risco não é grande. Das mulheres adultas, 20% foram alvo de pessoas com exibicionismo ou voyeurismo.
Masoquismo sexual e sadismo sexual estão sub-representados em todas as estimativas de prevalência. O sadismo sexual em geral chama atenção apenas em casos sensacionalistas de estupro, brutalidade e assassinato por luxúria. Os transtornos parafílicos excretórios são raramente reportados porque a atividade acontece, de modo habitual, entre adultos, com consentimento, ou entre prostituta e cliente. As pessoas com fetichismo em raras ocasiões são envolvidas pelo sistema legal. Aqueles com travestismo podem ser presos algumas vezes por perturbação da paz ou outros delitos se forem obviamente homens vestidos com roupas de mulheres, mas a prisão é mais comum entre aqueles com transtornos de identidade de gênero. Zoofilia como um verdadeiro transtorno parafílico é rara (Tab. 17.3-1).
Conforme em geral definido, as parafilias parecem ser, em grande parte, condições masculinas. O fetichismo quase sempre ocorre em homens. Mais de 50% de todas as parafilias têm seu início antes dos 18 anos. Pacientes com parafilia frequentemente têm 3 das 5 parafilias, seja de forma concomitante, seja em momentos diferentes. Esse padrão de ocorrência é especialmente o caso com exibicionismo, fetichismo, masoquismo sexual, sadismo sexual, fetichismo transvéstico, voyeurismo e zoofilia (veja a Tab. 17.3-1).
A ocorrência de comportamento parafílico atinge o auge entre 15 e 25 anos e declina de maneira gradual. O DSM-5 sugere que a designação de parafilia seja reservada para aqueles que estão acima de 18 anos para evitar patologizar a curiosidade sexual normal e a experimentação ocasional na adolescência. Em homens com mais de 50 anos, atos parafílicos criminosos são raros. Aqueles que ocorrem são praticados isoladamente e com um parceiro cooperativo.
ETIOLOGIA
Fatores psicossociais No modelo psicanalítico clássico, as pessoas com parafilia não conseguiram completar o processo normal do desenvolvimento em direção ao ajustamento sexual, mas o modelo foi modificado por novas abordagens psicanalíticas. O que distingue uma parafilia de outra é o método escolhido por uma pessoa (em geral homem) para lidar com a ansiedade causada pela ameaça de castração pelo pai e a separação da mãe. Embora sua manifestação seja bizarra, o comportamento resultante possibilita uma saída para os impulsos sexuais e agressivos que de outra forma teriam sido canalizados para o comportamento sexual normal. A falha na resolução da crise edípica pela identificação com o pai agressor (para os meninos) ou a mãe agressora (para as meninas) resulta na identificação imprópria com o sexo oposto ou uma escolha imprópria do objeto para catexia libidinal. A teoria psicanalítica clássica sustenta que transexualismo e fetiche transvéstico são transtornos porque cada um envolve identificação com o genitor do sexo oposto em vez de com o genitor do mesmo sexo; por exemplo, acredita-se que um homem que se vista com roupas de mulher se identifique com sua mãe. Exibicionismo e voyeurismo podem ser tentativas de acalmar a ansiedade de castração porque a reação da vítima ou a excitação do voyeur reassegura à pessoa parafílica que o pênis está intacto. O fetichismo é uma tentativa de evitar a ansiedade deslocando os impulsos libidinais para objetos inapropriados. Uma pessoa com um fetiche por sapatos nega inconscientemente que as mulheres perderam seus pênis por meio da castração, vinculando a libido a um objeto fálico, o sapato, que simboliza o pênis feminino.
As pessoas com pedofilia e sadismo sexual têm necessidade de dominar e controlar suas vítimas para compensar seus sentimentos de impotência durante a crise edípica. Alguns teóricos acreditam que escolher uma criança como objeto de amor seja um ato narcisista.
Pessoas com masoquismo sexual superam seu medo de lesão e seu sentimento de impotência mostrando que são refratárias a danos. Outra teoria propõe que o masoquista dirige a agressão inerente a todas as parafilias para si mesmo. Embora desenvolvimentos recentes em psicanálise coloquem mais ênfase no tratamento dos mecanismos de defesa do que em traumas edípicos, a terapia psicanalítica para pacientes com parafilia permanece coerente com a teoria de Sigmund Freud.
Outras teorias atribuem a evolução de uma parafilia a experiências precoces que condicionam ou socializam as crianças para cometerem um ato parafílico. A primeira experiência sexual compartilhada pode ser importante nesse aspecto. Ser molestada quando criança pode predispor uma pessoa a aceitar o abuso continuado quando adulto ou, de maneira inversa, se tornar uma abusadora de outras pessoas. Além disso, experiências precoces de abuso que não são especificamente sexuais, como agressão, enemas ou humilhação verbal, podem ser sexualizadas por uma criança e formar a base para uma parafilia. Tais experiências podem resultar no desenvolvimento de uma criança erotizada.
Um homem de 34 anos buscou tratamento com uma queixa principal de transtorno erétil. Ele frequentemente não conseguia obter ereção suficiente para o coito com sua esposa. O problema desaparecia sempre que ela estava disposta a realizar sua fantasia de submissão, amarrando-o com cordas, um cenário que ele desejava intensamente.
 O paciente explicou que se sentia livre para ser sexual quando estava amarrado porque isso o reassegurava de que podia se movimentar de forma vigorosa sem machucar a mulher. Além disso, trouxe uma história de ter sido amarrado “de brincadeira” quando era criança por uma babá, que, então, lhe fazia cócegas até que ele lhe implorasse para parar.
O começo de um transtorno parafílico pode resultar de pessoas usando como modelo para seu comportamento a conduta de outras pessoas que realizaram atos parafílicos, da simulação de comportamento sexual representado na mídia ou relembrando eventos do passado carregados emocionalmente, como ter sido molestado. A teoria da aprendizagem indica que fantasiar interesses parafílicos começa em idade precoce, e, como as fantasias e os pensamentos pessoais não são compartilhadoscom os outros (que poderiam bloqueá-los ou desencorajá-los), o uso e o mau uso de fantasias e impulsos parafílicos continuam inibidos até mais tarde na vida. Só então as pessoas começam a perceber que tais interesses e impulsos parafílicos são incompatíveis com as normas sociais. Nesse momento, no entanto, o uso repetitivo dessas fantasias tornou-se arraigado, e os pensamentos e comportamentos sexuais já se associaram ou ficaram condicionados às fantasias parafílicas.
Fatores biológicos
Diversos estudos identificaram achados orgânicos anormais em pessoas com parafilias. Nenhum deles usou amostras aleatórias dessas pessoas; em vez disso, investigaram amplamente pacientes com parafilia que foram encaminhados a grandes centros médicos. Entre esses pacientes, aqueles com achados orgânicos positivos incluíam 74% com níveis hormonais anormais, 27% com sinais neurológicos acentuados ou leves, 24% com anormalidades cromossômicas, 9% com convulsões, 9% com dislexia, 4% com estudo eletrencefalográfico (EEG) anormal, 4% com transtornos mentais importantes e 4% com deficiência mental. A questão é se essas anormalidades estão causalmente relacionadas a interesses parafílicos ou se são achados incidentais que não têm relevância para o desenvolvimento de parafilia. Testes psicofisiológicos foram criados para medir o tamanho volumétrico do pênis em resposta a estímulos parafílicos e não parafílicos. Os procedimentos podem ser de utilidade no diagnóstico e no tratamento, mas são de validade diagnóstica questionável porque alguns homens são capazes de suprimir sua resposta erétil.
DIAGNÓSTICO E CARACTERÍSTICAS
CLÍNICAS
No DSM-5, os critérios para transtorno parafílico requerem que o paciente tenha vivenciado excitação intensa e recorrente com sua fantasia desviante por pelo menos seis meses e tenha atuado o impulso impulso parafílico. A presença de fantasia parafílica, no entanto, ainda pode causar sofrimento a um paciente, mesmo que não tenha havido qualquer elaboração comportamental. A fantasia que causa sofrimento contém material sexual incomum relativamente fixo e apresenta apenas pequenas variações. A excitação e o orgasmo dependem da elaboração mental, senão da encenação comportamental da fantasia. A atividade sexual é ritualizada ou estereotipada e faz uso de objetos degradados, desvalorizados ou desumanizados.
Exibicionismo
Exibicionismo é o impulso recorrente de expor os próprios genitais a um estranho ou a uma pessoa que não espera o fato. A excitação sexual ocorre como antecipação da exposição, e o orgasmo é provocado pela masturbação durante ou após o evento. Em quase 100% dos casos, os exibicionistas são homens que se expõem a mulheres.
A dinâmica dos homens com exibicionismo é afirmar sua masculinidade mostrando seu pênis e observando as reações das vítimas – susto, surpresa e aversão. Nesse transtorno parafílico, os homens inconscientemente se sentem castrados e impotentes. As esposas de homens com exibicionismo com frequência substituem as mães a quem os homens eram apegados em excesso durante a infância ou, ao contrário, por quem eram rejeitados. Em outras parafilias relacionadas, os temas centrais envolvem derivativos de olhar ou mostrar.
Um profissional abusador de substância afinal conseguiu atingir a
sobriedade aos 33 anos de idade. Ao alcançar essa conquista, conheceu
uma mulher e se casou, começou a trabalhar regularmente
pela primeira vez na vida e conseguiu engravidar a esposa. Sua
atividade sexual preferida tinha sido a masturbação em locais semipúblicos.
O paciente tinha um forte sentimento de que sua mãe
sempre o achara inadequado, não gostava de passar um tempo com
ele e constantemente fazia comparações negativas entre ele e seu
irmão mais moço “mimado”. Ele recordava de várias vezes em que
seu pai tentava explicar a antipatia de sua mãe: “É uma daquelas
coisas, filho: a sua mãe não parece gostar de você.” Sem o abuso de
substância, ele abandonou seu exibicionismo, mas logo desenvolveu
incapacidade sexual com sua esposa e se tornou “viciado” em
sexo por telefone. (Cortesia de Stephen B. Levine, M.D.)
Os especificadores acrescentados ao transtorno exibicionista no DSM-5 diferenciam entre excitação pela exposição dos genitais a crianças pré-púberes, a indivíduos fisicamente maduros ou a ambos, crianças pré-púberes e indivíduos fisicamente maduros.
Fetichismo
No fetichismo, o foco sexual é em objetos (p. ex., sapatos, luvas, calcinhas e meias) que estão intimamente associados ao corpo humano ou a partes não genitais do corpo. Esse último foco é às vezes denominado parcialismo e é discutido mais adiante. O DSM-5 aplica o diagnóstico de transtorno fetichista ao parcialismo e vincula os seguintes especificadores desse transtorno: parte(s) do corpo; objetos inanimados; outros. O fetiche particular usado está associado a alguém intimamente envolvido com o paciente durante a infância e tem uma qualidade associada a essa pessoa amada, necessária ou até mesmo traumatizante. De modo habitual, o transtorno se inicia na adolescência, embora o fetiche possa ter-se estabelecido na infância.
Depois de instituído, o transtorno tende a ser crônico. 
A atividade sexual pode ser voltada para o fetiche em si(p. ex., masturbação com ou dentro de um sapato) ou o fetiche pode ser incorporado à relação sexual (p. ex., a exigência de que sejam usados sapatos de salto alto). O transtorno é encontrado quase exclusivamente em homens. De acordo com Freud, o fetiche serve como um símbolo do falo para pessoas com medo inconsciente de castração.
Os teóricos da aprendizagem acreditam que o objeto esteja associado à estimulação sexual em estágio precoce.
Um homem de 50 anos começou tratamento com a queixa principal de transtorno erétil que ocorria sobretudo com sua esposa. Ele estava sofrendo de uma depressão moderada relacionada a seus problemas conjugais e a problemas nos negócios. Não tinha problemas eréteis com mulheres que procurava em bares ou com quem marcava encontrosnos bares. Os bares eram seu local preferido, em parte porque o fumo tinha sido proibido em outras áreas públicas em sua cidade, e o ato de uma mulher fumando um cigarro era necessário para sua excitação sexual. Sua história familiar incluía uma mãe alcoolista e um pai emocionalmente abusivo que era um fumante inveterado.
Nas viagens de carro da família, o pai fumava com todas as janelas do carro levantadas. Se o paciente reclamasse de sentir náuseas, o pai lhe dizia “cale a boca”. Recordava que se se sentia muito atraído por uma professora da escola dominical que fumava quando ele tinha 6 anos de idade. Fumou pela primeira vez quando tinha 13 anos se escondendo furtivamente atrás da casa. Seu primeiro cigarro foi roubado de um maço que estava sobre a mesa de cabeceira de sua mãe.
Masoquismo sexual 
O masoquismo recebe esse nome em referência às atividades de Leopold von Sacher-Masoch, um novelista austríaco do século XIX cujos personagens sentiam prazer sexual ao serem abusados e dominados por mulheres. De acordo com o DSM-5, as pessoas com masoquismo sexual têm uma preocupação recorrente com impulsos e fantasias sexuais envolvendo o ato de serem humilhadas, espancadas, amarradas ou submetidas a sofrimento. Um especificador acrescentado a esse diagnóstico é “com asfixiofilia”. Também denominada asfixia autoerótica, trata-se da prática de atingir ou aumentar a excitação sexual por meio da restrição da respiração. As práticas sexuais masoquistas são mais comuns entre homens do que entre mulheres. Freud acreditava que o masoquismo resultasse de fantasias destrutivas voltadas contra si. Em alguns casos, as pessoas só conseguem se permitir experimentar sentimentos sexuais quando ocorre punição pelos sentimentos.
As pessoas com masoquismo sexual tiveram experiências na infância que as convenceram de que a dor é um pré-requisito para o prazer sexual. Aproximadamente 30% daqueles com masoquismo sexual também têm fantasias sádicas. O masoquismo moral envolve a necessidade de sofrer, mas não é acompanhado de fantasiassexuais.
Uma mulher de 27 anos apresentou-se para entrevista com o diretor de um curso para que havia se candidatado e o qual estava ansiosa para cursar. Ela apareceu na entrevista na companhia de um homem que apresentou ao diretor dizendo: “Este é o meu amante”. Quando questionada sobre esse comportamento incomum durante a entrevista, a candidata disse que seu companheiro havia ordenado que ela o trouxesse e fizesse aquela apresentação. Ela explicou, ainda, que fazia parte de um grupo que utilizava técnicas sadomasoquistas em seus jogos sexuais.
SADISMO SEXUAL
O DSM-5 define sadismo sexual como a excitação sexual recorrente e intensa ocasionada pelo sofrimento físico e psicológico de outra pessoa. O indivíduo deve vivenciar esses sentimentos por pelo menos seis meses e deve ter colocado em prática as fantasias sádicas para receber um diagnóstico de transtorno de sadismo sexual. As pessoas que negam elaboração comportamental de suas fantasias parafílicas e que dizem não sofrer de angústia ou dificuldades interpessoais ou sociais como consequência de suas parafilias são designadas com interesse identificado por sadismo sexual. 
O início do transtorno costuma ser antes dos 18 anos, e a maioria das pessoas com sadismo sexual é do sexo masculino. De acordo com a teoria psicanalítica, o sadismo é uma defesa contra o medo de castração; esses indivíduos fazem às outras pessoas aquilo que temem que lhes aconteça e obtêm prazer com a expressão de seus instintos agressivos. A denominação do transtorno provém do Marquês de Sade, um escritor e oficial do exército francês do século XVIII que foi várias vezes aprisionado por seus atos sexuais violentos contra mulheres. O sadismo sexual está relacionado ao estupro, embora o estupro seja mais adequadamente considerado uma expressão de poder. Alguns estupradores sádicos, no entanto, matam suas vítimas depois de fazerem sexo (os assim chamados assassinatos por luxúria). Em muitos casos, essas pessoas têm esquizofrenia subjacente. John Money acredita que os assassinos por luxúria sofram de transtorno dissociativo e talvez tenham uma história de trauma encefálico. Ele lista cinco causas contribuintes para o sadismo sexual: predisposição hereditária, mau funcionamento hormonal, relações patológicas, história de abuso sexual e presença de outros transtornos mentais.
Voyeurismo
Voyeurismo, também conhecido como escopofilia, é a preocupação recorrente com fantasias e atos que envolvem a observação de pessoas que ignoram estar sendo observadas e que estão nuas, despindo-se ou em meio a atividade sexual. A masturbação até o orgasmo costuma acompanhar ou se segue ao evento. O primeiro ato voyeurista em geral ocorre durante a infância, e a parafilia é mais comum em homens. Quando pessoas com voyeurismo são presas, a acusação via de regra é de vadiagem.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Os clínicos devem diferenciar uma parafilia de um ato experimental que não é recorrente ou compulsivo e que é realizado por seu caráter de novidade. A atividade parafílica inicia-se mais provavelmente durante a adolescência. Algumas parafilias (em especial os tipos bizarros) estão associadas a outros transtornos mentais, como esquizofrenia. Doenças cerebrais também podem liberar impulsos perversos.
CURSO E PROGNÓSTICO
A dificuldade de controle e cura dos transtornos parafílicos reside no fato de que é difícil as pessoas abandonarem o prazer sexual sem uma garantia de que novas rotas de gratificação sexual serão obtidas. Um mau prognóstico para esses transtornos está associado a início em estágio precoce, alta frequência dos atos, nenhuma culpa ou vergonha quanto ao ato e abuso de substância. O curso e o prognóstico são melhores quando os pacientes têm uma história de coito além da parafilia e quando buscam tratamento por conta própria, em vez de serem encaminhados por uma agência legal.
TRATAMENTO
Cinco tipos de intervenção psiquiátrica são usados para tratar pessoas com transtorno parafílico e interesses parafílicos: contro-le externo, redução dos impulsos sexuais, tratamento de condições comórbidas (p. ex., depressão ou ansiedade), terapia cognitivo-comportamental e psicoterapia dinâmica. A prisão é um mecanismo de controle externo para crimes sexuais que em geral não contém um elemento de tratamento. Quando ocorre vitimização em uma família ou no ambiente de trabalho, o controle externo provém da informação sobre o problema aos supervisores, pares ou outros membros adultos da família, alertando--os para que eliminem as oportunidades em que o perpetrador possa colocar em prática seus impulsos.
Terapia medicamentosa, incluindo medicação antipsicótica ou antidepressiva, é indicada para o tratamento de esquizofrenia ou transtornos depressivos se a parafilia estiver associada a eles. Antiandrogênios, como acetato de ciproterona, na Europa, e acetato de medroxiprogesterona, nos Estados Unidos, podem reduzir o impulso de se comportar sexualmente, reduzindo os níveis séricos da testosterona até concentrações subnormais. Agentes serotonérgicos como a fluoxetina já foram usados com sucesso limitado em alguns pacientes com parafilia.
A terapia cognitivo-comportamental é usada para romper os padrões parafílicos aprendidos e modificar o comportamento para torná-lo socialmente aceitável. As intervenções incluem treinamento em habilidades sociais, educação sexual, reestruturação cognitiva (confrontar e destruir as racionalizações usadas para apoiar a vitimização dos outros) e o desenvolvimento de empatia pela vítima. Dessensibilização imaginária, técnicas de relaxamento e aprendizagem do que desencadeia o impulso parafílico de modo que esses estímulos possam ser evitados também são ensinados. No ensaio do comportamento aversivo modificado, os perpetradores são filmados colocando em prática sua parafilia com um manequim. Então, o paciente com transtorno parafílico é confrontado por um terapeuta e um grupo de outros transgressores que fazem perguntas sobre sentimentos, pensamentos, motivos associados ao ato e repetidamente tentam corrigir distorções cognitivas e apontar a ausência de empatia do paciente com a vítima.
A psicoterapia orientada para o insight é uma abordagem de tratamento de longa duração. Os pacientes têm a oportunidade de entender sua dinâmica e os eventos que fizeram a parafilia se desenvolver.
Em particular, eles tomam consciência dos eventos diários que fazem atuar seus impulsos (p. ex., uma rejeição real ou fantasiada). O tratamento os ajuda a lidar de forma mais efetiva com os estresses da vida e reforça sua capacidade de se relacionar com um companheiro de vida. Além disso, a psicoterapia permite que os pacientes recuperem a autoestima, o que, por sua vez, lhes possibilita
a aproximação de um parceiro de uma maneira sexual mais normal. A terapia sexual é um adjunto apropriado para o tratamento de indivíduos com disfunções sexuais específicas quando eles buscam atividades sexuais não desviantes. Bons indicadores prognósticos incluem a presença de apenas uma parafilia, inteligência normal, ausência de abuso de substância, ausência de traços de personalidade antissocial não sexual e a presença de um vínculo adulto bem-sucedido. Os transtornos parafílicos, no entanto, continuam a ser desafios de tratamento significativos mesmo diante dessas circunstâncias.

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