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APOSTILA FGV Direito Tributário e Finanças Públicas I

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DIREITO TRIBUTÁRIO E 
FINANÇAS PÚBLICAS I 
AUTOR: LEONARDO DE ANDRADE COSTA 
COLABORAÇÃO: ANA ALICE DE CARLI 
 
PARTE I 
 
 
GRADUAÇÃO 
 2011.1 
Sumário 
Direito Tributário e Finanças Públicas I 
AULA 1 — PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA. AS NECESSIDADES PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO. 
BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS EM FACE DA EVOLUÇÃO SOCIAL .............................3 
AULA 2 — ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO NA FEDERAÇÃO ...............................................................................25 
AULA 3 — O ESTADO FINANCEIRO, A REPÚBLICA E O FEDERALISMO FISCAL. A DISTRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES ENTRE 
OS PODERES .............................................................................................................39 
 
AULA 4 — O PLANEJAMENTO E AS LEIS ORÇAMENTÁRIAS (PPA, LDO E LOA) ...........................................................55 
AULA 5 — OS CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS E ADICIONAIS..........................................................................................84 
AULA 6 — A DESPESA PÚBLICA, A EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO E A RESPONSABILIDADE FISCAL ...........................99 
AULA 7 — O FINANCIAMENTO DOS GASTOS, AS OPERAÇÕES DE CRÉDITO E A DÍVIDA PÚBLICA EM FACE DO 
EQUILÍBRIO FISCAL ............................................................................................................121 
 
AULA 8 — AS TRANSFERÊNCIAS CONSTITUCIONAIS E A PARTILHA DE RECEITA TRIBUTÁRIA NO FEDERALISMO 
FISCAL BRASILEIRO ....................................................................................................134 
 
AULA 9 — A RECEITA PÚBLICA NO ÂMBITO DA TEORIA GERAL DOS INGRESSOS PÚBLICOS .................................155 
 
AULA 10 — O TRIBUNAL DE CONTAS E O CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA.........................................175 
AULA 11 — O PODER DE TRIBUTAR, A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E A CAPACIDADE TRIBUTÁRIA ATIVA..........190 
AULA 12 — A PARAFISCALIDADE COMO TÉCNICA ADMINISTRATIVA PARA DESENVOLVER ATIVIDADES DE 
INTERESSE PÚBLICO E O TRIBUTO NA CR-88 .......................................................................................220 
 
AULA 13— ASPECTOS ECONÔMICOS DA TRIBUTAÇÃO E OS DIFERENTES SUBSTRATOS DE INCIDÊNCIA: O 
PATRIMÔNIO, A RENDA E O CONSUMO .................................................................................................236 
 
AULA 14 — A POLÍTICA FISCAL E A EXTRAFISCALIDADE: A NECESSÁRIA COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE EFICIÊNCIA 
ECONÔMICA, JUSTIÇA DISTRIBUTIVA E A CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA DOS TRIBUTOS ..........................272 
 
AULA 15 — A RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA, OS ELEMENTOS E AS DIVERSAS FASES DA OBRIGAÇÃO 
TRIBUTÁRIA.O MOMENTO DE FIXAÇÃO DO REGIME JURÍDICO-TRIBUTÁRIO .................................................305 
 
AULA 16 — AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS DO PODER DE TRIBUTAR. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS 
TRIBUTÁRIOS. A LEGALIDADE E A NECESSÁRIA PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA 
E DA JUSTIÇA FISCAL ........................................................................................................................334 
 
 FGV DIREITO RIO 3 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
AULA 17— A ISONOMIA E A CAPACIDADE ECONÔMICA DO CONTRIBUINTE. DO MÍNIMO EXISTENCIAL E DO NÃO 
CONFISCO ........362 
AVALIAÇÃO: DUAS PROVAS ESCRITAS (P1 E P2) 
AULA 1 — PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA. AS NECESSIDADES 
PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO. BREVE 
HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS EM 
FACE DA EVOLUÇÃO SOCIAL. 
1.1 PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA 
A compreensão de cada parte que compõe o objeto de estudo das Finanças Públicas1 e do 
Direito Tributário (juízo deôntico prescritivo do dever-ser),assim como da interação de seu 
conjunto e a realidade social (juízo ôntico descritivo do ser), pressupõe o entendimento de 
alguns elementos de natureza estruturante da atividade fi nanceira do Estado e bem assim do 
caráter multifacetado dos orçamentos, das despesas públicas, dos tributos e das demais receitas 
públicas não tributárias. 
Conforme será visto, esses temas podem ser examinados a partir do ponto de vista 
estritamente normativo, do enfoque exclusivamente econômico ou, ainda, da perspectiva em 
que o Direito, a Economia e a Política se relacionam e interpenetram. Destacam-se entre esses 
elementos, todos essenciais ao entendimento da matéria e cuja análise efetivar-se-á ao longo do 
curso: 
1. os princípios fundantes do ordenamento jurídico brasileiro voltados para a pulverização e 
contenção do exercício dos poderes estatais, destacando-se entre eles o sistema de distribuição 
de funções, de independência e de harmonia entre os denominados ―Poderes‖ da República2, 
assim como a forma de Estado3 Democrático 1 de Direito, usualmente denominados de 
princípios republicano, federativo e democrático, respectivamente, além da forma e do sistema 
de governo2 implementados; 
2. a função de planejamento exercida pelo Estado6 e a sua ligação com as finanças públicas por 
meio dos orçamentos,7 instrumentos necessários para a realização da atividade fi nanceira 
pública; 
3. as diversas estratificações, fases e dinâmica dos gastos públicos bem como das múltiplas fontes 
para o seu financiamento; 
4. os diferentes substratos econômicos8 de incidência de tributos e os correspondentes eventos 
juridicamente qualificados pela norma tributária9 a ensejar a instauração da relação jurídica-
 
1 O estudo da dinâmica e da ratio subjacente ao processo político democrático é de fundamental importância para a compreensão de quais deveriam ser, 
sob o ponto de vista teórico, as atribuições de cada um dos denominados Poderes da República na definição e execução das políticas públicas a serem 
implementadas pelos entes políticos, assim como o papel do planejamento e dos orçamentos na sociedade brasileira. 
2 Vide art. 2º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Essa questão é importante, por exemplo, para a compreensão dos possíveis 
efeitos sobre o exercício da competência tributária privativa dos entes políticos subnacionais (Estados, Distrito Federal e Municípios), na hipótese em que 
os tratados internacionais de natu- 
 
 
tributária, isto é, a interligação entre as denominadas ―bases econômicas de tributação‖ e as 
correlatas ―hipóteses jurídicas de incidência dos tributos‖; 
5. as múltiplas possibilidades de repercussão econômica dos tributos sobre os diversos agentes 
econômicos, os chamados contribuintes de fato, que arcam com o ônus ou encargo financeiro 
do tributo (eg. consumidores finais de bens e serviços, proprietários, locadores, locatários, 
industriais, produtores agrícolas, comerciantes, prestadores de serviços em suas diversas 
modalidades, financeiros, manual etc.), e que podem ser ou não a mesma pessoa designada em 
lei 
 
1 Nos termos em que será examinado nesta aula, as Finanças Públicas e o Direito Financeiro possuem o mesmo objeto de estudo, isto é, a 
atividade fi nanceirado Estado. No entanto, a disciplina jurídica é normativa e eminentemente prática, ao passo que a ciência das fi nanças é 
especulativa, não possuindo caráter disciplinador, pois é pré-normativa e atinente ao campo da economia. Não quer dizer, entretanto, que a ciência 
jurídica possua um fi m em si mesma e possa ser estudada, compreendida e aplicada sem a permanente interação com os outros campos do 
conhecimento formal e da realidade que se interpenetram. De fato, a capacidade humana de compreender a realidade é limitada, o que suscita as 
inevitáveis segmentações dos objetos e relações sob exame e a criação de modelos simplifi cados para a sua análise. 
2 Vide artigo 2º da Constituição da Re-pública Federativa do Brasil de1988, de agora em diante simplesmente CR-88, cujo Título IV intitula-se 
“Da Organização dos Poderes”. A parte relevante do tema para o presente estudo será apresentada na Aula 3 e detalhado na Aula 4. 
3 No caso brasileiro, a adoção da forma de Estado Federado está expressa, em especial, nos artigos 1º, 18 e 60, §4º, I, da CR-88. O Federalismo 
Fiscal será introduzido na Aula 2 ocasião em que será iniciado o estudo do Capítulo II, do Título VI, da CR-88 (art. 163 a 169), intitulado “Das Finanças 
Públicas”. O exame do atual regime de repartição de receitas tributárias na Federação brasileira será aprofundado na Aula 8 e a apresentação do sistema 
de atribuição de competências tributárias entre os entes políticos no Brasil será realizado na Aula 11, ocasião em que será iniciada a análise do Capítulo I, 
do Título VI, da CR-88, denominado “Do Sistema Tributário Nacional” - art. 145 a 162 da CR-88. 
 
 FGV DIREITO RIO 5 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
como o sujeito passivo da relação jurídica-tributária (o denominado contribuinte de direito, 
que possui o débito com o Fisco e tem o dever de extinguir o crédito tributário); 
6. os limites à atuação do Estado atual em face dos direitos e garantias do cidadão contribuinte; 
7. as fontes da legislação tributária, as diferentes estruturas normativas de imposição10 e a aplicação 
da norma jurídica tributária à luz da indissociável correlação entre o Direito e a Economia. 
A necessidade do prévio entendimento desses elementos, que englobam múltiplas disciplinas, 
decorre do fato de que as Finanças Públicas e a Tributação são subsistemas tanto do Direito 
como da Economia, e, ao mesmo tempo, expressão e resultante de um longo processo de 
sedimentação Política e Cultural de determinado povo, localizado em território defi nido em 
dado momento histórico, sob as inevitáveis infl uências das múltiplas interações dinâmicas de 
âmbito local, regional e global. 
No entanto, se por um lado existe o requisito do exame multidisciplinar e interdisciplinar das 
questões envolvidas, deve-se destacar que as normas econômicas não possuem caráter 
impositivo formal por força de sua simples existência, razão da indispensabilidade da norma 
jurídica, pois somente esta reveste a coercitividade muitas vezes necessária à realização e 
disciplina da atividade fi nanceira estatal e, ao mesmo tempo, pode, também, fi xar os limites e 
os parâmetros para a atuação do Estado de Direito, reduzindo o risco de descumprimento11 das 
―regras do jogo‖ pelas partes que interagem nas relações fi nanceiras e tributárias. 
Cumpre, ainda, ressaltar que o estudo das Finanças Públicas possui caráter expeculativo e 
abrange toda a atividade fi nanceira do Estado, isto é, os orçamentos, as despesas, a dívida 
pública bem como as diferentes formas de fi nanciamento dos gastos públicos, destacando-
se entre elas os tributos, as receitas decorrentes do patrimônio do próprio Estado eo 
crédito público.Destaque-se, entretanto,que, diferentemente do que ocorre com o Direito 
Financeiro, o estudo das Finanças Públicas não tem caráter normativo, tendo em vista ter 
como objetivo precípuo a análise econômica e o estudo dos possíveis impactos da atividade fi 
nanceira do Estado. 
Já o Direito Tributário, que no passado recente se encontrava formalmente inserido no 
escopo de estudo do Direito Financeiro, cuida tão somente do tributo e da relação jurídica 
tributária. Dessa forma, a disciplina jurídica dos tributos se ocupa apenas de um subconjunto 
pertencente ao âmbito da estrutura da matéria fi nanceira estatal, tendo em vista tratar tão 
somente de uma espécie de receita pública coativa de regime jurídico diferenciado. No entanto, 
o Direito Tributário desenvolveu-se de tal forma nos últimos 40 anos que a maior parte da 
doutrina12 aponta no sentido da sua ―autonomia‖, ainda que relativa13, haja vista que os tributos 
gozariam de: 
reza tributária fi rmados pelo presidente da República Federativa do Brasil, o qual é ao mesmo tempo chefe do Poder Executivo da União e chefe de 
Estado — da República Federativa do Brasil, estabeleçam isenções e benefícios fi scais de tributos estaduais e municipais. Sobre o tema importante 
ressaltar a decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, no 
Recurso Extraordinário (RE) 229.0960, acórdão que será examinado na Aula 24. 
6 O Estado atua, além do planejamento, que será objeto de estudo na Aula 4, na fi scalização e no incentivo, e bem assim como agente 
normativo e regulador da atividade econômica (art.174 da CR-88), na prestação de serviços públicos (art. 175 da CR-88), na exploração da atividade 
econômica (art. 173 da CR-88), em regime de monopólio ou não (art. 177 da CR-88), no exercício do poder de polícia (art. 78 da Lei nº 5.172/66, norma 
denominada de Código Tributário Nacional (CTN) pelo Ato Complementar n 36/67 e recepcionada com status de lei complementar pela CR-88, conforme 
será examinado a partir da Aula 8). 
7 O Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). 
 
 FGV DIREITO RIO 6 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
8 São três os substratos econômicos de incidência tributária: o Patrimônio, a Renda e o Consumo. Ressalte-se, entretanto, que determinado 
tributo formulado e desenhado para atingir determinada base econômica pode incidir, no mundo real, sobre outro substrato diverso, por força das 
condições de mercado ou, ainda, em função das normas jurídicas aplicáveis ou mesmo de sua interpretação. A matéria será inicialmente examinada na 
Aula 11 e aprofundada nas Aulas 13 e 17. 
9 Na aula 15 será examinada a técnica adotada pelo Código Tributário Nacional (CTN) sob o ponto de vista jurídico de incidência para criar a 
relação e a obrigação tributária, o que se realiza pela utilização tanto de situações de fato como de situações jurídicas previamente qualifi cadas pelo 
ordenamento. 
10 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Teoria da Imposição Tributária. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coordenador). Curso de Direito Tributário. 
São Paulo: Saraiva, 2008. p. 1. Ensina o eminente autor: “A imposição tributária, como decorrência das necessidades do Estado em gerar recursos para 
sua manutenção e a dos governos que o administram, é fenômeno que surge no campo da Economia, sendo reavaliado na área das Finanças Públicas e 
normatizado pela Ciência do Direito. Impossível se faz o estudo da imposição tributária, 
1. autonomia científi ca — existência de um conjunto de regras, princípios e institutos próprios, 
inaplicáveis aos outros ramos do direito (ex: o lançamento para constituir o crédito tributário, o 
qual será objeto de estudo nos próximos semestres; os princípios da anterioridade clássica e 
nonagesimal, a serem estudados na Aula 18 etc.); 
2. autonomia normativa — As Constituições de 1946 (art. 5°, XV, b) e de 19673 (art. 8°, XVII, c) 
apenas fi xavam a competência da União para legislar sobre normas gerais de direito fi 
nanceiro, o qual se consubstancia como a disciplina jurídica da atividade fi nanceira, sem haver 
menção expressa ao direito tributário. A Carta Magna de 1988, por sua vez, confere status 
diferenciado ao Direito Tributário. O artigo 24, I, da CR-88 dispõe que compete à União, aos 
Estados e ao DF legislar concorrentemente sobre direito tributário e, também, direito fi 
nanceiro, de forma apartada e individualizada. Ainda, o artigo 163, I, e o artigo 146, ambos da 
CR-88, conferem à lei complementar a atribuição, respectivamente, para dispor sobre fi nanças 
públicas e estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária; e 
3. autonomia didática — a maioria dos cursos universitários no Brasil oferecem o curso de 
Direito Tributário, não sendo abordada a matéria fi nanceira ou apenas examinada 
tangencialmente.Em suma, apesar do Direito Financeiro e as Finanças Públicas possuírem o mesmo objeto de 
estudo, isto é, a atividade fi nanceira do Estado (AFE), a primeira disciplina é eminentemente 
normativa e a outra marcadamente especulativa. Em sentido análogo, o estudo dos tributos é 
objeto de exame tanto do Direito Tributário como da Tributação, apesar do enfoque do 
primeiro ser jurídico e do segundo ser econômico.Inquestionável, entretanto, que somente é 
possível compreender os tributos e a tributação no contexto das Finanças Públicas em sua 
interação com a Política, o Direito e a Economia, fenômenos indissociáveis15 e usualmente 
analisados separadamente por comodidade ou questões de ordem didática. 
O quadro abaixo sumariza de forma esquemática o objeto de estudo do curso bem como a 
interação entre as diversas disciplinas mencionadas: 
 
3 A redação original do artigo 8°, XVII, c, da Constituição de 1967 possuía a seguinte redação: “Art. 8° - Compete à União: I - (...); XVII — legislar sobre: 
a) (...); c) normas gerais de direito fi nanceiro; de seguro e previdência social; de defesa e proteção da saúde; de regime penitenciário”. A alínea “c” foi 
alterada pela Emenda Constitucional n° 1, de 1969, que passou a expressar: 
“c) normas gerais sobre orçamen- 
 
 FGV DIREITO RIO 7 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
 
em sua plenitude, se aquele que tiver de estudá-la não dominar os princípios fundamentais que regem a Economia (fato), as Finanças Públicas (valor) e o 
Direito (norma), uma vez que pretender conhecer bem uma das ciências, desconhecendo as demais, é correr o risco de um exame distorcido, insufi 
ciente e de resultado, o mais das vezes incorreto.” 
11 LUHMANN, Niklas. Sociologia do Di-reito I. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1983. Tradução de Gustavo Bayer. p. 110 e 115. Assevera 
o autor que: “a normatização dá continuidade a uma expectativa, independentemente do fato de que ela de tempos em tempos venha a ser frustrada. 
Através da institucionalização o consenso geral é suposto, independentemente do fato de não existir uma aprovação individual (...) O direito não é 
primariamente um ordenamento coativo, mas sim um alívio para as expectativas. O alívio consiste na disponibilidade de caminhos congruentemente 
generalizados para as expectativas, signifi cando uma efi ciente indiferença inofensiva contra outras possibilidades, que reduz consideravelmente o risco 
de expectativa contrafática”. A contenção e os limites da atuação estatal na seara tributária serão abordados durante todo o curso, em especial após a 
Aula 16. 
12 ROSA JR., Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro & Direito Tributário. 15 ed. atual. com alterações no CTN e ampl. Rio de Janeiro: 
Renovar, 2001. p.151. “Parece-nos indiscutível a autonomia do Direito Tributário porque possui conceitos, princípios e institutos jurídicos que lhe são 
próprios e distintos dos demais ramos do direito”. O autor examina detalhadamente a questão no Capítulo VI, p. 135-162. 
13 Amaro, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p.1. Cf. ensina o autor: “Dado o extraordinário 
desenvolvimento do direito atinente aos tributos, ganhou foros de ‘autonomia’ o conjunto de princípios e regras que disciplinam essa parcela da 
atividade fi nanceira do Estado, de modo que é possível falar no direito tributário, como ramo ‘autônomo’da ciência jurídica, segregado do direito fi 
nanceiro. Veremos, mais adiante, a relatividade da ‘autonomia’ do direito tributário, a exemplo do que se dá com os demais ramos do direito.” 
1.2 AS FINANÇAS EM SEUS MÚLTIPLOS ASPECTOS 
Fixadas essas noções preliminares, torna-se importante salientar o sentido e o alcance da 
expressão fi nanças para melhor compreensão da matéria. 
Em sentido comum16, as fi nanças expressam a situação de uma pessoa natural ou jurídica, de 
direito público ou de direito privado, relacionadas aos recursos econômicos disponíveis. 
Os bens e direitos, meios necessários para a satisfação dos mais variados desejos e objetivos 
de quem os possui, podem ter diversos graus de liquidez, ou seja, a pessoa pode dispor desde 
moeda corrente nacional17 ou estrangeira até imóveis de difícil alienação, seja em função das 
exigências legais para a autorização de sua disposição ou em função de condições de mercado. 
Por outro lado, é importante ressaltar a necessidade de que seja também identifi cada, para as 
mesmas pessoas, titulares dos ativos, a existência e o montante de possíveis obrigações 
vinculadas a essas disponibilidades, isto é, se há também obrigações e dívidas assumidas, tendo 
em vista a relevância de que seja determinada a posição patrimonial líquida (capital próprio).4 
Assim, a determinação da posição econômica e fi nanceira de uma pessoa, de direito público 
ou privado, requer: (1) a defi nição de mecanismos para a quantifi cação monetária19 dos ativos e 
passivos, à exceção daqueles valores mantidos em caixa ou depositados em instituições fi 
nanceiras, bem como dos passivos já expressos em moeda corrente; e (2) de um sistema para a 
sua evidência, controle e gerenciamento ao longo do tempo. 
Idealmente, o sistema adotado para evidenciar as fi nanças, públicas ou privadas, deve 
compreender grupos de contas que expressem a realidade da atividade da organização, um 
 
4 Sob o ponto de vista jurídico Caio Mário da Silva Pereira pontua que “A idéia de patrimônio não está perfeitamente aclarada entre os modernos juristas, 
Finançaspúblicas 
Tributação 
Incidênciasobre 
opatrimônio, 
arenda 
eoconsumo 
Arelação 
jurídica-tributária 
Direitofinanceiro 
DireitoTributário 
Atividade 
financeira 
doEstado 
Tributos 
 
 FGV DIREITO RIO 8 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
regime de registro e contabilização dos atos e fatos relevantes, bem como demonstrativos fi 
nanceiros que possibilitem o efi ciente controle e a gestão da atividade da entidade e, ao mesmo 
tempo, aptos a informar adequadamente a situação: 
(a) Patrimonial, em determinado momento do tempo, bem como as suas variações entre períodos 
determinados (mutações ou variações patrimoniais); 
(b) Financeira, propriamente dita, adequada ao gerenciamento de liquidez de curto prazo e do fl 
uxo de caixa necessário ao fi nanciamento das atividades operacionais correntes e de 
investimentos, bem como da estrutura de capital e de solvência de longo prazo; e 
(c) Orçamentária, que expresse se foram, e em que grau, atingidas as metas estabelecidas, além de 
permitir o gerenciamento das ações planejadas, tendo em vista que o orçamento moderno 
(orçamentoprograma) é instrumento essencial de ligação entre o planejamento das ações e as fi 
nanças, permitindo a operacionalização efetiva e concreta dos planos de trabalho, na medida em 
que os monetariza, 
to, despesa e gestão patrimonial e fi nanceira de natureza pública; de direito fi nanceiro; de seguro e previdência social; de defesa e proteção da saúde; 
de regime penitenciário”. Já a Emenda Constitucional n° 7, de 1977, que conferiu nova redação ao dispositivo, dispunha: “c) normas gerais sobre 
orçamento, despesa e gestão patrimonial e fi nanceira de natureza pública; taxa judiciária, custas e emolumentos remuneratórios dos serviços 
forenses, de registros públicos e notariais; de direito fi nanceiro; de seguro e previdência social; de defesa e proteção da saúde; de regime 
penitenciário”. O inciso II e IV, do citado artigo 24 da atual Carta de 1988, estabelecem competência legislativa concorrente dos entes políticos para 
legislar sobre “orçamento” e “custas dos serviços forenses”. 
15 Para a compreensão do tema recomenda-se a revisão da Aula 3 do Material didático de Direito ConstitucionalI (2010.2) — intitulada 
Conceito de Sistema. 
16 FERREIRA, Aurélio Buarque de Ho-landa, Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa/ Aurélio Buarque de Holanda. 3ª ed. 
totalmente revista e ampliada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira , 1999. “fi nanças. A situação econômica de uma instituição, empresa, governo ou 
indivíduo, com respeito aos recursos econômicos disponíveis, esp. dinheiro, ou ativo líquido; ou condição fi nanceira”. 
17 O artigo 48, II, da Constituição da Re-pública de 1988 fi xa a competência do Congresso Nacional para dispor sobre “emissões de curso 
forçado” e o artigo 315 do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406, de 10.01.2002) estabelece que “as dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, 
em moeda corrente pelo valor nominal” salvo os casos previstos em legislação especial, a teor do disposto no artigo 318 do mesmo CC. Já o artigo 1° da 
Lei n° 10.192/2001 determina que o pagamento das obrigações pecuniárias exequíveis no território nacional deve ser realizado em real, ressalvadas as 
exceções previstas na legislação. Nos termos dos artigos 5° e 42 da Lei n° 8.666/1993, a qual dispõe sobre as licitações e os contratos públicos, todos os 
valores, preços e custos utilizados em licitações devem ter como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvada a hipótese de concorrência 
de âmbito internacional, cujo edital deve ajustar-se às diretrizes da política monetária e do comércio exterior e atender às exigências dos órgãos 
competentes. 
isto é, quantifi ca-os em moeda permitindo o estabelecimento de cronogramas físico-fi 
nanceiros. 
Nesse sentido, cabe salientar que o correto entendimento dos mecanismos de quantifi cação 
monetária dos bens, direitos e obrigações, assim como das respectivas demonstrações fi 
nanceiras que os evidenciam, é pressuposto da compreensão das Finanças Públicas e, em 
especial, de aspectos essenciais da tributação da renda, que ao lado do consumo e do 
patrimônio consubstanciam os substratos econômicos de incidência tributária (vide nota 5). 
Também é preliminar ao exame da matéria a distinção entre dois modelos de medidas 
adotados em análise econômica, denominadas, respectivamente, (1) stock measure, relacionado ao 
conceito de estoque, e (2) fl ow measure, vinculado à quantifi cação de fl uxos. O fl uxo é defi nido 
ao longo de um período específi co de tempo (por ano, mês, dia etc.), ao passo que o estoque 
refere-se a um dado momento no tempo, e não durante e ao longo de um dado período de 
tempo. Essa análise permite o acompanhamento da execução do que foi programando, por meio 
da verifi cação da execução dos orçamentos, o que explicita a situação patrimonial e fi 
nanceira em um dado momento do tempo e ao longo do período. Assim, em termos gerais e de 
 
 FGV DIREITO RIO 9 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
forma esquemática, visando à compreensão dos elementos constitutivos básicos da análise da 
situação patrimonial e fi nanceira de uma organização, pode-se representar o que se deseja 
alcançar no momento da seguinte forma: 
 
Ao fl uxo de receitas é contraposto o conjunto de despesas do período, o que permite 
determinar a situação líquida do patrimônio, ao fi nal do cada exercício, bem como as variações 
patrimoniais entre dois momentos determi- 
talvez em razão de não ter o direito romano fi xado com segurança as suas linhas. Segundo a noção corrente, patrimônio seria o complexo das relações 
jurídicas de uma pessoa apreciáveis economicamente. (...) Daí dizer-se que o patrimônio não é apenas o conjunto de bens. (...) Noutros termos, o 
patrimônio se compõe de um lado positivo e de outro negativo. A idéia geral é que a noção jurídica de patrimônio não importa balancear a situação, e 
apurar qual é o preponderante. Por não se terem desprendido desta preocupação de verifi car o ativo, alguns se referem ao patrimônio líquido, que 
exprime o saldo positivo, uma subtração dos valores passivos dos ativos. Ao economista interessa a verifi cação. Também ao jurista tem de cogitar dela 
às vezes, quando tem de apurar a solvência do devedor, isto é, a aptidão econômica de resgatar seus compromissos com os próprios haveres. Mas, em 
qualquer hipótese o patrimônio abraça todo um conjunto de valores ativos e passivos, sem indagação de uma eventual subtração ou de um balanço”. In. 
PEREIRA,Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 19ª ed. Volume I. Rio de Janeiro. Ed. Forense, 2002. p. 245. 
19 Princípio Contábil do denominador comum monetário. 
nados no tempo. Cabe ressaltar, entretanto, a possibilidade de existir fl uxo fi nanceiro sem 
impacto no Patrimônio Líquido, o que será examinado durante o curso. No exemplo, não foi 
alterada a situação do passivo ao longo do período a fi m de facilitar essa análise inicial. Saliente-
se, que parte da difi culdade da gestão e do controle fi nanceiro e patrimonial, público e privado, 
decorre do fato de que a despesa ou a receita gerada em determinado exercício — sob o ponto 
de vista jurídico ou econômico — nem sempre é realizada fi nanceiramente no mesmo período, 
podendo ocorrer, portanto, desconexões entre: (1) o fl uxo monetário; e (2) a contabilização do 
evento que altera a situação patrimonial líquida. 
Nesse sentido, importante frisar que o curso deste semestre se inicia com esta visão geral da 
matéria e da Atividade Financeira do Estado ao longo da história. Até a Aula 10 serão abordados 
os diversos temas atinentes ao campo tradicionalmente defi nido como pertinente ao Direito 
Financeiro e às Finanças Públicas, tais como o Financiamento dos Gastos e a Receita Pública no 
âmbito da Teoria Geral dos Ingressos Públicos, a Despesa Pública, a Responsabilidade Fiscal, os 
 Fluxo de Receita (por dia, mês etc.) – situação dinâmica 
 
Tempo 
 tempo 1 tempo 2 
 situação estática 2 situação estática 1 
 momento no tempo Fluxo de Despesa (por dia, mês etc) 
situação dinâmica 
 
 
100 100 100 100 
 100 100 100 100 100 100 100 100 
Ativo 
 150 = 
Patrimônio 
Líquido = 
 100 
Passivo = 50 
Ativo 
= 550 
Patrimônio 
Líquido = 
 500 
Passivo = 50 
Total = 800 
Total = 400 
Receitas 800 
00> Despesas <4 
Resultado +400 
Balan ç o Patrimonial 2 
Balan ç o Patrimonial 1 
 
 FGV DIREITO RIO 10 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Orçamentos (a Lei do Orçamento Anual — LOA, a Lei do Plano Plurianual —PPA e a Lei de 
Diretrizes Orçamentárias — LDO), o Controle da Execução Orçamentária, a Dívida Pública e o 
sistema de Repartição Constitucional de Receitas Tributárias. Uma vez apresentados os 
elementos que compõem o campo fi nanceiro e bem assim o delineamento do perfi l do 
Federalismo Fiscal brasileiro e do sistema de repartição de funções entre os denominados 
Poderes da República, a partir da Aula 11, com o estudo do Poder de Tributar e da Competência 
Tributária, será iniciado o estudo específi co da Tributação e do Direito Tributário em seus 
aspectos estruturais, o que envolve o exame da Parafi scalidade, dos substratos econômicos de 
incidência, da Extrafi scalidade e da formação da relação jurídica-tributária. Na aula 16 é iniciado 
o estudo das denominadas limitações constitucionais ao Poder de Tributar, o que pressupõe a 
distinção entre os institutos da isenção, da não incidência e das imunidades tributárias. De fato, 
ao lado dos diversos princípios que visam proteger o contribuinte, as imunidades 
consubstanciam, de acordo com a linguagem constitucional, limitações constitucionais ao Poder 
de Tributar. Por fi m, será examinado o conceito de legislação tributária e as suas diversas 
espécies, considerando a necessidade de estudar a sua aplicação no espaço eno tempo, matéria 
que será aprofundada nos próximos semestres 
— Direito Tributário e Finanças Públicas II e III. 
1.3 AS NECESSIDADES PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO. 
Os indivíduos possuem interesses e demandasvariadas, as quais, em seu conjunto, formam o 
que se denomina de necessidades gerais ou sociais5. 
 
5 Fábio Nadal e Marcio Cozatti apontam no sentido de que “a necessidade pública não se confunde com necessidade individual (cujo grupamento dá 
lugar às necessidades gerais que são, por excelência, homogêneas) e necessidade coletiva (não revestida de homogeneidade e que surge da 
contraposição de interesses)”. NADAL, Fábio e COZATTI, Márcio Faria. Direito Financeiro simplifi cado para concursos públicos. 
São Paulo: Impactus, 2008. p. 19. 
 
 FGV DIREITO RIO 11 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Nesse sentido, as demandas coletivas seriam a resultante abstrata do somatório das 
necessidades individuais. O Estado, entretanto, considerando, por um lado, a limitação21 dos 
recursos disponíveis (naturais, humanos, tecnológicos, fi nanceiros etc.), e, por outro, as 
demandas individuais e sociais infi nitas, elege, por meio do processo político, que varia de 
forma e conteúdo no tempo e no espaço, aquelas para as quais alocará esforços visando ao seu 
atendimento: são as chamadas necessidades públicas. Assim, uma vez fi xado normativamente 
o dever do Estado em realizar apenas algumas demandas coletivas politicamente determinadas 
— as políticas públicas-, o que ocorre modernamente por meio dos orçamentos, conforme será 
estudado nas próximas aulas, as mesmas se convolam e transmudam em necessidades 
públicas, a serem satisfeitas por meio dos serviços públicos, os quais se qualifi cam como o 
conjunto de bens e pessoas sob a responsabilidade do Estado. Os serviços públicos, que são 
instrumentos do Estado para o alcance dos fi ns a que se propõe, se realizam, atualmente, quase 
que exclusivamente, por meio da utilização da atividadefi nanceira do Estado. Nesse sentido 
ensina Aliomar Baleeiro6 que: 
se, em tempos remotos, foi usual, e hoje, excepcionalmente, ainda se verifi ca 
a requisição pura e simples daquelas coisas e serviços dos súditos, ou a colaboração gratuita e honorífi ca destes nas 
funções governamentais em verdade, na fase contemporânea, o Estado costuma pagar com dinheiro os bens e o 
trabalho necessários ao desempenho da sua missão. É o processo da despesa pública, que substitui, com vantagem, 
o da requisição, o da gratuidade de cargos, o do apossamento dos cabedais dos inimigos vencidos, embora de tudo 
isso ainda perdurem resquícios, notadamente em tempo de guerra. A regra, hoje, é o pagamento em moeda e, por 
isso, constitui atividade fi nanceira a que o Estado, as províncias e municípios exercem para obter dinheiro e aplicá-
lo ao pagamento de indivíduos e coisas utilizadas na criação e manutenção de vários serviços públicos. 
No atual contexto brasileiro, de determinação pelo processo político democrático das 
denominadas necessidades públicas, a serem atendidas pelo insubstituível instrumento da 
atividade fi nanceira do Estado moderno, é importante destacar que o poder constituinte 
originário defi niu ser objetivo fundamental da República Federativa do Brasil7: ―construir uma 
sociedade livre, justa e solidária‖, ―garantir o desenvolvimento nacional‖, ―erradicar a pobreza e 
a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais‖ e ―promover o bem de todos, 
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação‖. 
Para alcançar tais mandamentos constitucionais, o poder público disciplina as relações 
econômicas e sociais, planeja e executa uma série de ações, entre as quais se destaca a política 
macroeconômica, cujos objetivos, correlatos àqueles fundamentais 
 
21 Importante salientar a existência da denominada reserva do possível, adotada pela jurisprudência alemã, princípio associado à constatação de que 
todos os direitos têm custo e que os recursos públicos são limitados, razão pela qual haverá sempre e em qualquer circunstância a necessidade de 
escolha entre o que será e o que não será realizado pelo Poder Público. SCHWABE, Jürgen (Organizador). Cinqüenta Anos de Jurisprudência do Tribunal 
Constitucional Federal Alemão. Tradução Leonardo Martins e outros. Montivideo: Fundação Konrad Adenauer, 2005. p. 660-664.BVERFGE 33, 303. De 
fato, a própria Convenção Americana sobre Direitos Humanos, denominado Pacto de San José da Costa Rica, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo 
27, de 25.09.1992 e promulgada pelo Decreto 678, de 06.11.1992, estabelece em seu art. 26, intitulado “desenvolvimento progressivo”, que: “os Estados 
 
6 BALEEIRO, Alimoar. Uma introdução à ciência das fi nanças. 16ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 3-4. 
7 Art. 3º I, II, III e IV da CR-88. 
 
 FGV DIREITO RIO 12 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica, a fi m 
de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, 
constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via 
legislativa ou por outros meios apropriados.” 
constitucionalmente qualifi cados, podem ser sumarizados como: (a) a busca de alto nível de 
emprego; (b) a estabilidade de preços; (c) a distribuição equitativa da renda; e (d) o crescimento 
econômico. Os principais instrumentos utilizados na condução da política macroeconômica para 
atingir esses fi ns são “as políticas fi scal, monetária, cambial e comercial, e de rendas”8, todas integrantes 
da denominada atividade fi nanceira do Estado, caso adotado um conceito amplo9 para o 
termo.De fato, inquestionável a relevância e a interpenetração de cada uma dessas políticas 
econômicas, em especial para atingir consistência e coordenação entre as políticas públicas que 
ensejam as despesas do governo e as metas macroeconômicas, matéria cujo exame detalhado 
extrapola o objeto deste curso. Nessa toada, serão abordados nesse semestre apenas os aspectos 
mais relevantes dessas questões, na medida em que o estudo dos instrumentos diretamente 
relacionados (1) à obtenção das receitas e fi nanciamento dos gastos, (2) à realização das 
despesas, (3) ao planejamento orçamentário e à gestão fi scal e patrimonial do Poder 
Públicosuscitem uma análise mais detalhada dos aspectos macroeconômicos que se imbricam. 
Assim, pode-se representar grafi camente o objeto de estudo das próximas aulas pela fi gura que 
se segue: 
 
 Receita Pública Despesa Pública 
Nessa mesma linha de pensamento, Kyoshi Harada10 conceitua a ―atividade financeira do 
Estado 
como sendo a atuação estatal voltada para obter, gerir e aplicar os recursos necessários à 
consecução das fi nalidades do Estado que, em última análise, se resumem na realização do 
bem 
comum‖ (grifo nosso). 
 
8 VASCONCELLOS, Marco Antonio S. e GARCIA, Manuel E. Fundamentos de Economia. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 91. 
9 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 7. Assevera o autor que: “A expressão 
atividade fi nanceira tem a mesma extensão do termo “fi nanças” que, surgindo na Idade Média por derivação da palavra fi nare, é sinônimo de fi 
nanças públicas, e não se aplica às fi nanças privadas.” 
10 HARADA, Hiyoshi, Direito Financeiro e Tributário. 17ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 4.O Planejamento do Estado 
e os 
Orçamentos 
O Crédito e a 
Dívida Pública 
 
 FGV DIREITO RIO 13 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Aliomar Baleeiro11, por sua vez, adotando conceito mais amplo, defi ne que a ―atividade fi 
nanceira consiste em obter, criar, gerir e despender o dinheiro indispensável às necessidades, 
cuja satisfação o Estado assumiu ou cometeu àqueloutras pessoas de direito público‖ (grifo 
nosso). De fato, a própria CR-88 estabelece a competência da União para emitir moeda, 
atribuição a ser exercida exclusivamente por meio do Banco Central, em seu artigo 164, 
dispositivo inserido no Capítulo II, do Título VI, da CR-88, intitulado ―Das Finanças Públicas‖. 
Dessa forma, tanto o eminente autor como a 
 
11 BALEEIRO. Op. Cit., p. 4. 
 
 FGV DIREITO RIO 14 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Constituição incluem a política monetária diretamente no escopo da análise da atividade fi 
nanceira do Estado, o que será realizado neste curso apenas de forma tangencial. 
Pode-se concluir pelo que foi até aqui exposto, que a atividade fi nanceira é meramente 
instrumental, na medida em que apenas viabiliza a consecução das políticas públicas, as quais 
traduzem os objetivos estatais fi xados pelo processo político (ex: educação, saúde, segurança 
pública, transporte etc.). Portanto, a atividade fi nanaceira não constitui uma fi nalidade do 
Estado tendo em vista não possuir um fi m em si mesma. 
Assim sendo, sob o ponto de vista jurídico, o objeto de estudo do semestre será a 
Constituição Financeira, a qual, segundo a melhor doutrina, é composta pelas Constituições 
Tributária, Orçamentária e Monetária28 (artigos 145 a 169 da CR-88), além dos dispositivos 
pertinentes à fi scalização orçamentária dos Municípios (artigo 31 da CR-88); ao controle 
interno, externo e social da execução orçamentária e da Administração Pública (artigos 70 e 
seguintes da CR-88), ao orçamento do Poder Legislativo (artigos 51, IV, e 52, XIII, da CR-88), 
do Poder Judiciário (artigo 99) e do Ministério Público (artigo 127). Antes, porém, serão 
examinados, de forma sucinta, os principais períodos e características mais relevantes da história 
dos tributos e das fi nanças públicas, o que certamente auxiliará a compreensão da realidade e o 
atual estágio de desenvolvimento da matéria. 
1.4 BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS. 
A leitura de diversos episódios marcantes em todo o curso da história da humanidade revela 
uma verdade inquestionável, independentemente do lugar objeto da pesquisa, os tributos 
sempre tiveram e continuam a ter infl uência determinante no curso das civilizações. 
A primeira civilização de que se tem conhecimento29 concreto, cerca de seis mil anos atrás, era 
denominada Sumer, uma localidade entre os rios Tigre e Eufrates, no que hoje é o Iraque. Os 
acontecimentos históricos lá ocorridos revelam a grande infl uência dos tributos já naquela 
época, e estão gravados em hieróglifos encontrados em escavações em Lagash, localizado em 
Sumer. Após um período de incidência tributária de forma generalizada e bastante gravosa, um 
rei, chamado Urukagina, determinou a ―liberdade‖, por meio da extinção dos coletores do rei. O 
que parecia ser a solução de todos os problemas ensejou um fi nal amargo para o bondoso 
monarca e àqueles até então submetidos à tirania fi scal: a localidade, após alcançada a almejada 
―liberdade‖, foi totalmente destruída por invasores externos. 
A seguir, reproduz-se a fi gura (extraída do livro de Charles Adams, p. 2, vide nota 21) 
contendo os símbolos que registraram e informam a existência da lei libertadora de Urikagina. 
 
28 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário.Volume V. O Orçamento na Constituição. 3ª ed. revista e 
atualizada. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p.1. Identifi ca o autor que: a “Constituição Orçamentária é um dos subsistemas da Constituição Financeira, ao 
lado da Constituição Tributária e da Monetária, sendo uma das Subconstituições que compõem o quadro maior da Constituição de Estado de Direito, em 
equilíbrio e harmonia com outros subsistemas, especialmente a Constituição Econômica e a Política” 
29 ADAMS, Charles. For good and evil: the impact of taxes on the course of civilization. 2nd ed. United States: Madison Books, 2001. p. 1-2. 
Revela o autor: “Taxes are the fuel that makes civilization run. There is no known civilizations that did not tax. The fi rst civilization we know anything 
about began six thousand years ago in Sumer, a fertile plain between the Tigris and Euphrates rivers in modern Iraq. The dawn of history, and tax history, 
is recorded on clay cones excavated at Lagash, in Sumer. The people of Lagash instituted heavy taxation during a terrible war, but when the war ended, 
 
 FGV DIREITO RIO 15 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
the tax men refused to give up their taxing powers. From one end of the land to the other, these clay cones say, ‘there were the tax collectors.’ 
Everything was taxed. Even the dead could not be buried unless a tax was paid. The story ends when a good king named Urukagina, ‘established the 
freedom’ of the people, and once again, ‘There were no tax collectors’. This may not have been a wise policy, because shortly thereafter the city was 
destroyed by foreign invaders. There is a proverb about taxes on other clay tablets from this lost civilization which reads: You can have a Lord, you can 
have a King, but the man to fear is the tax collectors” (grifo nosso). 
 
Esse exemplo refl ete um problema crucial, a necessidade de recursos para implementação de 
uma organização mínima e de proteção contra invasores — questão que, mesmo após a criação 
dos denominados Estados-Nações Absolutistas continuou a se fazer presente. 
Já na civilização egípcia, caracterizada por sua longevidade12, em contraponto à experiência 
libertária ocorrida em Lagash, era possível identifi car, após o descobrimento de escritos e 
desenhos dentro de pirâmides e tumbas milenares, a existência de períodos de forte ―pressão‖ de 
fi scais dos faraós para garantir-lhes o recebimento da parcela de 20% (vinte por cento) a eles 
pertencentes. Constata-se por meio de fi guras e escritos milenares que nada era ocultado, nem 
mesmos os ovos sob as aves. 
 
12 ADAMS. Op. Cit. p. 5. Destaca o autor que: “Egyptian civilizatian was highlighted by its enduring length. An advanced form of civilized life was in full 
bloom along the Nile before 3000 b.c., and it perpetuated itself until the fall of Rome” 
 
 FGV DIREITO RIO 16 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Por sua vez, o grande jurista Marcus Tullius Cícero13 (106 — 43 a.C) difundiu no Império 
Romano a ideia grega contra os chamados tributos diretos, nos seguintes termos, um ano antes 
de sua morte (44 a.C): 
When constant wars made the Roman treasury run short, our forefathers often used to levy a property tax. Every eff ort must be 
made to prevent a repetition of this; and all possible precaution must be taken to ensure that such a step will never be needed … But if 
any government should fi nd itself under necessity of levying a tax on property, the utmost care has to be devoted to making it clear to the 
entire population that this simply has to be done because no alternative exists short o complete national collapse. 
Cabe salientar, entretanto, que o Império Romano é um exemplo clássico de como a 
exigência de tributos com fundamento apenas na força, sem referência ao valor justiça, 
transforma o direito de propriedade em um sistema de servidões sobre o homem, conforme 
assevera o professor Diogo Leite Campos14: 
Eis, pois, o legado de Roma emmatéria fi scal: o imposto como produto e instrumento da opressão, crescendo 
à medida que se desenvolve a máquina político-administrativa; assente na força pura, sem referência à justiça. O 
imposto ‗nasceu‘ em Roma caracterizado pela odiositas, fundado sobre a sua essência de mal necessário, de 
limitação do Direito pela força do ‗princeps‘, de instrumento de dominação, ‗de império‘. Enquanto as relações 
civis retiravam a sua força da justiça que realizavam como instrumento de cooperação entre homens livres e iguais. 
O carácter do imposto como produto e instrumento de um sistema de dominação foi evidente desde a grave crise 
do que o Império Romano atravessou a partir do século III. No decurso do principado de Diocleciano a economia 
e a sociedade são organizadas em termos de acampamento militar. O imperador estabelece a coacção como único 
instrumento de estabilização. Impõe-se uma escala de preços máximos para uma imensa lista de bens e serviços, 
estabelecendo como única sanção, para infractores, a morte. Simultaneamente, os impostos, destinados a manter 
uma máquina administrativa e militar crescente, aumentaram rapidamente. Criou-se um conjunto de impostos para 
fi nanciar o aparelho administrativo e militar; um imposto geral sobre as vendas; um imposto sobre o rendimento; 
múltiplas prestações de serviços obrigatórias (transporte, fabri- co de pão etc.). As atividades 
profi ssionais foram organizadas em corporações, elementos e instrumentos do Estado, com carácter coactivo e 
hereditário. Na última fase da sua história, a romanidade transforma-se numa comunidade em que todos 
trabalham, mas ninguém para si próprio. A propriedade mantém-se, é certo, como o ‗fundamento inamovível das 
relações humanas‘; mas a sua função deixou de ser ligada ‗naturalmente‘ à satisfação das necessidades de seu titular, 
para satisfazer os interesses públicos. 
 
13 CICERO, Marcus Tullius. On Duties II. In: Cícero. On the Good life. Tradução Michael Grant . New York: Penguin Classics, 1971. p. 162. Disponível em: 
http://books.google.com.br. Pesquisa realizada em 01.01.2009. 
14 CAMPOS, Diogo Leite de. A Jurisdicização dos Impostos: Garantias de Terceira Geração. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Tributo. Refl exão 
Multidisciplinar sobre a sua natureza. São Paulo: 
Editora Forense, 2007, p. 87-88. 
 
 FGV DIREITO RIO 17 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
Dando um salto na cronologia da história, outro momento merece destaque na abordagem 
que se estabelece neste curso é o século XIII d.C., o qual, para alguns autores33, representa o 
início da sistemática tributária que se consagra na atualidade, uma vez que foi a partir da 
promulgação da Carta Magna inglesa de 121534 que a legalidade ascendeu como princípio 
norteador das relações tributárias, impondo ao Rei João-sem-Terra o dever de observar limites 
para a criação de tributos. Na realidade, tal documento35 é decorrência da indignação dos barões 
proprietários de terras que forçaram King John a assinar a Magna Carta, pois já não 
concordavam com os constantes desrespeitos do monarca aos costumes tributários da realeza 
impondo-lhes excessiva carga tributária. De fato, tributação adicional somente poderia ser 
exigida com consentimento15, cujo conceito foi se alterando e expandindo ao longo do tempo, 
haja vista que a anuência da classe comum então ascendente economicamente passou também a 
ser exigida. 
No mesmo período, isto é, ainda no século XIII, conforme ressalta Galvêas37, o rei Eduardo I 
foi compelido a ir além e aceitar a norma segundo a qual ―nenhum tributo poderá ser lançado 
pelo rei, sem o consentimento dos arcebispos, bispos, condes, barões, cavaleiros, burgueses e 
todos os homens livres...‖. 
Alguns séculos depois, já no ano de 1628, a Inglaterra edita o Bill of Rights, o qual proclama 
que ―a partir desta data, nenhum cidadão será obrigado a conceder qualquer dádiva ou 
empréstimo ao soberano, ou a pagar qualquer tributo, sem a aprovação do Parlamento‖; ou seja, 
concretizou-se o princípio da legalidade consubstanciado no imperativo categórico notaxation 
without representation (aliás, tal expressão foi largamente difundida pelos americanos no período da 
revolução americana). Conforme preleciona Galvêas16 a referida norma-princípio é a base em 
que se fundam os orçamentos públicos dos países modernos. Destaque-se, no entanto, nos 
termos apontados pelo professor Ricardo Lobo Torres17 que: 
É inútil procurar antes das revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII a fi gura do orçamento. No mundo 
patrimonial já surgia a autorização dos estamentos e das cortes para a cobrança de impostos. Na Inglaterra a partir 
de 1215 e em Portugal, mas remotamente, tornava-se necessário o consentimento para que o Rei pudesse lançar 
tributos, que tinha o caráter extraordinário e só se justifi cavam quando insufi cientes os ingressos dominiais. Mas 
esses impostos, a rigor, não se confundem com os que permanentemente passam a ser cobrados a partir da 
instauração da estrutura liberal de Governo, posto que eram apropriados privadamente, sem a nota da publicidade 
que marca os tributos permanentes. Era difícil distinguir a Fazenda do Rei e a do Estado, as despesas do Rei e do 
Reino, as rendas da Coroa e do Reino. Assim sendo, não havia necessidade nem de autorização para a 
cobrança dos ingressos dominiais nem para arealização da despesa, pelo que descabe cogitar de 
orçamento no Estado Patrimonial. (grifo nosso) 
 
15 ADAMS. Op. Cit., p. 163. Esclarece o autor que: “John’s attempt to stretch the revenue devices of the realm had failed, but not entirely. Extra taxation 
could be collected with consent. In time the consent concept expanded. A rising class of wealthy commoners were called to meet in a House of Commons, 
to approve taxation for commoners in the same way the Great Council, approved taxation for the nobility. The king now became a politician. When extra 
revenue was needed, he did not need to steal it or arbitrarily increase taxation, he would call together his two councils of taxpayer representatives and 
present a case for more taxation.” 37 GALVÊAS. Op. Cit., 318. 
16 Idem. Ibidem. p. 318-319. 
17 TORRES. Op. Cit. p. 3-4. 
 
 FGV DIREITO RIO 18 
DIREITOTRIBUTÁRIOEFINANÇASPÚBLICASI 
 
33 GALVÊAS, Ernani. Breve História dos Tributos. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Tributo. Refl exão Multidisciplinar sobre a sua natureza. 
São Paulo: Editora Forense, 2007, p. 318. 
34 ADAMS. Op. Cit. p. 164. Um dos ca-pítulos da Magna Carta trata da livre circulação de mercadorias, conforme se extrai do texto, in verbis: 
“Let all merchants have safety and security to go out of England, to come into England, and to remain in and go about through England, as well by land as 
by water, for the purpose of buying and selling, without payment of any evil or injust tolls, on payment of ancient and just customs”. Conforme aponta o 
autor tal normativa foi seguida pelos Estados Unidos e Canadá: “the United States and Canadian constitutions adopted this principle of internal free 
trade. Commerce moving within the nation cannot be taxed. Freedom to travel in and out the country cannot be curtailed. The Russians fi nd diffi cult to 
understand why the West emphasizes this basic human right. Magna Carta is the source.” 
35 Cf. pontua Ana Alice De Carli, in: Bem de Família do Fiador e o Direito Humano Fundamental à Moradia. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 
2009: “Na seara da promoção e positivação dos direitos humanos, pode-se apontar como marco histórico, a Carta Magna inglesa, de 1215, a qual 
consagrou alguns direitos-garantias como o habeas corpus, o devido processo legal, a propriedade privada, e o princípio da legalidade.Não obstante, a 
questionável legitimidade da referida Constituição - pois, na verdade, consubstanciou apenas a concretização dos interesses da burguesia -, ela 
representa um capítulo da história do constitucionalismo inglês.”. Cumpre, realçar, que o princípio da legalidade tributária antecede a própria noção de 
legalidade em sentido lato. 
Portanto, o período denominado de Patrimonialismo é caracterizado pelo Estado protetor 
contra as guerras e invasões externas, sendo as fi nanças fundamentadas em rendas patrimoniais 
e dominiais dos príncipes bem como da exploração das colônias. A receita extrapatrimonial de 
tributos nesse período é secundária e excepcional, não havendo a necessidade de autorização 
parlamentar para a sua efetivação, tampouco para a realização das despesas, motivo pelo qual 
não existia orçamento sequer em sua concepção tradicional, confundindo-se e entrelaçando-se 
as fi nanças do Rei e a do Estado. 
O século XVIII, por sua vez, foi marcado pela independência americana e pela revolução 
francesa, a qual proclama a proteção de alguns direitos humanos fundamentais — em especial a 
propriedade e a liberdade —, uma vez que o Estado era visto como ―inimigo da liberdade 
individual, e qualquer restrição ao individual em favor do coletivo era tida como ilegítima‖, 
preleciona Dallari.18 
A Declaração de Independência dos Estados Unidos da America, de 4 de julho de 1776, 
proclama entre as razões da insatisfação com o King of Great Britain: ―For imposing taxes on us 
without our consent‖. A Constituição dos Estados Unidos, por sua vez, ratifi cada em julho de 
1787, estabelece em seu artigo 1º, seção 8, que: 
Th e Congress shall have the Power 1. to lay and collect taxes, duties, imposts and excises, to pay the debts 
and provide common defense and general welfare of the United States; but all duties, imposts and excises shall be 
uniform throughout the United States. (grifo nosso) 
Na mesma linha, a Constituição francesa de 03.09.1791 foi categórica na contenção da 
prerrogativa impositiva, tendo em vista a necessidade de renovação anual da autorização 
parlamentar para tributar: 
Titre V, art. 1 er: Les contributions publiques seront délibérées et fi xées chaque année par le Corps Legislatif, et ne pourront 
subsister au dela du dernier jour de La session suivante, si elles n’ont pás été expressément renouvelée. 
 
18 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 16. ed. atual. ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 1991. p. 233. 
 
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Se com o constitucionalismo nasce a idéia de orçamento incorporando as garantias 
normativas da 
liberdade, por outro lado a marca do período era a intervenção mínima do Estado na seara 
privada, 
apontando a liberdade contratual como um direito natural das pessoas. Com efeito, nesta 
época, o 
pensador Adam Smith sustentava que as relações econômicas deveriam ser regidas pelo 
princípio da 
liberdade de negociar, sem a participação do Estado a denominada fase do Estado Liberal — 
caracterizado como Estado Mínimo ou Estado de Polícia —, cuja premissa sob o aspecto 
econômico 
erapor alguns denominada como a primazia da mão invisível do mercado para reger a 
economia. 
A Revolução Industrial também merece realce, porquanto trouxe mudanças de diversas 
ordens, inclusive no campo da tributação, possibilitando a imposição de tributos sobre a 
produção industrial, sobre o consumo, bem como sobre o lucro e a renda auferida dos titulares 
de propriedade, acentua Galvêas41. 
A visão clássica e mais difundida desse contexto, que perdura desde a fase fi nal do século 
XVIII, todo o século XIX até o início do século XX, é no sentido de que a atividade fi nanceira 
do Estado Liberal era neutra, geralmente classifi cada como fi nanças neutras ou fi scais42, pois tinha 
apenas a função de arrecadar para fazer face às despesas decorrentes das prestações por ele 
exercidas, de caráter essencial, como as relacionadas à justiça, política, diplomacia, defesa contra 
agressão externa e segurança da ordem interna. Os tributos, conforme assevera Luiz Emygdio F. 
da Rosa Jr19, também eram caracterizados pelo fi m exclusivamente fi scal, posto que a exigência 
dos mesmos objetivaria tão-somente a obtenção de recursos para fi nanciar a atividade fi 
nanceira. 
Assim sendo, a atividade fi nanceira exercida pelo Estado somente visava à obtenção de numerário para fazer 
face às citadas despesas públicas, isto é, as fi nanças públicas tinham fi nalidades exclusivamente fi scais. Gasto 
Jéze resumiu de maneira lapidar o alcance da atividade fi nanceira desenvolvida pelo Estado no período clássico, ao 
enunciar: ‗Il y a dês dépenses publiques; Il faut lês couvrir‘. Assim, as despesas tinham um tratamento preferencial 
sobre as receitas, uma vez que essas visavam apenas a possibilitar a satisfação dos gastos públicos. Nesse período, 
portanto, o tributo tinha fi m exclusivamente fi scal porque visava apenas a carrear recursos para os 
cofres do Estado. 
Percebe-se que a expressão fi scalidade é utilizada em dois âmbitos e contextos distintos, isto 
é, tanto no que se refere ao papel das fi nanças públicas ao longo do tempo como também em 
relação às possíveis funções do tributo, que é atualmente, na maioria dos países, a principal fonte 
de receita pública. Sob o ponto de vista histórico das fi nanças públicas em geral, referida 
doutrina traz vantagens para a compreensão da evolução do papel da atividade fi nanceira do 
 
19 ROSA JR. Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2001, p. 4-5. 
 
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Estado sobre as ordens econômica e social ao longo dos diferentes períodos, enfatizando 
características que seriam distintas em cada época. No entanto, em que pese ser possível 
vislumbrar os pontos positivos da aludida segmentação sob o ponto de vista didático, haja vista 
marcar de forma clara e precisa, em períodos cronologicamente distintos (1) a fi scalidade — fi 
nanças neutras e tributos somente com fi nalidade arrecadatória — de um lado; e a (2) extrafi 
scalidade e a parafi scalidade — fi nanças ativas e os tributos com fi nalidade não apenas 
arrecadatória, a partir da segunda década do 
 
41 Ver GALVÊAS. Op. Cit., 318-320. 
42 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro, 2002.Forense. Rio de Janeiro, 2002. p. 361. “Fiscal. Derivado do latim, de fi scus, é vocábulo que 
nos vem do Direito Romano com a signifi cação de relativo ao fi sco ou ligado ao fi sco, em que continua a ser tido, tomado adjetivamente. Como 
substantivo, designa a pessoa a quem se comete a função ou atribuição de vigiar ou zelar o cumprimento ou a execução de certas leis, preceitos ou 
regulamentos de ordem fi scal ou tributária, ou empenhar-se pelo cumprimento de regras jurídicas e disciplinares em certos estabelecimentos públicos 
ou particulares, e para manter a regularidade na exação de certos atos de negócios, que devem ser executados ou praticados por outrem”. 
século XX —, de outro lado, conforme será examinado abaixo, o estudo de determinados fatos 
isolados da história nos permite afi rmar que a dissociação temporal entre a fi scalidade de um 
lado e a extrafi scalidade de outro apenas facilita a compreensão da ênfaseda intenção com 
que os tributos foram utilizados em cada período da história, na medida em que os mesmos 
também foram exigidos com outros objetivos que não meramente arrecadatórios em diversos 
momentos antecedentes ao denominado Estado de Bem-estar Social intervencionista, ou seja, de 
forma não neutra oucom fi ns outros que não meramente ―fi scais‖, ainda que não qualifi cada a 
política tributária com a denominação referida (―extrafi scalidade‖ ou ―parafi scalidade‖). Nesse 
sentido apresenta Adams 20 diversos exemplos históricos, dentre os quais duas passagens 
emblemáticas, e que se referem, respectivamente: (1) à utilização de tributos para infl uenciar a 
religião, como no caso do islamismo na Idade Média e, também, (2) das tarifas aduaneiras e o 
confl ito Norte e Sul que marca a confederação americana no período que antecedeu a guerra 
civil: 
(1) Th e humanity in the tax policy of the Moslems was of utmost importance. Th e Arabs 
brought peace and gentleness to an overtaxed world. Th ey liberated the old Roman world from 
decadent, oppressive, and corrupt taxation. Nothing illustrates better than the tax refunds they 
made to Christians and Jews in Palestine in A.D. 636. At that time the Moslems had conquered 
most of the lands of Judea, but their forces were overextended, and large body of Roman troops 
was on the march from Antioch. At a war council the Moslems decided to evacuate most of the 
conquered territories. After this decision made the Moslem leader called in the chief tax 
collector and gave him these instructions: ‗ You should therefore refund the entire amount of 
money realized from them that our relations with them remains unchanged but that as we are 
not in a position to hold ourselves responsible for their safety, the pool tax, which is nothing but 
the price of protection, is reimbursed to them‘. Accordingly, the entire sum collected from the 
Christian and Jewish communities was refunded to them. Th is aff ected the Christians to such a 
degree that tears trickled down their faces and, one and all, they passionately exclaimed: ‗May 
 
20 ADAMS. Op. Cit., (1) p. 133-134 e (2) p.333. 
 
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God bring you back to us.‘ Th e eff ect on the Jews was still more marked. Th ey cried out with 
vehemence: ‗By the law ant the prophets, the Roman emperor shall not take this city as long as 
the spark of life scintillates in our bodies‘. It´s too bad the Jews and Moslems today don´t feel 
that way. Th e Moslems used taxation to bring converts into the faith. Th e spread of Islam 
has been attributed to the sword and many historians harp on the Moslem cry of ‗Death to the 
infi del. Th e Koran (9:29) certainly justifi es that course of action. In practice, 
the Moslems acted to the contrary. Slau- 
ghter was not the normal modus operandi of even the most fanatical Moslems. Vanquished 
people were given three choices: death, taxes, or conversion to the faith. With these options 
it was not necessary for conquered people to lose their heads or their religion. (…) 
(2) Th e tariff of 1828 was called ‗the tariff of abomination,‘ a biblical term meaning 
the greatest evil. Prior to that time the tariff was needed to repay the national debt from the 
wars of 1812 and the revolution itself. By 1832 the national debt was paid and there was 
no justifi cation for the import taxes at high rates, except to promote a monopoly in 
the hands of Northern industrialists to raise prices for Southern consumers. Th e 
South exported about three-quarters of its goods and in turn used the money to buy 
European goods which carried the high import tax. Th is means that the South paid about 
three-quarters of all federal taxes, most of which were spent in the North. If they didn‘t buy 
foreign goods and pay high taxes the alternative was to buy Northern manufactured 
products at excessively high prices. Either way Southern money ended up in the North. Th 
e injustice of this arrangement dominated Southern hostilities toward the North. Said one 
historian: ‗Indignation against the tariff as an unfair tax injurious to their economy was 
general throughout the South‘ A southerner, a year after the Civil War ended expressed that 
indignation in a book appropriately clalled Th e lost Cause: ‗ In every measure that ingenuity 
of avarice devise the North exactes from the South a tribute, which could only pay at the 
expense and the character of an inferiour [sic] in the Union‘. 
Nessa toada, analisando as fi nanças funcionais e a utilização dos impostos alfandegários 
com fi ns extrafi scais em períodos remotos Aliomar Baleeiro21 pontua: 
Os progressos das ciências econômicas, sobretudo depois do impulso que lhes imprimiu a teoria geral de 
Keynes, refl etiram-se na Política Fiscal e esta, por sua vez, revolucionou a concepção da atividade fi nanceira, 
segundo os preceitos dos fi nancistas clássicos. 
Ao invés das ´fi nanças neutras´ da tradição, com seu código de omissão e parcimônia tão ao gosto das 
opiniões individualistas, entendem hoje alguns que maiores benefícios a coletividade colhera de ´fi nanças 
funcionais´, isto é, a atividade fi nanceira orientada no sentido de infl uir sobre a conjuntura econômica. 
Destarte, o setor público — ‗a economia pública‘ não se encolhe numa vizinhança pacífi ca e tímida junto 
às lindes da economia privada. A benefício desta é que deve invadi-la, para modifi cá-la, como elemento 
compensador nos desequilíbrios cíclicos. 
 
 
21 BALEEIRO. Op. Cit., p. 30-31. 
 
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Em verdade, a despeito das novidades terminológicas, a ´Política Fiscal´ é apenas nova aplicação 
dos instrumentos fi nanceiros para fi ns ´extrafi scais´. A Política Fiscal, no campo econômico, era 
bem conhecida dos clássicos para o protecionismo por meio de impostos alfandegários. Alguns 
advogam para fi ns ―sócio-políticos‖, como preferia dizer Seligman referindo-se às tendências de reforma 
social pelo tributo, defendidas por Wagner. Hoje a política anticíclica de modifi cação da conjuntura e da 
estrutura atrai as atenções em fi nanças extrafi scais. 
Ademais, sob o ponto de vista econômico, nos termos em que será analisado na Aula 14 
sobre a extrafi scalidade, os tributos, em regra, ainda que seja possível instituí-los com a 
intenção apenas de obtenção de recursos para os cofres públicos, afetam os preços relativos 
dos bens e serviços, modifi cam a alocação dos recursos pelos agentes econômicos, alteram 
as decisões quanto à melhor estrutura de fi nanciamento corporativo, distorce a taxa de 
retorno de determinada atividade econômica em detrimento de outra, independentemente 
da intenção do exator. Ou seja, a simples existência dos tributos impacta o comportamento 
das pessoas, das famílias, das empresas e da sociedade como um todo, motivo pelo qual é 
ínsito à tributação redefi nir a alocação dos recursos socialmente disponíveis, o que afeta a 
demanda e a oferta no mercado de fatores de produção e de bens e serviços, razão pela 
qual, economicamente, a extrafi scalidade é inerente e indissociável da denominada fi 
scalidade. 
Conforme já se pode extrair pelo que acima foi dito, a etapa subseqüente, sob o ponto de 
vista do desenvolvimento histórico das fi nanças, é classicamente denominada de ―fase de 
intervencionismo estatal‖ ou do ―tributo com fi m extrafi scal‖, e corresponde ao resultado 
da crise do Estado Fiscal do início do século XX, em função do descompasso entre a 
liberdade econômica e a realidade social. As desigualdades eram acentuadas, o que criou um 
grande hiato entre o discurso de desenvolvimento econômico sem a participação do Estado 
e o mundo da vida enfrentado por grande parte da massa humana, que se via forçada a 
trabalhar por baixos salários e com péssimas condições de vida. Como conseqüência de tal 
situação, já no século XIX, seguido pelo século XX, movimentos sociais surgiram paracombater o sistema liberal clássico vigente; marcado pelo individualismo exacerbado, 
momento em que prevaleciam de forma absoluta os valores segurança jurídica,liberdade 
e igualdade formal. 
Nesse contexto, exsurgiu o denominado Estado de Bem-estar Social, que traz a lume 
novos valores deixados de lado até então no contexto do Estado Liberal Mínimo (ou de 
polícia), caracterizado como mero espectador ou ordenador distante dos fatos sociais. O 
Estado Social passa a ser ator decisivo da conduta privada, com fundamento na visão de 
que a intervenção estatal era conditio sine qua non para o alcance da justiça social e da 
igualdade material. Em conexão com esse movimento, os dispositivos orçamentários das 
Constituições de diversos países foram alterados para abranger a intervenção do Estado na 
ordem econômica e social. 
 
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Assevera Luiz Emygdio 22 que o Estado passou a intervir na iniciativa privada 
especialmente pelas seguintes razões: 
a) grandes oscilações porque passavam as economias (...); b) crises provocadas pelo desemprego que 
ocorria em larga escala nas etapas de depressão, gerando grandes tensões sociais; c) efeitos cada vez mais 
intensos das descobertas científi cas e de suas aplicações; e d) dos efeitos originados da Revolução Industrial 
com o surgimento de empresas fabris de grande porte, com o consequente agravamento das condições 
materiais dos trabalhadores. 
Para intervir na economia o Estado precisou criar novos instrumentos, dentre eles surgiu, 
formalmente, a fi gura do tributo com natureza extrafi scal, isto é, o tributo deixava de ser 
reconhecido por seu caráter eminentemente arrecadatório para os cofres do Tesouro, para 
assumir, concomitantemente, a feição de mecanismo coercitivo, utilizado pelo Poder 
Público com o fi m de atingir outros objetivos e metas de natureza econômica e social. 
Nesse sentido, merece trazer como exemplos de medidas impositivas de exação com fulcro 
extrafi scal, as seguintes situações, que variaram ao longo da história: 1) aumento da alíquota 
do imposto sobre importação dos bens estrangeiros com vistas a fomentar a indústria 
nacional e garantir as reservas de moedas estrangeiras (instrumento auxiliar da política 
industrial e cambial); 2) redução das tarifas aduaneiras com o objetivo de reduzir os preços 
dos produtos e as pressões infl acionárias em âmbito local (instrumento auxiliar da política 
monetária); 3) adoção de imposto sobre o patrimônio territorial urbano com vistas à 
desestimular a especulação imobiliária, a má ou não utilização do imóvel urbano — vide 
IPTU progressivo, nos termos do art. 182, §4º, da CR-88 (instrumento auxiliar da política 
urbanística e de ocupação do solo), etc. 
O Estado Intervencionista (Social) ganhou força, especialmente por conta dos prejuízos 
causados pela II Guerra Mundial, período em que havia necessidade premente de se 
otimizar os recursos para fazer face as demandas coletivas. No entanto, as exigências sociais 
impuseram a necessidade de aumentos contínuos da carga tributária e da criação de outras 
fontes de receitas para dar cabo às políticas públicas, cada vez mais intervencionistas, 
implicando despesas crescentes, em especial pela demanda da Segurança Social/Seguridade 
Social, abrangendo a Saúde, a Assistência e a Previdência Social. De fato, sob infl uência do 
keynesianismo, o Estado de Bem-estar Social elevou sobremaneira o papel dos tributos, o 
que redundou no paulatino esgarçamento do 
 
22 ROSA JR. Op. Cit., p. 5-6. 
 
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modelo do Welfare State, nos termos então estruturados. As constantes crises do petróleo, no fi 
nal dos anos 70, tornaram inviáveis as estruturas do Estado Social, o qual carregava pesado 
fardo da dívida pública e de orçamentos desequilibrados e defi citários. As críticas vinham de 
todos os setores; em especial do pensamento liberal extremado, que denunciava o aniquilamento 
da liberdade por meio da exacerbada intervenção estatal na economia e do crescente peso dos 
tributos sobre os cidadãos. 
Com a crise do Estado do Bem-estar Social, confome ensina o professor Ricardo Lobo 
Torres47: 
(...) modifi ca-se novamente o perfi l da Constituição Orçamentária. As que já estavam 
formalmente redigidas, como a da Alemanha, alteram-se substancialmente em sua interpretação. 
Nos Estados Unidos inicia-se a discussão sobre a Emenda tendente criar regra obrigatória de 
equilíbrio orçamentário. (...). O grande problema atual da Constituição Orçamentária consiste 
em que deve ela ser rica e explícita em princípios jurídicos, de modo a permitir a elaboração da 
lei anual do orçamento segundo a ideologia do equilíbrio orçamentário e as idéias de 
economicidade e transparência das despesas, Insista-se em que o aspecto do gasto público 
é que se torna dramático nas fi nanças públicas contemporâneas. 
Apesar das acentuadas mudanças ocorridas no sentido da liberalização, privatização e foco do 
Estado na regulação da economia, reduzindo a face estatal provedora, o denominado 
neoliberalismo não superou (e nem poderia!) de forma absoluta o Estado Social. De fato, o 
processo histórico, assim como o processo de integração de mercados48, nunca é uniforme, 
contínuo e linear, sendo certo que, a cada etapa, novas características são incorporadas e diversas 
facetas do que existia no passado continuam a se fazer presente. Daí a complexidade da 
realidade atual! 
Nessa toada, por fi m, importante realçar que o perfi l e as características da receita pública 
foram delineadas de diversas formas ao longo da história, destacando-se entre elas, conforme 
ensina Aliomar Baleerio49: ―as extorsões sobre povos vencidos; doações (voluntárias) recebidas; 
recolhimento das rendas produzidas pelos bens e empresas do Estado; exigência coativa de 
tributos ou penalidades; tomada de empréstim osforçados, e; fabricaçãodedinheiro 
metálico ou de papel‖. Para o eminente autor essas diferentes formas de fi nanciamento da 
atividade fi nanceira do Estado, que ocorreram ao longo da história, podem ser agrupadas ou 
reduzidas a cinco padrões, não necessariamente sucessivos, a saber: 
1.parasitária: proveniente da ext orsão, pilhagem e exploração contra povos ou inimigos vencidos, 
característica do mundo antigo; 
 
47 TORRES. Op. Cit. p. 3-6. Nesse cenário, aponta o autor o Estado Liberal clássico, na sua versão minimalista, como marco para o surgimento da 
cultura orçamentária, destacando as mudanças ocorridas ao longo de seu percurso histórico. Vale dizer que Estado Fiscal no período clássico, também 
denominado de Estado Guarda-Noturno, se restringia basicamente às atividades de poder de polícia, à atividade jurisdicional e à realização de alguns 
serviços públicos, não exigindo, portanto, grande estrutura tributária. 
48 COSTA, Leonardo de Andrade. Se-minário Brasil Século XXI, em 24 de outubro de 2001, Brasília. O Direito na Era da Globalização. Realização 
do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, p. 117. “Preliminarmente, é importante enfatizar que a matéria tributária sempre foi e sempre 
será controversa pois traz dentro de si aspectos jurídicos, econômicos, administrativos, e, principalmente, de relações de poder. Portanto, sua análise 
deve ser, necessariamente, multidisciplinar, e o produto fi nal será sempre a expressão do sopeso entre as diversas variáveis envolvidas, além, é claro, da 
 
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visão de mundo do pesquisador. Seu estudo, em face do processo de integração de mercados, deve ser desenvolvido em duas dimensões: (1) a primeira 
no que se refere às diferentes formas em que se manifesta

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