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_______________________________________________ Curso de Pós-Graduação em Docência Superior Dharana Ventura Cavalheiro NOVA ESTRUTURA CURRICULAR PARA O ENSINO SUPERIOR DE TECNOLOGIA Monografia apresentada à AVM Faculdade Integrada como exigência parcial à obtenção do título de Especialista em Docência Superior Sob a orientação da Professora Ms. Aline Sampaio de Oliveira Rio de Janeiro–RJ 2015 Dedico esse trabalho ao meu Avô, Valentim Ventura Filho (In Memoriam). Mestre, Poliglota, Autodidata com três formações superiores, crescido na extinta FEBEM, filho mulato de escrava alforriada. Ser humano íntegro e genial, que lecionou para detentos de um presídio no Rio de Janeiro, para a juventude “Tijucana”, e em seu próprio Curso Preparatório. Homem de bem que me inspirou na busca incessante pelo conhecimento, que me ensinou que através do saber a aprender nós podemos evoluir e, principalmente, ajudar a todos. AGRADECIMENTOS Agradeço ao meu marido Márcio e minha mãe Nena, aos meus três amados filhos, Pedro, Lucas e Mariana, por compreenderem minha ausência e me apoiarem. Aos Mestres que me auxiliaram no processo de aprendizagem deste curso e especialmente a Mestre Anna Maria Napoli pela sua dedicação, compreensão e auxílio em todos os momentos, tornando o curso EAD com a sensação de presencial. Ao meu eterno Mestre de graduação, Antônio Junior, por ser uma inspiração em docência, conhecimento e humanidade. Aos colegas professores e alunos que participaram das minhas pesquisas e questionários, colaborando com boa vontade mesmo com a vida atribulada de tarefas. Ao Universo que conspirou ao meu favor e ao Nosso Criador Deus e seu filho, Mestre Jesus. EPÍGRAFE “A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê”. (Arthur Schopenhauer) RESUMO Este trabalho tem o objetivo de promover a reflexão sobre uma nova estrutura curricular organizada por meio de situações reais no ensino superior tecnológico, como uma forma de contribuir para o aumento do interesse do aluno adulto, e gerar valor para nossa sociedade que anseia por melhores condições de vida e credita na educação a responsabilidade de resolver essas questões. Levou-se em consideração a evolução histórica, conceitos básicos sobre currículo, teorias curriculares, transdisciplinaridade, andragogia, bem como a atuação docente no processo de ensino-aprendizagem e fatores mercadológicos da profissão, que foram apresentados através de aprofundamento teórico desta pesquisa. Utilizou-se a metodologia de pesquisa qualitativa através de coleta de dados, observação e questionário estruturados com o portal de internet SurveyMonkey. Palavras-chave: Ensino Superior Tecnológico, Organização Curricular, Transdisciplinaridade, Andragogia. ABSTRACT This work aims to promote reflection on a new curricular structure organized through real situations in higher technological education, as a way of contributing to the increased interest of the learner, and create value for our society that longs for better conditions life and credits in education a responsibility to address these issues. It took into account the historical development, basic concepts about curriculum, curriculum theories, transdisciplinary, andragogy and the teaching practice in the teaching-learning process and market factors of the profession, which were presented through theoretical development of this research. We used the qualitative research methodology through data collection, observation and questionnaire structured with SurveyMonkey. Keywords: Technological Higher Education, Curriculum Organization, Transdisciplinarity, Andragogy Lista de Ilustrações Figura 1 Escola .............................................................................................................. 25 Figura 2 Aluno ................................................................................................................ 25 Figura 3 Professor .......................................................................................................... 26 Figura 4 Ensino Aprendizagem ...................................................................................... 26 Figura 5 Percentual de Docentes por Rede de Ensino .................................................. 45 Figura 6 Percentual de Docentes favoráveis ao Tema ................................................... 46 Figura 7 Área de Conhecimento ..................................................................................... 46 Figura 8 Fatores que podem motivar o Aluno ................................................................ 50 Figura 9 Cursos dos Entrevistados ................................................................................ 51 Lista de Tabelas e Quadros Quadro 1 Características das Teorias Curriculares ........................................................ 20 Quadro 2 Princípios Básicos da Andragogia (Wikipedia, 2015) ..................................... 28 Quadro 3 Pedagogia x Andragogia ................................................................................ 28 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 9 CAPÍTULO 1 CURRÍCULO ........................................................................................ 13 1.1 Evolução Histórica ............................................................................................. 14 1.2 Teorias Curriculares .......................................................................................... 15 1.3 Componente Curricular e Disciplinaridades ...................................................... 20 CAPÍTULO 2 ANDRAGOGIA E HEUTAGOGIA ......................................................... 24 2.1 Processo de Ensino Aprendizagem .................................................................. 24 2.2 Andragogia e Heutagogia .................................................................................. 27 2.3 Relação com uma nova estrutura Curricular ..................................................... 30 CAPÍTULO 3 ATUAÇÃO DOCENTE ......................................................................... 32 3.1 A Ação Docente ................................................................................................ 32 3.2 Tecnologia atual ................................................................................................ 34 3.3 Motivação e Aprendizagem ............................................................................... 35 3.4 Mercado de Trabalho ........................................................................................ 36 CAPÍTULO 4 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR POR MEIO DE SITUAÇÕES ............ 38 4.1 Fatores para nova estrutura .............................................................................. 38 4.2 Legislação ......................................................................................................... 40 4.3 Tendências Atuais ............................................................................................. 42 4.4 Apresentação da Coleta e Análise de Dados da Pesquisa ............................... 44 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 52 REFERÊNCIAS .............................................................................................................55 ANEXO A ............................................................................................................. 66 ANEXO B ............................................................................................................. 67 ANEXO C ............................................................................................................. 69 9 INTRODUÇÃO Tema Nova Estrutura Curricular para o Ensino Superior de Tecnologia permeada de ação humana e princípios éticos promovendo o interesse do educando em aprender e inovar tendo como mediador o docente que o respeite como indivíduo único e em formação. Problema É possível despertar o interesse do educando do curso superior de tecnologia em aprender e inovar, através de uma nova estrutura curricular organizada por meio de situações reais, a fim de gerar valores para a sociedade em que vive? Objetivos Objetivo geral Propor uma nova estrutura curricular para o Ensino Superior Tecnológico, trazendo à reflexão o confronto entre a estrutura curricular tradicional, organizada por disciplinas e uma nova estrutura curricular, organizada por meio de situações. 10 Objetivos específicos Apresentar evolução histórica, conceito e teorias acerca de Currículo e identificar fatores que justifiquem a necessidade de reorganização curricular. Entender o processo de ensino-aprendizagem em adultos através do conceito de Andragogia e Heutagogia relacionando-os à aplicação de uma nova estrutura curricular para promover o sucesso do discente. Verificar como o professor universitário pode aplicar positivamente um novo modelo de currículo, formando egressos capazes de agregar inovação e transformação para sociedade atual. Demonstrar um modelo de estrutura curricular baseado em educação por meio de situações de acordo com estudos realizados e aplicados em outros países e no Brasil, considerando a legislação vigente e os Planos Nacionais de Educação. Justificativa Este estudo foi originado através de experiências pessoais, durante minha trajetória acadêmica e profissional e o desejo latente de ser um indivíduo transformador capaz de fazer a sua parte para mudar o mundo através da paz, compreensão e amor. Diante das observações realizadas, concluí que no decorrer do período acadêmico as dissociações entre o ensino e a realidade e fragmentação das disciplinas, dificultam o processo de aprendizagem do educando e não conseguem promover o interesse em aprender. E, quando egressos, chegam a seus primeiros empregos, com conteúdo teórico e ações humanas deficientes, com um grande abismo em relação à realidade profissional que 11 acabam, por vezes, conduzindo suas carreiras de forma insatisfatória e sem inovações para a sociedade. Compreender a problemática, contextualizá-la e propor uma nova estrutura curricular considerando conceitos de “inter” e “transdisciplinaridade” para produzir conhecimento e formação aos discentes de forma que possam transformar, positivamente, nossa sociedade é objeto deste estudo. Também pretendo promover a reflexão sobre o conceito de educação como mercadoria como fator impeditivo para uma nova proposta para estrutura curricular do ensino superior tecnológico, que possibilite aos alunos aprenderem a pensar de forma crítica sobre a sociedade atual através de valores humanos, éticos e pacíficos. Entende-se que este estudo tem legítima importância para a comunidade acadêmica do ensino superior tecnológico e para a sociedade. Trazendo à reflexão o confronto entre a estrutura curricular convencional e uma nova estrutura curricular, por meio de situações. Espera-se que uma reorganização curricular pautada em conceito interdisciplinar e transdisciplinar possam agregar inovação e habilidades cognitivas e emocionais, à formação dos educandos. Portanto, percebe-se uma oportunidade sintonizada às demandas sociais, econômicas e culturais. Metodologia Com base na afirmação de Flick (2004), a abordagem teórica qualitativa pode ser sintetizada em três posturas referentes à forma de compreensão do objeto de estudo e foco metodológico: o estudo dos significados atribuídos às atividades e ambientes pelos indivíduos; a elaboração das realidades sociais; e as posturas estruturalistas ou psicanalíticas, que partem de processos do inconsciente psicológico ou social. O estudo desta pesquisa qualitativa deve estar centrado no problema e contextualizado não só nos resultados extraídos dos acontecimentos cotidianos, mas principalmente na literatura produzida sobre o tema Currículo na Educação. Utiliza-se, nesta pesquisa, a observação do comportamento que ocorre naturalmente no âmbito real e perguntando às pessoas sobre o seu comportamento e seus estados 12 subjetivos diante do problema da pesquisa, através de questionários voltados aos docentes e discentes de cursos de Ensino Superior Tecnológico. A pesquisa terá como base os estudos realizados por Alice Lopes, Willian Pinar. Tyler, Antônio Flávio Moreira, W. H. Schubert sobre Currículo e suas Teorias, Ivani Fazenda sobre Interdisciplinaridade, José Carlos Libâneo e Ubiratan D'Ambrosio sobre Transdisciplinaridade, Malcolm Knowles sobre Andragogia, Paulo Freire sobre Pedagogia e Claudio Romualdo a respeito de aprendizagem e educação, entre diversos outros autores estudiosos do tema. 13 CAPÍTULO 1 CURRÍCULO Propor uma nova estrutura curricular para o Ensino Superior de Tecnologia que sugira um modelo organizado por meio de situações reais, aproximando a construção do conhecimento da vida real de forma a despertar no aluno interesse legítimo pela aprendizagem, é um grande desafio, porém, é factível de acordo com a expressão: “A reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação Teoria/Prática” (FREIRE, 2007, p. 22), logo a prática deve ocorrer no estado real dos acontecimentos. A importância que embasa o objeto desta pesquisa está no fato de que é necessidade universal o estudo do problema em motivar e aumentar o interesse do aluno do Ensino Superior de Tecnologia, visto que a atual estrutura curricular ainda promove a distância entre teoria e a prática ao apartar a aprendizagem da realidade em que vive o indivíduo. Na educação de adultos, o currículo deve ser constituído em função da necessidade do estudante. A fonte de maior valor na educação de adultos é a experiência do aprendiz. Se a educação é vida, vida é educação; portanto, a aprendizagem consiste na substituição da experiência e nos conhecimentos da pessoa... (ROMUALDO, 2002, p.110). Partindo desta citação, podemos entender que a educação do adulto deveria se dar por meio de situações e não por disciplinas. E por ser sujeito deste estudo o aluno adulto, observa-se que na educação superior podemos fazer uso do conceito de andragogia, pois .... Fornecem ao adulto a possibilidade de escolher o que quer aprender e de que forma, e isso é essencial no panorama de hoje. Afinal, o foco nas reais necessidades de aprendizado se tornou menos óbvio diante de milhares de possibilidades de acesso a qualquer tipo de conteúdo... (KNOWLES, 2011, p.13). É importante demonstrar o conceito de que ensinar exige apreensão da realidade (FREIRE, 1996, p.41), e que, através de uma estrutura curricular moldada pela realidade e necessidade do egresso, tem-se a oportunidade de construir conhecimento e cidadãos inovadores e transformadores para nossa sociedade. Partindo do conceito de “Currículo” através da sua evoluçãohistórica, é possível perceber que seu conceito se modifica de acordo com o momento histórico e as dimensões sociais, 14 políticas, econômicas e culturais da sociedade em cada período, formulando teorias que serão descritas neste capítulo. 1.1 Evolução Histórica Etimologicamente, o termo Curriculum, do Latim, significa caminho, percurso, trajeto, que segundo Goodson (1995, p.7), deriva da palavra latina currere, que significa correr, porém o currículo é tratado, neste estudo, no âmbito educacional e por isso considera-se pertinente o que diz Sacristan (1999, p.36) sobre a definição de currículo como sendo Um projeto seletivo de cultura, cultural, social, política e administrativamente condicionado, que preenche a atividade escolar e que se torna realidade dentro das condições da escola tal como se acha configurada” e ainda como “ligação entre a cultura e a sociedade exterior à escola e à educação; entre o conhecimento e cultura herdados e a aprendizagem dos alunos; entre a teoria (idéias, suposições e aspirações) e a prática possível, dadas determinadas condições (SACRISTAN, 1999, p.61). Imergindo na história, no século XIII não existia organização curricular, o ensino possuía base religiosa e “teriam que ser a eles impostos por um processo de rígida disciplina” (SCHUBERT, 1986, p. 61). A partir do século XIV até o século XVII, passa-se a considerar, também, as experiências de vida e a observação dos acontecimentos para compor o currículo de ensino. No final do século XVIII, a Fé é substituída pela Razão, pelo estudo científico e pela experiência, que perdura até o final do século XIX, quando inicia uma nova mudança que culmina no século XX, com movimentos Tecnicistas e Progressistas, provocando a ruptura com o conceito de currículo humanista do início do século XIX. Segundo Silva (1999, p.24), na concepção de Bobbitt, O precursor do Movimento Tecnicista, A questão do currículo se transforma numa questão de organização. O currículo é simplesmente uma mecânica. A atividade supostamente científica do especialista em currículo não passa de uma atividade burocrática. (...) o currículo se resume a uma questão de desenvolvimento, a uma questão técnica. O estabelecimento de padrões é tão importante na educação quanto, digamos, numa usina de fabricação de aços, pois, de acordo com Bobbitt, a educação, tal 15 como a usina de fabricação de aço é um processo de moldagem (SILVA, 1999, p. 24). Nesse cenário, Ralph Tyler, seguindo os pressupostos de Bobbitt, tem caráter determinante na definição do que conhecemos sobre currículos hoje, pois possuía como princípio, os objetivos comportamentais para atender as necessidades de desenvolvimento econômico de base industrial. Observa-se na obra de Tyler (1977), uma preocupação com o desenvolvimento social e melhor qualidade de vida, porém “não reflete a necessidade de criação de uma sociedade que não seja capitalista”, de acordo com Moreira (1990, p.54). É possível perceber através de Tyler (1977) que o objetivo inicial da organização por disciplinas, com o aprendizado hierarquizado em series, desconsiderando a individualidade do ser, era atender a necessidade de preparar em menor tempo visando fatores econômicos e esse movimento perdura até meados dos anos 80, inclusive no Brasil. Após esse período, surgem vários grupos baseados nos movimentos relacionados à igualdade das mulheres, dos negros, dos homossexuais entre outros, considerados como “minoria” que trazem o tema Currículo a uma nova discussão que visava a necessidade de que este fosse “voltado aos problemas sociais, econômicos e políticos da realidade que refletisse uma sociedade menos capitalista” (GESSER, 2002, p.75). Observa-se que muitas mudanças curriculares ocorreram ao longo da história e mais uma vez vive-se um momento de transformação social, cultural e econômica e essa síntese de revisão histórica do currículo, sugere que é possível uma nova estrutura curricular para o Ensino Superior Tecnológico, visto que está em constante busca de adequação à melhores condições de ensino, de qualidade, de política e de vida. 1.2 Teorias Curriculares 16 Durante a evolução histórica do tema currículo, pode-se identificar a definição de três teorias: a Teoria Tradicional, apresentada por Bobbitt e Tyler, a Teoria Crítica que é vista através de Freire e Bernstein com a definição de currículo oculto, Pinar enfatizando “os significados subjetivos que as pessoas dão às suas experiências pedagógicas e curriculares” (SILVA, 1999, p. 38), Saviani que inicia a crítica da crítica, realizando aprofundamento dos estudos de Freire entre outros e a Teoria Pós Crítica, estudada e apresentada por Moreira, Tomas Tadeu da Silva, Focault e Michael Young. 1.2.1 Teoria Tradicional A Teoria Tradicional é tendência durante o início do período histórico do currículo até o início do século XX e têm como principais referências Bobbitt e Tyler com seu modelo tecnocrático e John Dewey com seu modelo progressista. Para Tyler (1977) a finalidade da educação era definida pelas exigências profissionais da vida adulta, a organização do currículo era feita por especialistas, consolidando as ideias de Bobbitt. Tyler (1977) centrava o currículo de ensino em quatro questões básicas no processo de construção curricular, sendo elas: Objetivos: Que objetivos educacionais a escola deve procurar alcançar? Experiências: Como selecionar experiências de aprendizagem que possam ser úteis na consecução desses objetivos? Eficiência: Como podem ser organizadas as experiências de aprendizagem para um ensino eficaz? Avaliação: Como se pode avaliar eficácia de experiências de aprendizagem? 17 De acordo Tyler, o papel do professor na elaboração do currículo, se restringe a atuar no que foi definido pelas comissões revisoras especiais, sendo a elaboração do currículo empreendida para uma só disciplina, por um determinado professor (1977, p.119). É com base nessa teoria que a seleção do conteúdo do currículo é determinada por quem detém o poder e é tratada como verdade absoluta, onde o professor transmite conhecimento e o aluno apenas o absorve. No modelo progressista de John Dewey, a educação, a filosofia e a ordem social constituem um todo indissociável (DEWEY, 1938). Dewey assume que através da experiência se adquire o conhecimento, porém nem toda experiência adquirida resulta em um aprendizado positivo, logo é possível perceber que uma experiência eventualmente poderá resultar em desmotivação. Ainda segundo Dewey a organização curricular deve ter dois princípios básicos: primeiro a experiência como aspecto do aprendizado, e segundo que as experiências são progressivas, pois a partir de uma se adquire um entendimento elevado que permite que uma posterior mais complexa seja possível de ser entendida e analisada, portanto as matérias anteriores devem se conectar com as posteriores através da conexão das experiências (DEWEY, 1938). Observa-se neste modelo que por ser centralizado, não abrange em sua totalidade a diversidade sócio cultural. 1.2.2 Teoria Crítica A Teoria Crítica surge como fator de desconfiança, questionamento e transformação, é antagônica a Teoria Tradicional e é comumente associada à Escola de Frankfurt, abordando a educação como caminho para eliminação da desigualdade social de acordo com Saviani (2007). Horkheimer determina que a teoria crítica 18 Tem como objeto os homens como produtores de todas as suas formas históricas de vida. As situações efetivas, nas quais a ciência se baseia, não sãopara ela uma coisa dada, cujo único problema estaria na mera constatação e previsão segundo as leis da probabilidade. O que é dado não depende apenas da natureza, mas também do poder do homem sobre ele. Os objetos e a espécie de percepção, a formulação de questões e o sentido da resposta dão provas da atividade humana e do grau de seu poder. (HORKHEIMER, 1968, p.163) A teoria crítica, utiliza-se de pressupostos do Marxismo para justificar o funcionamento da sociedade e nesse aspecto a preocupação de seus defensores está centrada em entender a cultura como elemento de transformação da sociedade. Outro fator é a utilização da psicanálise para explicar a formação do indivíduo, pois de acordo com Gesser (2002, p.78), “Apple em seu livro Ideologia e Currículo (1979) define o currículo oculto em termos do conceito de hegemonia e o vincula como o resultado da transmissão social e política do status quo”, ou seja, as disciplinas setoriais desviam a compreensão da sociedade como um todo sendo então submetidos à razão instrumental. Nesse contexto, Freire defende a dialética que se dá no sentido de entender os fenômenos estruturais da sociedade. Logo, tem-se Pedagogia Crítica ou Radical conectada com movimentos de justiça social, uma filosofia educacional descrita por Henry Giroux (1986) como um "movimento educacional, guiado por paixão e princípio, para ajudar estudantes a desenvolverem consciência de liberdade”. Na Teoria Crítica, Freire representa um dos mais influentes educadores críticos e em seus textos defende a habilidade dos estudantes de pensar criticamente, o que os permite “reconhecer conexões entre seus problemas individuais, experiências e o contexto social em que eles estão imersos” (FREIRE, 1985, p.35). Para Freire, “a práxis envolve o engajamento em um ciclo de teoria, aplicação, avaliação, reflexão e de volta à teoria” (FREIRE, 1984, p.125). Assim diante deste estudo, na Teoria Crítica do currículo sugere que este deve estar comprometido com a formação de consciência crítica na busca por sentidos para a aprendizagem na experiência histórica e no compromisso político com a transformação social. 19 1.2.3 Teoria Pós Crítica A Teoria Pós Crítica, também chamada de crítica da crítica, tem em sua discussão fatores que vão além da desigualdade social, pois “passa a dispor das dimensões de gênero, raça, etnia, sexualidade” (SILVA, 1999, p.16). Segundo Michel Foucault (1979), um dos estudiosos da Teoria Pós Crítica, "todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo”. Foucault é extensamente estudado por Moreira e por Silva, que no campo curricular destaca “o abandono das grandes narrativas; a descrença em uma consciência unitária, homogênea, centrada; a rejeição da ideia de utopia; a preocupação com a linguagem e com a subjetividade; a visão de que todo o discurso está saturado de poder; a celebração da diferença” (MOREIRA, 2001, p. 10). Questionando estes pressupostos, Young (2010, p. 73) argumenta que, “ao reduzir o conhecimento a pontos de vista particulares, o pós- modernismo segue uma lógica redutora que polariza o conhecimento dominante contra as vozes ausentes ou silenciosas que este exclui”. Percebe-se então, que o cerne da questão está no poder, que não tem mais um único centro, está espalhado por toda a rede social. É possível verificar na literatura que existem fundamentos que são contrários, de acordo com Alice Lopes quando afirma que “não apenas existem diferenças entre os focos dos vários estudos pós-críticos, mas também há registros teóricos nessas vertentes que se opõem entre si” (LOPES, 2013, p.11). Lopes representa a concepção de transformação social através da política de currículo quando afirma que a “transformação social como um projeto do currículo é pensada considerando que a política de currículo é um processo de invenção do próprio currículo e, com isso, uma invenção de nós mesmos” (LOPES, 2013, p.21). 20 Para visualizar os conceitos das teorias citadas, tem-se um quadro adaptado e elaborado a partir da lista de conceitos identificados por Silva (1999, p.12). Para Silva é a característica “poder” que separa as teorias tradicionais das teorias críticas e pós-críticas do currículo. Quadro 1 Características das Teorias Curriculares TEORIAS TRADICIONAIS TEORIAS CRÍTICAS TEORIAS PóS.CRíTICAS ensino ideologia identidade, alteridade, diferença aprendizagem reprodução cultural e social subjetividade avaliação poder significação e discurso rnetodologia classe social saber-poder didática capitalismo representação organização relações sociais de produção cultura planejamento conscientização gênero, raça, etnia, sexualidade eficiência emancipação e libertação multiculturalismo objetivos currículo oculto resistência Fonte: Adaptado de Silva 1999, p.16/17. 1.3 Componente Curricular e Disciplinaridades Disciplinaridade é apresentada neste estudo, como componente curricular, cujo significado etimológico é a soma de disciplinas. O objetivo é compreender sua importância e contribuir para reflexão sobre uma nova estrutura curricular. Entende-se que é necessário conhecer o conceito das dimensões multi, pluri, inter e trans, que determinam a interação entre as áreas de conhecimento ou campos de saber. A respeito de disciplinaridades, tem-se a afirmativa de Olga Pombo, quando diz que 21 A palavra é, pois, ampla demais, que está a ser banalizada, aplicada a um conjunto muito heterogéneo de situações e experiências. E esta utilização excessiva gasta a palavra, esvazia-a, tira-lhe sentido (POMBO, 2004, p.5). Por tanto, de acordo com Pombo, não é possível apresentar uma definição precisa, porém apresenta de forma etimológica o seguinte pressuposto em relação aos termos Multidisciplinaridade, Pluridisciplinaridade, Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade: Disciplinas que se pretendem juntar: multi, pluri, a ideia é a mesma: juntar muitas pô-las ao lado uma das outras. Ou então articular, pô-las inter, em inter-relação, estabelecer entre elas uma acção recíproca. O sufixo trans supõe um ir além, uma ultrapassagem daquilo que é próprio da disciplina (POMBO, 2004, p.5). Na tentativa de facilitar a compreensão, Pombo ainda categoriza esses termos em três níveis, O primeiro é o nível da justaposição, do paralelismo, em que as várias disciplinas estão lá, simplesmente ao lado umas das outras, que se tocam, mas que não interagem. Num segundo nível, as disciplinas comunicam umas com as outras, confrontam e discutem as suas perspectivas, estabelecem entre si uma interacção mais ou menos forte; num terceiro nível, elas ultrapassam as barreiras que as afastavam, fundem-se numa outra coisa que as transcende a todas (POMBO, 2004, p.6). Diante do exposto por Pombo, consegue-se verificar que apenas a Transdisciplinaridade, por seu caráter de “ir além” e de “fundir-se numa outra coisa” atende a perspectiva de uma nova estrutura curricular por meio de situações, sem disciplinas. A afirmativa ocorre porque, de acordo com os textos de Pombo (2004, p.10), “A ciência começa a aparecer como um processo que exige também um olhar transversal... assim sendo, a interdisciplinaridade... É qualquer coisa que se está a fazer quer nós queiramos ou não”, por isso torna-se cabível conhecer um pouco mais sobre esses dois termos. 1.3.1 Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade De acordo com Mariana José, Lenoir (1998) categoriza a interdisciplinaridade a partir de “quatro finalidades:científica, escolar, profissional e prática, que são organizadas a partir 22 dos objetivos que se deseja atingir”. Desta forma, por tratar-se do tema relacionado à educação, entende-se que o objetivo interdisciplinar escolar é o foco principal. Este objetivo está compreendido em três níveis, sendo eles curriculares, didáticos e pedagógicos. A percepção dos níveis da interdisciplinaridade escolar poderia ser repensada em três planos de aprendizagem: “a disciplina no nível curricular, a interdisciplinaridade no nível didático e a transdisciplinaridade no nível pedagógico” (FAZENDA, 2008, p.87). Transpondo para o ensino superior, infere-se a competência no nível curricular e a transdisciplinaridade no nível andragógico. A transdisciplinaridade, de acordo com Theophilo Roque, propõe, Transcender o universo fechado da ciência e trazer à tona a multiplicidade fantástica dos modos de conhecimento, assim como o reconhecimento da multiplicidade de indivíduos produtores de todos estes novos e velhos modos de conhecimento (ROQUE, 2003) Nesse sentido, pode-se afirmar que a transdisciplinaridade é composta por múltiplos sistemas de níveis e objetivos. D’Ambrósio, em seu artigo sobre a Transdisciplinaridade na Universidade, esclarece que, O conhecimento é então encarado como modos, estilos, técnicas de explicar, de conhecer, de lidar com a realidade como ela se manifesta em distintos ambientes naturais e culturais. Obviamente, esses modos, estilos e técnicas não se realizam no modelo disciplinar, nem mesmo nos seus variantes da multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade. Exigem uma visão transdisciplinar do conhecimento. (D´AMBROSIO, 2014, p.2) Consegue-se, através dos estudos, conjugar a transdisciplinaridade com a teoria pós- crítica, quando D´Ambrósio (2014, p.3) afirma que em sua essência a transdisciplinaridade é uma atitude de respeito “e mesmo humildade, com relação a mitos, religiões e sistemas de explicações e conhecimentos, rejeitando qualquer tipo de arrogância e prepotência.”. Logo se nossa sociedade almeja transformações que interrompam o processo de incompreensão entre os indivíduos e os conflitos de todas as ordens, causados principalmente pelas disputas de poder, é fundamental um olhar atento para uma atitude transdisciplinar. Compreender que a essência da transdisciplinaridade objetiva o resgate dos valores de respeito e humildade é reconhecer que a fragmentação do conhecimento é grande 23 gerador de poder daqueles que detém o conhecimento em determinada disciplina estimulando a competição em todas as esferas sociais, conforme esclarece D´Ambrosio quando afirma que, A essência da proposta transdisciplinar parte de um reconhecimento que a atual proliferação das disciplinas e especialidades acadêmicas e não-acadêmicas conduz a um crescimento incontestável do poder associado a detentores desses conhecimentos fragmentados, podendo assim agravar a crescente iniquidade entre indivíduos, comunidades, nações e países. Além disso, o conhecimento fragmentado dificilmente poderá dar a seus detentores a capacidade de reconhecer e enfrentar os problemas e situações novas que emergem de um mundo a cuja complexidade natural acrescenta-se a complexidade resultante desse próprio conhecimento transformado em ação que incorpora novos fatos à realidade, através da tecnologia. (D´AMBROSIO, 2014, p.3). Pode-se então, concluir que um docente através de uma atitude transdisciplinar, com posturas diferentes da lógica binária, deve fazer uso da andragogia para o processo de ensino aprendizagem, superando a visão fragmentada com compreensão da complexidade que se dá os processos da vida. 24 CAPÍTULO 2 ANDRAGOGIA E HEUTAGOGIA Para entender o conceito de Andragogia e Heutagogia é preciso um entendimento prévio do processo de ensino aprendizagem e do conceito de Pedagogia, no entanto não é objeto deste estudo um aprofundamento acerca de Pedagogia, visto que o direcionamento é específico para o processo de ensino-aprendizagem do adulto que tem suas especificidades. Revisita-se, neste estudo, os trabalhos de importantes estudiosos como Freire, Malcom e Hase, para conceituação e compreensão destes termos. 2.1 Processo de Ensino Aprendizagem Como o próprio termo explicita, processo de ensino aprendizagem é a forma como se ensina e como se aprende. Partindo deste pressuposto, podemos considerar os estudos de Saviani, Libaneo e Mizukami, que embora apresentem diferenças, é sintetizado pelo trabalho de Santos (2005, p.11/12.), onde apresenta um resumo das abordagens que reproduzo neste trabalho as que mais se aproximam do conceito de Andragogia. 25 Figura 1 Escola Figura 2 Aluno 26 Figura 3 Professor Figura 4 Ensino Aprendizagem 27 Revendo o conceito do processo de ensino aprendizagem e relacionando-o com o indivíduo adulto podemos observar que: ...considera a aprendizagem um processo completamente interno controlado pelo aprendiz e envolvendo todo o seu ser em interações com o ambiente à medida que o percebe. Mas ele também acredita que a aprendizagem é um processo de vida tão natural - e tão necessário - quanto à respiração. (ROGERS in KNOWLES, 2011, p.53). Com a compreensão do processo de ensino aprendizagem e suas abordagens, faz-se necessário conceituar os termos Pedagogia, Andragogia e Heutagogia para promover a reflexão crítica entre processo, métodos, sujeitos e objetos. 2.2 Andragogia e Heutagogia O Termo Pedagogia tem origem na Grécia antiga e vem das palavras: "paidos" ("da criança") e "agein" ("conduzir") (WIKIPEDIA, 2015). Freire, que escreveu diversos livros sobre Pedagogia, a define “como uma ação cultural, diferenciando duas ações culturais centrais: educação bancária e educação problematizadora.” (FREIRE, 2013, p.8) e não especifica a quem se destina a aplicação, logo é cabível pensar que com o passar do tempo o termo pedagogia adquire um sentido que vai além do “ensinar crianças”, amplia sua ação ser aplicada ao ensinar as “crianças que cresceram”, porém com considerações específicas para os jovens e adultos. Enquanto a criança necessita da “condução” do professor para o conhecimento, o adulto não tem essa necessidade, então entre pedagogia para crianças e “pedagogia” para adultos, temos uma diferença de atuação de quem e como e para quem será aplicada. Nesse cenário surge a Andragogia, termo não muito utilizado ainda nos dias de hoje, que também tem sua origem derivada do Grego, nas palavras: “Andros” (“adulto”) e “gogos” (“educar”). O Termo Andragogia foi proposto por Malcolm Knowles, na década de 70. De 28 acordo com Knowles, o professor passa a ser um facilitador e a responsabilidade passa a ser do aprendente. No quadro abaixo, temos os princípios básicos da Andragogia. Quadro 2 Princípios Básicos da Andragogia (Wikipedia, 2015) 1. Necessidade de saber: adultos precisam saber por que precisam aprender algo e qual o ganho que terão no processo. 2. Autoconceito do aprendiz: adultos são responsáveis por suas decisões e por sua vida, portanto querem ser vistos e tratados pelos outros como capazes de se autodirigir. 3. Papel das experiências: para o adulto suas experiências são a base de seu aprendizado. As técnicas que aproveitam essa amplitude de diferenças individuais serão mais eficazes. 4. Prontidão para aprender: o adulto fica disposto a aprender quando a ocasião exige algum tipo de aprendizagem relacionado a situações reais de seu dia-a-dia. 5. Orientação para aprendizagem:o adulto aprende melhor quando os conceitos apresentados estão contextualizados para alguma aplicação e utilidade. 6. Motivação: adultos são mais motivados a aprender por valores intrínsecos: autoestima, qualidade de vida, desenvolvimento. Fonte: adaptado do site Wikipedia Desta forma pressupõe-se que, “ninguém educa ninguém, ninguém aprende sozinho, nós homens e (mulheres) aprendemos através do mundo” (FREIRE, 2013, p.103), ou seja, a própria concepção de pedagogia de Freire vai de encontro ao conceito de andragogia, “pois o indivíduo busca seu conhecimento através de suas vivências” (LEMOS, 2014, p.2). Para comparar melhor os princípios de Pedagogia e Andragogia, observa-se a tabela abaixo reproduzida do artigo de Matai (2006, p.7). Quadro 3 Pedagogia x Andragogia MODELO PREMISSAS PEDAGÓGICO ANDRAGÓGICO Necessidade de Conhecer As crianças aprendem, sem questionar e saber para que serve o que o professor ensina. O adulto conhece a suas necessidades e de forma pragmática, busca conhecimento naquilo que tem necessidade. Autoconceito do Aprendiz O aprendiz é dependente do mestre. O sistema afeta a auto-estima e O adulto atua de forma independente, com autonomia e se sente capaz de aprender e de adquirir conhecimento 29 deprime ao colocar a capacitação do aprendiz em dúvida. de que necessita, inclusive sem a ajuda do professor. O papel do Aprendiz Não se valoriza a experiência do aprendiz e sim a do professor e de outros letrados. O aprendiz somente tem que ler, ouvir, fazer exercícios escolares. A experiência do adulto aprendiz é de importância central. A experiência do professor e de outros letrados serve somente como fonte de consulta, que poderá ser ou não valorizada pelo aluno. Prontidão para Aprender O aprendiz sempre está disposto a aprender o que o professor determinar para ser aprovado. O aprendiz adulto está pronto para aprender aquilo que decide aprender, o que considera significativo para as suas necessidades. Orientação da Aprendizagem Aprendizes são orientados a aprender por disciplina, com conteúdos específicos que lhe serão futuramente necessários, na visão do professor. A aprendizagem é organizada pela lógica dos conteúdos programáticos. O aprendiz adulto orienta a sua aprendizagem para o que tem significado em sua vida – com aplicação imediata, não para aplicações futuras. O conteúdo não precisa necessariamente ser organizado pela lógica programática. Motivação Aprendizes são motivados a aprender por incentivos externos, como notas, aprovação, reprovação, cobrança dos pais e outros. A motivação dos adultos está na sua tendência à atualização, uma motivação interna, sua própria vontade de crescimento, sua auto-estima e sua realização Fonte: MATAI apud CAVALCANTI, 2005. A partir da Andragogia, na forma de uma extensão que incorpora a auto-aprendizagem, identifica-se o surgimento, através de Stewart e Hase e Chris Kenyon, do termo Heutagogia, de origem grega, nas palavras: "heuta" ("auto") e "agogus" ("guiar") (WIKIPEDIA, 2015). Hase sugere que “há benefício na passagem da andragogia para a aprendizagem verdadeiramente auto-determinada” (HASE, 2000, p.1) conceituando-a como heutagogia. Para Hase heutagogia 30 Baseia-se na teoria humanista e abordagens à aprendizagem descrita na década de 1950. Sugere-se que heutagogia é adequada às necessidades dos alunos do século XXI, em particular no desenvolvimento da capacidade individual. Uma série de implicações de heutagogia para o ensino superior e do ensino profissional são discutidos (HASE, 2000, p.1). De acordo com Hase (2000, p.2) a heutagogia pode ser vista como uma progressão natural das metodologias educacionais anteriores e pode fornecer a melhor abordagem para a aprendizagem no século XXI. Hase também reconhece que: A informação é rápida e facilmente acessível; que onde a mudança é tão rápida os métodos tradicionais de formação e educação são totalmente inadequados; que o conhecimento baseado em disciplina é inadequado para se preparar para viver em comunidades modernas e locais de trabalho; que a aprendizagem é cada vez mais alinhada com o que fazemos; que estruturas organizacionais modernas exigem práticas de aprendizagem flexíveis; e que existe uma necessidade de rapidez de aprendizagem (HASE, 2000, p.3). De uma forma geral, pedagogia pode ser caracterizada com um processo de ensino- aprendizagem para a criança, onde o professor determina o que deve e como deve ser aprendido, enquanto que na andragogia, o adulto é o centro do processo, surge a figura do “facilitador” que determina o que será aprendido e o aluno como irá aprender e, por fim, na Heutagogia, o próprio aluno determina como e o que irá aprender, representando a aprendizagem autodeterminada. 2.3 Relação com uma nova estrutura Curricular Pode-se sugerir que seja possível relacionar a Heutagogia com uma nova estrutura curricular, de acordo com Hase, é possível relacionar sim, pois Uma abordagem heutagogical reconhece a necessidade de ser flexível na aprendizagem onde o professor fornece recursos, mas o aluno desenha o curso real que ele ou ela pode levar ao negociar a aprendizagem. Assim, os alunos podem ler em torno de questões críticas ou perguntas e determinar o que é de interesse e relevância para eles e, em seguida, negociar novas tarefas de leitura. Como professores, devemos nos preocupar com o desenvolvimento da capacidade do aluno e não apenas a incorporação de habilidades com base de 31 disciplina e conhecimento. Devemos renunciar a qualquer poder que julgarmos a nós mesmos para ter. (HASE, 2000, p.5) Logo, a incorporação de habilidades com base de disciplina e conhecimento não são mais importantes que o desenvolvimento da capacidade do aluno, é coerente afirmar que uma organização curricular, sem disciplinas pré-fixadas, onde o processo de ensino- aprendizagem se dá por meio de situações reais, que podem ser determinadas pelo próprio aluno, a Heutagogia e uma nova estrutura curricular seriam complementares e dependentes para o sucesso do processo num todo. Hase cita como exemplo Modelos de aprendizagem baseada no trabalho que existem atualmente demonstram como integrar o desenvolvimento de recursos humanos e gestão de recursos humanos (HASE, 1998), que soam heutagogicamente. Estes modelos desafiam as nossas formas de pensar sobre a aprendizagem e o aluno por: os professores pensam mais sobre o processo do que sobre conteúdo, permitindo aos alunos dar sentido ao seu mundo, em vez de fazer o sentido do mundo do professor; forçando-nos a passar para o mundo do aluno e permitindo aos professores olhar além de sua própria disciplina e teorias favoritas. (HASE, 2000, p.6) Como relacionar então? É possível verificar, através dos estudos que a relação se dá exatamente pelo pressuposto da Heutagogia de que, quem determina o que quer aprender é o aluno, logo não existe um currículo tradicional que atenda a necessidade de desenvolvimento do adulto considerando seu próprio conceito. 32 CAPÍTULO 3 ATUAÇÃO DOCENTE Após a exposição da história do currículo e suas teorias, dos conceitos de pedagogia, andragogia e heutagogia e o processo de ensino aprendizagem, entende-se que se faz necessário refletir como a atuação docente será articulada em um contexto curricular novo. Para tanto é importante verificar como o docente deve se preparar e atuar de acordo com todo esse cenário de transformação, quais as tecnologias atuais podem serusadas para atuação deste “mediador” do conhecimento e serem apropriados neste contexto. Entende-se a importância de verificar situações reais onde novas estruturas estão sendo aplicadas no ensino superior demonstrando a atuação docente e como o mercado de trabalho docente pode ser afetado com uma nova organização curricular. 3.1 A Ação Docente Sabe-se que muitos docentes, atuam apenas baseados nos referenciais que carregam dos antigos professores que pressupõe ser adequado para aplicação em sala de aula, logo, para reflexão sobre a ação docente, o texto de Freire, determina bem seu significado quando diz que, “na verdade, não nasci marcado para ser um professor a esta maneira, mas me tornei assim na experiência de minha infância, de minha adolescência, de minha juventude” (FREIRE, 2001, p.42). Então qual deve ser a prática docente em uma nova estrutura curricular, organizada por situações reais, transdisciplinar, visando alcançar a excelência na tarefa de ensinar o aluno a aprender? Se a práxis docente se desenvolve no decorrer da experiência do indivíduo que vem a tornar-se professor, a primeira ação a ser observada é a atitude do 33 docente diante da vida, seus valores éticos em relação à ética universal. Sem uma conduta ética é impossível que o docente possa ser um mediador que transmita valores humanistas, justos e morais para o aluno. A segunda ação é ter humildade para aceitar que nos dias de hoje a internet provém todo o conteúdo de que o aluno necessita, logo, o professor não é mais o detentor do saber embora este fato não deva ser considerado fator desmerecedor da sua atuação enquanto mediador que detém domínio sobre o conteúdo que o aluno deseja conhecer. A terceira ação é conhecer e aprender a lidar com o ser humano, entender suas características e através dessa prática, seja pela andragogia e/ou heutagogia promover a capacidade do aluno em autodesenvolvimento, reflexão e pensamento crítico, político, social de forma universal. Assim, é importante que o professor reflita e seja persistente para enfrentar e transformar as rotinas. Em relação à reflexividade, Libâneo (2002) diz que há duas formas básicas: a liberal e a crítica. Em relação à crítica, aborda a reflexividade crítico-reflexiva como tarefa intencional e ativa dos professores, e identifica modos de agir do professor a partir das seguintes características: Fazer e pensar, a relação teoria e prática; Agente numa realidade social construída; Preocupação com a apreensão das contradições; Atitude e ação críticas frente ao mundo capitalista e sua atuação; Apreensão teórico-prática do real; Reflexividade de cunho sociocrítico e emancipatório. (LIBÂNEO, 2002, p. 63). A quarta ação, é ter a capacidade de se relacionar e dirigir entre todas as áreas do saber para encontrar o ponto de convergência entre o todo e o seu conhecimento, facilitando o ensinar através de situações reais e não de uma disciplina especifica, essa inter-relação deve promover ações entre diversos docentes com seus saberes diferentes, agregando valor ao aprendizado do aluno. Nesse aspecto é importante compreender que a noção de deter o poder sobre determinado assunto necessita deixar de existir para que todos compartilhem seus saberes para o bem comum, porém negar o poder não é abrir de dominar o conteúdo, esse domínio é necessário para que o docente inspire a confiança do aluno. 34 O docente também necessita evoluir, pesquisar, praticar o saber que domina e o saber mediar o saber, visto que o mundo e a sociedade estão em constante evolução, não se pode estagnar e acreditar que desta forma o sucesso no processo de ensino aprendizagem será sempre o mesmo. É fato conhecido que existem docentes que buscam seu desenvolvimento e não esperam acontecer, por amor ao ato de ensinar a aprender, ultrapassando as adversidades que se impõem em sua trajetória de vida e profissional e obtém verdadeiro sucesso por sua dedicação e, em alguns casos, sacrifícios. De certa forma este direto está garantido pela Lei, porém é necessário que o doente tenha seu desejo de evoluir e é importante destacar que no texto da LDB de 1996 (Art. 67) está previsto que deve ser assegurado pelos sistemas de ensino aos professores, dentre outros: aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim e período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho (BRASIL, 1996). Portanto, a formação continuada é uma necessidade e um direito, cabendo ao docente fazer valer o seu direito e aos sistemas de ensino repensar os programas oferecidos, favorecendo a uma formação crítico-reflexiva. 3.2 Tecnologia atual Ao falar em tecnologia atual, a Internet surge como principal ferramenta de disponibilização de conteúdo de forma dinâmica nesse cenário. Desta forma é possível verificar que a velocidade com que o conhecimento muda e é disponibilizado fica quase impossível que o professor que mantem a práxis tecnicista possa acompanhá-la e motivar ou prender o interesse do aluno. A própria rotina diária tem motivado o acesso a formas de aprendizagem diferenciadas, como, por exemplo, a formação EAD, Certificações Tecnológicas a Distância, e até 35 mesmo Mestrado EAD, embora ainda de forma muito restrita e algumas de elevado custo financeiro. Desta forma conclui-se que o docente precisará preparar-se para um novo cenário profissional, talvez um cenário em que as pessoas entrem no processo de ensino aprendizagem virtualizado. Novas profissões certamente estão a surgir, assim como a profissão de Design Instrucional e o docente deverá estar aberto para este novo cenário visto sua responsabilidade em formação dos indivíduos para uma sociedade mais humanizada e pacífica. 3.3 Motivação e Aprendizagem Uma das tarefas mais difíceis do docente nos tempos atuais, considerando a tecnologia oferecida e os métodos tradicionais de ensino que ainda existem nas instituições é a motivar a autonomia em aprender, é aumentar o interesse do aluno em conteúdo que ele pode acessar virtualmente quando bem lhe convier. De acordo com Freire entende-se o professor como alguém que está ali para facilitar a autonomia e a aprendizagem do aluno, porém de modo desafiador, fazendo com que o educando venha a perceber que cada vez mais ele necessita aprender, de forma crítica. Então como motivar o aluno adulto, que trabalha quarenta horas semanais no mínimo, que vai para uma sala de aula, que talvez esteja ainda com formas de ensino tradicionais, apenas pela necessidade de aquisição de um diploma que talvez possa garantir uma remuneração um pouco melhor que a atual? A resposta talvez esteja em identificar o que esse aluno, enquanto sujeito autônomo deseja aprender, liberá-lo da obrigatoriedade de horário, tornando-o flexível a disponibilização do discente, deixando que ele decida em que momento está mais disposto a aprender, a conhecer e a refletir. O papel do docente nesse cenário é articulado com uma nova estrutura curricular, escolhida e determinada pelo aluno, organizada por meio de situações reais e problematizada de acordo com a 36 sociedade em que vive. O docente atua formando este indivíduo integralmente. Luckesi (2003, p. 11) aborda que a “formação integral do ser humano necessita abrir-se para uma lógica transdisciplinar”, o que implica na inclusão de todas as linhas de desenvolvimento do ser humano: cognitiva, afetiva, emocional, espiritual, ética, social, criativa. 3.4 Mercado de Trabalho Pensar em mercado de trabalho é pensarno futuro, pois estamos constantemente atravessando diversas mudanças no mercado de trabalho devido ao avanço da tecnologia da informação e o próprio movimento de reordenação da Educação e o anseio de transformação da sociedade com aumento progressivo de IES privadas e do método de ensino a distância. Logo é cabível imaginar um futuro em que salas de aulas presenciais sejam substituídas por laboratórios e estes estejam disponíveis para docentes e discentes, de acordo com suas disponibilidades, sem obrigatoriedades, pois o conteúdo pode ser disponibilizado virtualmente e os professores podem motivar seus alunos em qualquer lugar e hora em que estejam conectados. Assim é possível propiciar tanto ao docente quanto ao discente o tempo necessário para pesquisa científica, para aprimoramento dos seus saberes e a ajuda mutua. Observa-se que o mercado de trabalho está em adequação para um novo professor, aquele transformado em designer de currículo, viabilizando a integração entre os saberes, como já vem ocorrendo nos Estados Unidos. De acordo com Ronaldo Mota que afirma que: O professor designer de currículo é a expressão maior e mais completa do mestre contemporâneo. Vai além de ministrar o conteúdo estrito senso, mas é também responsável por preparar o educando para o hábito de aprender a aprender, desenvolvendo habilidades de aprendizagem que são consideradas imprescindíveis aos profissionais e cidadãos em um mundo centrado na inovação. (MOTA, 2013, p1) 37 De acordo com Machado (2008, p.14) percebe-se que o docente de ser capaz de “além da experiência profissional articulada à área de formação específica, (...), dialogar com diferentes campos de conhecimentos e inserir sua prática educativa no contexto social, em todos os seus níveis de abrangência”. E conforme Machado sintetiza, o perfil do docente da educação profissional precisa dar conta de três níveis de complexidade: a) desenvolver capacidades de usar, nível mais elementar 16 relacionado à aplicação dos conhecimentos e ao emprego de habilidades instrumentais; b) desenvolver capacidades de produzir, que requer o uso de conhecimentos e habilidades necessários à concepção e execução de objetivos para os quais as soluções tecnológicas existem e devem ser adaptadas; e c) desenvolver capacidades de inovar, nível mais elevado de complexidade relacionado às exigências do processo de geração de novos conhecimentos e novas soluções tecnológicas. (MACHADO, 2008, p.15) Desta forma pode observar que surge gradativamente um novo movimento de transformação profissional e do mercado de trabalho do docente. 38 CAPÍTULO 4 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR POR MEIO DE SITUAÇÕES Neste capítulo discute-se o tema central deste trabalho, que é a proposta de uma nova estrutura curricular organizada por meio de situações, sem ser fragmentada em disciplina, considerando o ensino superior tecnológico como foco principal e seus docentes e discentes. Apresentam-se fatores que pressupõe a necessidade de uma nova organização curricular, o que existe em termos de Lei que favorece essa mudança e as tendências atuais que consideram aplicável o tema deste trabalho, inclusive o modelo de educação utilizado na Finlândia. Apresenta-se neste trabalho um conjunto de pesquisas realizadas através de questionários, com o objetivo de coletar a opinião e a vivência de docentes e discentes do ensino superior tecnológico, a cerca de uma nova estrutura curricular, transdisciplinaridade e os valores implícitos nesse contexto. 4.1 Fatores para nova estrutura Considera-se um fator importante que um currículo organizado por situações culturais, sociais e realistas com objetivo de resolver os problemas da sociedade em que está inserido, por meio da educação. Desta forma poderá possibilitar uma transformação na sociedade, visto que a resolução de problemas sociais por meio da educação, já é uma tendência que reforça a necessidade de uma reforma curricular, considerando que as reformas curriculares foram norteadas pela sociedade e para a sociedade, no decorrer da história do currículo (FREIRE, 1993). 39 Atualmente, com o advento da Tecnologia, encontra-se qualquer conteúdo disponível de forma virtual, logo qual o sentido de trazer 50 alunos para uma sala de aula e apresentar um conteúdo que ele já tem acesso de qualquer lugar e em qualquer momento, onde praticamente não existe novidade? Pressupõe-se que através de um conteúdo transdisciplinar, com docentes atuando na prática da andragogia, favorecendo ao aluno a capacidade de reflexão crítica sobre o saber e o motivando a pensar e a pesquisar. Entretanto, não se pode considerar que sejam desnecessários os encontros presenciais, pois são práticos para elaboração de projetos relacionados ao conteúdo e ao próprio convívio do ser humano com outros, o que contribui para a sua formação. Entende-se que o conteúdo deve estar de acordo com a necessidade da sociedade em que docente e discente vivem. Portanto, modelos tradicionais de currículo, que não são aplicáveis na prática podem inviabilizar movimentos criativos e inovadores, pois considera-se que a realidade é complexa e diversificada e não pode ser compreendida apenas olhando partes separadas e esquecendo de que tudo acontece de forma global e unificada. Nesse contexto é necessário que se resgate os valores e os conhecimentos produzidos de forma coletiva através da cooperação dos vários campos do saber. A organização dos saberes de acordo com o artigo 5º da Carta da Transdisciplinaridade (FREITAS, 2010) diz que a docência transdisciplinar deve ser aberta ultrapassando o campo das ciências exatas devido ao seu diálogo e sua reconciliação não somente com as ciências humanas, mas também com a arte, a literatura, a poesia. E, complementando essa ideia, a construção de conhecimento também ganha consistência na experiência espiritual como abordada no artigo 8º (FREITAS, 2010, p. 98): A dignidade do ser humano também é de ordem cósmica e planetária. O aparecimento do ser humano na Terra é uma das etapas da história do universo. O reconhecimento da Terra como pátria, é um dos imperativos da transdisciplinaridade. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade, mas, com o título de habitante da Terra, ele é ao mesmo tempo um ser transnacional. O reconhecimento pelo direto internacional dessa dupla condição - pertencer a uma nação e a Terra - constitui um dos objetivos da pesquisa transdisciplinar. Também é possível verificar na Legislação um movimento que reforça o ensino superior como alicerce para atender as demandas sociais, pois com a proposta do MEC - Ministério da Educação e Cultura, os cursos superiores de tecnologia devem ser como 40 “uma das principais respostas do setor educacional às necessidades e demandas da sociedade brasileira”, uma vez que o progresso tecnológico vem causando profundas “alterações nos modos de produção, na distribuição da força de trabalho e na sua qualificação” (BRASIL, 2002, p.2). Assim, entende-se que estes são fatores para que possa refletir sobre uma nova organização curricular. 4.2 Legislação Sempre que ocorre a discussão sobre uma nova estrutura curricular é necessário recorrer à legislação, sobre o que ela determina e permite que se aplique no âmbito curricular do Ensino superior. Também podemos verificar, através de Delors (2001) que considera em seus textos, quatro pilares que afirmar serem cabíveis na construção de uma nova organização curricular, que são: “aprender a conhecer..., aprender a fazer..., aprender a viver junto...; e aprender a ser." (DELORS, 2001, p.90). Atravésdo CNE - Conselho Nacional de Educação, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a organização e o funcionamento dos cursos superiores de tecnologia, encontramos no Artigo 2º, que o curso deve “adotar a flexibilidade, a interdisciplinaridade, a contextualização e a atualização permanente dos cursos e seus currículos; ” (BRASIL, 2002, p.1), fator que corrobora para a proposta de uma nova estrutura curricular. Ainda nas Diretrizes Curriculares Nacionais, pode-se perceber que é cabível uma organização curricular com aspectos, humanísticos, através do Artigo 6º, 41 § 1º A organização curricular compreenderá as competências profissionais tecnológicas, gerais e específicas, incluindo os fundamentos científicos e humanísticos necessários ao desempenho profissional do graduado em tecnologia. (BRASIL, 2002, p.2) Observa-se também que existe um apoio nas Diretrizes Curriculares em estabelecer currículos experimentais, que pode ser considerado como uma nova organização curricular, conforme apresentado no Artigo 14º, Poderão ser implementados cursos e currículos experimentais, nos termos do Artigo 81 da LDBEN, desde que ajustados ao disposto nestas diretrizes e previamente aprovados pelos respectivos órgãos competentes. (BRASIL, 2002, p.3) Embora possa observar nas Diretrizes e na LDB nº 9.394/96, a liberdade em inovar no âmbito da organização curricular, ainda é possível identificar que a burocratização infere na limitação da inovação propriamente dita. Para completar ainda no decorrer da elaboração deste trabalho, foi sancionada a Lei 13.168/2015, que altera o artigo 47º da LDB 9394 e determina que “a lista das disciplinas que compõem a grade curricular de cada curso e as respectivas cargas horárias; ” (BRASIL, 2015) deverá ser publicado antecipadamente, o que pode acarretar a impossibilidade de oferecer um currículo flexível no decorrer do curso com a ajuda do aluno em sua formação. No PNE – Plano Nacional de Educação, também é possível que existe a necessidade de mudar o foco para a aprendizagem do aluno conforme disposto na estratégia 15.6, onde afirmar que deve-se “promover a reforma curricular dos cursos de licenciatura e estimular a renovação pedagógica, de forma a assegurar o foco no aprendizado do (a) aluno (a). (WEIGERT, 2014, p.82). Ainda no PNE, também é possível identificar um fator importante na estratégia 10.6, que determina Estimular a diversificação curricular da educação de jovens e adultos, articulando a formação básica e a preparação para o mundo do trabalho e estabelecendo inter-relações entre teoria e prática, nos eixos da ciência, do trabalho, da tecnologia e da cultura e cidadania, de forma a organizar o tempo e o espaço pedagógicos adequados às características desses alunos e alunas. (WEIGERT, 2014, p.78) 42 Diante do exposto é factível afirmar que a Legislação apoia uma reforma na organização curricular, considerando os pressupostos já apresentados neste trabalho, porém o movimento para mudança deve ocorrer em todas as esferas envolvidas nesse processo inerente à sociedade, não depende apenas de um único indivíduo, mas um indivíduo pode iniciar essa mudança. 4.3 Tendências Atuais Como tendência atual na organização curricular no Brasil, tem-se o currículo flexível na Escola de ensino integral no Estado do Rio de Janeiro, o projeto do Estado de São Paulo e o Método de Ensino do Instituto Ayrton Senna, que embora não seja para o Ensino superior, demonstram que existe legítimo interesse em reformar a educação. O Estado de São Paulo projeta para 2016, uma organização curricular onde o aluno poderá escolher o que deseja aprender, objetivando atrair o interesse e o retorno do aluno para o “aprender” (ESTADÃO, 2015). No ensino superior brasileiro é apresentada uma nova organização curricular através do Projeto PORVIR, onde a Universidade UniAmérica, de Foz do Iguaçu (PR), iniciou em 2014 um projeto onde não existe a divisão por séries e sem currículo organizado por disciplinas (KALENA, 2014). O objetivo, segundo Kalena é Oferecer ao aluno um aprendizado ativo e, com isso, aproveitar melhor cada oportunidade de desenvolvimento que tem na universidade. Com a retirada da divisão por disciplinar as competências são orientadas por projetos temáticos semestrais, onde o aluno escolhe um problema real da sua comunidade para trabalhar os temas daquele semestre. Neste projeto não existem aulas expositivas, os conteúdos são estudos em qualquer lugar, o tempo de sala de aula é destinado a debates, reflexões e problematizações com todos os alunos, visto que não existem mais divisões por séries (KALENA, 2014). A Universidade Minerva também apresentou uma revolução no ensino superior, com sua proposta de substituição das suas aulas tradicionais por Seminários e dividiu as áreas do 43 saber em cinco: artes e humanidades, ciências sociais, ciências naturais e ciência da computação e negócios (RODRIGUES, 2015, p.1). No âmbito internacional temos o método de Ensino da Finlândia, considerado e atestado pelo PISA (Programme for International Student Assessment, ou Programa para Avaliação Internacional de Estudantes) como um dos melhores no mundo, equiparado ao Ensino de Cingapura e da China, diferindo na questão da gratuidade, pois na Finlândia apenas 3% das instituições de ensino são privadas. Observa-se em comum a valorização do professor desde a pré-escola, o foco no aluno, o investimento e o planejamento na utilização do mesmo, a descentralização, a valorização no aprendizado, em suma conforme Marten (2003, p.1) reproduz em seu artigo: “Uma boa educação era vista como um direito humano essencial relata Erkki Aho”. Os professores são altamente capacitados, pois todos são graduados e por isso lhes é concedida a autonomia necessária para determina o processo de ensino aprendizagem. Atualmente a Finlândia está a aplicar uma nova reforma no ensino, onde a transdisciplinaridade é o foco central da mudança, substituindo parcialmente o currículo por disciplina por um currículo por fenômenos, onde não se estuda mais as disciplinas, porém tópicos onde se podem aprender todos os saberes concomitantemente, com os alunos participando ativamente do planejamento do currículo. O ensino superior da Finlândia se divide em Acadêmico e Politécnico, este segundo prioriza formar profissionais que tragam soluções para os problemas da sociedade, a organização dos seus cursos é realizada de acordo com seguintes áreas: Recursos Naturais Tecnologia e Transportes Gestão e Administração, Hotelaria e Economia Doméstica Cultura Humanidades e Educação (LOPES, 2000). Já no Catálogo Nacional Brasileiro de Cursos Superiores de Tecnologia de 2010, têm-se as seguintes áreas de acordo com o Ministério da Educação: Ambiente e Saúde, Apoio Escolar, Controle e processos industriais, Gestão e Negócios, Hospitalidade e Lazer, Informação e Comunicação, Infraestrutura, Militar, Produção Alimentícia, Produção Cultural e Design, Produção Industrial, Recursos Naturais e Segurança. Diante do resultado encontrado nessa busca por identificar as Tendências Atuais referenciando ao Tema deste trabalho, pode-se perceber que existe um futuro promissor 44 no caminho de construir uma educação onde a organização curricular deixa de ser por disciplina, contudo, essa mudança deve ocorrer desde sua base inicial, para que possa se perpetuar no indivíduo durante toda sua trajetória. 4.4 Apresentação da Coleta e Análise de Dados da Pesquisa Com base nos estudos apresentados, dispõe-se a análise dos dados coletados e os resultados obtidos. Dessa forma, tentamos responder o problemamencionado na introdução: 1. É possível despertar o interesse do educando do curso superior de tecnologia em aprender e inovar, através de uma nova estrutura curricular organizada por meio de situações reais, a fim de gerar valores para a sociedade em que vive? A aplicação dos 3 questionários ocorreu através de meio eletrônico, ou seja, acesso à internet. Foi divulgado em grupos de professores e de alunos da internet, mídias sociais, e-mail e celulares. Suas respostas foram coletadas de forma anônima, para preservar a identidade dos respondentes. O primeiro questionário aplicado foi destinado a professores do ensino superior tecnológico, com o objetivo de saber como os docentes compreendem o currículo. A partir das respostas do questionário, obtivemos algumas informações sobre conhecimento em relação ao tema organização curricular. Tal questionário está constituído de 5 questões fechadas com múltipla escolha e espaço para comentário, conforme ANEXO A. O segundo questionário aplicado foi destinado a alunos do ensino superior tecnológico, com o objetivo de compreender a visão do aluno e a importância que o mesmo dispõe sobre uma nova organização curricular. A partir das respostas podemos observar o posicionamento dos alunos a respeito do tema. Tal questionário está constituído de 9 questões de fechadas com múltipla escolha e espaço para comentário conforme ANEXO B. 45 O terceiro e último questionário aplicado também foi destinado a professores com o objetivo de conhecer a opinião e entendimento sobre um currículo organizado por meio de situações reais e transdisciplinaridade, conforme ANEXO C. Questionário 1 – Quem são os Docentes que estamos pesquisando e como os compreendem o Currículo Acadêmico. Temos neste questionário 100% de professores atuando na rede privada de ensino superior, embora não fosse o grupo específico. Figura 5 Percentual de Docentes por Rede de Ensino Desse total 75% acredita ser possível a aplicação de uma organização curricular determinada por meio de situações reais. Um docente que respondeu negativamente sobre uma nova organização curricular, argumentou que “conhecimentos básicos são determinantes para a formação do indivíduo. Ademais, nosso sistema de ensino fundamental e médio não ajudam o ensino superior”. 100% 0%0% Percentual de Docentes por Rede de Ensino Privada Pública Ambos 46 Figura 6 Percentual de Docentes favoráveis ao Tema Em relação a área de conhecimento, apesar de ter sido destinado ao Ensino Superior Tecnológico, devido a pesquisa estar disponível na internet, obteve-se 75% de respostas de Docentes de outras áreas de acordo com o gráfico da figura 7 e pode-se perceber que mesmo em outras áreas também acredita-se que uma nova estrutura curricular é possível, mostrando a compreensão do docente em relação ao tema. Figura 7 Área de Conhecimento 75% 25% Acreditam ser viável uma nova estrutura curricular Sim Não 50% 25% 25% Área de Conhecimento Saúde Tecnologico Ciências Humanas 47 Questionário 2 – Pesquisa destinada a Professores do Ensino Superior Tecnológico Sobre Organização Curricular Neste segundo questionário, aplicamos questões que busca obter opiniões e conhecimentos mais reflexivos sobre o tema. Cerca de 70% dos entrevistados já tinham ouvido falar em organização curricular por meio de situações. Quando questionados sobre a possibilidade de o docente interagir com outros professores na elaboração de aulas em uma nova organização curricular, bem como destinar tempo para pesquisa científica e encontros com colegas de outras especialidades, objetivando o planejamento em conjunto e o foco no aprendizado do aluno, 90% dos entrevistados respondeu que acredita ser positiva essa forma de atuação e que o profissional não será desvalorizado. Alguns comentários foram significantes sobre a questão em si, que reproduzo neste trabalho para conhecimento de todos. “Seria muitíssimo interessante isto. Os professores vivem em correria e mal tem tempo de preparar as suas aulas sozinhos. Especialmente aqueles que trabalham durante o dia e dão aulas à noite. Seria muito interessante conseguir juntar todos os professores de um determinado curso para desenhar as integrações entre os assuntos e exemplos utilizados por todos. Mantendo uma conexão entre a parte conceitual e prática de cada curso.” Entrevistado 1 (2015). “Oportuniza uma produção coletiva que não necessariamente precisa ser realizada com encontros presenciais. Assim, uma proposta de rede para trocas de experiências, projetos tornariam relatórios enriquecedores e deles muitas idéias e planos incríveis. Uma pesquisa formação em prática. Índico Edmea Santos sobre esse assunto.” Entrevistado 2 (2015) “Entendo que desta forma amplia a proposta da aula agregando visões e posturas dos outros professores.” Entrevistado 3 (2015) Os 10% dos entrevistados que não concordaram com a forma de atuação citada, optaram por não deixar comentários. Quando questionados sobre o conhecimento dos Termos de Andragogia e Heutagogia, 60% dos entrevistados responderam positivamente. Obteve-se um comentário interessante relativo a um entrevistado que não conhecia os termos que deixou claro que 48 embora não conhecesse o termo, aplicava-o diariamente, conforme mensagem deixada no questionário: Na verdade, intuitivamente. Mas depois que fui ler os 6 princípios da ANDRAGOGIA e o significada da HEUTAGOIA pude perceber que seguia estes princípios no dia a dia das minhas aulas, onde muitos exercícios práticos são desenvolvidos através do exemplos reais que cada aluno vive nos seus trabalhos.” Entrevistado (2015). Ao questionar aos entrevistados se concordam que atualmente com conteúdo disponível para acesso online livre, a forma de transmitir o conhecimento é substituída pela forma de ensinar a aprender e a pesquisar, teve-se a concordância de 60%, porém entre os 40% que discordaram, deixaram em seus comentários que acreditam ser uma agregação e não substituição. Quando o entrevistado foi questionado sobre acreditar ser possível motivar o aluno adulto, trabalhador, no modelo curricular tradicional, obtivemos 62,5% de respostas positivas, porém vale reproduzir os comentários obtidos nesta questão. “Dizer que não é radicalismo. A motivação é mais difícil no modelo tradicional, mas não é impossível.” “É preciso que ele enxergue onde poderá aplicar aquele conteúdo na sua vida real. Senão ele vai automaticamente se desmotivar e perder o interesse. Para isto o professor tem um trabalho forte de tentar entender o dia a dia de seus alunos para propor exercicios que sejam úteis para os mesmos no seu dia a dia.” “O modelo tradicional fará com que cumpra o necessário para obtenção do diploma, mas motivação fora de decorebas e respostas mais assíduas e participativas creio que apenas se nesse modelo.curricular houver muita criatividade e comprometimento, além de participação assídua dos educadores, aí acredito que ele se motive e se envolva com o processo de ensino e aprendizagem num modelo curricular tradicional.” Entrevistados (2015) Considerando a proposta de uma nova estrutura curricular, questionou-se se era possível neste contexto, criar o pensamento crítico no aluno de forma que o conteúdo mediado fosse utilizado em prol de melhorias para a sociedade e 100% dos entrevistados concordaram que é possível. 49 Quando questionados sobre promover a diversidade sobre raça, gênero, sexo, cultura, numa sala de aula atuando sob o modelo curricular