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SÍNTESE SOBRE A ESSÊNCIA DA CIBERCULTURA 1 De acordo com Pierre Levy, a cibercultura está ligada a dois conceitos: a totalização e a universalidade, opositores (nota: apenas no contexto da cibercultura); isto é, quanto mais universal se torna a cibercultura, menos totalizável ela é. A universalidade diz respeito à abrangência de conteúdo, que é indeterminada, ou seja, “sem conteúdo particular”, e o ciberespaço é denominado sistema do caos, pois acatará todos os sentidos (visual, auditivo etc.). Para Levy, as implicações da cibercultura sobre a sociedade se alteram conforme aquela se modifica e evolui; neste contexto de evolução, a velocidade se mantém onipresente. Também, a cibercultura tende a convergir para a universalização de sistemas-padrão, isto é, diversas tecnologias utilizam “princípios técnicos” presentes em sua maioria, a fim de que possam ser utilizadas no maior número possível de computadores. “Quanto mais o digital se afirma como um suporte privilegiado de comunicação e colaboração, mais essa tendência à universalização [...]”. É característica do ciberespaço progredir para a integração, interconexão e para sistemas interdependentes, assim como ocorre em sistemas técnicos como aviação, automobilismo, de finanças, mas num nível maior. Há dois motivos para isso: o primeiro, pois constitui a infraestrutura de todos esses outros sistemas e assegura essa progressão dos mesmos; o segundo, é a máxima deste sistema cibernético ser a própria universalidade, ou melhor, a “interconexão geral das informações, das máquinas e dos homens”. Adiante, o autor assemelha os efeitos causados pela ascensão da cibercultura aos efeitos causados pela escrita, em sua época. Neste contexto, nas sociedades orais os emissores e receptores de mensagens compartilhavam uma “situação idêntica” e um “universo semelhante de significação”. Com a escrita, os interlocutores dum processo comunicacional deixaram de, necessariamente, compartilharem tais aspectos e, agora, podiam se expressar apesar de diferenças socioculturais. Essa característica, por sua vez, foi “legitimada” e “interiorizada” pela cultura, o que leva o autor a aferir que a escrita condiciona, mas não determina, o universal. O universal condicionado pela escrita se refere à imutabilidade do sentido da mensagem, devendo ser o mesmo ontem, hoje e amanhã. SÍNTESE SOBRE A ESSÊNCIA DA CIBERCULTURA 2 “[...] o domínio englobante do significado, a pretensão ao ‘todo’, a tentativa de instaurar em todos os lugares o mesmo sentido (ou, na ciência, a mesma exatidão) encontram-se, para nós, associadas ao universal”. Conforme Levy, as mídias de massa continuam os processos de universalidade e totalização iniciados com a escrita. Para um maior alcance, a mensagem midiática busca o “denominador comum” de seus destinatários e, portanto, “não pode explorar o contexto particular” dos mesmos. Ao realizarem tal formatação mais universal, as mídias de massa “totalizam”. Ora, totalizar é fechar os sentidos de uma mensagem, sendo estes os mesmos em quaisquer circunstâncias. Ademais, “O contexto global instaurado pelas mídias, em vez de emergir das interações vivas de uma ou mais comunidades, fica fora do alcance daqueles que dele consomem apenas a recepção passiva, isolada”. Para o autor, a totalização de uma forma cultural se dá “sobre a identidade da significação”, de modo que estas formas buscam uma convergência de características dos coletivos aos quais se referem. Mesmo que, em decorrência da escrita, a universalidade e a totalização tenham estado vinculadas, a ascensão da cibercultura permite, mas não garante, sua separação. Essa separação é possibilitada pela cibercultura, pois esta permite que os agentes da comunicação voltem a partilhar o mesmo contexto. Levy afirma que “qualquer que seja a mensagem abordada, encontra-se conectada com outras mensagens”. Sendo assim, nos tempos cibernéticos, não há mensagens que estejam fora de seu contexto (resultado do dinamismo da rede). Aqui, a interconexão proporcionada pela cibercultura dá um novo significado à universalidade como presença global; sua “totalização” não seria de sentido, mas pelo contato. Aprofundando mais, o autor difere universal de planetário (global) ao afirmar que o primeiro implica, não só uma presença globalizada de indivíduos na rede, mas o acesso à rede como um direito indissociável da humanidade; enquanto o segundo se limita simplesmente à abrangência. “Assim, o ciberespaço não engendra uma cultura do universal por de fato está em toda parte, e sim porque sua forma ou sua ideia implicam de direito o conjunto dos seres humanos”. SÍNTESE SOBRE A ESSÊNCIA DA CIBERCULTURA 3 A cibercultura, em suma, “dá forma a um novo tipo de universal: o universal sem totalidade”, pois não há como se ter um fechamento de sentido neste sistema. Seu modelo pluridirecional de difusão e o constante acréscimo das mais variadas informações impedem a totalização. Por outro lado, Pierre Levy discorre sobre o movimento social por detrás da fomentação da cibercultura e afirma que o desenvolvimento tecno-industrial, neste caso incluso o computador, é fruto de um desejo (motor) que será formulado mediante fatores econômicos e institucionais. Esse desejo é, para a cibercultura, “de comunicação recíproca e de inteligência coletiva”. Não se deve, também, confundir o ciberespaço com a infraestrutura técnica na qual se fundamenta; o ciberespaço é uma forma de utilizar as infraestruturas existentes (elétrica, telefônica, de cabos, etc.) e “visa [...] um tipo particular de relação entre as pessoas”. Essa diferenciação é importante, pois a utilização de estruturas técnicas como meio social de comunicação dá à cibercultura um significado humano, civilizatório e de liberdade de expressão. Conforme Levy, a informática pessoal foi fomentada por um movimento social que buscava transpor as máquinas computadorizadas de grandes empresas para utilização de indivíduos, alterando, assim, o significado social da informática. A comunicação baseada no sistema de computadores surgiu no fim dos anos 80, com jovens cultos que buscavam um espaço para encontros e compartilhamento de ideias. É importante, aqui, informar que o ciberespaço não é constituído apenas da Internet, mas de todas as redes que a alimentam. “[...] o ciberespaço como prática de comunicação interativa, recíproca, comunitária e intercomunitárias, o ciberespaço como horizonte de mundo virtual vivo, heterogêneo e intotalizável no qual cada ser humano pode participar e contribuir”. De acordo com o autor, três princípios regem a cibercultura, a saber, a interconexão, a criação de comunidades virtuais e a inteligência coletiva. A cibercultura valoriza a conexão em detrimento do isolamento e, portanto, gera a tendência de maior integração de sistemas numa rede única. Essa tendência causa uma mutação física da comunicação: noções de canal e rede passam para sentirmos, agora, um “espaço envolvente”, em que todo este espaço é “canal interativo”. A criação de comunidades virtuais é uma prolongação da interconexão e, portanto, condicionada por esta. É uma associação de relações em torno de interesses e aspectos em comum, não obstante as localizações diferenciadas de seus SÍNTESE SOBRE A ESSÊNCIA DA CIBERCULTURA 4 participantes. Conforme Levy, a responsabilidade individual e a opinião pública continuam a ter procedência no ciberespaço, já que as relações online não excluem as emoções, e existem regras costumeiras que regem estas relações. A moral predominante nas comunidades virtuais é a da reciprocidade, em que sua recompensa é simbólica através do reconhecimento da “opinião pública“ virtual. Neste caso, com a ascensão do ciberespaço, “opinião pública” pode ter passado por uma metamorfose, “já que as comunidades virtuais do ciberespaçoo oferecem, para debate coletivo, um campo de prática mais aberto, mais participativo, mais distribuído que aquele das mídias clássicas”. A inteligência coletiva é, conforme Levy, finalidade última da cibercultura. Vários autores sobre o tema são concordantes ao afirmarem que a melhor utilização do ciberespaço é em prol da sinergia dos conhecimentos, das ideias, etc. Ocorre que, além de ser solução, inteligência coletiva é, também, uma problematização do ciberespaço. Afinal, o ciberespaço coloca em alta o indivíduo e suas contribuições pessoais em detrimento do coletivo ou subordina o mesmo indivíduo sob um “organismo que o ultrapassa”? Essa e outras questões pautam temas como modos de organização e estilos de relações que surgem com o advento da cibercultura. Finalizando, Levy explica que a cibercultura é “um programa sem objetivo nem conteúdo” em particular; abrange e busca a todos os tipos, através de dois valores que fundamentos seus três princípios-base: a autonomia e a abertura para a diferença (de conteúdos, possibilidades, formas, etc.). REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA LÉVY, Pierre. Cibercultura. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Ed. 34, 1999. p. 111-133.
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