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Direitos Básicos do Consumidor

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= UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ =
DIREITO DO CONSUMIDOR
PROF. ANA LECTÍCIA
AULA 4
TEMA: DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR I. Artigo 6º do CDC. Proteção da vida, saúde e segurança (Artigos 8º, 9º e 10 CDC). Educação do consumidor. Direito à informação. O consentimento refletido. A liberdade de escolha.
 
	Esses direitos básicos estão inseridos no artigo 6o do CDC. É uma síntese daquilo que o intérprete vai encontrar nos dispositivos de direito material e processual. 
Vamos falar do artigo 6o: Direitos Básicos do Consumidor.- direitos fundamentais, de referência do consumidor, tendo em conta que os princípios elencados nos artigos 4o e 5o do CDC agora vão se materializar em direitos básicos.
CONCEITO: “São aqueles interesses mínimos, materiais ou instrumentais, relacionados a direitos fundamentais universalmente consagrados que, diante de sua relevância social e econômica, pretendeu o legislador ver expressamente tutelados” (Sérgio Cavalieri Filho em Programa de Direito do Consumidor). É a “coluna dorsal” do CDC.
Segundo Hélio Zaghetto Gama (Curso de direito do consumidor, Ed. Forense, 2004, p.50) os direitos elencados no art. 6º do CDC são as linhas mestras do ideal a ser seguido na proteção das incolumidades física, psíquica e econômica dos consumidores, bem como certas garantias instrumentais, capazes de conferir efetividade à proteção jurídica do consumidor.
Importante observar que a enumeração do art. 6º é numerus apertus (rol meramente exemplificativo). Logo, existem outros direitos do consumidor disseminados pelo sistema.
	Tanto é assim que o art. 7o do CDC, que é uma norma de extensão, estende a aplicação da proteção ao consumidor também quando esta tutela estiver prevista em outra leis ordinárias (a exemplo do Novo Código Civil), em Convenções e Tratados Internacionais, ou mesmo em Portarias Administrativas. 
“Art. 7º - Os direitos básicos previstos neste Código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades adminsitrativas competentes, bem como os que derivam dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.” 
Como se vê, as fontes do direito do consumidor são múltiplas e variadas, não se esgotando no rol do art. 6º do CDC.
ANÁLISE ESPECÍFICA DO ROL LEGAL DOS DIREITOS BÁSICOS DO ART.6º:
I - “a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;” (the right to safety)
Vida, saúde e segurança são bens jurídicos inalienáveis e inafastáveis do princípio constitucional maior da dignidade da pessoa humana.
O propósito do inciso foi proteger a incolumidade física dos consumidores, harmonizando-se com a regra do caput do art. 4º, que impõe respeito à dignidade, à saúde e à segurança do consumidor. Logo, não basta que os produtos e serviços sejam simplesmente adequados aos fins a que se destinam (qualidade-adequação); é preciso que sejam seguros (qualidade-segurança). 
Trata-se do dever de segurança atribuído aos fornecedores: este procura garantir que os produtos colocados no mercado de consumo não acarretem riscos à vida, saúde ou segurança do consumidor. 
Então, o dever de segurança é um direito que se traduz na tutela da incolumidade física – psíquica – econômica do consumidor.
	É um direito fundamental – que vai sofrer desdobramentos, nos artigos 8o, 9o e 10 do CDC.
	O artigo 8o diz que os produtos ou serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos a saúde e a segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis – que são os chamados riscos inerentes (que seriam aqueles produtos potencialmente perigosos, de acordo com a natureza deste produto e sua fruição – obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar informações necessárias e adequadas a seu respeito). Exemplo: remédios, produtos agrícolas. Neste caso, o dever de segurança já está mitigado, mas não o dever de informação, que deve ser reforçado para evitar danos.
	Daí a necessidade de advertências, de sinais ostensivos, de informações precisas, nos rótulos, embalagens, nos invólucros, nos recipientes, nas peças publicitárias e nos locais onde são desenvolvidos serviços potencialmente perigosos. Assim também dispõe o parágrafo único do artigo 8o do CDC: “Em se tratando de produtos industriais, ao fabricante (e não ao fornecedor) cabe prestar as informações a que se refere esse artigo, através de impressos apropriados que devam acompanhar o produto”.
	Importante perceber que esse princípio da incolumidade física-psíquica do consumidor vai sofrer um desdobramento também na parte penal do CDC. Ele também se transforma no tipo penal dos artigos 63 do CDC: “ omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos nas embalagens, invólucros, recipientes ou publicidade”. Pena: detenção de seis meses a dois anos ou multa. O sujeito ativo desse crime é o fornecedor. Incorrerá nas mesmas penas ( mediante informações escritas e ostensivas) quem deixar de alertar sobre a periculosidade do serviço a ser prestado. Se o crime é culposo, detenção de 1 a seis meses ou multa. 
A informação tb é ressaltada na previsão do artigo 9o : “o fornecedor de produtos ou serviços potencialmente nocivos ou perigosos a saúde e a segurança deverá informar de maneira ostensiva e adequada a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto”. 
	Já o artigo 10 do CDC trata da teoria do risco do empreendimento que diz que o fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de periculosidade ou nocividade a saúde ou segurança. 
	O § 1º traz um dever pós-contratual, uma vez que o fornecedor de produtos ou serviços que, posteriormente a sua entrada no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade deverá comunicar o fato, imediatamente, as autoridades e aos consumidores mediante o chamado RECALL (chamamento: chamar de volta do mercado produtos imprestáveis – nocivos ou perigosos – de modo a possibilitar o conserto do vício e/ou ressarcir o consumidor por eventuais danos). Aqui a periculosidade foi detectada após o produto ser lançado no mercado. 
	Os anúncios do RECALL serão veiculadas na imprensa, às expensas do fornecedor do produto ou serviço, ou seja, é ele que arca com o pagamento da contrapropaganda. Sempre que tiverem conhecimento da periculosisdade de produtos ou serviços a saúde ou segurança dos consumidores a União, os Estados o Distrito Federal e os Municípios, igualmente, deverão informar a respeito, sob pena de responder judicialmente por sua inércia. O princípio da informação é tb dever dos entes federados.
	Sobre o tema, registre-se o crime previsto no artigo 64 do CDC: “deixar de comunicar a autoridade competente aos consumidores a nocividade ou periculosidade do produto cujo conhecimento seja posterior a sua colocação no mercado”. Ou seja: deixar de fazer o chamamento. A detenção é de 6 meses a 2 anos e multa. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente, os produtos acima referidos. 
Em relação ao RECALL a pergunta é a seguinte: O RECALL retira a responsabilidade do fabricante por defeito do produto? 
Segundo a jurisprudência, ele não é excludente da responsabilidade objetiva do fornecedor sobre danos provenientes dos vícios ou defeitos de tais produtos e serviços, devendo responder nos exatos termos do art. 12 e ss do CDC, inclusive o conserto deve ser feito de forma gratuita.
O STJ já decidiu acerca do recall:
a) Não considerou culpa concorrente o fato do consumidor não ter atendido ao recall (vide REsp 1010392/RJ, 3.ª T, 13/05/2008);
b) Não cabe dano moral pelo simples fato de o fornecedor “chamar” o consumidor para sanar o vício do produto (Vide Informativo 274, AgRg no AG 675.453-PR, 14/02/2006).
	
	Veja a superproteção que o legislador conferiu a esse princípio da incolumidade física – psíquica., colocando-o como princípio ( artigo 8o), como direito básico e também colocando tipos penais para ele. Você não pode ter um produto que lhe faça mal. A pílula anticoncepcional de farinha que lançaram no mercado brasileiro – a Talidomida – que gerou anomalia no recém – nascido, enfim, todos os danos causados por tais produtos já foram devidamente indenizados em juízo, uma vez que causaram danos enormes aos consumidores, por violarem o dever de segurança, isto é, foram colocados no mercado de consumo com defeito. 
Quando tratarmos da responsabilidade civil nós discutiremos sobre a possibilidade ou não no direito brasileiro da teoria do risco do desenvolvimento. Isso porque quando o CDC fala em seus artigos 8o e 9o sobre o sabe ou deveria saber ser perigoso o produto, nós estaremos aí tratando, por exemplo, dos transgênicos (algo que não sabemos, por não possuirmos conhecimentos científicos, se são ou não perigosos). Um acidente de consumo (= fato do serviço) é uma infringência desse direito básico contido no artigo 6o, I do CDC – que é atingir essa incolumidade física- psíquico – econômica do consumidor. 
Então, se você atingiu, por força de um produto, a segurança jurídica do consumidor você terá que indenizar (obrigação de indenizar é sinônimo de responsabilidade civil: art.927 do CC e arts. 12 e 14 do CDC). 
II - “a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha (right to choose) e a igualdade nas contratações;”
O inciso II do artigo 6o fala da educação e a divulgação sobre o consumo adequado de produtos e serviços, assegurada a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações.
Partimos da premissa segundo a qual o consumidor é o sujeito vulnerável na relação de consumo e um dos motivos para tanto é a sua condição de não profissional, de não ser detentor das informações a respeito do produto ou serviço disponibilizado no mercado.
Por isso, ele não é capaz de formular, previamente, um refletido juízo de oportunidade e conveniência da contratação, do seu efetivo custo-benefício, da sua real utilidade. Assim, sua manifestação, muitas vezes, não é refletida, esclarecida ou consciente.
Atento a isso, o legislador estabeleceu como direito básico à educação para o consumo, pois aumentando o nível de conhecimento e informação do consumidor, na mesma proporção se aumenta o seu poder de reflexão e juízo crítico sobre a contratação.
Tal direito envolve dois aspectos: o formal (inserção de temas realcionados ao direito do consumidor nos currículos esclares, desde o ensino fundamental, nas escolas públicas e privadas, bem como a disciplina nas universidades, pois como se sabe a educação é um direito de todos e um dever do Estado, nos termos do art. 205 da CF) e o informal (por meio dos veículos de comunicação em massa social ou institucional, prestando informações, orientações e esclarecimentos aos consumidores).
O direito à liberdade de escolha tem ligação com os princípios constitucionais da livre iniciativa e da liberdade de concorrência, e visa permitir ao consumidor só adquirir produtos que venham a efetivamente atender às suas necessidades, sendo vedada a imposição de contratação, a exemplo da prática vedada de venda casada de produtos e/ou serviços, consoante art. 39, I, do CDC.
Por fim, o direito à igualdade nas contratações deve ser encarado num duplo aspecto: tanto nas relações dos consumidores com os fornecedores (sinalagma das contratações – equilíbrio econômico-financeiro), quanto aos consumidores entre si, pois não é admissível a diferenciação de consumidores (art. 5º, caput da CF) ,devendo fornecer as mesmas condições para todos os consumidores (ex. Vedada a diferenciação de preços para diferentes formas de pagamento, por cheque ou dinheiro ou cartão de crédito), salvo as diferencições admitidas por lei (gestantes, crianças, etc).
III - “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;” (right to be informed)
	O inciso em epígrafe versa sobre A INFORMAÇAO ADEQUADA E CLARA sobre os diferentes produtos e serviços (com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço; bem como sobre o risco que apresentam – ambos – tratam do princípio da transparência e que vai sofrer o desdobramento no artigo 31 (quando fala de práticas comerciais na oferta) e também vai ter um tipo penal do artigo 66 do CDC.
Tal tipo penal diz o seguinte: “Fazer informação falsa ou enganosa ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço de produtos e serviços”. 
Existe verdadeiro direito à informação e, por outro lado, dever de informar a cargo dos fornecedores, pois são esses os detentores do processo produtivo, sabem o que produziram, como e para quem, aspectos em que o consumidor é absolutamente vulnerável.
Tal direito à informação tem por finalidade garantir ao consumidor o exercício do direito à uma escolha consciente, diminuindo os riscos de uma contratação inútil e gerando maiores chances de alcançar suas legítimas expectativas.
 A abrangência deste direito básico à informação permeia todas as fases da contratação – antes, durante e depois de findo o contrato (ex. Recall, art.10,§1º, CDC). 
Vamos agora analisar o inciso IV do artigo 6o do CDC, que também trata do princípio da informação: é direito básico do consumidor a proteção contra publicidade (art.37) enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais; bem como contra a prática de cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos ou serviços. 
Esse tema será abordado com mais detalhes na aula própria específica para a análise da publicidade enganosa e abusiva, bem como na aula acerca da proteção contratual com a vedação das chamadas cláusulas abusivas (art. 51, CDC).
Obs.) Exemplo prático: danoninho vale por um bifinho. Foi considerada uma publicidade enganosa. Saiu do ar: não vale o peso nutricional de um “bifinho”. O mesmo no que tange a propaganda das HAVAIANAS que soltavam tinta e deixavam cheiro, ao contrário do que ia ao ar. Foram retiradas do ar pela enganosidade. 
Tal publicidade dá informação inverídica – que potencializa o erro do consumidor: a se comportar de forma prejudicial a sua saúde e segurança. Pergunta-se:
Pode ter publicidade de cigarro ou de cerveja? Pelo CDC, seguindo a letra da lei, todas são abusivas porque incitam o consumidor a consumir um produto contra a sua segurança, ou seja, produtos que incontestavelmente lhe acarretarão danos à saúde, porém seguindo a CF de 1988, ainda é permitida a comercialização de tais produtos, desde que haja advertência ostensiva acerca de seus malefícios.

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