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A Estrutura dos Gases FÍSICO-QUÍMICA I – EQ (4311S-04) Prof. Allan Morcelli A Estrutura dos Gases • Até o momento, nosso estudo dos gases enfocou principalmente o seu comportamento macroscópico, descrito por grandezas como pressão, volume e temperatura. • Estas grandezas nos são familiares por nossa experiência sensível, mas sua origem em fatos microscópicos não é imediatamente óbvia. • O ramo da ciência que estabelece a ponte entre os fatos dos mundos microscópico e macroscópico é a Mecânica Estatística. No caso particular do estudo de sistemas em equilíbrio, fala-se em Termodinâmica Estatística, pois termodinâmica sempre se relaciona com o equilíbrio de sistemas. A Estrutura dos Gases • É verdade que todos nós temos algumas noções sobre o mundo microscópico, e até mesmo utilizamos estas noções para discutir efeitos atrativos e repulsivos em modelagens de gases reais como a de van der Waals. • No entanto, nossa discussão foi meramente descritiva, sem trazer o aparato de um raciocínio mais rigoroso. Devemos agora, portanto, aprofundar nossa compreensão da estrutura microscópica dos gases. Faremos isso no âmbito da Teoria Cinética dos Gases (TCG), desenvolvida no século 19 por Maxwell e Boltzmann. Interação molecular nos gases • Antes de discutir a TCG, vamos examinar alguns aspectos da interação entre partículas nos gases. • No nível microscópico, os gases caracterizam-se por serem constituídos de um grande número de partículas. • Quando o gás é rarefeito, essas partículas ficam a maior parte do tempo distantes umas das outras, e, quando colidem, geralmente é uma colisão entre duas moléculas. Interação molecular nos gases • A figura mostra a energia de interação entre duas partículas (moléculas) de um gás. Quando a distância entre as duas partículas é infinita, convencionamos que a energia potencial delas é zero. • Pela física sabemos que a força é igual à derivada da energia potencial em relação à distância, com sinal trocado. Interação molecular nos gases • Você pode ver que em distâncias muito grandes, a força tende a zero. • Se aproximarmos duas moléculas distantes, observamos que sua energia potencial de interação diminui até que alcançamos um mínimo na distância de equilíbrio De. Ao longo desse trecho, observa-se uma força de atração entre elas. Interação molecular nos gases • Exatamente na distância De, duas moléculas em repouso ficariam equilibradas. • Em distâncias mais curtas, notamos que a energia potencial cresce rapidamente, de modo que. surgem forças repulsivas de elevada grandeza Interação molecular nos gases • Portanto, um par de moléculas interagindo está sujeito a forças atrativas, ou repulsivas, ou a uma ausência de forças, conforme a distância entre as moléculas. • Podemos ver que as moléculas não são realmente como esferas rígidas: se fossem rígidas, seria impossível aproximá-las além de um certo limite. O gráfico nos mostra que não há esse limite, desde que tenhamos energia suficiente disponível. Poderíamos imaginar as moléculas como esferas semirrígidas, sendo algumas mais macias e outras menos. Relação entre covolume e volume molecular • Já sabemos que o volume molecular tem relação com o covolume que aparece na equação de Van der Waals e em outras equações similares. • Vimos agora que as moléculas não são realmente esferas rígidas, mas como a curva na região repulsiva é praticamente vertical, é razoável considerar que o valor de σ no gráfico (a distância entre os centros de duas moléculas próximas quando sua energia potencial é zero) representa a distância entre duas moléculas quando elas se chocam. Relação entre covolume e volume molecular • Os valores tabelados para o covolume b da equação de Van der Waals podem ser usados para estimar o tamanho das próprias moléculas. Como foi visto, o parâmetro b representa o volume (molar) excluído por causa do volume finito ocupado pelas próprias moléculas. • Admitindo que as moléculas são esferas (aproximadamente) rígidas de raio r, podemos ver facilmente (figura) que a distância σ entre os centros de duas moléculas que se tocam é 2r, ou seja, σ é igual ao diâmetro de uma molécula. Relação entre covolume e volume molecular • Quando uma molécula está sozinha em um recipiente, não existe volume excluído, pois essa molécula não tem de quem excluir volume. Só quando temos duas moléculas é que uma torna um certo volume inacessível para a outra. Relação entre covolume e volume molecular • Suponha que duas moléculas esféricas rígidas estão encostadas, como na figura. A região pontilhada ao redor da primeira molécula é o volume de uma esfera de raio σ = 2r, que fica inacessível para a segunda molécula. Pelo mesmo motivo, existe um volume equivalente ao redor da segunda molécula que é inacessível à primeira. • Portanto, o volume de uma esfera de raio σ é o volume excluído de um par de moléculas, Vexc(par). Relação entre covolume e volume molecular • Já o volume v de uma molécula é e, portanto, Relação entre covolume e volume molecular • Se cada par de moléculas gera um volume excluído de 8v, então podemos dizer que o volume excluído por molécula no sistema é a metade disso, ou 4v: e portanto o volume excluído por mol será onde NA é a constante de Avogadro. Relação entre covolume e volume molecular • Portanto, • Este resultado nos permite utilizar o parâmetro b da equação de van der Waals para estimar o diâmetro das moléculas do gás. Teoria Cinética dos Gases • A teoria cinética dos gases constrói uma descrição dos gases partindo de um tratamento mecânico para o sistema. • O gás nada mais é do que um sistema de N partículas (onde N em geral é grande). As propriedades do gás são derivadas diretamente das propriedades mecânicas desse sistema de partículas. • O tratamento feito pela TCG exige algumas hipóteses iniciais, que veremos a seguir. • Os resultados obtidos pela TCG nos permitem chegar a vários resultados interessantes. Teoria Cinética dos Gases • É possível mostrar que a temperatura e a pressão são manifestações do movimento molecular, sendo a temperatura uma medida da energia cinética translacional das partículas e a pressão um efeito de colisões contra as paredes. • Também é possível descrever a velocidade das moléculas em gases e a velocidade do som (que é estreitamente relacionada à velocidade molecular). Teoria Cinética dos Gases • As chamadas propriedades de transporte (viscosidade, difusão e condutividade térmica) também podem ser previstas adequadamente por meio da TCG, assim como a cinética das reações químicas. • Resultados importantes são obtidos também a respeito do calor específico dos gases, que se relaciona com as formas de movimento possíveis para as partículas dos diferentes gases. As hipóteses da Teoria Cinética dos Gases 1. Um gás é um sistema composto por um número muito grande de partículas pequenas (átomos ou moléculas) em movimento incessante e aleatório. 2. Na ausência de um campo de forças, as partículas movem-se em linha reta de acordo com a 1ª lei de Newton. 3. O tamanho das partículas é desprezível frente ao espaço vazio entre as partículas, de modo que as partículas não colidem com muita frequência. 4. Quando ocorre uma colisão entre partículas, a sua energia cinética total se mantém constante (isto é, a colisão é elástica). Revisão de física • Define-se o momento ou quantidade de movimento de uma partícula de massa m como • Dizemos ainda que a força atuando sobre uma partícula em um dado instante é a taxa de variação do momento em ralação ao tempo no instante dado: Revisão de física • A força média que atua em uma partícula durante um intervalo de tempo dado é, analogamente: • Todos aprendemos que F = ma. Entãocomo se justifica que a força é a derivada do momento em relação ao tempo? Basta efetuar a derivação, supondo que a massa da partícula não muda: Gás de partículas • Para facilitar a compreensão, faremos nossa análise de um gás como sendo um sistema mecânico de partículas em uma série de etapas. • Começaremos estudando um gás composto de uma única partícula confinada em uma caixa unidimensional. Depois vamos abordar uma caixa em três dimensões e por fim vamos generalizar para um gás de N partículas. Gás de uma partícula na caixa unidimensional • Primeiro caso: caixa unidimensional. • Suponha que temos uma partícula de massa m que se move no eixo x com velocidade vx em uma caixa unidimensional de comprimento L (figura). Gás de uma partícula na caixa unidimensional • Já que o tempo que a partícula leva para ir de uma extremidade da caixa à outra é e o tempo que leva para ir e voltar a uma mesma extremidade é Este é o tempo que a partícula leva para voltar a colidir com uma das paredes. Gás de uma partícula na caixa unidimensional • Está claro que a frequência de colisão (número de colisões por unidade de tempo) com uma parede dada é • O que ocorre na parede a cada colisão? Suponha que uma partícula se choca com a parede direita da caixa. Antes da colisão, sua velocidade é +vx e, depois de colidir, sua velocidade muda para -vx. Portanto, seu momento muda de pinicial = +mvx para pfinal = - mvx (figura). A partícula sofre, portanto, uma variação de momento ∆p = pinicial - pfinal. Gás de uma partícula na caixa unidimensional • Portanto, a parede da direita sofre ∆p de módulo igual mas sinal contrário a cada colisão: Gás de uma partícula na caixa unidimensional • Temos uma colisão a cada ∆t. Portanto a força média sobre a parede é Gás de uma partícula na caixa tridimensional • Segundo caso: caixa tridimensional. • Por simplicidade, vamos considerar uma caixa cúbica de aresta L. • Seu volume será • A partícula tem velocidade v, e os movimentos nas direções x, y e z são totalmente independentes (figura). Por isso, a força média que a partícula exerce em cada parede é dada por expressões semelhantes à desenvolvida para o movimento unidimensional. Gás de uma partícula na caixa tridimensional • Define-se a pressão como força sobre área: • A área de uma face do cubo é L², onde se aplica a força média F. Portanto, temos para a pressão em uma parede do eixo x. Resultados análogos valem para y e z. Gás de N partículas • Em um gás de muitas partículas, cada uma das partículas atua de maneira semelhante fornecendo sua contribuição para a pressão total. Assim, a pressão sobre uma parede do eixo x é • Se todas partículas tiverem massa m, podemos escrever Gás de N partículas • Em um gás de muitas partículas, cada uma das partículas atua de maneira semelhante fornecendo sua contribuição para a pressão total. Assim, a pressão sobre uma parede do eixo x é • Se todas partículas tiverem massa m, podemos escrever Gás de N partículas • O valor médio do termo v²xj que aparece no somatório acima é simplesmente a média aritmética dos v²xj de todas as partículas: de modo que Gás de N partículas • Portanto, podemos escrever a equação para o cálculo da pressão resultante como para a pressão exercida sobre uma parede do eixo x. Gás de N partículas • Em um gás há um grande número de partículas e seu movimento é aleatório. Isso faz com que as direções x, y e z sejam equivalentes (na ausência de um campo de forças). Desse modo, • Quando as propriedades de alguma coisa são iguais em todas as direções, dizemos que essa coisa é isotrópica. Um gás, portanto, é isotrópico. A velocidade escalar v=|v| de uma partícula está relacionada com o valor das componentes vx, vy e vz por Gás de N partículas • Portanto, o valor médio de v² entre todas as partículas do gás é E, como o valor médio das três componentes (x, y e z) se equivale, a equação acima pode ser colocada como Gás de N partículas • E, assim, podemos reescrever a expressão desenvolvida para pressão resultante em uma parede como Esta equação é a Equação Fundamental da TCG. Ela vincula propriedades macroscópicas (pressão e volume do sistema) a propriedades microscópicas (massa das partículas e valor médio do quadrado da velocidade das partículas). Temperatura e energia cinética translacional • A energia cinética translacional de uma partícula, ϵc,trans, é dada por • Portanto, o valor médio de ϵc,trans em um gás de N partículas iguais será Temperatura e energia cinética translacional • E, portanto, a energia cinética translacional de todas as partículas do gás, Ec,trans, será: • Podemos reescrever a equação fundamental da TCG como Temperatura e energia cinética translacional • Podemos identificar o lado direito como o termo nRT da equação do gás ideal. Desse modo, obtemos uma interpretação cinética para a variável macroscópica da temperatura: Esta equação nos diz que a temperatura é uma medida da energia cinética translacional média das partículas. Temperatura e energia cinética translacional • Lembrando que Ec,trans = N <ϵc,trans> e que n = N/NA, onde NA é a constante de Avogadro, podemos escrever a equação anterior como • Cortando o N, obtemos onde kB é a constante de Boltzmann kB =1,38065×10 −23 J/K Note a unidade de kB. Esta constante “traduz” energias no nível molecular em temperatura e vice-versa. Graus de liberdade • Associamos às partículas que compõem a matéria um certo número de graus de liberdade de movimento, isto é, formas de movimento possíveis. • Dizemos que átomo livre em um certo volume tem três graus de liberdade, pois ele pode se mover em cima de três coordenadas espaciais (x, y e z). • Esses são três graus de liberdade na posição, mas podemos perceber a partícula em questão também tem três graus de liberdade na sua velocidade, pois necessitamos de três valores (vx, vy e vz) para descrever o vetor velocidade v. Graus de liberdade • Se cada átomo livre tem três graus de liberdade referentes ao movimento translacional, é claro que um sistema composto de N partículas livres terá 3N graus de liberdade translacionais. • Ou seja, precisamos de 3N números para especificar a posição das partículas do sistema (assim como precisamos de 3N números para especificar as velocidades delas). Graus de liberdade • Quando nosso sistema não é composto só de partículas livres, mas de moléculas ou partículas ligadas entre si, o que acontece? • Bem, acontece que o número total de graus de liberdade continua o mesmo (3N). Só que agora nem todos são graus de liberdade translacionais. Graus de liberdade • Uma molécula tem várias formas de movimento possíveis: além do movimento de translação, também tem movimentos rotação e vibração. • Uma molécula diatômica como o H2 tem: 3 graus de liberdade translacional (ela se move no espaço) 2 graus de liberdade rotacional (imagine a molécula alinhada com o eixo z: então podemos girá-la em torno do eixo x e do eixo y, mas não dá pra girá-la em torno do eixo z) 1 grau de liberdade vibracional (a ligação H−H funciona como uma mola entre os dois átomos). Ao todo, temos 6 graus de liberdade na molécula de H2, ou seja: 3N com N = 2. Graus de liberdade • Moléculas lineares como H2, CO2 e HCCH, cujos átomos ficam em uma linha reta, têm apenas dois graus de liberdade rotacionais. • Moléculas não-lineares como H2O, CH4, etc. têm três graus de liberdade rotacionais. Graus de liberdade • Para saber o número de graus de liberdade vibracionais de uma molécula de N átomos, você toma o número total de graus de liberdade (3N) e subtrai os translacionais e rotacionais. Resulta 3N −5 paramoléculas lineares e 3N − 6 para moléculas não- lineares. Graus de liberdade • E nos sólidos? Que graus de liberdade existem? • Podemos considerar que um sólido nada mais é do que uma molécula muito grande. Então, sendo N um número extremamente grande, temos 3N graus de liberdade ao todo, sendo quase todos vibracionais e só três translacionais e três rotacionais. Exemplo: Determinar quantos e quais graus de liberdade existem em uma molécula de CH4. • Resolução. Trata-se de uma molécula com 5 átomos. Portanto, ela tem 3N = 3×5 = 15 graus de liberdade (GL) ao todo. • Qualquer corpo sempre tem 3 GL translacionais. • Além disso, a molécula de metano não é linear; por isso, ela tem 3 GL rotacionais. • Os graus de liberdade restantes (15 − 3 − 3 = 9) são vibracionais. Energia associada aos graus de liberdade • Cada um dos graus de liberdade de um sistema corresponde a uma das forma de movimento de um sistema mecânico. • Naturalmente, podemos especificar o estado de um sistema em termos de cada um desses movimentos moleculares. • Por exemplo, para especificar o estado de uma molécula diatômica, poderíamos descrever uma posição e uma velocidade para os três graus de liberdade translacionais, os dois rotacionais e o único vibracional. Energia associada aos graus de liberdade • Cada uma dessas formas de movimento tem energia associada. • Os graus de liberdade translacionais contêm apenas energia cinética, assim como os graus de liberdade rotacionais. • Os graus de liberdade vibracionais, por outro lado, contêm energia potencial além da energia cinética. Energia associada aos graus de liberdade 1. Um grau de liberdade translacional está associado a uma coordenada q (que pode ser x, y ou z dos eixos cartesianos). Ele contém apenas a energia cinética onde m é a massa do corpo e v é sua velocidade na coordenada q. Energia associada aos graus de liberdade 2. Um grau de liberdade rotacional está associado a uma coordenada angular, e contém apenas a energia cinética de rotação onde I é o momento de inércia e ω é a velocidade angular da rotação considerada. Energia associada aos graus de liberdade 3. Um grau de liberdade vibracional está associado a uma coordenada vibracional q (trata-se de uma coordenada generalizada que não precisamos especificar aqui). O movimento de vibração normalmente é descrito por uma lei do tipo da lei de Hooke (mola). A energia do grau de liberdade vibracional é a soma de uma energia potencial ( 𝟏 𝟐 𝒌𝒒²) e uma energia cinética ( 𝟏 𝟐 𝝁𝒗𝟐): onde k é uma constante do oscilador (constante de mola), μ é uma grandeza com unidade de massa e v é a velocidade na coordenada q. Energia associada aos graus de liberdade • O estado de um sistema é especificado por coordenadas de posição e velocidade. • Note que em todos os casos apresentados, a energia em um grau de liberdade é quadrática em relação a essas coordenadas: • Energia translacional é proporcional a v², • Energia rotacional é proporcional a ω², • Energia vibracional é proporcional a q² (parte potencial) e a v² (parte cinética). Energia associada aos graus de liberdade • Em sistemas clássicos desse tipo, em que a energia é proporcional ao quadrado de uma coordenada ou de uma velocidade que descreve o estado do sistema, o valor médio da energia associada é • Isso não é difícil de provar, mas não vamos demonstrá-lo dessa vez. • Guarde bem o seguinte: o resultado anterior só é válido para formas de energia como as listadas acima, que são proporcionais ao quadrado de uma coordenada ou velocidade em um sistema clássico. Esse resultado não se aplica para dependências não-quadráticas, e também não se aplica para variáveis discretas como as da mecânica quântica. Energia associada aos graus de liberdade • Com o resultado, podemos ver que a energia média associada a cada grau de liberdade de translação (x, y ou z) é pois existe uma energia cinética proporcional a vx² ou vy² ou vz² na translação. Energia associada aos graus de liberdade • Da mesma forma, a energia média associada a cada grau de liberdade de rotação é • pois existe uma energia cinética proporcional a ω² para cada uma das rotações eventualmente possíveis no sistema. Energia associada aos graus de liberdade • Por fim, a energia média associada a cada grau de liberdade vibracional em um oscilador clássico descrito por uma lei tipo Hooke é • pois existe uma energia cinética proporcional v² e uma energia potencial proporcional a q² (onde q é uma coordenada de vibração e v a velocidade correspondente). Energia associada aos graus de liberdade • A descrição das vibrações moleculares em termos da mecânica clássica não é satisfatória, pois os níveis de energia vibracionais são quantizados e a separação entre eles costuma ser bastante grande. Portanto, a equação não é adequada para descrever a energia média nos graus de liberdade vibracionais em moléculas reais. • Na prática, em temperaturas moderadas ou baixas (como na temperatura ambiente), a imensa maioria das moléculas de uma substância permanece no estado vibracional de mais baixa energia, e muito poucas ocupam níveis vibracionais mais altos. Por esse motivo, a energia média em cada grau de liberdade vibracional em uma molécula real é bem menor do que o kBT previsto para um oscilador clássico. O teorema da equipartição da energia • Se uma molécula ou um sistema qualquer tem a energia expressa como a soma de vários termos quadráticos, então, como vimos, a energia média de cada um é 𝟏 𝟐 𝒌𝑩𝑻. • Para esse tipo de sistema, perceba não faz diferença qual é a natureza de cada energia; todas elas têm esse valor médio. • Podemos ver que em média a energia total do sistema se distribui igualmente entre as formas de energia possíveis (desde que descritas por termos quadráticos de posição e velocidade). O teorema da equipartição da energia • Por exemplo, se descrevermos uma molécula diatômica pela mecânica clássica, teremos a energia (em média) dividida nas seguintes partes iguais: • Teremos os três graus de liberdade translacionais, com três partes (de energia cinética), os dois graus de liberdade rotacionais, com duas partes (de energia cinética) e o único grau de liberdade vibracional, com duas partes (uma de cinética, outra potencial). O teorema da equipartição da energia • Como você pode ver, a energia dos movimentos moleculares fica dividida em 7 partes iguais (em média). • Como cada uma dessas partes é 𝟏 𝟐 𝒌𝑩𝑻, o total é de 𝟕 𝟐 𝒌𝑩𝑻 para a energia média em todos os graus de liberdade da molécula. • Mas, conforme discutido, para uma molécula diatômica real como o N2 ou outra semelhante, à temperatura ambiente, temos que desconsiderar as duas partes de energia vibracional. Assim, restam apenas as 5 partes iguais da energia 𝟏 𝟐 𝒌𝑩𝑻 nos graus de liberdade translacional e rotacional, totalizando uma energia total de 𝟓 𝟐 𝒌𝑩𝑻 em média. O teorema da equipartição da energia • Insistimos em escrever “em média” porque, em qualquer instante dado, a energia de um tipo pode ser diferente de outra. • Ao longo do tempo, com as colisões incessantes entre as moléculas, a energia se transforma de maneira aleatória entre as diversas formas possíveis, e é só “em média” que a energia de um tipo é igual à de outro tipo. Energia total nos graus de liberdade molecular Parte translacional • Se somarmos a energia média nos três graus de liberdade translacional de um sistema molecular, obtemos a energia translacional média total: • onde o subscrito c indica que se trata de energia cinética apenas. As partículas de um gás sempre apresentam este tipo de energia. • Mas se as partículas forem moléculas, é preciso somar as contribuições das formas deenergia rotacional e vibracional. Energia total nos graus de liberdade molecular Parte rotacional • Moléculas têm dois ou três graus de liberdade rotacional, conforme sejam lineares ou não. • Em um gás de moléculas lineares: • Mas se as moléculas forem não-lineares, Energia total nos graus de liberdade molecular Parte vibracional • Sendo N o número de átomos na molécula, existem sempre 3N graus de liberdade molecular. • No caso de molécula linear: restarão 3N − 5 modos vibracionais após serem descontados os três translacionais e os dois rotacionais. • Já nas moléculas não-lineares: restarão 3N − 6 modos vibracionais após serem descontados os três translacionais e os três rotacionais. Energia total nos graus de liberdade molecular Parte vibracional • Lembrando que cada modo vibracional corresponde a uma energia 𝒌𝑩𝑻, pois tem 𝟏 𝟐 𝒌𝑩𝑻 de energia cinética e mais igual quantidade de energia potencial, podemos escrever: Energia total nos graus de liberdade molecular Parte vibracional: Considerações • Isso é válido de acordo com a mecânica clássica, na qual todos os modos são sempre capazes de receber energia. • Mas de acordo com a mecânica quântica, que oferece uma melhor descrição do mundo microscópico, só é possível que um modo vibracional receba ou forneça energia de determinados valores. • No caso dos modos vibracionais, a energia necessária para levar uma molécula do estado fundamental para um estado vibracional excitado geralmente é muito maior que a energia disponível à temperatura ambiente. Energia total nos graus de liberdade molecular Parte vibracional: Considerações • A consequência é que na maioria dos gases os modos vibracionais encontram-se “congelados”, isto é, ficam inacessíveis em temperaturas baixas (como a temperatura ambiente). • Em temperaturas mais altas os modos vibracionais podem se tornar parcialmente ativos (capazes de receber alguma energia, porém menos que o kBT previsto classicamente), e só em temperaturas muito altas haverá alguma aproximação ao valor previsto classicamente. Energia total nos graus de liberdade molecular Parte vibracional: Considerações • Caso estejamos considerando um gás de moléculas pequenas, o número de graus de liberdade vibracionais é pequeno e podemos desprezar a energia molecular vibracional para a maioria dos propósitos práticos. • Entretanto, em moléculas com muitos átomos existe uma grande quantidade de modos vibracionais. Por exemplo, em uma molécula de butano, C4H10, temos 42 graus de liberdade, dos quais 36 são vibracionais. Por isso, mesmo que cada grau de liberdade vibracional contenha relativamente pouca energia, somados eles dão uma parcela substancial da energia total nos graus de liberdade da molécula. Energia total nos graus de liberdade molecular • Portanto, se considerarmos que a energia interna U de um gás é a soma da energia de suas N partículas, e que a energia média <ϵ> de cada partícula é simplesmente a soma das energias médias em cada grau de liberdade, podemos escrever (As energias Etr, Erot e Evib representam o valor total no sistema macroscópico dos diferentes tipos de energia molecular.) Energia total nos graus de liberdade molecular • Assim, um gás ideal monoatômico terá enquanto que um gás ideal de moléculas diatômicas ou lineares em geral terá (supondo que os modos vibracionais não contribuem) Energia total nos graus de liberdade molecular e um gás ideal de moléculas não-lineares terá (de novo supondo que os modos vibracionais não contribuem). Energia interna, U • A energia total de um sistema pode ser considerada como a soma de uma energia interna (referente às partes que compõem o sistema) e uma energia externa (que se refere às relações entre o sistema e os arredores). • Assim, se uma pedra está no térreo ou no décimo andar de um prédio, isso diz respeito à energia externa (no caso, energia potencial gravitacional). E se a pedra está parada ou em movimento, isso diz respeito de novo à energia externa, na forma de energia cinética do corpo. De maneira geral, a energia externa não interessa nos estudos de físico-química. Energia interna, U • A energia interna, por outro lado, é de grande interesse na termodinâmica e na físico-química em geral. • A energia interna U tem relação com o movimento das partículas que compõem o sistema e às interações entre essas partículas. • Podemos particionar a energia interna em cinética e potencial: Energia interna, U • A rigor, não se pode conhecer o valor da energia interna de um sistema, pois seria preciso conhecê-lo em seus detalhes mínimos. • Que parcelas compõem a energia interna total? A energia cinética e potencial de cada partícula. E partícula, aqui, quer dizer cada uma das menores partículas, não simplesmente as moléculas ou átomos. Por enquanto não conhecemos a estrutura da matéria nos limites últimos. • Na discussão que fizemos anteriormente a respeito da energia como soma de parcelas translacionais, rotacionais e vibracionais, por exemplo, deixamos de lado a energia eletrônica e a energia nuclear (tanto a eletrosfera como o núcleo são descritos por estados quantizados de energia). Energia interna, U • Em nossos estudos sobre gases, em que não vamos mexer na estrutura da eletrosfera nem na do núcleo, podemos perfeitamente escrever a energia de uma molécula como onde o termo <ϵ0> é um termo desconhecido que contém a energia dos elétrons, do núcleo, e de tudo o mais que nossa análise não alcança. Energia interna, U • Nessa mesma linha de raciocínio, podemos escrever a energia interna de um gás monoatômico qualquer como e outras expressões semelhantes para os outros gases, onde o termo U0 = N<ϵ0> esconde as partes desconhecidas da energia interna, que consideramos como uma constante. Energia interna, U • As expressões que apresentamos até agora para a energia interna dependiam unicamente da temperatura T, U = U(T) • Isso é correto se as moléculas de nosso gás não têm forças de interação entre elas, pois nesse caso não existe energia potencial entre moléculas, e não faz diferença elas estarem distantes ou próximas umas das outras. • O gás ideal representa um gás em que as partículas não interagem apreciavelmente entre si. Por isso, a energia interna de um gás ideal é bem representada como U = U(T), uma função apenas da temperatura. Energia interna, U • Entretanto, sabemos que na realidade existem algumas interações fracas entre as moléculas. Se um gás está muito rarefeito, essas interações quase não tem efeito, porém em líquidos e gases densos, onde as moléculas estão muito mais próximas, essas interações tornam-se expressivas. • Portanto, o mais correto é escrever U como uma função também do volume U = U(T, V) • Com uma expressão desse tipo, a energia interna de sistema é diferente se as partículas estiverem distantes (V grande) ou próximas (V pequeno). (Também poderíamos escrever U como função de T e P, U = U(T, P) com a pressão desempenhando o papel de distinguir estados com partículas mais próximas ou mais distantes.) Capacidade térmica a volume constante: CV • Quando um sistema é mantido a volume constante, ele não pode realizar nem receber trabalho de expansão-compressão. Supondo que o sistema também não está envolvido em nenhuma outra forma de trabalho (elétrico, etc.), então q = ∆U e podemos escrever Capacidade térmica a volume constante: CV • Para um gás composto de moléculas que não interagem entre si, podemos escrever U como U = U(T) = U0 + Etr(T) + Erot(T) + Evib(T) (Normalmente podemos desconsiderar a Evib.) Como vimos anteriormente, os termos dependentes de T na equação acima aparecem como múltiplos de kBT. Colocando de uma forma bem sucinta, Capacidade térmica a volume constante: CV • Paraum gás composto de moléculas que não interagem entre si, podemos escrever U como U = U(T) = U0 + Etr(T) + Erot(T) + Evib(T) (Normalmente podemos desconsiderar a Evib.) Como vimos anteriormente, os termos dependentes de T na equação acima aparecem como múltiplos de kBT. Colocando de uma forma bem sucinta, f = um número igual a 3 em um gás monoatômico, 5 em um gás de moléculas lineares e 6 em um gás de moléculas não-lineares (desconsiderando a Evib). Capacidade térmica a volume constante: CV • Desse modo, a diferencial dU da energia interna do gás é e a derivada da energia interna em relação à temperatura é Capacidade térmica a volume constante: CV • Portanto, a capacidade térmica a volume constante CV de um gás ideal é o que nos dá, desconsiderando a parte vibracional, Capacidade térmica a pressão constante: CP • Quando mantemos um gás a pressão constante e fornecemos calor a ele, ocorre variação do volume, que aumenta à medida que o gás vai sendo aquecido. Ao expandir-se, o gás realiza trabalho contra a pressão externa. Essa energia transferida como trabalho é cedida pelo gás e recebida pelo meio externo. Então, a variação da energia inteira do gás é igual ao calor recebido menos esse P∆V que o gás dispende ao se expandir: • Naturalmente, como já vimos, o calor se converte a variação de entalpia em um processo a P constante. A expressão mostra claramente que o calor q recebido pelo gás em parte se acumula no gás (gerando o ∆U), e em parte vai virar trabalho (no termo P∆V). Capacidade térmica a pressão constante: CP • Dividindo ambos os membros da equação anterior pelo ∆T, temos mas esse é um CP médio. Quando ∆T torna-se infinitesimal, temos Capacidade térmica a pressão constante: CP • No caso em que o gás é ideal, U depende unicamente da temperatura, de modo que a derivada (∂U/∂T)P acima é igual a Além disso, para um gás ideal o termo P(∂V /∂T)P torna-se Capacidade térmica a pressão constante: CP • Inserindo os resultados, obtemos, para um gás ideal: Razão CP/CV • Em muitas aplicações é importante conhecer a razão entre a capacidade térmica a pressão constante e a volume constante. Essa razão é geralmente representada pela letra 𝜸: • Esta grandeza 𝜸 também é conhecida como índice adiabático. Para um gás ideal, a equação fornece de imediato o resultado:
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