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1 Texto adaptado do Artigo “Rossi CN et al., Ressuscitação cardiorespiratória em cães e gatos – revisão. RPCV (2007) 102 (563-564) 197-205” Tem-se por definição de paragem cardiorespiratória (PCR) a súbita interrupção da respiração e da circulação sanguínea (Robello e Crowe, 1989). Ainda que afete todos os sistemas do organismo, os órgãos mais acometidos são o cérebro, o coração e os rins (Welsh, 2002). A mesma pode ser classificada como respiratória ou cardiorrespiratória (Wingfield e Van Pelt, 1992). Na paragem respiratória a ventilação cessa, mas o ritmo cardíaco está normal. Porém, se não revertida rapidamente, evolui para ritmo cardíaco letal e paragem cardiorespiratória, já que a hipoxemia e a hipercapnia decorrentes da paragem respiratória, podem levar à acidose e à liberação de catecolaminas, resultando em arritmias, tais como fibrilação ventricular, assistolia ou dissociação eletromecânica, atualmente conhecida como atividade elétrica sem pulso (AESP) O funcionamento do coração e consequentemente a circulação sanguínea, são interrompidos na fibrilação ventricular, na assistolia e na atividade elétrica sem pulso. Como a AESP pode ocorrer em animais com doença ou paragem cardiorespiratórias graves, é impor- tante verificar a presença de batimentos cardíacos e características de pulso no paciente, mesmo que o eletrocardiograma esteja normal (Nelson e Couto, 2001b). De acordo com dados da Universidade da Geórgia, nos anos 80, a arritmia letal mais comum em cães e gatos foi a AESP (Robello e Crowe, 1989) e, por este motivo, a desfibrilação elétrica não é recomendada como primeira opção no tratamento da PCR, como preconizado na medicina humana (Evans, 1999). Em cães e gatos ocorre inicialmente a paragem respiratória, que pode progredir para a paragem cardíaca. O tratamento rápido da paragem respiratória com ventilação assistida e oxigênio pode evitar a paragem cardíaca, principalmente se não houver doença grave concomitante (Nelson e Couto, 2001b). O termo ressuscitação cardiorespiratória (RCR) tem sido substituído pelo termo ressuscitação cardio- pulmonar-cerebral (RCPC) para enfatizar a importância do cérebro durante a ressuscitação e o período após a mesma, já que não há vantagem nenhuma em reestabelecer a função cardiorespiratória de um paciente com atividade cerebral diminuída ou ausente (Gfeller e Fresno, 2002; Crowe e Rabelo, 2005). Uma vez confirmado o diagnóstico da paragem cardiorespiratória, todos os esforços devem ser instituídos com o objetivo de melhorar o fluxo sanguíneo e reestabelecer o batimento cardíaco, já que os objetivos imediatos da RCPC são prevenir a lesão cerebral irreversível, restaurar o funcionamento efetivo do coração e pulmões e corrigir a hipóxia tecidual e a acidose que se desenvolvem (Nelson e Couto, 2001b). Suporte básico da vida Constatada a paragem cardiorespiratória, seguem-se os procedimentos diretamente relacionados a RCR, identificados pelas letras iniciais do alfabeto: a permeabilização das vias aéreas (A = Airway); a ventilação pulmonar (B = Breathing); a circulação (C = Circulation). Vias Aéreas (A) A prioridade na paragem cardiorespiratória é estabelecer uma via aérea, sendo que a intubação orotraqueal é o método mais eficiente. Clinicamente, a hipoxemia pode estar associada à dispneia, orto- pneia, taquipneia, taquicardia, síncope ou cianose (Henik, 1992). A limpeza prévia das vias aéreas e da cavidade oral deve ser realizada antes da intubação e a sucção pode ser utilizada para remover vômito, sangue, muco ou líquidos da boca, faringe e traquéia. A traqueostomia pode ser necessária se houver dificuldade de acesso à laringe para a intubação através da boca (Henik, 1992). 2 Respiração (B) A ventilação deve ser iniciada assim que uma via aérea estiver estabelecida. Pode ser realizada através de aparelho de anestesia utilizando-se oxigênio a 100%, que é o melhor método, ou através de ambu com ar ambiente (21% O ou conectado a uma fonte de oxigênio a 100% (Henik, 1992). A taxa de ventilação tem sido extensivamente discutida, mas ainda não há consenso sobre a mesma. As frequências de 20 movimentos respiratórios por minuto para cães de grande porte e de 24 para os de pequeno porte, parecem ser mais eficazes que 12 a 15 respirações por minuto, como previamente recomen- dado (Nelson e Couto, 2001b). Já frequências de 12 por minuto resultam em alcalose respiratória após 8 minutos de ventilação artificial (Sanders et al., 1984). Alguns pesquisadores recomendam taxas de venti- lações de 20 a 25 movimentos por minuto (Crowe, 1988), outros preconizam 20 a 40 movimentos respiratórios por minuto (Marks, 1999; Young, 1992) ou ainda taxas de frequência respiratória semelhantes às compressões torácicas (Gfeller e Fresno, 2002). A literatura é, portanto, inconclusiva, mas o que prevalece nos focos de discussão atuais são freqüên- cias respiratórias mais elevadas que as preconizadas antigamente (Gfeller e Fresno, 2002). É importante ressaltar que a ventilação e compressão simultâneas poderão levar a um risco maior de barotrauma e pneumotórax, principalmente em pacientes pequenos, não sendo, portanto, recomendada (Haskins, 2003). Além disso, uma ventilação excessiva, tanto em frequência como em amplitude, poderá levar a uma diminuição ainda maior do retorno venoso, principalmente em pacientes hipovolêmicos. Foi realizado um estudo para determinar o efeito da taxa de ventilação/compressão e do decúbito durante a ressuscitação, no qual foram utilizados 18 gatos divi- didos em dois grupos (Henik et al., 1987). Os animais do grupo I foram posicionados em decúbito dorsal e os do grupo II, em decúbito lateral. Dentro de cada grupo, os animais foram, ainda, divididos em três técnicas de ressuscitação: • Técnica A: 5 compressões cardíacas e 1 ventilação, de acordo com a Associação Americana do Coração (AHA); • TécnicaB: Compressão e ventilação simultâneas; • Técnica C: 10 compressões cardíacas e 1 ventilação. Os valores da pressão parcial de oxigênio (foram significativamente maiores nos animais posicionados em decúbito lateral e que receberam 10 compressões para cada ventilação. Em 50% dos animais submetidos à técnica A, ocorreu hipercapnia. Os resultados indicam que o aumento da oxigenação durante a paragem cardiorespiratória, no gato, foi maior nos animais posicionados em decúbito lateral. Apesar da técnica C ter apresentado os melhores resultados neste estudo, pesquisas adicionais são necessárias para determinar os efeitos da técnica utilizada na RCR em felinos após a PCR (Henik et al., 1987). A estimulação do ponto Jen Chung (Vaso Governador 26), através da acupuntura, pode ser efetivo em reverter a paragem respiratória. O método consiste na inserção de agulha de acupuntura ou hipodérmica no ponto localizado na linha mediana do filtro nasolabial, em profundidade de 10 a 20 mm, girando-a até que o animal apresente sinais de reversão da apneia. Em 69 casos de apneia ou depressão respiratória, durante procedimentos anestésicos, verificou-se 100% de sucesso com 10 a 30 segundos de estimulação. Entretanto, em sete casos de apneia seguida de paragem cardíaca, tratada com o estímulo deste ponto, obteve-se sucesso de 43%, requerendo-se de 4 a 10 minutos de estimulação. Essa técnica atua na depressão respiratória de origem central pela ação reflexa dos receptores opiáceos cerebrais produzindo, ainda, efeitos simpatomiméticos, com reflexos sobre os sistemas cardiovascular e respiratório (Janssens et al., 1979). Circulação (C) O primeiro método utilizado para promover a circulação artificial em animais, após a paragem cardiorespiratória, é a compressão cardíaca externa. Este método parece ser ineficaz em proteger o cérebro de injúrias e deve ser somente parte inicial do protocolo de ressuscitação (Evans, 1999), jáque o fluxo sanguíneo gerado durante a compressão cardíaca externa é de apenas 6 a 20 % do normal (Bircher e Safar, 1981). Sua eficácia é dependente da transmissão de força no esqueleto torácico, através dos pulmões, coração e vasos intra-torácicos. Certas condições, tais como fraturas de costela, efusão pleural, hérnia 3 diafragmática e pneumotórax impedem a realização da manobra, indicando a necessidade da toracotomia e compressão cardíaca interna (Crowe 1988; Crowe et al., 1988).O mecanismo pelo qual o fluxo sanguíneo é gerado durante as compressões externas pode ser explicado pelas teorias da bomba torácica e da bomba cardíaca (Crowe e Rabelo, 2005). A teoria da bomba torácica é aquela onde o fluxo é gerado pelo deslocamento da vasculatura pulmonar devido às compressões torácicas. Com o aumento da pressão intratorácica, gerada pela compressão do tórax, há influência na pressão venosa e no fluxo sanguíneo. A pressão venosa aumenta, diminuindo o fluxo e a perfusão cerebral. Esse mecanismo é o mais impor- tante na compressão externa em cães com mais de 20 kg de peso (Crowe e Rabelo, 2005). Já a teoria da bomba cardíaca baseia-se no fato do fluxo sanguíneo ser gerado pelo deslocamento das câmaras cardíacas, sendo mais efetivo na geração de fluxo ao cérebro, já que uma menor pressão venosa é gerada. Isto é particularmente verdadeiro na compres- são cardíaca interna. Quando se realiza a compressão externa em animais de mais de 20 kg, este mecanismo não representa qualquer vantagem, já que não se atinge a eficiência desejada (Crowe e Rabelo, 2005). Portanto, cães pequenos, filhotes e gatos devem ser posicionados em decúbito lateral para a realização da massagem cardíaca externa; já cães com mais de 20 kg devem ser posicionados em decúbito dorsal (Henik, 1992). Uma outra manobra possível de se realizar são as compressões abdominais interpostas entre as compres- sões torácicas externas. Isso aumenta o enchimento cardíaco durante a diástole, aumentando o fluxo sanguíneo total. Também melhora o fluxo arterial coronário, já que aumenta a pressão aórtica diastólica (Crowe e Rabelo, 2005). Se a paragem cardíaca ocorrer enquanto o tórax do paciente estiver aberto, a massagem cardíaca interna é a técnica de escolha (Henik, 1992), já que resulta em aumento da pressão sanguínea arterial, do débito cardíaco e da perfusão cerebral, miocárdica e dos tecidos periféricos; diminui a acidemia arterial e venosa, com menores concentrações de lactato e maiores taxas de sobrevida, possibilitando melhor recuperação neurológica se comparada com as manobras externas (Haskins, 1992). Em cães e gatos, as frequências recomendadas são de 80 a 120 (Wingfield e Van Pelt, 1992) de 80 a 100 (Haskins, 1989), e de 60 a 120 (Crowe, 1988a) compressões por minuto, respectivamente, para animais de pequeno, médio e grande porte. É importante dar um intervalo entre elas para permitir a diástole e, consequentemente, uma adequada perfusão sanguínea para todos os órgãos. Esse intervalo limita o número de compressões a serem realizadas (Haskins, 2003). A decisão de substituir a compressão cardíaca externa pela interna deve ser tomada dentro de 5 minutos de inefetividade das compressões torácicas externas (Haskins, 2003) e quando a paragem ocorrer secundariamente a uma hipovolemia grave, como a ocorrida após trauma múltiplo ou hemorragia (Crowe e Rabelo, 2005).
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